#133 Salvador Martinha - A vida de um humorista: entre artista e atleta de alta-competição

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José Maria Pimentel
Olá, o meu nome é José Maria Pimentel e este é o 45°. Esta semana há muitos novos mecenas e pessoas que apoiaram o 45° para agradecer. São eles Enrique Pais, Zé da Rádio, eu digo como vocês puserem, portanto neste caso está Zé da Rádio, Duarte Camerão, Tiago Sequeira, Tereza Painho e também o Vasco Patarata, o Vítor Ramos, Marília Pérez, a Isabel Melhores Martins, a Ana Boça, o Francisco Cruz, a Diana Mira, o Luís Moura e José Lobomirsky. Muito obrigado a todos. E esta semana tenho um anúncio para fazer que me deixa muito orgulhoso. Decorreu no domingo passado, em Lisboa, a quarta edição do Festival Podge, o festival de podcasts. E o 45 Graus foi o vencedor do prémio Podcast do Ano, para além de ter ganho na categoria de política, economia e informação. Este prémio deixa-me obviamente muito contente, é sinal que estou a fazer alguma coisa certa ao longo destes 5 anos de 45 Graus. Queria deixar aqui os parabéns à organização, incluindo os vários voluntários que participaram, por terem a teimosia de insistirem em fazer um festival de podcasts num país que, embora tenha cada vez mais podcasts de qualidade, bem feitos e originais, tem ainda alguma falta de estrutura por trás destes podcasts, que na maioria são como o 45°, projetos independentes, e isso torna difícil fazer eventos deste tipo como festivais. Mas estes eventos são particularmente importantes precisamente para incentivar a que existam mais podcasts e sobretudo podcasts com cada vez mais qualidade. E esta é obviamente a altura certa para agradecer a todos vós que têm ouvido o 45° ao longo destes anos, partilhado com os vossos amigos, colegas, familiares e, sobretudo, aqueles que se tornaram mecenas do 45° e que contribuem para que ele continue a existir e a crescer. E tenho também de agradecer a quem está deste lado e vale a pena aqui destacar o papel da edição de som, que era algo que eu no início fazia sozinho, com o meu talento limitado, mas depois decidi passar a pasta e quem o fez foi primeiro o Martim Cunharrego e agora o Hugo Oliveira, muitíssimo bem, sendo que este é um papel essencial, o papel de editor de som, não só para garantir que o som tenha qualidade adequada, e às vezes é preciso dar uns toques para que isso aconteça, mas também para fazer cortes e limpar o som de maneira a que vocês fiquem com o melhor da conversa, que fiquem com o sumo da conversa. E num podcast como o 45° que resulta de conversas longas, tirar essas crescências muitas vezes faz toda a diferença e eu sei que é algo que vocês valorizam, embora suspeite que muitas vezes seja imperceptível. Aliás, este é um destes trabalhos que quanto mais bem feito for, menos se nota. E por fim, tenho de agradecer à Diana, que é nisto, como em vários outros projetos, a minha partner in crime, e que está envolvida no 45° de uma maneira menos visível, mas desde o início e em vários aspectos, desde a escolha de convidados, aos temas, à estética, à comunicação do podcast, enfim, de uma maneira que até tenho, se calhar, alguma vergonha de admitir e queria aproveitar aqui para agradecer também. E aliás, ela foi também responsável por ter acontecido este episódio que vão ouvir hoje, cujo convidado é o Salvador Martinha. O Salvador dispensa, eu diria, grandes apresentações, é um humorista ou comediante, como preferirem, está no espaço público já há muito tempo, tem uma carreira longa na stand-up comedy, foi, por exemplo, o primeiro humorista português com espetáculo na Netflix, tem também trabalhado na escrita de séries, por exemplo a série Princípio, Meio e Fim, que foi muito inovadora, e mais recentemente a série Sou Menino para Ir, que começou na internet e agora está na RTP. E tem também um dos podcasts com maior longevidade no espaço português, chamado Ar Livre, se não conhecem vale a pena ouvir, até porque o Salvador consegue uma coisa difícil, que é ter um podcast leve, mas inteligente ao mesmo tempo. Esta conversa com o Salvador foi então um episódio diferente, com menos guião do que o habitual. Falámos de uma série de temas em torno do humor, desde aquilo que o fez despertar cedo para o humor, ao processo criativo do Salvador e da importância que tem a preparação mesmo naquilo que parece 100% criatividade como é o caso do humor, a relação entre o humor e outras formas de arte, os vários tipos de humor, o que distingue o bom do mau humor ou o mau do bom humor se quiserem, A ligação entre o humor e a tristeza, que é um tópico importante e que tem paralelos com outras formas de arte. Os desafios de fazer humor em Portugal. A maneira como o humor tem evoluído ao longo dos tempos. Como é que ele lida com as críticas e com os elogios. E, finalmente, aquilo que explica um aspecto peculiar do humor que é a relação muito íntima que os humoristas conseguem criar com o seu público. Esta conversa teve também uma peculiaridade porque não estávamos sozinhos. Estava connosco o meu amigo Luís Figueiredo, que é guionista e que por isso tem interesse por estes temas e que a certa altura não resistiu em fazer um comentário. Portanto, quando ouvirem essa voz, já sabem de quem é. Espero que gostem da conversa. Salvador Maria Martinha. Muito bem-vindo a este podcast. Muito obrigado, José Maria.
Salvador Martinha
Dois Marias, não é? Exato, incrível. Encontra-se choque. Sim, sim.
José Maria Pimentel
Salvador Maria é outro nível. É, é outra nível. É, é até uma categoria muito superior. Olha, isto não é uma entrevista de vida, mas acho que faz sentido começar pelo teu humor, ou pelo teu percurso e como é que tu entras no humor. Estou olhando para trás, quando era miúdo, o que é que tu achas que te levou a fazer piadas? Porque eu já te ouvi dizer que... Aliás, mais, eu lembro de ouvir uma vez a tua mãe dizer que nunca diria que a tua irmã fosse ser humorista, que ela também, enfim, acho que se pode considerar humorista, mas que no teu caso era óbvio, o que significa que tu has de ter essa memória, não é? Que função é que tu achas que teve o... Porquê que
Salvador Martinha
foi tão apelativo para ti? Eu acho que posso ter sido incentivado pela minha mãe também, pela pessoa que me incentivava para o palco, que a minha mãe sempre teve esse fascínio do palco. Mas
José Maria Pimentel
não era mais de colegas? Não era uma coisa de pares? Se calhar estou a imaginar isso, mas imagino uma coisa que tenha surgido com colegas na
Salvador Martinha
escola, com outros mius, quer dizer... Sempre que me fazem essa pergunta eu às vezes tenho respostas novas para ela. Porque o tempo vai passando e eu vou fazendo novas descobertas. Agora que formulaste essa pergunta e colocaste a minha mãe nessa narrativa, eu acho que a minha mãe pode ter incentivado bastante, no sentido em que a minha mãe gostava de palco, incentivava-me a ler, a fazer danças, a imitar sketches do Herman e ela ficava muito contente com isso. Então imagino que teres uma validação de um pai por estares a fazer mini shows em criança, foi criando esse vício em mim. Sim, agora na escola. Levava esse palco de casa para a escola, não é? Como eu fazia esses treinos em casa. Ia para a escola fazer isso. Eu já apresentei os Globos de Ouro. Na escola. Quando tinha 14 anos. Eu organizava a gala, era tudo. Eu era a psique, eu era o apresentador, eu era os jurados e ganhava sempre um globo.
José Maria Pimentel
O próprio, o próprio apresentador.
Salvador Martinha
Portanto, sempre gostei, sempre de certa maneira. Colocavam-me em palcos fictícios, não era? Na altura, porque não eram palcos profissionais e eu gostava dessa validação, dessa sensação. Onde
José Maria Pimentel
eu estava a criticar com isto é que deve haver um lado de... Quer dizer, todos nós temos essa experiência, não é? Quando tu estás com amigos, sobretudo quando estás a crescer, e fazes piadas e as outras pessoas se riem, tu percebes que tens ali um poder e uma espécie de validação social, não é? E portanto é uma... Conseguindo tu puxar essa alavanca é uma coisa muito tentadora. Depois, por outro lado, há uma espécie de prazer em que tu tens para ti próprio de fazer as piadas, quase, aquele lado mais cognitivo da coisa, não é? E era isso que eu estava a tentar perceber, ou seja, tentar perceber para ti qual é que foi mais importante, não é? Porque o humor tem esses lados todos, não é? Tem esse lado social e tem o lado... Quer dizer, tem outros mais, não é? Mas tem o lado de... É quase como um jogo, não é? No fundo estás-me a perguntar o que é que me chitou para o humor. Sim, o que é que te chitou e o que é que te chita, não é? Que eu presumo que seja o mesmo, não é?
Salvador Martinha
As coisas vão mudando, não é?
José Maria Pimentel
Desculpa, eu estou a perguntar... Porquê é que eu perguntei pela infância? Porque no início essas coisas são mais puras. Depois nós vamos crescendo e... O que é que é o
Salvador Martinha
primário? O que é que me atraía, não é? O que é que me atraía no humor ao princípio. Sim, eu acho que era essa sensação de... Dava-me uma sensação de algum poder, não era? De algum... De prever as reações do outro, não é? Porque o humorista antecipa um bocadinho a reação do outro em segundos, não era? E eu fascinava-me. Eu, por exemplo, eu lembro-me das minhas primeiras piadas que eu fazia para os adultos e eu simulava erros. Eu simulava gafes. Porque eu sabia que os adultos não me vão ver como uma piada premeditada. Sou muito novo para estar a fazer esta piada premeditada. Então vou fingir que me engano numa palavra. E vou me enganar de propósito só para ver a reação deles. Enganava-me, por exemplo, em vez de dizer o meu pai é um cavalheiro. Eu pensava nisto, em tempo, dizia assim agora vou dizer o meu pai é um cavaleiro. Realmente o pai é um grande cavaleiro, não é mãe? Ah que gíria, ele não é cavaleiro, é cavaleiro. E eu pensava, Foi uma vítima da minha premeditação. Estás a ver? E isso excitava-me. E depois é uma sensação ótima, não é? Fazer rir. As pessoas riem. As pessoas gostam de ti, não é? Se tu fazes rir a alguém,
José Maria Pimentel
a pessoa automaticamente gosta de ti. E isso é poderoso, acho que foi o... E estás a provocar uma reação incontrolada na outra pessoa. É quase um hipnose, não é? É um Q.O. Sim?
Salvador Martinha
Não é? É um Q.O. Imagina, quando tu vês as pessoas a rir numa plateia, quando as pessoas riem muito, as pessoas riem-se de uma maneira estranha, não
Salvador Martinha
é? Não se riem para... Contorcem-se, não é?
Salvador Martinha
Contorcem-se para a frente, para trás. É como se tivesse a dar murro sem dar. E a cara, não é? A cara que
José Maria Pimentel
tu fazes. Já deves ter apanhado fotografias tuas a rir-te, não é? A pessoa está sempre com cara de parvo, não é? Quando nos estamos a rir a sério, não é uma fotografia que nós gostamos muito.
Salvador Martinha
Sim, eu lembro-me de uma vez de um elogio que eu encarei como um elogio que foi um amigo meu que foi ver um espetáculo e disse-me assim pá, gostei imenso do espetáculo, mas senti-me super desconfortável ao lado da minha namorada porque ela mostrou dentes que eu não sabia que ela tinha! Sabes? E eu já passei por essa experiência também, do outro lado de ir ver um humorista com a minha mulher, e também vê-la a rir muito. É desconfortável porque é tipo, que horaso esta cara fez rir a minha mulher? Nunca tinha visto aquele dentinho ali. E isso é lindo, não é? Consegues abrir uma cara. Porque as caras muitas vezes são fechadas. Eu tenho muito esta perceção, imagina, quando faço espetáculos mais pequenos, tu tens uma perceção, os mais novos têm uma cara mais aberta, mais pura. Miúdos 16 anos, 17, 19, já estão, a cara já está predisposta. A cara já está predisposta. Portanto, da cara deles normal até ao riso não há uma grande mutação. Agora, pessoas com 50 e tal anos, caras carrancudas, pagaram o seu bilhete mas querem rir, não estão para brincadeira. Da cara normal para o riso, é pá, é mágico. És um pintor de caras, das tantas.
José Maria Pimentel
E tu quando estás no palco, estás a... Quer dizer, também deve variar muito de palco para palco, mas tu estás atento às pessoas, ou seja, estás a ver esse efeito, estás atento a ver esse efeito surgir, porque pode ser uma distração também, se estás concentrado, no tipo de estar na audiência com as versões cerradas, pode ser desmotivante. Vou-te dar
Salvador Martinha
sempre o princípio, é giro, porque faz-me estas perguntas e lembro-me sempre do princípio e da agora. No princípio havia pessoas que me diziam assim parece que estás a ler um teleponto. Porquê? Tinha medo do público, fixava num ponto. Agora não, eu quero ver cada cara. À medida que o tempo foi passando, eu fui-me sentindo mais confortável cada atuação que eu faço, vejo mais a sala. É como se a minha visão fosse aumentando. Vejo as camisas das pessoas, as caras das pessoas, o número de dentes das pessoas, o estado de espírito a mudar. Se no lado esquerdo se está mais a rir, no direito como é que está? O que é que se passa lá em cima? Porque é que lá em cima estão-se a rir mais de cá em baixo? Fui aumentando a minha visibilidade do espetáculo, estás a perceber?
José Maria Pimentel
E deves ter uma visão de resolução mais elevada do que tinhas antes para conseguir perceber o que é que é uma cara carrancuda a sério, de uma cara carrancuda que tem potencial para rir, não é? O que não é carrancuda, é simplesmente... Eu sou o tipo de pessoa que se tiver num espetáculo stand-up não me estou a rir. Se calhar até não me rio muito. Sim, eu não te
Salvador Martinha
imagino a rir muito. Mas se calhar vais dizer, é pah grande o espetáculo. Gostei muito deste espetáculo do chapéu. Estou-te a ver a dizer
José Maria Pimentel
isso. Tires-lhe o chapéu.
