[especial] Em que partido vota um liberal-social nestas eleições?
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José Maria Pimentel
🎶 Olá, o meu nome é José Maria Pimentel e este é
o 45°, episódio diferente do normal, em vários sentidos, porque é mais
curto, porque sou eu a falar sozinho, é monólogo, E também porque,
ao contrário dos outros episódios, em que, como sabe, eu tento sempre
ter uma perspectiva o mais estrutural, o mais perene possível, aqui vamos
estar a falar de tema conjuntural e, portanto, o episódio vai tornar-se,
na verdade, obsoleto muito rapidamente, ao contrário do que normalmente acontece. Mas
a verdade é que eu já tinha pensado, em eleições anteriores, várias
vezes fazer episódio documentário porque, enfim, vocês ouvem, quem ouve o podcast
regularmente conhecem o meu ponto de vista, o meu ponto de partida.
Quando chegamos a eleições eu tenho sempre enfim, como imagina a maior
parte de vocês, várias dúvidas, passo semanas a pensar sobre o tema,
a pensar em quem é que vou votar e porquê, enfim, a
formar uma opinião e portanto também pensei que podia ser interessante para
quem costuma ouvir o podcast, partilhar esse processo porque pode acabar por
ser bem interessante e se calhar útil em alguns casos para quem
parte de uma posição próxima da minha. No outro dia lembrei-me disso,
pus uma story no Instagram a perguntar o que é que se
achavam que fazia sentido, enfim, houve uma maioria mais do que absoluta
a favor e portanto achei que agora tinha-me comprometido e tinha mesmo
de fazer. Além disso, eu sou defensor que, lá está, não é
algo que eu tenha feito nos últimos anos, mas acho que a
pessoa tem a obrigação de tentar ser o mais imparcial possível e
é isso que eu tento fazer aqui no podcast e sobretudo quando
toca a temas políticos e enfim, para quem ouviu, tentei fazê-lo naquela
série de episódios sobre orientações políticas que depois deu origem ao livro,
isto é a primeira parte do livro, mas a verdade é que
nenhum de nós é neutro, ou seja, nós podemos tentar ser imparciais
mas não somos neutros no sentido em que nós temos ponto de
partida que não é neutro porque depende dos nossos valores. Isso é
algo já agora que eu explico bem no livro na primeira parte
e também para quem tenha apanhado também explico bem num curso que
gravei para o Life MBA que entretanto foi disponibilizado gratuitamente por eles,
curso de literacia política e através do Expresso. Se não tiverem apanhado,
eu ponho na descrição do episódio e ele vai estar gratuito até
às eleições. E portanto, resumidamente, achei que fazia sentido fazer episódio a
partilhar pouco a minha visão e no fundo que partido ou que
partidas é que me parecem fazer mais sentido para alguém que parte
do meu ponto de vista. E o meu ponto de vista, para
quem ouve o podcast e para quem lê o livro, já é
familiar, eu costumo definir-me como liberal social, que é basicamente uma corrente
que parte do liberalismo clássico mas depois lhe incorpora algumas preocupações sociais,
chamemos-lhe assim, mais típicas da esquerda. O que é que isto significa
na prática? Portanto, ele parte do liberalismo clássico, não é? E a
isto, quando falamos de liberalismo, estamos a falar da ideia de que
a melhor sociedade é aquela em que os indivíduos têm mais liberdade.