Salvador Martinha
Desculpa, desculpa. Arriscaste, arriscaste. Nunca tinha visto arriscar tanto no teu podcast.
Salvador Martinha
Eu tenho um risco, mas depois corte. Não, deixa estar.
Salvador Martinha
Por favor, isto é maravilhoso. Mas lá está, imagina que para teres uma experiência positiva num espetáculo de humor, não tens que mostrar os tais dentes invisíveis que eu estou a dizer, não é? Pode ser uma coisa que coça aqui no cérebro e que é completamente mind-blowing, que acrescentou-te uma perspectiva a um raciocínio. O humor também tem muito isto.
José Maria Pimentel
Não, mas atenção. Quando eu dizia isto, por exemplo, no meu caso, eu estar... Eu não me rir muito, há momentos em que me rio. Ou seja, e essa é a magia na mesma, não é? Pode ser... Não quer dizer que é mais difícil, mas pode demorar mais tempo a acontecer. Mas essa magia de tu conseguires mexer... O humor tem muito a ver com a teoria da mente, não é? Que tu conseguires perceber o que é que está dentro da cabeça da outra pessoa e ir ao ponto de tu conseguires influenciar isso de modo a que ela tenha uma reação incontrolada,
Salvador Martinha
não é? Claro. É uma manipulação. Sim, sim, sim. Já viste que um humorista tem que ser um grande manipulador? Sim, no fundo é. Metes aquela palavra atrás daquela palavra, levas as pessoas para um sítio e depois tiras o tapete. Mas tu para tiras o tapete tens que saber em que sítio é que está a pessoa. Portanto, eu diria-te que um bom humorista é um grande manipulador. É estranho dizer isso, mas é verdade. Somos manipuladores. Sim, sim, sim. E tens que antecipar. Tens de ter o plano todo traçado. Tem
José Maria Pimentel
que estar tudo previsto. Tem que ter com alguma margem, mas tem que estar tudo previsto para depois... Para a punchline entrar no momento certo e ter o efeito certo. Claro. Isso é agora, Mas antes disso, esse crescimento é feito com amigos e com a família. Eu lembro do Ricardo, eu espero contar esta clássica, a conta da avó, não é? Tu estás a... Sim, a avó dele é muito simbólico. Eu acho que todos nós temos a nossa avó. Sim, sim, sim. E todos nós temos a...
Salvador Martinha
Todos nós temos a nossa avó. Não, não é todos nós a avó. É um bocadinho tóxico. Acredito que cada humorista tenha, como o Ricardo tem a avó, tem a sua avó, que não necessariamente
José Maria Pimentel
a avó. No meu caso não é a avó. Muitas vezes é o tipo de pessoa que não seria suposto rir-se, ou que tu não terias aquele rapport, mas consegues chegar lá fazendo rir. Quer dizer, enfim, à minha escala é uma coisa gira quando tu consegues sortir esse efeito, não é? É uma coisa desafiante e depois tem aquela pá... E eu percebo a história da avó porque como pessoas mais velhas, sobretudo senhoras, não é? Tem a ver também com a maneira como as pessoas cresceram, não é? Não cresceram para rir com humor parvo, não é? Sim. Então, se o rento diz uma coisa parva e a pessoa diz, não é? Aquilo é quase magia, não é? Mas são essas pessoas
Salvador Martinha
que vão passando pela nossa vida que nos vão dando, que nos vão começando a... No fundo o Ricardo Araújo eu acho que ele treinava com a avó, não é? Acho que ele próprio dizia isso, não é? Treinava com a avó. Estás a ver? Eu sequer treinava com a minha mãe porque gostava dessa validação, treinava porque às vezes havia um ambiente pesado à minha volta, então eu ia treinando o meu humor para aliviar o ambiente. Eu acho que estes treinos vêm da nossa vida. Depois tornei-me um bocadinho mais obcecado pela técnica e fiquei chitado com esta ideia. Não, isto é matemática! E durante muito tempo vivi nesse sistema. É uma equação. Uma piada é uma equação, não é? X mais Y dá não sei quê. Ultimamente tenho-me libertado um bocadinho disso. Por exemplo, muitas vezes experimento stand-up, tenho um tópico, tenho uma ideia e vou. Porque também me dá prazer experimentar dessa forma. Porque também ficar preso a uma equação também às vezes pesa-me e faz com que eu perca o interesse da comédia. Percebes? Não há nada mais alimentador do que eu ter 4 ou 5 ideias no telemóvel. Olha, hoje vou a um bar experimentar. Esses pensamentos que já tenho mais ou menos arrumados, que vou arrumando os raciocínios e vou, do que ter que sempre fazer o mesmo processo. Meter a nota no telemóvel, escrever, vim de piadas, decorar e ir. Eu o que eu gosto neste momento é um equilíbrio entre os dois. Na fase de preparação. Depois quando tenho um solo de stand-up, tem que haver um alinhamento já definitivo. Não, é claro, claro, claro. E ao outro lado também. Até porque as pessoas pagaram um bilhete e eu tenho que respeitar isso. Uma pessoa pagou 20 euros, 25 euros para me ver e eu tenho que ter respeito por isso. Portanto, eu não vou dizer, hoje vou... Não, hoje é o que me der. Tenho que respeitar. A pessoa podia ter escolhido estar num outro sítio. Escolheu uma mina aquela noite. Às vezes vem de fora. Pode vir um casal dos Açores, pode vir um gajo de Londres, podem vir de Aveiro para um espetáculo de Lisboa. Portanto, temos que respeitar isso.
José Maria Pimentel
Sim, sim. E esse ponto é importante. Essa ética de trabalho é uma coisa que... No mundo das artes, muitas vezes, há uma certa displicência. Fazer como que é o seu
Salvador Martinha
artista, posso fazer o que quiser. Eu sei porque. Para tirar o peso. Porque imagina, eu quando comecei nesta atividade era porque eu tinha este jeito, não é? Tinha jeito para fazer rir. E isso era puro, Era uma coisa que era natural. Tu foste... Passei anos pesados. Até que, imagina, até eu tiro o estilo que tenho hoje, passei alguns anos pesados a dizer assim ah pá, tu não és bem tu no palco. Isto é um processo pesado, não é? Porque... Diziam isso amigos teus, não é? Diziam amigos meus, estás a ver? Portanto, é quase como se tu te prostituísses uma coisa... Um talento teu puro e passa a ser uma atividade profissional. Estás
José Maria Pimentel
a ver? Nós em Portugal lidamos mal com isso, não
Salvador Martinha
é? Exatamente. Pronto, é
José Maria Pimentel
isso. Vocês lembram o que eu estava a dizer. Impureza. Ou aparente impureza.
Salvador Martinha
Passando a ser um trabalho, as coisas ficam confusas e tu às vezes a despliciência aparece um bocadinho aí. Para voltares a ser amador, às vezes as pessoas precisam de ter lives de amadorismo...
José Maria Pimentel
Para parecer que és genuíno. Para parecer que
Salvador Martinha
és genuíno, talvez.
José Maria Pimentel
Eu acho que é por aí, sim. E isso há muitas coisas. Eu lembro sempre de uma coisa que não tem nada a ver com isto, mas uma vez estava no trabalho e um tipo ia fazer uma apresentação e ele diz, não foi literalmente isto ou para frasear, ele diz Vamos apresentar isto, mas não se preocupem que isto não foi nada preparado. Que é uma frase muito bizarra para dizer. Desresponsabilização. É, é. É tirar a carga.
Salvador Martinha
Muitos humoristas fazem isso, tipo não, isto não, isto dois vai ser mais para experimentar. E o que é que pode ter acontecido? Pô, até está a ensaiar bastante. Mas desresponsabilizam-se, não é? Já estão ali, criam uma narrativa em que se falharem, são ilusões.
José Maria Pimentel
Eles acham que estão a desresponsabilizar-se, mas também estão a sinalizar a quem está no público este gajo não investiu.
Salvador Martinha
Exatamente, este gajo não investiu. Não está a dar a importância que devia. Mas tocas num ponto importante. Se me disseres o que é que eu acho que é melhor é a pessoa responsabilizar-se, é dizer assim, não, eu estudei bastante para isto, eu preparei este espetáculo, vai correr bem. Das vezes que me correram melhor foram sempre assim. E estás a falar com um gajo que sou muito dado ao improviso, mas tem que ser no equilíbrio. O improviso parece que uma boa base. Sem dúvida que a pessoa tem que se assumir. Eu trabalhei para isto, eu esforcei-me, as pessoas estão ali à minha espera, vai correr bem. Não é tipo, hoje estou bem maluco. Há dias corre bem. Já fiz muitos espetáculos assim, mas vivo muito mesmo quase dos deuses da comédia. Estás fresco, imagina. Para improvisar tens de estar muito fresco. A tua cabeça tem de estar, no meu caso, bem dormido, bem alimentado e bem fresco. Se estiver cansado, para improvisar é muito difícil, porque o esforço é muito maior. Fazer rir sem ter um guião, para correr bem, é um esforço muito maior. Ficas exausto.
José Maria Pimentel
Uma coisa engraçada, como é óbvio, eu nunca tive a experiência de fazer humor, mas tenho experiência criativa noutras áreas, e uma coisa muito gira que acontece no nosso cérebro, e eu presumo que no humor acontece em estróides, é que tu começas a pensar num determinado tema, sobre o qual tens que escrever, enfim, dar uma aula, o que quer que seja, e que tem esse lado criativo no sentido em que ele não está definido e pode-se expandir e tem diferentes ângulos. E de repente, tu ali naquele momento tens uma ideia, mas é como se tu tivesse inserido o chip no teu cérebro e a partir daí, nos próximos dias, é como se o teu inconsciente fosse fazendo o trabalho e as ideias começam a brotar. Claro que sim. E esse é um efeito fascinante, esse efeito sempre me fascinou imenso. E no humor, eu lembro de certa altura, quer dizer, como é óbvio, a minha vida não é fazer piadas, portanto, eu normalmente não estou a pensar nisso. E a certa altura fiz um curso de... Uma espécie de curso de comédia, e tínhamos de fazer lá um exercício. Sim. E naqueles dias lembrei-me de imensas coisas. Depois fechei a tampa e não me voltei a lembrar. Mas naquele dia era quase uma magia. De repente tu estás a andar na rua e lembras-te de uma série de coisas. Agora, qual é a curiosidade que eu tenho aqui? Imagino que haja métodos para isso. É como é que tu pegas nisto e exploras ao máximo. Isto que acontece naturalmente, para mim chega, não é? Mas para ti não. Tu tens que tirar o máximo possível do cérebro. Imagina,
Salvador Martinha
para ser saudável de cabeça, fui treinando o desligar e ligar. No fundo é ligar e desligar a obsessão. Se eu disser assim, olha, daqui a um mês vais fazer um espetáculo, vou fazer 15 minutos de stand-up novos. O prazo ajuda-me muito a ativar a obsessão. É tipo, opção ativada! Durante esse mês vou estar obcecado e vou estar a anotar obsessivamente. Vou estar sempre a lembrar, mas eu consigo desligar-me. Imagina, agosto, zero. E em agosto é quase como se ficasse semi-profissional. Agosto porque eu costumo parar sempre em agosto. Sou clássico. Tipo em agosto, tirar aquele mês. Sempre gostei dessa ideia do mês, estás a ver? E cada vez mais meses. Era só agosto, agora já era agosto e setembro. Preciso desse tempo para me ir reinventando. E para o trabalho criativo isso é essencial. É essencial. Portanto, em agosto, imagina, como eu estou-te a contar, vai aparecendo como estás a dizer olha aqui uma ideia e aponte. Mas nada obcecado. Quando eu começo a ativar as minhas ideias, já tenho uma ideia, imagina, para um projeto para uma série e quando entram os prazos e os timings eu ativo-me assim. Então começa a minha obsessão. Sem fim. Até acabar. Mas
José Maria Pimentel
que é uma coisa automática. Ou seja, estás a fazer outras coisas e de repente estás a cozinhar e lembras-te de uma coisa qualquer e apontas no telemóvel. Ou
Salvador Martinha
não? Não, não, não. É o dia todo naquilo. Mas que é sentado? É quase como se o... E sim, eu às vezes tenho este... Ah, mas isso é interessante. Eu às vezes tenho este imaginário que é, eu posso acordar de manhã e mal acordo eu já estou a trabalhar. Eu sei que isto é estranho estar a dizer. Não sei se as pessoas vão identificar com isso.
Salvador Martinha
No teu caso não é. Eu na cama,
Salvador Martinha
eu posso estar a olhar para a parede e só a pensar. Que ideias? Eu não sei o quê. Isto é esta piada? Isto pode dar isto, pode dar aquilo, pode dar aquilo. Nessa meia hora, depois ainda vou para o banho, nesse percurso pode ter sido uma hora de trabalho produtivo o que é estranho, não é? Quem me tiver a
José Maria Pimentel
ver de fora, se me tiverem a filmar, este gajo não está a fazer nada Eu não acho nada estranho, porque o que acontece é tu, provavelmente no dia anterior tiveste a ver coisas, ou a ler, ou enfim, ou a falar com pessoas, ou a andar na rua, estiveste a absorver essa informação, e depois o que está a acontecer era aquilo que eu estava a descrever. É esse processo natural daquilo brotar, quer dizer, virar consciência. Há aquele livro até muito giro, não sei se conheces, do John Cleese, da criatividade. Sim, eu conheço. E o método que ele escreve é um bocado isso. É uma coisa intensiva, tu estás a ler, a pensar sobre aquele tema, e de repente paras, e é na ociosidade que a coisa... Mas é uma ociosidade direcionada,
Salvador Martinha
não é ociosidade a gosto. Só que não é num escritório, é isso que eu te quero dizer. O meu escritório é a minha cabeça. Eu sou muito vagabundo em Lisboa. Ando muito em Lisboa. Eu trabalho assim, muitas vezes. Vou de casa para o Saldanha a pé, é uma hora. Porque vou ativando o meu cérebro dessa maneira e estou a trabalhar a andar. É uma das partes do processo, depois, que lá que me sento e escrevo, estás a ver? Mas é essa a opção, depois, chegar ali uma hora do dia, imagina, a família ajuda muito nisso, chegam os meus filhos e há um corte, desligou-se. Quer saudade,
José Maria Pimentel
se não entras em... E tu nesse... Tu estás a andar, eu posso estar a ousar ainda, lembras-te das coisas e isto pode parecer um problema enorme, mas eu acho importante, tu retenes na memória ou paras para apontar aquilo no
Salvador Martinha
telemóvel? Não posso confiar na memória, claro. Eu mostro-te o meu telemóvel. O meu telemóvel é um scroll infinito de notas. Ou seja, estás sempre a parar, tipo maluquinho, não é? Sempre, sempre, sempre. E o que isso vale? O tempo que eu demorei a perceber isso. Tipo, a anotação é dos trabalhos mais importantes de um criativo. Imagina, se eu agora perdesse as minhas notas, eu perco meses de trabalho. Eu tenho que começar do zero. Às vezes vou ver aqui, eu aqui posso já ter um espetáculo de stand-up, está a ver com a quantidade de notas que eu tenho aqui. Se eu perder isso tudo, não tenho nada. Porque a minha memória
José Maria Pimentel
está cada vez pior. Claro, e não retiveste. Não dá, não é? No momento achas que sim, a tentação é essa. No me metes, é uma ideia tão óbvia que não me
Salvador Martinha
vou esquecer. Mas acho que é um dos primeiros passos que uma pessoa pode dar para se começar a se tornar criativo profissional. A notação. Eu acho que é isso que distingue um criativo profissional de um... É uma das coisas de um amador. Há pessoas que têm ideias do caraças, não apontam. Está a ver? Toda a gente tem boas ideias. Qualquer pessoa, em qualquer profissão, tu podes ser padeiro e dizer assim, epá, tive aqui uma boa ideia para um bolo. Só que as pessoas acham que não. Depois é tipo, que ideia que eu tinha aqui para um bolo? Depois de carai era o pastel de nata, está a ver? Mas esqueceu-se. Isto é um... Acho que toda a gente devia anotar as suas ideias e os seus pensamentos e acho que muita gente faz isso, não é? Tipo as notas do telemóvel, não é só para criativos, não? Não acho que
José Maria Pimentel
haja tanta gente... Eu faço isso, eu faço muito isso. Eu uso o Google Keep, não sei se conheces. Não,
Salvador Martinha
mas imagina-te como uma pessoa que tem uma aplicação diferente para notas.
José Maria Pimentel
O que é que dá o Google Keep? Tem integração com a Google, o que é simpático, molhas de acesso às minhas notas, mas também não sei se tem coisas especialmente interessantes para eles e permite organizar por etiquetas, permite fazer checkboxes, portanto podes... Um bocadinho
Salvador Martinha
mais profundo, não é? Consegue fazer uma árvore. Não é tão
José Maria Pimentel
profundo assim, há coisas mais profundas mas dá jeito. Não sei, é pouco conhecido estranhamente, embora seja da Google, que dá-me o mesmo sujeito. E, por exemplo, a preparar os guiões das conversas, por exemplo, parecendo que não é um trabalho muito criativo no sentido em que, como é baseado em perguntas e terrenos a explorar, em mim surte muito esse efeito. Leio e imagino. Este é um caso óbvio, mas este é mais simples de entender. No último episódio estávamos a falar um bocadinho sobre política britânica do Reino Unido. Li alguns papers da convidada, obviamente já várias coisas que eu trazia atrás, li algumas notícias, li algumas... Posso ter visto um documentário ou ouvido um podcast. Ou eu ouço aquilo tudo e depois muitas vezes acontece-me. Naqueles dias, lá está, por isso é que é essa espécie de ociosidade focada, porque é só naqueles dias que acontece, porque o cérebro, o inconsciente, está a trabalhar sobre aquilo e depois acontece-me. Estar a andar por casa ou estar a guiar ou estar a andar a pé e de repente lembro-me e anoto muitas vezes até mando clipes do whatsapp a mim próprio. Às vezes me acontece a correr. Vou correr. Por acaso
Salvador Martinha
tenho uma pergunta para ti que é, imagina, eu vi esse episódio, estava muito bom, gostei muito. Tu quando te preparas para as conversas, tu reúnes muita informação e não tens medo de esquecer dela à meio das conversas. Porque tu reúnes muita informação. Imagina que tu queres rebater alguma coisa e esqueces-te da informação. Aí tens de confiar muito na tua cabeça, não é? Eu tenho um guião. Tenho notas. Ah, então às vezes as coisas que estás a dizer tens lá os...
José Maria Pimentel
Convém saber onde é que elas estão nas notas. Não dá. Mas tu faz isso bem. Porque não se nota que tens um guião. E isso só funciona quando eu sei onde está nas notas, mas também acho que se a coisa vier a propósito é improvável que eu me esqueça. O meu medo é esquecer-me de perguntar ou esquecer-me de cobrir esse tema. Não sei se percebes o que quer dizer.
Salvador Martinha
Percebo, mas eu acho surpreendente, como tu achas o humor surpreendente, Por exemplo, se o cara acha assim, como é que este gajo decora um texto de uma hora e não explica as pessoas? Para mim não é surpreendente, é uma coisa muito normal. Eu fico surpreendido em podcast, é que é preciso preparação. Como é que consegues rebater sempre com as referências. Porque também é um timing muito rápido, não é? Também gaguejas um bocadinho e já foste. Sim, é isso. E isso é interessante, também me fez finir nessa capacidade. Porque eu, por exemplo, eu iria ter essa dificuldade.
José Maria Pimentel
Como sempre acontece, parte da explicação é da pessoa estar a ver de fora e não ter passado por isso. E por exemplo, no caso aqui do 45°, eu estou a gerir a conversa. Eu estou a levar a conversa... Estás a levar a teu gosto. ...A um lado imprevisível, porque é uma conversa e não é uma entrevista do curo, mas eu estou a geri-la, estou a guiar mais ou menos, como se estivéssemos os dois no carro. Eu estou a guiar e de vez em quando tu mexes no volante, mas eu estou lá e tenho os pedaços. Claro, claro,
Salvador Martinha
mas é preciso usar o bem.
José Maria Pimentel
Sim, é preciso... Oza. Obrigado. Estavas a descrever há bocado, eu fiquei curioso em relação a um passo, porque estavas a dizer tira dessas notas todas, e eu estava a te descrever que faço a mesma em relação ao podcast. E no meu caso, por exemplo, o que eu faço é muitas vezes tiro as notas de uma maneira completamente desorganizada, depois meto aquilo tudo num documento, tudo organizado e depois vou andando para baixo, vou pegando, pego numa frase, ponho acima sob um dos tópicos, por exemplo, pego noutra e organizo aquilo tudo e aquilo no final fica uma coisa que na minha cabeça faz todo o sentido. Mas é um exercício diferente, no caso do humor, como é que tu pegas nessa nuvem de coisas desconexas...
Salvador Martinha
Também tem que organizá-las, porque por exemplo as notas às vezes estão um bocado aleatórias, não é? Imagina, às vezes tenho, tipo, vários documentos abertos, tipo, ideias 2023-2024. Ideias no geral, ideias para séries, ideias para uma exposição, várias ideias. Portanto, isso é ideias, vários projetos que eu tenho. Imagina, 17 ideias para projetos. Vou juntando a uma lista de projetos. Mas essas são macro ideias, no fundo. São macro ideias. Pois imagina, ideias para stand-up. Depois, dentro das ideias de stand-up, já ideias sub-ideias para a ideia, estás a
José Maria Pimentel
ver? Vou organizando, é um bocadinho como tu. Sim, sim, eu estava a pensar dentro do stand-up depois tens que ligar as ideias. Ou seja, tens que ligar as piadas, digamos assim. Ah, sim, sim, estou a perceber que estás a ver. Tem que
Salvador Martinha
fazer parte de uma história. Claro, não, isso imagina.
José Maria Pimentel
Que é a magia do stand-up. O mau stand-up, entre outras coisas, uma das características que tem é quando é uma história desconexa, não é? Aquilo não se liga, não é? As pessoas têm que parar e... Sim, os chamados
Salvador Martinha
links. É daquelas primeiras coisas que quando eu aprendi eu adorei, tipo link, que é de como é que juntas uma piada à outra, como é que passas de um tema
Salvador Martinha
para outro. Sem parecer uma coisa mal feita, não é? E ao princípio eu estava todo desfitado, tipo, ai, a garna lindo, viste aquele link e não sei o quê. Depois
Salvador Martinha
vais partindo desses conceitos. Já não penso como link. Já é natural, se calhar também. Mas como é que se faz? Estás-me a perguntar. Imagina, há uma fase em que eu tenho uma ideia, não é para um beat, imagina, trotinetes. Tenho um ângulo específico para trotinetes e aí então começo a escrever um texto que pode ter 4 páginas. Depois vais partindo, vais tirando. Eu trabalho um bocado com aquele sistema de mapa de ideias. Imagina, trotinete. Então ponho tudo sobre trotinetes. Não tenho nada de trotinetes, portanto... Imagino trotinetes abandonadas em Lisboa. É fácil, podemos fazer aqui juntos, não é? Trotinetes abandonadas em Lisboa. Agora reparei que, por exemplo, em Londres as trotinetes não estão abandonadas. Posso guardar essa nota. Em Londres não estão abandonadas as trotinetes. Aqui estão. Homens de fato andam de trotinetes. Estranho, não é? Pessoas que andam de capacete em trotinetes. Pessoas que não andam de capacete. Acidentes que já vi de trotinetes. Há um mundo de caminhos ali, é quase como se... Ainda não é piada,
José Maria Pimentel
não é? São vias que podem ser exploradas.
Salvador Martinha
Mas se tu exploras bem, de cada tema há sempre 10 minutos. É um desafio. Eu consigo te fazer 10 minutos sobre água. Porque dá, não é? Se tu vais cavando e vais cavando e há microtemas dentro dos temas e liga a outros temas e liga a outros temas eu quando vejo um tema penso assim, vejo todas as perspetivas e depois fico com as melhores ideias desse tema tu
José Maria Pimentel
achas que há um lado de alta competição nisso? Ou seja, de... Enfim, de humor quase como um desporto não é uma coisa que tu podes aperfeiçoar? Humor normalmente é visto mais como uma arte do que como uma técnica. Mas puxando por esse lado a técnica pode ser uma coisa que tu vais aperfeiçoando como se fosse
Salvador Martinha
um desportista que vai correr os 100 metros. Completamente. Ora, no último espetáculo que eu tinha, o meu texto tinha essa premissa que estás aqui a colocar. Que eu comecei a ver-me como um atleta de alta competição. Então, cortei no álcool. A relação que os artistas têm com o álcool e com as drogas, porque é que os artistas não se veem como atletas, mas são. Imagina, estando na estrada e fazendo 50 espetáculos. Na minha última tour tive 56 espetáculos. Foi muito duro, até fiquei traumatizado desta tour, porque foi muito exigente e muito solitário nem sei se gostei muito desta experiência ir para a Covilhã, Antuário, Ipaveiro, sempre sozinho aquele... Meter aquele cartão no hotel, ver a luz verde hotel, hotel, hotel Ah, mas ias sozinho? Às vezes... Nem sempre podia levar a minha família e também não... Às vezes levar a família retira-te um bocadinho a concentração.
José Maria Pimentel
Certo. Não, eu estava a imaginar, sei lá, road manager, esse tipo de...
Salvador Martinha
Sim, sim. Sim, mas depois o palco em si é muito giro, mas dá uma pancadinha nas costas e estás lá sozinho. Não é? Portanto, é uma solidão assistida. Estão a saber? Mas eu comecei a perceber que para fazer esta tour tão grande, para um português é grande, eu tinha que fazer alguns cortes. Eu tinha que me ver como um atleta da competição, tinha que dormir bem, tinha que comer bem, tinha que estar em forma física. Isso altera. Se eu estiver cansado em palco, isso vai interferir na qualidade do espetáculo. Portanto, é bom que esteja em forma física, é importante falar bem, com boa dicção, falar alto, tipo o corpo, não é? Se eu tiver uma postura muito enfesada, vou criar um impacto na plateia de uma forma. Se eu estiver um bocadinho mais aberto, vou criar outro impacto na plateia. Sabe a ver? Portanto, sim, eu
José Maria Pimentel
vejo... É o essencial, aquela linguagem corporal. Até porque tu não tens mais nada senão o teu corpo. Não há mais nada em palco, não é? Não há mais nada. É uma das
Salvador Martinha
características do stand-up. Exatamente, um stand-up comediano, para encher um palco, é só conta com o corpo dele. Não
José Maria Pimentel
há nada ali para distrair
Salvador Martinha
as pessoas. Portanto, eu acho que era fixe estarmos em forma, não é? Acho que é muito importante. Sim, sim. Agora, repara que as artes durante muitos anos é tipo, vou fumar uma cansa e vou... Pois
José Maria Pimentel
é, mas o humor está num lugar estranho. O humorista tem obviamente aspectos em comum com outros artistas, mas tem o humorista tipo, os humoristas em média têm características que são muito diferentes dos outros artistas. Desde logo a racionalidade, não é? Conversava sobre isso até com um amigo meu, que por acaso está muito longe daqui, e ele dizia que os humoristas são ultra-racionais. O que eu não concordo completamente, não sei se é a palavra certa, mas há um olhar cru para a realidade, pelo menos de determinado tipo de humoristas, não de todos, que é, por exemplo, muito diferente da arte no geral, que está muito mais ligada às emoções e é uma espécie de sensibilidade. Acho que está a mudar um bocadinho. Qual deles?