Há uma confiança de que as pessoas, se lhes dermos liberdade, tendrão
a fazer o melhor para elas próprias, mas também, em muitos casos,
para o bem comum. E, portanto, fala-se muitas vezes, aliás, da ordem
espontânea a propósito disso. E, claro, na economia, a defesa de mercados
livres, uma visão benevolente em relação ao setor privado, embora eu costumo
dizer que o liberalismo deve ser pró-mercados mas não pró-negócios, ou seja,
não pró-empresas em particular, aí já entramos no chamado capitalismo de compadrio
que muitas vezes acontece. Depois, claro, na área social, liberdade de costumes
também faz parte do liberalismo. E depois há outro ponto importante da
visão liberal e que é dos que mais faltam até em Portugal,
historicamente, que é a ideia de governo limitado. Isto muitas vezes é
interpretado como a ideia de Estado pequeno, sobretudo atualmente, e eu não
digo que isso não seja relevante, mas para mim a ideia do
governo limitado tem sobretudo a ver com uma lógica de limitação de
poder, mais do que propriamente a dimensão do Estado, ou seja, nós
podemos ter Estado pequeno, que não cobre muitos impostos mas tenha muito
poder, seja muito autoritário e vice-versa, obviamente podemos ter como acontece nos
países nórdicos, e é de voltar a esse tema, Estado grande mas
que na verdade é Estado com poder limitado, portanto não é Estado
autoritário nesse sentido. Portanto, isto é o liberalismo clássico. A componente social,
enfim, pelo menos na minha interpretação, vem de vários aspectos. Por lado,
a noção dos limites dos mercados, que são na minha opinião uma
fonte de prosperidade, mas também obviamente tem limitações, e que o Estado
ele próprio é importante, e o último episódio, para quem ouviu, falava
exatamente da importância de ter uma administração pública robusta. Depois, o facto
de que a liberdade económica é importante, mas sem igualdade de oportunidades,
ou seja, sem igualdade de pontos de partida, ela não é verdadeiramente
suficiente para nós termos uma sociedade em que possamos considerar que as
pessoas têm oportunidades iguais, não é? Sem essa igualdade de pontos de
partida, o que leva a que seja necessário, por exemplo, investir a
educação. E depois, agora, finalmente, outro tema que já foi referido nos
podcasts, é importante que as pessoas possam, enfim, competir, ganhar dinheiro, se
for esse o objetivo, mas também há pessoas que podem querer trabalhar
noutras áreas, obviamente. Portanto, nem tudo é economia, as pessoas podem querer
trabalhar, enfim, na cultura, por exemplo, e são áreas onde as pessoas
tenderão a ganhar menos dinheiro e, portanto, é importante que a sociedade
também permita que isso aconteça e dê condições de vida a essas
pessoas, ou pessoas com deficiência, pessoas mais velhas, e, portanto, isso torna
também importante termos estado social, ou seja, estado com capacidade para ter
outras medidas que vão para lá do mercado puro e duro. Ou
seja, o mercado não... No fundo é uma variante do que eu
disse antes, não é? O mercado não serve para tudo, não é?
E portanto, no fundo, quer dizer, isto que eu estou a descrever
não é uma coisa particularmente original, quer dizer, no fundo o que
nós estamos a falar, e esta é a ideia que está muito
na minha cabeça e eu presumo que também alguns de vocês pelo
menos, do que eu conheço dos ouvintes do 45°, estamos a falar
no fundo do modelo dos países europeus mais prósperos, que nos juntam
uma economia aberta, em comparação com a economia portuguesa em muitos aspectos,
mas também o estado social forte, que permite, lá está, ter uma
educação robusta, sistema de saúde robusto, criar igualdade de oportunidades, mas também,
enfim, amparar as pessoas quando é necessário. E também tenho o meu
lado conservador, e viro certo gosto pela estabilidade e também numa preocupação
com a comunidade, que na verdade é algo que, curiosamente, o conservadorismo
e a esquerda partilham e que acaba por distingui-los da visão liberal
mais clássica. Chegado aqui, como é que alguém como eu, que se
define como liberal social, vota nestas eleições? Em muitos aspectos esta pergunta
não seria muito diferente para outras eleições, mas agora vamos falar destas
em particular. Há três partidos que basicamente ficam de fora. O Chega
fica de fora, o PCP e o Bloco ficam de fora, acho
que não é muito necessário explicar porquê. Depois o PAN é partido,
enfim, eu não sou anti-PAN, não tenho aquela aversão ao PAN que
conheço muita gente que tem, acho que é partido bem intencionado, é
partido que até funciona para muita gente como a porta de entrada
para o voto, ou seja, o partido em que as pessoas votam
inicialmente, mas, enfim, também acho que não é preciso explicar muito mais,
do meu ponto de vista não é partido muito sólido, ideologicamente, não
é? É difícil perceber, é partido até moderado, enfim, tem essa vantagem,
mas não se percebe muito bem, quer dizer, para além do Animais
e Natureza, e mesmo aí, enfim, do lado da Natureza às vezes
também não se entende muito bem, mas não tem uma ideologia coesa
por fora, não é? Portanto, por aí, se tornaria difícil para mim
votar no PAN, embora não entenha uma grande aversão. Depois, o PS.
Bem, em primeiro lugar é preciso tirar de cima da mesa aquela
história do socialismo usado não como significando o socialismo do partido socialista,
mas como significando o socialismo, uma coisa quase comunista, uma coisa quase
da Venezuela, que obviamente não é o caso em Portugal e obviamente
não é o caso do PS, que é basicamente partido que se
devia chamar socialdemocrata, na prática, é partido do centro-esquerda europeu e da
família dos partidos do centro-esquerda europeu. Dito isto, num país como Portugal,
em que há em muita gente uma aversão ao setor privado e
olhar para o Estado como solução para todos os problemas, que haja
agora em parte injustificada, isso vem tudo de sermos país com baixo
capital social e com grande desigualdade estrutural, mas sendo justificada, como imaginam,
não é a solução que eu acho melhor. Portanto, torna-se difícil, enfim,
para liberal, mesmo para liberal social, torna-se difícil votar no PS, pelo
menos estruturalmente. Não quer dizer que não aconteça, mas enfim, torna-se difícil
que isso aconteça estruturalmente e de resto, enfim, há alguns liberais deste
tipo no PS, mas são relativamente poucos, é uma franja pequena. Além
disso, o PS tornou-se menos atrativo também por ser partido que tem
eleitorado mais envelhecido e depois acaba por se refletir nas políticas, não
quer dizer que não seja necessário ter políticas para esse eleitorado, mas
reflete-se num tipo de propostas mais clientelares que o tornam menos interessante.
E depois o óbvio, que na verdade é a razão mais óbvia
para não votar PS nestas eleições que é, precisamos de alternância, o
PS está no governo há 8 anos e eu falava há bocadinho
que dos princípios, para mim, principais do liberalismo é a contenção de
poder, a limitação de poder e isso pressupõe que haja alternância no
governo e portanto nesta altura, claramente, na minha opinião estamos a precisar
de alternância no governo. Isto para não falar, obviamente, de todas as
trapalhadas que o governo teve metido, da endogamia e da falta de
abertura à sociedade da própria composição do governo, enfim, isto para não
falar de tudo isso. Assim, até se podia argumentar que a liderança
mudou, enfim, eu acho que isso vale o que vale, mas se
olharmos só para a figura do líder, o António Costa tinha o
grande problema, na minha opinião, de ser uma pessoa muito pouco reformista,
quer dizer, não tinha, tinha uma visão muito cínica da possibilidade de
reformar o país e muito pouco ambiciosa. Embora até fosse governante, quer
dizer, sobretudo depois da geringonça, relativamente centrista, pouco reformista mas relativamente centrista,
o Pedro Nuno Santos claramente é de outra índolo, não é? Portanto,
é alguém mais à esquerda e, sobretudo, enfim, do meu ponto de
vista, com convicções demasiado vincadas e opiniões demasiado formadas para alguém que
vai ter que governar o país na prática, não é? Portanto, por
todas essas razões, digamos assim, o PS, mesmo não embarcando eu naquela
história do socialismo como papão, o PS fica de lado. E portanto,
sobram IEL, AD e LIVRE. E aqui, vale a pena olhar pouco
para os programas dos partidos, também obviamente para os históricos deles e
para aquilo que foram dizendo em campanha para perceber o que é
que defende cada deles, enfim, aquilo que eu vou dar é a
minha interpretação, como é lógico, mas acho que resume bem o que
defende cada deles. Começando pelo IEL, pelo Iniciativa Liberal. Para mim tem
dois grandes méritos. O primeiro grande mérito é ser o primeiro partido
que veio por a tónica em que Portugal precisa mesmo de maior
crescimento económico. Isso é fácil de subvalorizar mas a verdade é que
não tem nada a ver viver num país que está a crescer
ou viver num país que está, enfim, relativamente estagnado. Não quero exagerar
este ponto, mas se olharmos para os últimos 20 anos tem estado