Salvador Martinha
Acho que a sensibilidade está a entrar para os humoristas um bocadinho mais. Os humoristas eram um bocadinho mais racionais, não eram mais tipo... Pá pá pá, a partir, bulldozers. E começas a ver comediantes mais artistas. Eu acho que há... Defina, dá um exemplo, ou concretiza o que é que se quer dizer. Isto é uma conversa um bocado vaga, não
José Maria Pimentel
é? Sim. Por isso é que eu estou a pedir para concretizar.
Salvador Martinha
Imagina, na minha maneira de ver as coisas é, há comediantes que são de fórmula, é tudo por fora, são matemáticos, fazem as piadas, vai, no final do espetáculo não as conheceste, mas riste, mas não sabes nada sobre eles. E depois Há comediantes que vêm de dentro a comédia. Ah,
José Maria Pimentel
estou a perceber o que queres dizer. Pessoas que vêm de dentro têm esse lado mais emocional que se aproxima mais do resto das artes. Exatamente. É que inicialmente eu percebo que estavas a dizer uma coisa diferente. É que tinha que ver com outro debate completamente diferente que era de entrarem considerações morais no humor, se quiseres, não é? E a pessoa estar a fazer humor não apenas Fora da seca Vilmer, mas por outros motivos. Por exemplo, estavas a dizer isto, mas não, estavas a dizer, a comparar esse lado... Mas na verdade sempre houve, por exemplo, o Carlin, por exemplo, era muito esse humor emocional. E embora ele fosse um tipo muito cru, mas ele punha tudo... Aquilo era muito ele, não é? E era aquele humor zangado, como era...
Salvador Martinha
Sim, era um artista, porque é um humorista transformador. É uma conversa vaga, não é? Eu tenho estas definições na minha cabeça. Há pessoas que são mais pragmáticas. É tudo do mesmo saco. Eu acho que não. Percebes? Eu acho que um Chapéu é diferente de um Jimmy Carr, não é? Um Jimmy Carr é um rei das one-liners Jimmy
José Maria Pimentel
Carr é muito específico
Salvador Martinha
Muito específico, mas não vês com um artista transformador como o Chapéu O Chapéu chita de determinada maneira, por exemplo, tipo Ei, o que é que eu acabei de ver aqui?
José Maria Pimentel
Estás a ver? Esse é mais dessa segunda... O
Salvador Martinha
que é que eu acabei de ver aqui? O Bo Burnham, que para o final do podcast eu tenho esta referência, é completamente para mim um humorista artista. Tipo, as pessoas emocionam-se durante o espetáculo. Nem sabem bem explicar porque. Ele tem uma música num dos espetáculos dele que é sobre meter a mão num pacote Pringles. O texto é completamente parvo, mas as pessoas emocionam-se e arrepiam porque ele faz aquilo com uma música por trás do Kanye West. E como é que explicas que ele conseguiu arrepiar a plateia?
José Maria Pimentel
A música ajuda muito. É outro fenómeno que... É outra maneira de tocar as emoções das pessoas, não é? Mas é interessante isso.
Salvador Martinha
Mas não é só a música. A comédia está cheia de gajos com violas e músicas. Claro, claro.
José Maria Pimentel
Não estou a desvalorizar. A música ali, que me ajuda, mas não é só a música. Ele não faz isso só pela música. Mas sim, o Chapéu é outro exemplo. E tem um lado de crítica grande. Os espetáculos dele que fizeram polémica têm muito a ver. Ele está ali a pôr muito dele, não é aquele humor...
Salvador Martinha
E depois também, eu acho que é a coragem, alguns humoristas têm a coragem de pôr os seus temas mesmo cá dentro. E eu acho que isso é muito bonito. Agora são as minhas definições, eu não quero incortir estas definições aos outros, mas eu acho que há diferenças. Claro.
José Maria Pimentel
Está bem, mas tu não estás a propor que essa é a única variável que interessa para organizar os humoristas, não é? Mas parece-me uma maneira interessante de olhar para isso. Por acaso, essa era outra coisa que eu te queria perguntar. Estás a ver? Agora foi-se tu a pegares no volante para levar a conversa para aí. Como é que nós podemos fazer uma taxonomia do humor ou dos humoristas, não é? Não tinha pensado nesse tipo. Porque há aqueles tipos mais clássicos do humor observacional, da comédia negra, do... Eu acho que essas etiquetas estão completamente... Passadas?
Salvador Martinha
Fora de moda. As pessoas continuam a usá-las e isso não existe. Para mim isso não existe. Isso são etiquetas, pá, são etiquetas da Netflix, quase, sabe aqueles que às vezes, tipo, comédia pateta. Pá, já viste, ao mendar que estiver a fazer um filme de comédia e de repente aparece comédia pateta. Não sabes isso? Na Netflix há alguns filmes que estão como comédia pateta, porque a Netflix decidiu que aquilo é etiqueta. Mas o que é
José Maria Pimentel
comédia pateta quer dizer?
Salvador Martinha
São comédias mais light. Parece um plenarismo. Sim, mas imagina.
José Maria Pimentel
Não quero ofender, mas... É um
Salvador Martinha
plenarismo ofensivo. Vou te cancelar. Eu não associo, não faço essa associação de palavras. Tipo, enfim, de palavras da comédia, nunca punho a palavra pateta.
José Maria Pimentel
O humorista não convive bem com a patetice, não é? Eu acho uma palavra menor. Por exemplo, se para a
Salvador Martinha
comédia não curto. Pateta é aquele tipo assim e agora naqueles programas da tarde e agora vem aqui este o misto que é que ela vai fazer as suas e se a minha patética e se você não veja
José Maria Pimentel
como é que é a caricatura do patético mas se eles querem dizer no netflix
Salvador Martinha
que é que é comédia negra? Não existe. Tipo, a minha coisa... Sim, mas não existe, tipo, é muito simplista estarmos a dizer a alguém este gajo é comédia negra, o Chapéu é comédia negra não tem comédia negra dentro dele o Ricky Gervais é um gajo de humor negro as pessoas podem ter mais camadas é isso que eu acho que está a se tornar interessante na comédia é sair dessas etiquetas mostrar etiquetas pelo menos, olha este comediante tem 4 etiquetas é pá, este é um comediante que tem 4 etiquetas. Uma só etiqueta é pobre, porque ninguém é assim. Se não estamos a fazer dos comediantes, do estilo de comediantes, como nas novelas o bom e o mau. Tipo, há o mau, que é do humor negro, depois há os bons, que são da observação. Não é assim. Agora, as novelas já evoluíram para séries e o que é que nós descobrimos? Que os personagens são complexos.
José Maria Pimentel
As novelas já evoluíram ou não? Continuam a ver telenovelas.
Salvador Martinha
Não, imagina, tipo... Desculpa. Continuo
Salvador Martinha
a ver de vez em quando, ligo a televisão e percebo isso. Não, imagina. Antigamente o vilão era sempre vilão. Não, eu só estou a discordar com a lógica cronológica. Sim, sim.
Salvador Martinha
Mas eu percebo. Não, mas nas novelas os vilões já são complexos e os bons são complexos. E mesmo um gajo de humor de observação que é light, claro que tem um humor negro dentro dele. Para
José Maria Pimentel
quem está a ver de fora, as etiquetas são tentadoras porque são úteis para organizar. Para quem está dentro e pratica humor, deve ser muito irritante porque não está tentando pôr numa caixinha. E tu não queres estar lá, tu não queres ser o Zavala Martini que é do humor observacional. Também queres fazer outro tipo de
Salvador Martinha
coisas. Sim, a mim irrita-me sobretudo porque imagina, eu acho que às vezes a malta da comédia negra quer pôr o humor negro como os pesos pesados. Exato,
José Maria Pimentel
sim, essa é outra dimensão. É uma batota que eles fazem. So os corajosos. Que é tipo
Salvador Martinha
o Bill Burr, o Chapéu, o Ricky Gervais. Não vejo que eles sejam do humor negro. Percebes? Na minha cabeça não.
José Maria Pimentel
Quero dizer, eles fazem humor negro, não é? Os Gerveses fazem um tipo de humor... Humor negro é um bocadinho assim. Nós fazemos um humor
Salvador Martinha
um bocadinho mais arrojado que os outros. Isto é um traje
José Maria Pimentel
para os outros humoristas. Mas é, também há várias maneiras de entender isso, não é? Tu podes admitir que ele é mais corajoso, não tem também nada de sentido, mas não achar que ele é melhor por isso. Quer dizer, desde quando é que a coragem na arte é uma medida de necessariamente qualidade? Corajoso ou arrojado? O Javés tem um humor muito arrojado no sentido em que a minha avó não gostaria de ver isso e os meus pais também não achariam grande graça. É os tópicos, não é? Os temas. Sim, sim, é o tipo de... Agora, é uma maneira de fazer muito bom humor como há várias outras, não é? Não tem que ser humor negro, não é? Claro. Eu, por acaso, até aprecio, mas não tem que ser... Não é a única maneira de fazer. Um bom ângulo a olhar para isto é, o que é comum no mau humor? Às vezes é mais fácil de ir por aí do que definir o bom. Exatamente. Olha, uma pergunta é uma boa
Salvador Martinha
pergunta. Muito obrigado. Podcast de boas perguntas. Normalmente é o contrário, não é? Tipo, o que é que é o mau humor? Deixa-me pensar um bocadinho contigo. Então eu diria, o que é que quando eu vejo e não curto? É... Já foi feito. Desinteressa-me logo. Ah, tipo, eu tipo, desinteresso-me por aquele artista, não é? Porque, então, mas já foi feito, outra vez. Portanto, a falta de capacidade de trazer coisas novas.
José Maria Pimentel
Essa é a dimensão mais... Que toda a gente concorda, não é? Porque é relativa, não é? Eu acho, enquanto
Salvador Martinha
pensas... Ajuda-me, ajuda-me. Tipo, ajuda-me aqui enquanto convidado. Sim.
José Maria Pimentel
Hoje em dia nós estamos sempre a receber por exemplo aquelas... Enfim, isto é uma forma de humor muito modesta, mas estamos sempre a receber aquelas piadolas por WhatsApp, que alguém faz um trocadilho ou uma coisa de qualquer género. A maior parte das vezes, é normal, mas a maior parte das vezes aquilo é ultra-preguiçoso. Porque aquilo é, por exemplo, muitas vezes é criar uma situação que permita tu usares aquele trocadilho, mas aquela situação não estava lá. Mas tu tiveste que a criar para depois usar um trocadilho que não fazia
Salvador Martinha
sentido. É óbvio, mas este óbvio é difícil de qualificar. Sim, agora pergunto-me se eu se calhar nunca estou muito concentrado no que é mau humor. Estou mais atento ao que me fascina. Tipo, não estudo o mau humor. Não, mas descarta-o.
José Maria Pimentel
Põe-lo de lado, não é? Sim. Mas claro, não estás a refletir sobre o que é que tu desejas. Vou-te
Salvador Martinha
ser honesto. Eu acho que não é mau humor, mas Eu ligo muito ao carisma da pessoa. Tipo, ao carisma daquela pessoa. Porque há pessoas que sabem fazer humor na fórmula, mas falta qualquer coisa, não é? Tipo, não é fascinante, não agarra. É engraçado falares disso, porque aí entrou outra característica que eu acho muito peculiar do humor. Não sei se
José Maria Pimentel
te partilhas disto. Eu acho que para nós acharmos graça, por exemplo, a uma série ou um filme, nós temos que criar uma vontade com a personagem. Para mim é uma das razões pelas quais os filmes de comédia resultam pior do que as séries de comédia. Porque tu precisas de entender, lá está, ter uma teoria da mente em relação àquela pessoa. Ou seja, teoria da mente é um termo que parece um termo sofisticado, mas quer dizer simplesmente nós conseguimos perceber o que é que está dentro da cabeça de outra pessoa. Uma coisa que os miúdos é das últimas coisas a desenvolver-se na nossa cognição. Os miúdos desenvolvem para aí aos 6 ou 7 anos, que eles começam a perceber o que é que está dentro da tua cabeça que não é igual ao que está dentro da cabeça deles. E no humor eu acho que nós precisamos disso para começar a achar graça. Eu sinto isso, por exemplo, se começar a ver uma série de humor há ali um... Tens que gostar da pessoa. Não é necessariamente gostar, é criar alguma proximidade, mas sobretudo quase como se fosse um amigo teu, não é? Nós achamos graça sobretudo a pessoas que são próximas e, portanto, nós entendemos o efeito que aquilo gerou dentro da cabeça dela. E no caso de uma, por exemplo, no caso do stand-up, eu acho que os melhores comediantes de stand-up são aqueles que têm, por um lado, essa capacidade de quase representação que tu avisas, mas por outro lado é porque tu começas a percebê-los, é quase como se eles fossem um amigo teu, não é? No início, eu não sei se tu sentes isso, mas eu quando... Algumas vezes Eu tenho muito menos cultura nisso do que tu, não é? Mas eu quando comecei a ouvir humoristas que hoje gosto muito, e poderia ser o Chapéu, o Gerveso, mesmo o Seinfeld, por exemplo, aliás, o Seinfeld, séria, que é a minha série preferida, no início não estava a achar graça aquilo. No início é estranho, aquela pessoa tem um delivery que é estranho, está a falar de uma maneira estranha, e depois tu habituaste-te e se a pessoa tivesse esse lado idiosincrático, ou sequer isso que estavas a aludir... Por exemplo, estás a dizer que
Salvador Martinha
tens de encaixar com a pessoa, sim? Sim, é quase como conheces pessoas num grupo de amigos e há uns que não te fascinam tanto e há aquele que tu fizeste, há uma química, tem que haver uma química, no fundo estás a falar
José Maria Pimentel
de química. Só que o que eu quero dizer é, no caso do humor deste tipo, que é consumido à distância, pelo menos comigo essa química demora algum tempo a construir. É a razão pela qual eu não acho que normalmente graça há comédias em filmes, porque não dá tempo, porque tudo aquilo é muito rápido. Mas isto pode ser meu, não é? Lembraste-me disso quando tu estavas a descrever essa parte do palco e da capacidade. Essa capacidade no fundo tem a ver com a capacidade de ligar a quem está a ver. Criar uma ligação. Aquela pessoa é especial para ti. E portanto já não é só o humor que ela está a fazer, quase como se fosse uma coisa desgarrada da pessoa. É o humor do Salvador, ou o humor do Gervés ou do Chapéu. E tu achas piada porque é quase como se o conhecesses. Não é só piada. Sim, sim. Por exemplo, o que muito estás
Salvador Martinha
a dizer faz todo o sentido. Sim, as pessoas depois criam essa relação de dizer eu sei que, ah, isto é o estilo dele, não é? Portanto, vão... É quase como se fosse um grupo secreto entre esse humorista e as pessoas, não é? Porque não é nenhum humorista para 10 milhões, não é? Portugueses. Há sempre uma fatia. Cada humorista consegue a sua fatia. Uns mais, uns menos. E essa fatia tem esses códigos secretos. E Eu acho que as pessoas gostam disso, ter essa relação com... Você é... E sabem as coisas da pessoa e não sei o quê. E há um lado até de... Imagina.