a cair face aos outros países europeus. E esse é ponto importante,
era algo que já era, enfim, já era, até aqui no podcast
já falava há algum tempo e o IELT tem o grande mérito
de ter sido o primeiro partido a trazer isto e depois, enfim,
o PSD foi copiar o próprio PS, também deu a este tema
peso que não tinha, e o IEL tem esse mérito. O segundo
mérito que tem para mim é ser o partido que revela no
programa uma maior preocupação com melhorar a qualidade das instituições. E isso,
como sabem, Para mim, enfim, para quem ouve o podcast sabe que
esse, na verdade, para mim é o nosso grande problema, ou seja,
mais do que políticas certas ou discutir as políticas certas, nós precisamos
de ter instituições que sejam capazes de gerar essas escolhas políticas, porque
muitas vezes é isso que está em causa, e de implementá-las quando
é necessário, não é? E, portanto, precisamos de, enfim, lá estava governo
limitado, também precisamos de uma administração pública capaz, como eu falava há
bocadinho, como foi falado no episódio anterior, enfim, este último ponto, como
calculam, não é tão forte para ser eufemístico no programa do IEL,
mas na questão de ter governo limitado, ter governo transparente, ter mecanismos
de verificação prévia da unidade dos membros do governo, até da regulação
do lobbying, até de alterações ao sistema eleitoral, por exemplo, ou seja,
são tudo medidas que eu acho interessantes para criar uma instituições mais
inclusivas. Ou, por exemplo, a outra que não referia à descentralização dos
serviços públicos. Sobretudo por estes dois motivos eu vi com bons olhos
quando o IEL surgiu e quando começou a atuar no espaço público.
Mesmo, enfim, com outros aspectos que eu não gostava tanto. Mas vi
com bons olhos e por isso votei neles nas últimas eleições. Mas
nestas não vou fazer. Por vários motivos. Alguns deles já vêm de
trás, na verdade. Primeiro, a EL tem revelado, na minha opinião, uma
espécie de monomania em reduzir o Estado transversalmente em todas as áreas
e meter privados em tudo. E não é que eu seja, como
imaginam, anti-privado, diz pelo contrário, mas não resultam em tudo e não
resultam em tudo da mesma forma, e há casos, lá está, remeto
de novo para o episódio da administração pública, em que concessões ou
privatizações mal negociadas acabaram por lesar o Estado, ou quer como quem
diz, lesar os cidadãos, lesar os contribuintes, e se calhar há áreas
em que não é muito difícil fazer esse tipo de concessões ou
privatizações bem feitas porque é fácil de definir o escopo, o âmbito
do serviço que é suposto prestar e se calhar há outras em
que não é assim tão fácil fazer isso e, por exemplo, em
algumas áreas da saúde, enfim, não tenho dificuldade em acreditar que possa
ser esse o caso. E portanto, na minha opinião, o IEL é
dogmático neste aspecto. É a mesma coisa nos impostos. Eu concordo que
há muito a mudar nos nossos impostos. Até concordo, por exemplo, que
é preciso diminuir o IRC para tornar a nossa economia mais competitiva.
Nós somos país que não se pode dar ao luxo ter IRC
tão alto, mas a verdade é que mesmo os países que a
IEL usa como referência de políticas em várias áreas, como por exemplo
a utilização de privados na áreas como a saúde ou a educação,
têm em muitos casos impostos altos, impostos mais altos do que os
nossos, já agora, sobretudo sobre rendimento e impostos bastante progressivos. E aqui
a questão é, haverá certamente muito o que fazer para tornar o
nosso regime fiscal mais simples, até para o tornar mais justo, mas
a questão é, sem impostos o Estado deixa ter meios para conseguir
criar igualdade de oportunidades. E os liberais dizem que defendem o elevador
social, mas depois parecem acreditar, em muitos casos, que a solução mágica,
a solução única que vai funcionar para tudo, é mais liberdade económica.