José Maria Pimentel
Olha, uma das coisas que caracteriza um bom humorista ou humorista com talento é a gestão dos silêncios. É usar o silêncio para a comédia. Não é fácil. E, por exemplo, o Luís Siquei é um tipo que faz isso muito bem. E que funciona bem porque tu o conheces. É quase uma provocação, não é? Ele diz uma coisa.
Salvador Martinha
Sim, os silêncios do Luis Siquei resultam nele. Outro não pode copiar aqueles silêncios. Cada um tem os
José Maria Pimentel
seus silêncios. Exatamente. Porquê? Porque tu o conheces. Tu achas que conheces, no fundo. Não conheces, não é? Mas aquela persona pelo menos, é sempre uma persona, não é? Mas já
Salvador Martinha
até familiar, não é? Sim. Há outros comediantes que o estilo deles é, por exemplo, há um comediante que é o Russell Howard, que não para quieto, não é? Então é uma máquina, imagina, eu acho que foi dos comediantes que eu vi num festival na Escócia, que é o Finnish Festival, que eu lembro-me de estar comigo a dizer assim ai olha o som das gargalhadas eram tão altas nós nunca tínhamos feito com aquela qualidade e olha-me o som das gargalhadas, tipo, as pessoas partiam-se a rir a um nível muito e ele não tinha silêncios, mas é um ritmo alucinante, não é? Mas não quer dizer que uma pessoa com mais silêncios não tenha um ritmo alucinante. São duas perspectivas. É mais intenso. A pessoa que fala mais rápido é sempre mais intenso. Mas as pessoas... É uma coisa gira, porque na comédia as pessoas dizem sempre isso. É uma coisa de quem gosta de comédia diz assim silêncios, não é? É como se fossem apreciadores de chocolate que comentam sempre o chocolate tipo... Aqueles chocolates... Dizem
José Maria Pimentel
isso do silêncio, eu achava que estava a fazer um comentário original.
Salvador Martinha
Não, não, as pessoas têm um fascínio dos silêncios no humor Porque uma pessoa que domina os silêncios consegue multiplicar as piadas. Exato. Consegue fazer
Salvador Martinha
piada sem dizer nada. Consegue multiplicar. Se deres o silêncio certo, riram-se aqui, riram-se
Salvador Martinha
lá. Podes multiplicar a gargalhada, não é? Isso é muito importante. É quase
José Maria Pimentel
magia, sim. Porque tu
Salvador Martinha
que és cientista e gostas disto, no final do espetáculo há umas estatísticas de quantas vezes as pessoas rirem. Isso é giro. Tu podes ver, olha, neste comediante as pessoas riram-se 300 vezes. Neste 120, duro. Eu tinha esta conta, imagina, até havia uma regra, acho que havia uma regra nestes livros, era 12 em 12 segundos. E eu tinha isso, durante muitos anos trabalhei com este sistema. 12 em 12 segundos, eu pelo menos vou dar um motivo às pessoas para se rirem. Era assim que eu também me descansava. Não sei se tem piada, mas 12 em 12 segundos,
José Maria Pimentel
isso é um bom ritmo, não é? Mas também é traiçoeiro, é limitador só essa dimensão, não é? Ou seja, eu posso achar
Salvador Martinha
mais piada uma coisa da qual me ri menos. Foi como eu te disse inicialmente, ao princípio estás mais preso na técnica, não é? Pois, eu estava a pensar nisso agora.
Salvador Martinha
Eu fico afastinado, mas eu contava mesmo e sabia, tipo, ora, o meu espetáculo tem 220 piadas e isso também me dava confiança.
Salvador Martinha
Pelo menos eu digo... Era uma rede, sim.
Salvador Martinha
Eu vou tentar 220 vezes. Sim. E sabes que se falhas numa é tipo baseball. Tens outra base. Vais para outra base. Estas analogias são típicas. De
José Maria Pimentel
que? De alta competição?
Salvador Martinha
Sim, com o boxe, uma punchline é um murro no espectador.
José Maria Pimentel
Sim, sim. Pois, a punchline. Faz sentido. Há outra coisa que é comum nos artistas, ou pelo menos existe essa lógica no senso comum, e eu acho que também existe muito dentro dos humoristas, mas não sei quão transversal é que é, que é um certo lado neurótico. Muitas vezes há uma tendência para depressões. Ou seja, eu acho que isso é normal no mundo criativo, não é? Mas não sei nos humoristas, sei que existe, mas não sei se existe. Ou seja, é uma coisa transversal. Como é que tu vês isso? Ou seja, achas que é por ser um trabalho criativo ou é por ser humor? Que pode ser um escape, não é? Porque o humor é um escape também, não é?
Salvador Martinha
Eu acho que os humoristas são humoristas justamente
Salvador Martinha
devido a essa tristeza. Achas que isso é transversal? Durante
Salvador Martinha
muitos anos eu acho que as pessoas viam os humoristas como alegres, não é? É uma falsa ideia da alegria, não é? Quem faz rir é alegre. Isto é das maiores ilusões que
José Maria Pimentel
existem. Pois, porque pode ser ao contrário. Podem procurar esse paliativo precisamente por... Eu acho que é ao contrário. Os humoristas, no fundo, são pessoas que desenvolveram muito o seu sentido
Salvador Martinha
de humor, não é? E profissionalizaram o humor devido a uma enorme tristeza. Espera, não vamos pôr os humoristas como se fossem pessoas diferentes. Acho que os humoristas somos pessoas normais como os outros e toda a gente tem uma dimensão triste. Só que os humoristas decidiram trabalhar a sua dimensão triste assim, desta maneira. Não sei se isto te responde.
José Maria Pimentel
Mas tu achas que essa dimensão triste é maior e por isso vão em busca do humor como paliativo?
Salvador Martinha
Não sei se é maior. Não sei se a minha tristeza, por exemplo, eu e tu, não sei se a minha tristeza é maior que a tua. Se calhar somos iguais. Eu decidi trabalhar a minha... Como a tristeza a mim, a minha tristeza, a minha ansiedade, o meu desconforto durante a minha vida, me punha em apuros, eu decidi enganar a minha tristeza desta forma. Portanto, eu escolhi o humor, tu escolheste a tua.
José Maria Pimentel
E pode ser também Esse lado social do humor
Salvador Martinha
que não pode crer. Tu expliquei que és ciência?
José Maria Pimentel
Sim. Eu não sou cientista, para dizer que sou cientista. As pessoas até ficam enganadas.
Salvador Martinha
Isto não pode ter a ver com uma ultra-racionalidade? Que há bocado de falares também. Quem
Salvador Martinha
é este senhor? Está aqui um senhor a falar. Ele está a concordar muito com a gente. Está aqui um amigo que está a dizer... Ele está a concordar e está... Descontroloso.
José Maria Pimentel
Não, mas intervenho à vontade.
Salvador Martinha
Quando tu és muito racional, colocas em causa tudo. Porquê é que eu estou aqui e estão a gostar de mim, sequer não estão a gostar de mim? E a tal ultra-racionalidade que se falava
José Maria Pimentel
sobre os humoristas,
Salvador Martinha
faz-te ser neurótico, porque faz-te pensar será que eles estão a gostar de mim? O que é que eles estão a pensar de mim? Será que estou a suar? Será que está a ver que eu estou a suar? E o humorista é muito assim e é esse truque que também o faz ter as perspetivas de brincar com a realidade.
José Maria Pimentel
Uma espécie de... O que chamamos de racionalidade, para mim, é quase uma autoconsciência em estroizes. Sim. Estás a ver tudo fora, não é? Estás a virar tudo ao contrário, não é?
Salvador Martinha
Quero que Salvador tinha, quando era miúdo e sabia que se trocasse a letra, o cavalheiro em vez de cavaleiro, sabia que ia fazer rir. É uma inteligência que é super racional. Ele era super racional.
José Maria Pimentel
E está a desconstruir tudo, não é? Uma coisa de ver o... No outro dia, quando nós tivemos essa conversa, chamava-lhe de entropia, não é? Porque tu vejas do lado mau. Não é mau necessariamente, é o lado desorganizado das coisas, se quiseres, não é? Como o mundo, a nossa vida é entropia, nós temos que ir à procura de ordem, e às vezes criar uma certa ilusão da ordem. E o humor faz, muitas vezes põe a nu o desordenado que é o mundo em vários aspectos. Pode ser, de forma mais observacional, lá está um tipo de incongruência, ou pode ser, no caso do humor negro, é confrontar-nos com aspectos feios que nós queremos pôr debaixo do tapete. Ou seja, esse estado mental facilmente produz uma certa instabilidade emocional. Porque tu... No fundo, estás a perguntar porquê os humoristas têm essa instabilidade emocional. Sim. Eu não acho que seja... Enfim, a minha impressão não é que seja uma coisa absoluta, não é? Porque até se deve refletir no tipo de humor, mas a minha impressão é que existe essa propensão, até porque, quer dizer, fui ouvindo e lendo sobre o assunto, e pode ter que ver com isso, de facto, com tu estás sempre a virar as coisas ao contrário, é uma espécie de autoconsciência em relação ao mundo que te rodeia, em relação às outras pessoas, e virar as coisas de pernas para o ar. Esse exemplo do cavalheiro-cavaleiro é uma coisa muito prótano, é uma coisa ainda muito incipiente, mas é isso, é virar a coisa ao contrário. Agora vou trocar uma letra nesta palavra e vou... Estás a criar entropia, não é? É uma palavra organizadinha, não é? Tinha ali as letras todas no sítio, a pessoa diz a palavra, a outra pessoa entende, não é? Se estiver a falar muito longe, se calhar, não se entende, não é? Já está a interpretar mesmo, mas tu entende e tu chegas lá e tiras o H, não é? E fica cavaleiro, não é? E a pessoa acha graça porque aquilo de repente está fora do sítio, não é? Mas esse estado mental de estar à procura sempre, porque está fora do sítio, pode...
Salvador Martinha
Sim, achas que a cabeça humorística te pode levar a isso. Eu acho que é mais o contrário. Não sei se é a cabeça humorística... Ele pensa muito tempo. Acho que é o contrário. Acho que a cabeça dos humoristas é desenvolvida pela inadaptidão. Imagina... É como se não tivesse uma perna. Então se não tivesse uma perna, tu vais ter que desenvolver outro skill. Tu estás a compensar essa perna que não tens. Mas que
José Maria Pimentel
perna é essa que não
Salvador Martinha
tens? Profundo. Profundo. E se cada humorista tem a sua. Passam coisas... Olha, por exemplo, esta história é gira. Eu uma vez vi, neste festival também da Escoça, vi um humorista que era o Adam Mills e ele era extremamente bonito. Que não joga normalmente. Agora já está diferente, não é? Mas é quase tipo... Imagina, os gajos feios têm que trabalhar mais, não é? Para ter carisma. Exato. O gajo bonito está calado. E tipo, ai, o Afonso é tão misterioso. Ele nem falou. Um gajo feio não é misterioso. É tipo, este gajo é estranho na discoteca. Estás a ver? Sim, sim. Portanto, tens de desenvolver mais. Tens de desenvolver outra competência, não é? E uma vez, eu estava a ver a estada de mil e estava a comentar comigo, mas este gajo está uma lindíssima, este gajo podia estar numa novela. Porque comparava, não é? Como se os humoristas fossem todos estranhos. Nem é feio, são estranhos, não é? Também há uma pose de... Eu quero lá saber. Sim, e a meio do espetáculo dele, do acte dele, ele de facto revela que não tinha nenhuma perna biónica. Ah, muito bom. E eu percebi. Eu sabia. Eu sabia que ele não podia... Faltava-lhe alguma coisa. Eu sabia que ele faltava-lhe alguma coisa. Estás a ver? Nem sempre está relacionado com a beleza. Mas há qualquer coisa que falta aqui. Então tu desenvolves... É como se não vistes de um olho, o outro olho vai ver mais.
José Maria Pimentel
Essa perspetiva é engraçada. Eu acho que isso joga nos dois sentidos, que é por um lado, se te faltar alguma coisa, tu vais buscar o humor enquanto valência alternativa, se fosse um gajo feio ou se lá está, no caso dele, se lhe faltar a perna. E depois também há o outro lado, que é como o humorista explora essa desordem, essa entropia que eu falava, depois também é um statement de que tu és humorista ter essa ar desordenado, não é?
Salvador Martinha
Sim, é tipo, sou livre, sou livre e tenho que... E depois ainda ao lado meta disto,
José Maria Pimentel
que é, como todos os humoristas têm essa ar desordenado, se tu apareces como o Jimmy Carde, fatinho e penteado, isso tem piada. Ou como o Ricardo, inverteram essa ordem. E o Ricardo vai de
Salvador Martinha
fato claramente para... Não sei se se calhar não é consciente, não lhe perguntei, mas é provável. Tu respeitas mais quem está de fato a dizer coisas. Há mais respeito, não
José Maria Pimentel
é? Ah, mas eu Acho que ele está a tentar criar o contrário. Quer dizer, agora se calhar já não resulta, mas no início é criar o contrário. É um humorista,
Salvador Martinha
está a fazer macacadas, mas de repente aparece de fato. Sim, se calhar foi essa a ideia dele, para dar um bocadinho... E devemos-lhe todos muito, porque ele fez um adiantamento aqui de prestígio para usar um sketch de jogado de Federente, ou humor. Ele fez muito para nós. Imagina, antes do Ricardo Arujo, os humoristas não eram tão respeitados. Devemos-lhe isso. Ele
José Maria Pimentel
e outros humoristas. Sim, o Herman fez isso. O Herman, o Bruno Guerra,
Salvador Martinha
devemos isso. Tipo, ah não, espera lá, é um bocadinho como os chefes de cozinha, não é? Antigamente era o Sr. Paulo na cozinha. Agora é o Chefe Avileiros. O Chefe Kiko. Ele no Bombeiro. E foram alguns chefes que levaram os chefes todos com eles. Acho que
José Maria Pimentel
nenhuma profissão sofreu um incremento de prestígio social como a do chefe. De humorista está perto, mas eu acho
Salvador Martinha
que chefe está acima. Eu estar aqui no teu podcast, não é? No teu podcast tu convidas pessoas inteligentíssimas. Convidaste humoristas, pronto. Os humoristas já estão nessa... Espera, porque os humoristas pensam. Antigamente não. Antigamente era aquilo.
José Maria Pimentel
Não, não, absolutamente não. O que eu digo é que acho que os chefes partiram de mais de baixo e enfim, talvez num espaço cultural não, mas no espaço de notoriedade, atingiram um estrelato que não era... Mas e
Salvador Martinha
é justo porque foram estudar. Claro, não é justo. Qualquer. Foram aprender, evoluíram. E tem a ver também com a
José Maria Pimentel
evolução das preferências da população. Mas é engraçado. Há 30 anos dizer olha, o meu filho vai ser cozinheiro. E as pessoas ficam,
Salvador Martinha
epa, pensou duas vezes. Agora é respeito. Parece uma excelente escolha. E humorista também. Sim, sim, sim.
Salvador Martinha
Há milhares de pessoas que querem ser humoristas. Por acaso eu gostava de ter este número, porque se calhar dá para ver quantas pessoas querem ser economistas, não é? Há estes dados,
José Maria Pimentel
quantas pessoas quiserem. Sim, pelo menos tens o número das pessoas que se tentam escolher. Como não há curso de humorista. Pois não. Que
Salvador Martinha
eu acho que devia haver. É interessante.
Salvador Martinha
Era giro. Já tive esta ideia. Pensar, imagina um curso de humorista, mas que fosse para o mundo interno. Que as pessoas vinham estudar para Portugal. Pinhamos Portugal na rota de... Queres ser comediante? Estudas em Portugal. Pá, como professores ingleses. Mas um bom, fazia muito sentido, eu se voltasse para trás e ia tirar esse curso de humorista por mim o que é que era um curso de humorista? Era muito mais workshops de escrita criativa e investia muito mais nisso fiz alguns mas poucos, não é? Porque tu rapidamente em Portugal fazes um, dois workshops já estás a fazer cinema para a televisão é assim, não é? Não precisas de estudar muito para teres... Sim. Iria ter formação de dança, iria ter formação musical, estás a ver? Eu acho que os humoristas poderiam evoluir muito mais...
José Maria Pimentel
A dança era para estar mais à vontade com o corpo, no fundo, não é? Com
Salvador Martinha
o corpo em palco. Sim, sim, contudo,
Salvador Martinha
ter formação de atores... Os humoristas não estudam muito, no geral, não é? Mas eu lembro... Olha, a minha mãe dizia-me uma frase gira, que era... Eu dizia, mãe, está a ver? Eu não estudei muito, consegui, mãe. Gabarolas. Não consegui logo, mas imagina, aos 26, 27... Já estava a viver da comédia, estás a ver a sério? Quer dizer, vivo desde os 20 da comédia, mas mais a sério desde os 26, 27. Mãe, consegui. Consegui, não sei desistir muito. Porque eu sempre fui um bocado de selvagem nos estudos. Eu faltava duas cadeiras para acabar o curso, portanto na prática tenho um décimo segundo. Mas a minha mãe dizia assim, tá bem, mas imagina se tivesse estudado mais. E é verdade. Tipo, e se estão pessoas novas a ouvir este podcast e querem ser humorista, faz uma diferença. Se tiveres talento para humorista, se fosse aprender a cantar, a dançar, um curso de atores e de escrita, vai fazer a diferença e vai-se notar. Porque tu olhas para o nosso panorama, a maior parte dos humoristas não tem muita formação. Porque estamos a começar, Nós somos aqueles... Eu ainda me sinto... Sabes aquelas fotografias de futebol, aqueles com a boas de Cabedal? O gordo em Portugal não está muito longe dessa fotografia. Não estamos muito longe dessa turvia preta e
José Maria Pimentel
branca. O plano de saúde mental é um ótimo plano. Houve só um problema, é que ele nunca fez nada que ajudasse a implementar o plano.
Salvador Martinha
Estamos a violar todos os dias direitos humanos. A falta de apoio do governo por estes sítios mostra isso. As instalações são péssimas. Passava frio a tomar banho. Tinhas uma televisão e ficavas a babar-te a olhar para lá. E pronto. Desassossego é a nova série Fumaça. São 13 episódios sobre saúde e doença mental em que tentamos ir das experiências pessoais à política, das promessas à prática. Estreia a 24 de novembro. Procura por Fumaça na tua aplicação de podcasts ou no link na descrição deste episódio.
José Maria Pimentel
Isto é pornográfico. É frio, cheira mal, está degradado, não tem nada. É só o que eu tenho a perguntar, se nós já temos escala, porque uma das coisas que são necessárias para isso é a escala, porque qualquer ofício precisa de muito treino e portanto tu precisas de... Isto aplica-se a quase tudo, aplica-se à cirurgia, por exemplo, Uma cirurgia de uma especialidade muito específica é a melhor no local do mundo onde houver escala para haver cirurgiões a fazer aquilo centenas de vezes, não é? Porque ganham aquela prícia. E no humor, que é outro ofício, também precisas disso. Bom ponto,
Salvador Martinha
bom ponto. E esse é um dos nossos pontos fracos de sermos portugueses. Imagina, comparando com os humoristas brasileiros, o que é que eles têm a mais do que nós? Eu acho que nós somos bons no texto. No geral, os humoristas portugueses, eu acho que somos bons no texto. Portanto, aí não diferimos deles. E às vezes até somos um bocadinho mais meticulosos do que eles. Até porque, por exemplo, comparando com, em termos de stand-up, imagina, eu tenho 7 espetáculos stand-up. Tipo, se calhar há humoristas brasileiros muito maiores do que eu que tenho 2. Não precisaram de fazer 7. Fazem um 4 em 4 anos. São milhões de pessoas. Nós é tipo fiz 40 espetáculos, acabou. Volta
José Maria Pimentel
a fazer. E o que é que
Salvador Martinha
eles têm mais do que nós? Têm mais horas de voo. Tem mais público, portanto é difícil competir em palco com o humorista brasileiro porque com o mesmo espetáculo ele faz 300 vezes e um português faz 50. E isso nota-se. Mas eu acho que acredita nisto que eu estou a dizer. Nós somos bons, não tenho as dúvidas. Acho que se nós morássemos em Inglaterra ou morássemos no Brasil e estivéssemos nascido naqueles países, com o mesmo número de horas de voo, tínhamos aquela escala. Às vezes até imagina, vem cá o Luís Siquei, ei, o Luís Siquei está num outro patamar, não sei o quê. Pá, com humildade, claro, ele é um gênio. E nós, que não somos tão geniais como o Luís Siquei, mas o que difere é as horas de voo. Eu tenho um avião, ele tem um avião, o dele é melhor, o meu é uma avioneta, só que ele voa 300 vezes por ano e eu vou 30.
José Maria Pimentel
Não, a questão é, não sei se o dele é melhor, pode ser só as horas de voo. Até devemos dar de
Salvador Martinha
barato que é melhor, pronto. Era ridículo agora dizer,
José Maria Pimentel
acho que sou melhor que o Luís. Ou seja, eu percebo a tua modéstia, mas não parece que isso seja óbvio. E as horas de voo, para ti, dão o quê na prática? Ou seja, concretamente, o que é que elas dão? Dão a parte da delivery, capacidade de transformar o texto, maximizar
Salvador Martinha
o potencial do texto? Vou-te dizer uma coisa, que é, o que é que os comediantes portugueses têm que um inglês ou um brasileiro não tem? Silêncios que não é suposto ter. Porquê? Nós não temos o texto tão decorado como eles. Porque uma coisa é fazer 30 espetáculos, outra coisa é fazer 200. Os solos que tu vês na Netflix, gravados, eles fizeram 200 vezes. 200 mesmo? Ou mais, porque... Não sei, imagina. Só as tours podem ser gigantes, imagina, 100, 150 espetáculos. Mais as horas que eles treinaram nos comedy clubs. Portanto, tens de juntar isso tudo. Portanto, tu notas nos comediantes portugueses. Claro que depois se nós filmarmos dá para editar. E eu odeio ver um espetáculo no meu stand-up porque eu digo Porra, olha este silêncio. Não, não, não. Tens de cortar. E eles também cortam, claro. Eles também fazem... E também cortam, não é? Não são deuses, mas temos muitos silêncios que não é suposto ter e isso não é possível a dizer, eu vou decorar este texto, vai, não dá, por exemplo, O Seinfeld dizia que só sabia um texto de core se ele conseguisse dizer o texto de core enquanto dava chapadas na própria cara. Já está a juntar decorar um texto com obstáculos. E aí tu sabes o teu texto e às vezes olhamos para a rábola e não sei quê. Mas eu hoje tenho mais consciência disso. No meu próximo espetáculo pretendo ter menos vezes isto, estas coisas. E aí nós podemos melhorar. Como é que podemos melhorar? Saber que temos este problema que eles não têm e temos
Salvador Martinha
que treinar mais, temos que ensaiar mais, temos que ensaiar mais do que eles, não é a hipótese? Para ti o impacto das horas de voo está no palco, na maneira
José Maria Pimentel
como tu traduzes aquelas coisas, e não na produção do texto. É esse o teu ponto?
Salvador Martinha
Não, porque aí estamos iguais. Aí temos o mesmo tempo. Quer dizer, depois eles vão experimentar os textos deles mais vezes do
Salvador Martinha
que nós também
José Maria Pimentel
o ponto é esse, é que primeiro tu dizes isso com razão por exemplo nos Estados Unidos há uma tarimba muito longa de andar em bares o próprio Starnfield faz isso durante não sei quanto tempo a dar ali noites e noites e noites a dizer aquilo e a testar coisas diversas e essa tarimba também é capaz de se refletir no texto Claro, só que depois não te esqueças que isto é também um negócio e
Salvador Martinha
eles também vão para a tour, não são anjinhos barrocos que fazem... Às vezes é tipo, bora fazer uma tour, bora encher um saco de dinheiro. Portanto, ele tem prazos, não é? E nós em Portugal também temos, só que os deles são mais alargados e eles têm mais dinheiro para fazer esse processo mais longo. Estás a ver? Eu não posso ser assim. Vou estar três anos. Poder posso, mas percebes isso? Vou estar dois anos em Barros. Não é? Eu vou fazer para estrear ali, porque dá-me um jeito de fazer esta turna nesta altura. Problemas de Portugal. São lá de problemas. Mas
José Maria Pimentel
está melhor, está muito melhor do que estava há anos.
Salvador Martinha
Muito melhor. Melhor porque nós agora, o que eu sei, está ao alcance de todos nós podemos... Sabemos o que é que podemos
José Maria Pimentel
fazer. E o humor tem um lado limitativo nesta aspecta, é muito... Como depende da língua, depende também da cultura, mas depende sobretudo da língua. Tu podes fazer humor em Portugal, podes ir ao Brasil, mas o Brasil já é um obstáculo.
Salvador Martinha
O Brasil está-se nas tintas para nós. Pois, e para lá disso...
Salvador Martinha
Se é, quero saber se é. Fazem-me favor de vez em quando. Outro dia falei com um amigo meu, que é por acaso art dealer e é agente também de quadros e ele deu-me uma perspectiva gira. Que foi? Imagina, até vou dizer isto. Agora, quando vieram cá os humoristas, foi cá o Jimmy Carr, foi cá o Luis Siquei e os
Salvador Martinha
humoristas, assim, mais conceituados, não quiseram abrir para eles. Mais conceituados de cá. De cá. Repara nisto. Sim, sim, sim. Nós só somos conhecidos aqui. Claro, claro. Mas,
Salvador Martinha
tipo, ninguém, tipo assim, agora vou abrir para o Luiz e se fica...
Salvador Martinha
Isto é ridículo. Repara, isto é ridículo mas se os humoristas pensaram nisto, não é ridículo. Percebeu isso perfeitamente. Claro. Porque tu habituaste-te a um determinado reconhecimento e aquele gajo nunca te viu na vida. Sim, de repente eu vou abrir e ele está-se meio a cagar para mim, não é? Mas
Salvador Martinha
ao mesmo tempo é menor, porque eu considero menor porque é o nosso eguinho, não é?