E eu até concordo, enfim, Há muita gente que discorda desse aspecto,
mas eu concordo que a liberdade econômica é importante, mas claramente não
é suficiente, sobretudo se tivermos diferenças de pontos de partida e sobretudo
num país como Portugal que é estruturalmente muito desigual. Digo estruturalmente no
sentido em que é tipo de desigualdade que é difícil mudar. E
portanto nós precisamos de meios para fazer isso e precisamos, se calhar,
de considerar mudar até o nosso leque de impostos para fazer face
a isso. E foi, por exemplo, muito interessante observar a posição do
IEL sobre aquela proposta, não sei se apanharam, de imposto sobre grandes
heranças. Que era imposto sobre grandes heranças, especificamente, portanto não eram todas
as heranças, e tinha como objetivo basicamente isto, quer dizer, basicamente dar
mais igualdade de oportunidades, não é, e mitigar o impacto que obviamente
a diferença que faz nós sermos filhos de pais ricos ou filhos
de pais pobres. E eu lembro-me que no debate em que se
falou disso o Rio Rocha classificou esse imposto como, não só impraticável,
até aí acho que se pode ter debate razoável sobre isso, mas
imoral. Imoral parece estranho, para conservador não me pareceria tão estranho, até
acho que podia ter bons argumentos no sentido de qualificar o imposto
como imoral, mas para liberal, à partida, é importante ter igualdade de
oportunidades, e acreditar que ela vai surgir só com liberdade económica, enfim,
é bastante estranho, na minha opinião. E, aliás, talvez alguns de vocês
se lembrem do episódio que o Carlos Vimarens pinta, que eu provoquei
com esse tema, e ele acabou por dizer, na minha opinião com
grande honestidade intelectual, que até poderia haver com bons olhos imposto desses,
desde que depois diminuísse o imposto sobre rendimento. Mas ele entrou em
outro, entre imposto sobre rendimento e imposto sobre heranças, ele até preferia
o imposto sobre heranças, o que na verdade faz sentido, enfim. Estou
aqui a parafraseá-lo, mas acho que não estou a parafraseá-lo mal, não
é? E depois, relacionado com tudo isto, o IEL parece-me ter discurso
quase 100% económico, ou seja, parece que tudo o que interessa são
questões económicas e tudo aquilo de que falamos vai dar a mercados,
a economia, a impostos, enfim, parece que ainda tudo em torno disso
que, enfim, parece-me uma visão ainda limitada da política, enfim, curta, não
é? E além disso, o discurso da parte dos impostos é discurso
que apela exclusivamente a pessoas que ganhem bem, bem para a realidade
portuguesa como é lógico, e que deixam os outros de fora, quer
dizer, ninguém obviamente gosta de olhar para a sua folha de ordenado
e ver que tem lá uma fatia grande sacada para IRS ou
para a Segurança Social. Claro que ninguém gosta disso, não é? Mas
é discurso que acaba por pôr as pessoas a olhar para a
política de uma maneira, enfim, muito egoísta. E não é que o
egoísmo não tenha o seu lugar na política, mas partido tão centrado
nesse aspecto, enfim, é uma coisa que me faz impressão. E depois
há outro aspecto que eu também não acho especial graça, que é
aquele tipo de discurso, enfim, para ser eufemístico, meio panfletário, com aquelas
cartazes, lá está, a falar do socialismo, como se tivéssemos na Venezuela,
e uma espécie de fascínio meio infantil que às vezes parece haver
por determinadas figuras bastante dúbias, como é o caso do Javier Milet
na Argentina. E portanto, no fundo, eu tenho pena, mas o IEL
parece-me, pelo menos por hora, ser quase uma mistura entre partido de
empresários, como dizia o João Maria Joné, e partido de alguns miúdos
deslumbrados com algumas ideias libertárias, mas com uma visão muito simplista da
política. Não há nada de errado com isso à partida, enfim, são
dois públicos, sobretudo não há mal de ser partido cujo eleitorado seja
mais de empresários e ligado ao setor privado, não há nada de
errado com isso. Para mim, o que eu acho é curto para
partido liberal clássico e obviamente é ainda mais curto para partido que
queira atrair pessoas mais do liberalismo social. E isto para não falar
dos maus sinais de falta de democracia interna que têm surgido no
partido nos últimos tempos. Não sei o suficiente para opinar sobre eles
mas são pelo menos maus sinais. Ainda assim não queria terminar muito
pessimista. Eu continuo a achar que foi bom ter surgido partido em
Portugal que se diz liberal e ainda tenho alguma esperança de que
possa, pelo menos, mitigar estes aspectos em que eu discordo. É improvável
que me venha alguma vez a identificar completamente porque, lá está, a
minha índole é mais liberal social, mas acho possível que se venha
a aproximar mais do liberalismo clássico. E com isto restam a AD
e o LIVRE. Se calhar até começo pelo LIVRE, que é mais
comparável com o IL neste sentido. Enfim, às vezes parecem disputar o
mesmo eleitorado. É sempre uma questão que surge. O LIVRE é partido
para mim difícil de avaliar. Eu sou admirador do Rui Tavares, já
foi convidado aqui do podcast, é uma pessoa que sabe muito, que
pensa bem, não é a pessoa mais carismática do mundo, talvez pouco
por causa disso. É tipo de esquerda, claramente, nunca será outra coisa,
mas não é radical e sobretudo a principal característica do Rui Tavares
é ser democrata verdadeiro e isso hoje em dia é uma característica
rara. Democrata a 100%, alguém que recusa queirem radicalismos, é algo que
vai sendo raro em política e por isso esse aspecto é aspecto
que me faz querer que o livro continue por aí e ganhe
algum peso. Tem uma série de ideias que eu acho positivas, mesmo
que não concordo totalmente com elas. Tem ideias, por exemplo, lá está
para promover a igualdade de oportunidades, por exemplo, na regulação dos estágios
não remunerados. Foi o livro que defendeu a introdução do tal imposto
sobre grandes heranças e doações, sobre o qual eu acho que é
preciso ter debate de como é que ele funcionaria na prática, mas
parece-me uma ideia interessante e algo que existe já noutros países perfeitamente,
portanto não é propriamente uma ideia ultra-revolucionária. Eles propõem-no como medida isolada,
eu em Portugal talvez o fizesse mais na onda do Carlos Guimarães
Pinto substituindo o imposto sobre o rendimento, mas a verdade é que
me parece uma ideia nova, nova em Portugal e uma ideia que
faz sentido discutir. O LIVRE é também partido pró-Europa, com o que
eu simpatizo bastante, enfatiza muito o tema da transição climática, que não
é o tema mais sexy do mundo, mas obviamente é importante. Até
tem algumas medidas sobre a qualidade das instituições, por exemplo, aumentar a
transparência de governação, aumentar a democracia deliberativa, E depois tem uma série
de ideias mais ousadas, como por exemplo o rendimento básico incondicional, a
semana de 4 dias, que são, enfim, em certo sentido medidas utópicas,
mas este tipo de partido, o LIVRE e o próprio IELT, que
falava há pouco, são partidos que também, como partidos novos e como
partidos relativamente pequenos, faz sentido que proponham algumas medidas utópicas, faz sentido
que elas surjam no debate político e surgindo que venham de partidos
como o LIVRE. Ainda assim é preciso manter algum realismo, às vezes
tenho algum receio de que o realismo falta aqui e ali e
a pessoa lembra-se sempre do caso da eleição da Joacine, enfim, que
foi caso que demonstrou, digamos eufemisticamente, uma certa falta de realismo. Isto
é o bom. Depois, claro, o livro não deixa de ser partido
de esquerda, portanto, dá uma visão mais estatista, como de resto este
exemplo do imposto sobre as heranças Mostra, porque era acrescento e não
uma troca por outros impostos. E, além disso, eu quando vi os
debates, confesso que fiquei pouco desconfortável porque, enquanto o debate com os
vários partidos da direita, incluindo o IEL, foi muito aguerrido, os debates
com o PCP e com o Bloco foram perfeitamente pacatos, enfim, pareciam
quase buddies, e que pareciam que estavam quase a ocupar o mesmo
espaço político. E isso para mim permanece uma incógnita em relação ao
LIVRE. É que eu ainda não consigo compreender e obviamente não posso
olhar só para o Rui Tavares porque o LIVRE, enfim, felizmente, aliás
até é partido muito amplo nesse sentido, é partido que vai muito
para lá do seu líder, acho que eles chamam-o de porta-voz, ou
qualquer coisa do género. Mas fico sem perceber, dizia, se o LIVRE
é uma espécie de ala esquerda de partido liberal social ou se
é mais uma espécie de bloco de esquerda, mas menos radical. E
a verdade é que são coisas bastante diferentes e eu ainda não
percebi exatamente se é uma coisa ou se é outra. E finalmente
a AD, que é como quem diz o PSD. O PSD é