José Maria Pimentel
É, claro. Por outro lado, este
Salvador Martinha
art dealer, que é um gajo que vende quadros para o mundo inteiro, disse uma expressão que eu não sei se vou conseguir reproduzir aqui, eu disse assim isso é falta de troca, tipo ele deu uma expressão qualquer que é tipo, isso é um mau negócio tipo o negócio não está bem feito, o negócio tinha que ser assim ele vai, vai abrir para o ICK, mas quando ele fizer uma cena em Londres tem que haver uma troca e a trocas não estão feitas. Que é tipo, vem cá às portas dos fundos, nós fazemos tudo para eles e
José Maria Pimentel
não vamos lá fazer nada. Percebes o que estou a dizer? Mas acho que ele está a assumir que há interesse de ambas as partes, pode não haver, não é? Sim, mas
Salvador Martinha
imagina, nós aqui é tudo vago, é amador. Percebes a maneira? Acabamos por não ir para estas corridas por amadorismo do próprio negócio isto é um negócio! Eles vêm cá, nós vamos abrir para as portas dos fundos, imagina como já fizemos, como eu fiz uma coisa com as portas dos fundos mas depois é vago, não é? Porque nós portugueses também... Eu não sou nada premeditado nestas coisas. Eu não sou um americano, sabes que pensam tudo. Contacto, tal, fecha, não sei o quê. Mas este art dealer, não é art dealer,
Salvador Martinha
ele é galerista. Desculpa que é diferente. Se ele tiver ouvido já estava a sentir insultado. Sim,
Salvador Martinha
mas ele como é um gajo de negócio do mundo, esta perspetiva achei muito interessante. Mas estás a ver, isso é giro também. Às vezes nós estamos muito dentro das nossas áreas e às vezes falarmos com pessoas de outras áreas de repente exploqueamos. Para mim, e faz muito sentido o que eu disse, nunca tinha ouvido ninguém dizer isso. Sim,
José Maria Pimentel
é um dos benefícios de falar com pessoas de outras áreas. Temos perspectivas diferentes. Mas é engraçado isso, sim. Porque estávamos-me a perguntar, não há troca, não é? Eu estava a fazer, por exemplo, qual é o... Vem cá o ICK, eles dizem. Salvador, vais cá abrir o espetáculo e tal qual é o benefício para ti? É que ele seria pago por exemplo? Prestígio dentro do meu pequeno quadrado que é Portugal
Salvador Martinha
mas mesmo um prestígio não é... Mas sinceramente eu abrir para o Luís Siquei a mudar alguma coisa para mim dentro de Portugal, não.
José Maria Pimentel
Pois, é isso, é isso. O que eu estou a tentar chegar.
Salvador Martinha
Nada. Só eu estou a ser o porreiro para ele. Isto é ridículo. Mas estamos a especular. Não, está a ser mais simpático. Eu estou a ser simpático para ele e ele depois faz assim, um abraço e um queijo. Mete-me em um gajo qualquer, cabra, quem é que está em Portugal? É indiferente para ele.
José Maria Pimentel
E até uma coisa, enfim, é tentadora, mas eu não entendo quem é que ganha aí. Porque o Alicica, quer dizer, não é necessário. Tu não ganhas e o
Salvador Martinha
público também não parece que ganhe assim tanto,
José Maria Pimentel
não é? Porque o público se quiser ver os faladores... E vais dizer em inglês! E vais dizer em
Salvador Martinha
inglês! E depois houve humoristas que fizeram e muito bem e correu bem em inglês. Mas em inglês, cá? O Malhel Cardoso, o Guilherme Fonseca,
Salvador Martinha
que são bons humoristas, abriram para eles e competentemente. Porque estás a presumir que parte do público
José Maria Pimentel
não era portugueso, o que é bastante provável, se não estavas a pensar
Salvador Martinha
nisso. Sim, Portugal agora também está a entrar na rota dos espetáculos internacionais. Quando vem cá um Jimmy Carr, se calhar...
Salvador Martinha
Ele não vem cá por acaso. As pessoas estão em Londres e dizem Ah não, vou ver o Jimmy Carr em Lisboa
Salvador Martinha
e passam o fim de semana.
José Maria Pimentel
Exato, exato. Isso é giro. Sim, eu vi o Gervais em Barcelona, por exemplo. Por exemplo?
Salvador Martinha
Porque não veio cá. É um programa. Mas respondendo à tua pergunta, isso é uma coisa que me chateia imenso, é que estamos muito limitados. No fundo só atuamos para Portugal. Sim, conseguimos fazer brincadeiras com o Brasil. Nós não temos novelas portuguesas a passar lá, não é? Foi o nosso problema. É isso, é isso. Porquê é que nós não pensámos primeiro? Porquê que não foi a Vila Fai a passar lá? Estás a ver?
José Maria Pimentel
A Vila Fai. O problema é que não sei se dava. Mas esse exame dos humoristas estrangeiros e tu ves lá a abrir, lembra-me de uma história. Não sei se vocês já ouviram contar essa história. E nem sei se é verdadeira. Contava-se a propósito do Herman quando veio cá o Frank Sinatra. Pai, nos anos 90. Acho que é uma história antiga. Já ouviste? Já ouvi, mas conta-me outra vez. Eu posso estar a contá-la mal, mas a ideia era que ele ia abrir o espetáculo. E o Herman canta, não é? Portanto, presumo que ele fosse cantar. Ele ia abrir o espetáculo. Portanto, o Herman era, naquela altura em que o Herman era... O maior! O maior em Portugal! Era a pessoa mais conhecida. Sim, sim, sim. E ele chega lá e o Sinatra ignora-o completamente. Ele até
Salvador Martinha
tem uma pequena frase, ele diz assim Senhor Frank, este é o melhor humorista português e ele diz, bom para ti. Um abraço, siga.
José Maria Pimentel
E o Herman tem um ego, pelo menos parece visto de fora, alguém com um ego bastante grande.
Salvador Martinha
Os humoristas portugueses que confraternizaram com o Luiz Siquei têm feedbacks semelhantes. Tipo, super frio. Claro. Indiferente. Isso também é tipo, porque ele é tão bom vamos ter que nos respeitar uma experiência de um homem frio que não tem interesse, um deles pediu uma fotografia, o que é que foi? Ele disse não. Ou alguém pediu tipo não, ele disse só não. Estás a ver este
José Maria Pimentel
género? Sim. A diferença é que não foi em público. Não foi em público. A do Buerman deve ter sido. Mas ele veio naquela
Salvador Martinha
fase em que, não é? Veio na fase do cancelamento, portanto devia estar mesmo
José Maria Pimentel
deprimido. Pois, exato. Acredito. De manhã era uma boa fase. Não devia estar a queimar o terco. Estás a ver como é que ele
Salvador Martinha
curou a depressão dele. Deve ter estado deprimido. Que média, não é?
José Maria Pimentel
Sim. Foi ou não foi? Sim, eu também. Era uma fuga para a frente. Deve ser. Eu vou fazer uma inversão porque nós não chegámos a falar disto há bocadinho, Mas outro aspecto que eu acho peculiar do humor, para além daquilo que eu falava há bocado, tu tens que te habituar, ou acho eu, quer dizer, pelo menos na minha perspectiva, tens que te habituar ao humorista, é que o sentido do humor também é muito variável. Tu dizes aquela bocadinho que é do humorista ter um bocado o seu público. Aliás, qual é que é o teu público? Tu vais ter noção disso. O meu público é... São pessoas dos
Salvador Martinha
16 aos 40. Consideram um público jovem no geral, em que a fatia é jovem, se bem que não sei até que idade é que se é jovem. Também é um
Salvador Martinha
espectro grande, 16 aos 40 é bom. Sim. É um público 50% mulheres, 50% homens.
José Maria Pimentel
Ah, engraçado. 50-50. Boa, boa. Quanto mais mulheres
Salvador Martinha
numa sala, melhor. Porquê? As mulheres é que mandam nisto. Tu se fores ver na tua vida quem é que tomou a maior parte das decisões. Tu vais ao teatro, porquê? Quem é que decide? As mulheres é que ditam as coisas. Portanto, é bom, é um bom sinal ter as mulheres. E é um excelente público. Por exemplo, a mim seria um pesadelo ter 90% de homens. Nem teria nenhum motivo para fazer comédia. Se a minha comédia fosse só para homens, não tinha interesse nenhum. Se agora dissesses para mim assim... Não tinha interesse porquê? Se tu dissesses assim, não há mulheres no mundo, eu não fazia comédia.
Salvador Martinha
Ah, está bem. Já pensaste nisso? Sim, mas aí vamos atuar.
Salvador Martinha
Porque é que tu começaste a fazer comédia? Se calhar. Imagina, só houver homens no mundo, tu a fazer comédia? Para quê? Qual é o meu objetivo? Não sei explicar, mas é como... Eu já tinha um texto sobre isto, que era tipo, eu faço comédia para aumentar o desejo que as mulheres têm para mim está a perceber? É brincar, é brincar mas é a sério.
José Maria Pimentel
Eu não te perguntei isso no início mas essa é uma das razões social e do lado cognitivo. Mas eu acho que é verdade. Apesar de
Salvador Martinha
ser casado, tu és casado mas gostas que outras pessoas estejam interessadas em ti.
José Maria Pimentel
Claro, claro. É o teu valor não é? Sim. E de parte até é inconsciente não é? Mas eu acho que a comédia... E falas muito aquela pergunta clássica, não é? Porquê que há mais humoristas homens? Eu acho que tem a ver com isso. Tem a ver com esse... Eram os homens a serem engraçados, não é? É uma maneira de se afar, não é? Uma maneira de se afar bem. Talvez, talvez. Há outras, não é?
Salvador Martinha
outras, mas... Mas tu consegues usar essa, não é? Eu costumo dizer que o humor foi a forma que eu arranjei de ser bonito e é verdade e resultou para mim tipo não tinha eu não podia estar calado percebes eu não podia ser o afonso misterioso é que pô afonso misterioso era muito mais fácil não podia fazer que misterioso a maneira como ele está super fixe super seguro de si, nada! O gajo pode não dizer pão, pode não dizer nada, e eu tinha que estar sem meu movimento!
Salvador Martinha
Deve ser! Tivesse
José Maria Pimentel
que correr mais, não é? Tive que correr mais! E o que é, Agora fomos numa tangente e o que eu ia perguntar não tinha nada a ver com isso. Eu perguntei-te pelo teu público porque uma das coisas interessantes do humor é que o humor, pelo menos é a percepção que eu tenho, muda entre gerações. Ou seja, a geração dos nossos pais não se ri da mesmo tipo de coisas que a
Salvador Martinha
nossa geração tem. Mudam as roupas. As pessoas às vezes, ouve isso que eu te digo. Imagina, a mesma piada ido para um homem de fato, ou para um jovem vestido daquela maneira, a pessoa já nem estava a ouvir o homem de fato. Para um miúdo de 15 anos, se estiver com um comediante grisalho, que se veste de uma determinada maneira, ele está a ouvir blá blá blá. Agora viu um miúdo vestido da maneira dele, com aquele estilo que ele quer, este gajo tem a minha atenção. Estás a ver? Eu não estava a pensar
José Maria Pimentel
nisso. Estavas a falar de uma coisa diferente que era interessante também. Estou a dizer só pelo estilo. Aquilo que eu estava a falar é mesmo do tipo de humor, ou seja, imagina. Exatamente, os estilos foram mudando. Há muitas piadas que eu recebo de familiares mais velhos que não acho graça nenhuma. Mas eles acham imensa piada, então vão mandar aquilo. Porque é um tipo de humor diferente. Mas tu vês mesmo as décadas,
Salvador Martinha
eu acho que imagina... Houve estilos de humor reinantes. Monty Python. Nonsense. Nessa altura era nonsense. Então as pessoas apreciavam o nonsense. Depois veio o Seinfeld. A fase da observação. Ai, pequenas coisas do dia-a-dia, como isto é fascinante. Eles falam de coisas do dia-a-dia, isto é lindo. E rimos todos sobre isto. Depois passámos para a fase do Rick and Jevese. Humor-desconforto. Office. Mudou o mundo, não é? Este desconforto que ele foi dizer ao chefe tive vergonha, te escondi-me na sala a ver a série, que fascinante. E agora estamos a passar, não queria ser o adjetivar, mas é esse humor como é que eu ia dizer? Acho que é uma mistura, o chapéu é o novo, o tipo humor de humor poderoso não é? Que arrebenta com tudo de, ai a perspectiva que ele teve foi muito arrojado nesta perspectiva. Ele disse mesmo as merdas. Ele diz as merdas sem medo. Ele teve coragem, não é? Quase que estamos a entrar na era do humorista corajoso. Ele disse isto! Ai!
José Maria Pimentel
Enquanto agente social, assim. Eu
Salvador Martinha
acho que são os dois... Tipo, agora é coragem e sensibilidade. São as duas palavras que eu vejo na tendência do humor para a frente. Quando por exemplo os Monty Python não vejo tanta coragem, se cara não era daquela época, não havia tanta coragem não era? Tipo, ai o papagaio
José Maria Pimentel
não sei o que é, mas... Eles foram imensamente corajosos naquela altura. Sim, eu sei, eu sei. Mas eu
Salvador Martinha
percebo o que queres dizer. Não sei se estou certo, porque precisava estar lá. Se calhar assim, imagina, o Herman quando fez a última ceia foi super corajoso. Claro. Mas
José Maria Pimentel
não era intervencionista, não é? Era corajoso, mas ele não estava a fazer uma intervenção. Pelo contrário, isto é, Ele estava a dizer, olha, eu não quero nada com isto, mas deixa-me fazer o sketch da última série.
Salvador Martinha
Claro. Mas também não havia... Os Monty Python não tinham a corrente de feedback que existe hoje, não é? Pois é, claro. Agora tu vais, tipo, tu podes ser cancelado. É como se nós atuássemos agora, como se os humoristas... Estás na corda bamba, não é? Estamos num coliseu romano. É para ficar vivo! Este humorista é para cancelar! É para cancelar! Estamos assim, não é? Portanto, esse é um grande desafio para um humorista. Como é que tu não te deixas influenciar por isso? É preciso coragem e paciência. Eu, por exemplo, eu sinto-me um humorista corajoso mas às vezes não tenho paciência. Estás a ver? Não me tapes.
José Maria Pimentel
Para ter o trabalho.
Salvador Martinha
Sim. Não é para ter o trabalho, é para dar a fatura de determinada piada. O
José Maria Pimentel
trabalho era nesse sentido, não é? O trabalho é que aquilo te vai dar. O trabalho é que me
Salvador Martinha
vai dar. Percebes? Prefiro então investir, acho que temos que investir no trabalho de cada piada é uma tese e está muito bem defendido para não virem malucos chatear-me eu não quero malucos a chatear-me.