partido de centro-direita, claro, a melhor definição talvez seja que é partido
liberal Conservador. Agora, também é partido muito mais amplo do que estes,
partido onde cabem muitas sensibilidades e, portanto, tal como o PS, é
partido onde cabem muitas inclinações dentro. Com a liderança atual houve uma
tentativa de tornar o partido mais centrista, enfim, sobretudo mais centrista do
que na versão da PAF, com o Pazos Coelho. No que isso
tem eu diria de bom e de mau. Bom ser menos ideológico
e ter menos aquela carga, lá está de muitas certezas, que é
sempre perigosa na política e o mau é que se tornou também
mais eleitoralista, enfim, em vários aspectos. Por outro lado, é evidente que
aqui não estamos só a falar do PSD, estamos a falar do
PSD mais CDS e isso já vai à tona, não é? Com
algumas declarações do lado do CDS, que é naturalmente partido conservador e,
portanto, fica aqui uma combinação que é preciso não esquecer que não
é só o PSD. Ainda assim, em todo caso, talvez não seja
exatamente o mesmo que a coligação anterior do CDS, na medida em
que houve parte, sobretudo o eleitorado do CDS, mais conservador de todos,
que acabou por ir para o Chega e, portanto, em certo sentido,
isso permitiu, mesmo na versão AD, ter discurso pouco mais centrista, enfim,
pelo menos quisermos ver o copo meio cheio. Mas o aspecto que
eu acho mais positivo, que eu sempre achei, na verdade, mais positivo
no PSD, sobretudo em comparação com o PS, é que tem uma
abertura, normalmente, a ir buscar independentes, ou seja, pessoas de fora, à
sociedade civil, como se costuma dizer, bastante maior. Nem sempre corre bem,
há sobretudo exemplo que mal corre, às vezes corre melhor, mas a
verdade é que há essa propensão no PSD. E, por exemplo, estou
a lembrar que nas listas de candidatos está, por exemplo, o Alexandre
Homem Cristo, que foi, se bem se lembram, convidado aqui do podcast
sobre educação e que é uma pessoa que tem uma visão muito
sustentada sobre a educação e uma visão sobre, lá está, até o
papel da educação no elevador social que eu falava há bocadinho, que
o torna, enfim, valor acrescentado num governo de centro-direito. E portanto, este
é ponto importante. Por outro lado, como eu dizia, depois há sempre
aquelas vozes mais conservadoras da AD que vêm à tona e, portanto,
quando eu estou assim entusiasmado, vou-me pouco perdendo o entusiasmo, seja quando
algumas figuras do CDS mais conservadoras decidem falar ou quando o próprio
Passos Coelho decidiu fazer aquelas declarações sobre a imigração, enfim, eu vou
ficando com pouco mais de dúvidas. O que me parece importante, e
isso sem dúvida, é, como eu dizia há pouco, que tenhamos alternância,
e a alternância tem que se fazer do PS para outro grande
partido, e portanto neste caso será o AD barra PSD. E portanto,
para chegar ao fim deste monólogo, os três partidos nesta fase que
me pareceriam interessantes seriam IEL, LIVRE e AD. Enfim, O IEL votei
nas anteriores mas já a coloquei de parte e, portanto, continuo na
dúvida e devo continuar até muito perto entre AD e LIVRE. O
LIVRE, gostava de lhe dar o benefício da dúvida, é partido que
eu gostava de ver crescer no parlamento, mesmo com as dores de
crescimento que isso possa ter. A D, enfim, gosto de ver o
copo meio cheio em relação ao recentramento e sobretudo à abertura de
independentes. Além disso, ao contrário do PS, que também por ter eleitorado
mais envelhecido parece Relativamente contente com o status quo, o PSD tem
pelo menos uma intenção mais ambiciosa em relação ao país e isso,
na minha opinião, é algo que agora faz falta. Mas sobretudo, ponto
principal para mim nesta fase é que precisamos de alternância no partido
de governo porque o PS está lá já há muito tempo e
porque precisamos de algumas medidas novas, enfim, que voltem a projetar o
país. Portanto, espero que este episódio vos seja útil de alguma forma.
Talvez aconteça que, como a mim, vos deixo mais dúvidas do que
respostas, mas espero que seja interessante e voltamos a falar para a
semana com novo episódio, voltando ao esquema normal para tratar temas mais
estruturais e, sobretudo, mais importantes do que este. Até lá e bons
votos! Este episódio foi editado por Hugo Oliveira. Contribua para a continuidade
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