José Maria Pimentel
São os dois caminhos não é? Ou tu robustece o teu amor de maneira a que ele não tenha ângulos mortos e portanto não pode pegar a mel lá de nenhum Ou então vais no outro caminho e dizem que é? Então vou provocar-vos e vou fazer pior ainda. E vocês vão ficar dois. Sim, exatamente. São os dois caminhos. O Chapéu fez isso, não é? Aquilo até se torna um bocado cringe a partir de certo momento. Pois eu, por exemplo, estávamos aqui a falar antes, os três,
Salvador Martinha
com uma pessoa mistérica que está aqui neste podcast. Quando eu tive dois programas no canal, o especial e o nada especial. O especial era um talk show e o nada especial era um spin-off do especial que era só um nó. Imagina, o que é que mudou no humor nos últimos tempos? Agora o humorista tem que evoluir, ou seja, cada piada tem que estar mais testada, mais à prova de bala, não é? O público tornou-se mais exigente, portanto o humorista também tem que alcançar esses padrões de exigência. Eu acho que esses tempos não vão voltar. Eu lembro-me de escrever, com o meu amigo Alexandre Romão, escrevíamos sem Réina e Rock. Nós realmente não tínhamos medo de nada porque não havia esse medo. Portanto, isso é um tempo que não volta. Não estou a dizer que agora não estamos melhor, mas eram tempos engraçados. Imagina tu escreveres sem medo. Sim, sim. Também
Salvador Martinha
é assim. Imagina, eu não tinha
Salvador Martinha
muita responsabilidade porque era um pequeno humorista do canal Q portanto, também sabes quando começas, tipo, dizes piadas e ninguém está a ouvir também mas esse humor era muito arrojado porque não sei se voltei a ser tão corajoso como nesses tempos porque não tinha nenhum limite de facto, nem a minha cabeça tinha limites eu não tinha de facto limites por inconsciência e isso não volta e é pena também porque acho que se conseguia coisas giras assim e agora podes não conseguir coisas giras algumas
José Maria Pimentel
coisas por medo sim, ou eu acho que o perigo é ver determinados terrenos que não vão ser explorados por esse medo. Sim, mas eu acho que isso mudou, acho que
Salvador Martinha
se calhar agora os humoristas têm medo. Eu acho que é estranho um humorista dizer isto, acho que é um pequeno segredo que os humoristas agora têm, que não lhes fica bem dizer, mas têm medo. As suas coisas são muito analisadas, muito...
José Maria Pimentel
Mas é, eu acho que até é um bocado o último reluto. Ou seja, os humoristas são aqueles que se podem dar ao luxo de resistir a essa acho que membros lhe, maior sensibilidade do público, porque eles podem fazer humor a partir disso. E estão a fazer humor, portanto não estão verdadeiramente a... Mesmo o Chapéu, se aquilo não fosse humor, ele era um pária neste momento. Como é o humor, enfim, foi agredido, não é que não tenha tido consequências, mas como foi o humor, deu polémica, mas... Mas
Salvador Martinha
sabes que eu acho que, por exemplo, em relação ao stand-up comedy... Já agora, desculpa, só para quem não está a
José Maria Pimentel
ouvir, você já me ensinou do que é, mas o... Deu polémica, foi um special que ele fez, ou seja, um espetáculo que ele fez. Aquilo lá está, era humor, mas ele estava sempre, sempre, sempre a criticar e a meter-se com as pessoas transgénero e com a lógica de intersexo, diferenciando sexo e género, não haver homem melhor. Ele estava sempre a meter-se, mas era um espetáculo violento. Ou seja, aquilo era sempre a bater na mesma coisa e foi bastante polémico. Mas ela está sendo humor, embora tenha sido muito polémico.
Salvador Martinha
Mas olha que eu acho que no espetáculo stand-up nós não temos essa proteção. Porque é a nossa cara. Aquilo é a cara dele. Se teres um bigode é que altera. Tu podes dizer muitas coisas com um bigode é que uma peruca. Aí as pessoas já se riem. Sim, sim. Porque É mesmo assim. Aí eles estão com bigodos e vestidos. Ah é brincar. E estão com uma voz. Imagina, eu por exemplo tenho uma coisa às vezes faço que é criar um personagem que é um agente de influencers que é Plin. Dentro daquela vozinha que eu tenho posso
José Maria Pimentel
ir muito mais longe. Sem
Salvador Martinha
aquela vozinha eu não posso ir tão longe. Quer dizer, poder posso, mas as pessoas... Ah, ele está a brincar! E as coisas que ele diz, porque ele é um personagem. Se eu já estou a falar sem vozinha, ai ai ai. Então, não há essa proteção. Em cara limpa, está a saber? Por isso é que
José Maria Pimentel
os humoristas estão sempre a dizer que não estou a dizer o que acham. Precisam dizer isso muitas vezes porque isso não é necessariamente óbvio para quem está fora. O Gervais está sempre a dizer isso. Ele diz sempre, não, isto não é o que eu acho. É comédia. Não,
Salvador Martinha
mas às vezes eu acho que as pessoas...
José Maria Pimentel
Eu não sei se o público compreende
Salvador Martinha
essa frase, porque eu acho que o público depois pensa que o humorista nunca está a falar a verdade. Eu acho que não. O Gervais, metade do espetáculo está a falar a sério.
José Maria Pimentel
Não sei se é isso que ele diz, por acaso. Não sei se ele reconhece isso. Não, eu
Salvador Martinha
acho que está, mas... Claro que fala a sério.
Salvador Martinha
Às vezes é que não. Imagina, ele tem umas piadas no último special que é tipo, não sei o quê, das mulheres. Então está a gozar. Tipo, a dizer que as mulheres não compreendem não sei o que. Está a gozar, claro que ele está... A piada é tipo, olha ele a dizer que as mulheres não compreendem piadas, imagina. Ele está a brincar, claro, e o público ri-se por isso. Sabe que é estúpido ele dizer que as mulheres não vão compreender. Uma coisa mais ou menos deste jeito. Mas depois quando ele tem um beat sobre os comentários do Twitter, ele está a falar a sério e está a dar a sua opinião. Não há nenhum comediante que esteja sempre a brincar. Isto é só brincar, não é? É uma mistura. Claro que ele não está a brincar,
José Maria Pimentel
mas ele dizer que está a brincar, protege-o. Se ele conseguir convencer as pessoas... Claro. Ou seja, é esse o objetivo dele. E o que tu estavas a dizer, se ele fosse com uma peruca e com um bigode era mais fácil convencer as pessoas mesmo quando tivesse a ler os tweets que estava a brincar. Eu na verdade acho que essas partes são as partes do espetáculo
Salvador Martinha
do Loco Mendes Grosso. E provavelmente é porque ele está a falar a sério. Sabe o que é que acontece? Isto é muito engraçado. Nesse estilo de humor em que tu
Salvador Martinha
vais dar as tuas opiniões é uma linha muito... É muito difícil aquilo. É um Ferrari que estás que... Imagina, por exemplo, o Chapéu consegue fazer isso mas tu consideraste que estava a dizer a Crins, não foi? Sim, Crins no sentido em que já estava a repisar. O que é que acontece? Nota-se, tipo, ah ele está bem chateado e o gajo está chateado e o público não está habituado a ver isto. Porque o público está sempre a ver, tu eras um macaquinho, um macaquinho tão rir, tão a brincar, agora tão sério, não sei o quê. E às vezes tu notas, ah o gajo está mesmo tenso com isto, olha o chapéu, isto magoou, estranho, humorista com sentimento, o que é isto? O público também estranha isso, porque se tu vês uma pessoa tensa em palco, ficas tenso, não ficas? Ficas tenso, ficaste nervoso também, está aqui uma onda, não está? E as pessoas esperam do humorista que
José Maria Pimentel
alivia uma onda. É ao contrário, a ideia é libertar a tensão. Mas a realidade
Salvador Martinha
é que os humoristas também têm as suas más ondas. Claro, é isso. E algum do material deles vem de bad vibes.
José Maria Pimentel
Sim, sim, sim. E, enfim, isto não é uma coisa estanque, não é? Parte do espetáculo pode ser precisamente provocar esse tipo de sensações. Eu acho que a minha sensação de com o chapéu de altar a repisar tem a ver também com o quão importante é o tema para ti. Ou seja, como nós não vivemos na realidade americana, embora aquele seja o tipo de temas que... Em Portugal é um microcosmo completamente, mas é um microcosmo. No meu caso, o Tânia Sérgio é um tema que me é familiar, mas apesar de tudo não está tão presente como provavelmente na audiência dele. Então esgota mais rapidamente, a certa altura, pronto, teve graça, agora já estás a...
Salvador Martinha
Sim, o público pode se cansar deste tema porque ele está com uma obsessão. Exato, exato. Aquilo é opressivo. Porque ele teve, como vou, muita pancada, aquilo mexeu mesmo com ele. Imagina, que tipo de pessoa tem esta carapaça? Imagina ter milhões de pessoas a dizerem mal de ti. Ninguém gosta. Não, ninguém. Mesmo os humoristas mais durões. Eu tenho uma grande carapaça. Achas que isto é humanamente possível? Uma pessoa ter milhões de pessoas que... Imagina, eu quando comecei a fazer isto pensei assim, espera lá, quando depois me tornei mais conhecido, eu tenho milhares de pessoas que não gostam de mim. Já viste? E aquilo me magoa. Eu ficava assustado, assim. Ficava tipo quase em emoção fatal e pensava. Eu tenho, e dizia para mim, milhares de pessoas que não gostam de mim. Há milhares. Pode haver, imagina, 300 mil pessoas em Portugal que não gostam de mim. Assim, tipo, não gostas de gajo? Mas pronto, quero acreditar que há um bocadinho mais que gostam, que trabalham para aquelas 400 mil. Nem sei, nós não sabemos os números, não é tão especular. Isso é uma sensação estranha, tipo, eu não comecei nisto para ver 300 mil pessoas que não gostam de mim. E nós somos muito mais sensíveis
José Maria Pimentel
ao negativo do que
Salvador Martinha
ao positivo, né? Claro, é aquela típica de...
José Maria Pimentel
Se houver 10 comentários positivos, ou 9 positivos e 1 negativo, tu vais ler o negativo. E vais ficar a pensar
Salvador Martinha
no negativo. Uma vez pus uma fotografia no meu Instagram que era... Falhei! Que era uma fotografia da plateia num espetáculo meu, tudo a rir, 23 pessoas, que apareciam na foto e um coiso, sem rir. E eu... Falhei! Porque tu podes se concentrar muito no
José Maria Pimentel
negativo. Sim, sim, falha essa.
Salvador Martinha
Tu elogios já não ouves. Eu já não ouço bem
Salvador Martinha
elogios. Imagina... É ridículo. Os
Salvador Martinha
elogios ou são bem estruturados... Imagina, tipo, aquelas coisas... É, muito bom, é, não sei o quê... Agora não disse nada, desculpa, não se percebeu. Mas estava com pedor em dizer elogios. Mas aqueles elogios, tipo, eu não sei o quê, nem vou dizer. Estou a continuar com medo. Não me entram. Ou são estruturados ou já não entram. Uma crítica entra logo. Não gostei nada. Oh, fico logo, vai dar triste. Não consigo controlar, não é?
José Maria Pimentel
Sim, e essa indiferença aos elogios, eu percebo o que queres dizer e é uma coisa especialmente párvore. Eu sinto isso também e tento dar para trás porque é estúpido, não é? Quer dizer, um elogio é uma coisa ultravaliosa e é uma pessoa que se dedicou a enviar-te uma mensagem ao invés de... Não acreditas tanto, não é?
Salvador Martinha
Tu acreditas no que é dito negativo e nunca diz assim. Ele está a ter, mas ele está a brincar. Nunca! Mas quando é elogio... Mas sabes porquê? Porque imagina, as pessoas às vezes também inventam coisas, não é? Tipo... Há muitas pessoas que inventam coisas. Há pessoas que dizem assim Epá, tipo, tu és o gajo dos podcasts, não é? Curto, curto. E depois o cara nem ouve
Salvador Martinha
bem. Também há estes. Portanto, o elogio também tem... Pessoas que dão mal. Não é um elogio. A
José Maria Pimentel
heurística talvez seja um bocadinho essa, não é? O elogio, ok, é bom, mas pode ter necessidade 100% verdadeira e pode não ser muito exato, ou não está a dar uma novidade. Se tivés um comentário negativo, pode ser alguém que está a ver uma coisa e tu não reparaste uma falha tua, e eu acho que aí no vosso caso isso é muito mais visível, o que te chateia não deve ser o comentário negativo estúpido do... Isso é normal! Isso não chateia ninguém, não é? Agora se há um que diz, não acho a piada nenhuma... Está
Salvador Martinha
muito pior o Salvador, por exemplo. Sim, quanto mais estruturado é o comandante negativo, pior é. Se for, este gajo é o normal. Ah, estou aliviado. Porque o Ronald tem uma coisa que me descansou, eu tive que arrumar a minha cabeça. Quando comecei a ter mais feedback, tive que arrumar a minha cabeça, porque isto é violento. O feedback é violento, o positivo e o negativo isto mexe contigo e pensava sempre no Ronaldo a dizer assim espera o Ronaldo...
Salvador Martinha
O molestamento, não é? Não, não por comparação,
Salvador Martinha
pelo contrário, vais perceber. Então o Ronaldo é efetualmente o melhor jogador do mundo, ou seja, é um facto, ele marca os golos, as equipas são campeãs e tem pessoas que dizem que não é normal ou que não é bom, ou que não joga bem, portanto, até com factos as pessoas não gostam imagina quando é vago, portanto para um artista então... O esporte é meritocrático, não é? O Ronaldo tem haters do quê? Tecnicamente, ele marca gols. É uma lenda. Como é que tem? Não gosta do Ronaldo? Do quê? Então imagina nós, que dizemos
José Maria Pimentel
coisas. Mas isso não implica depois de tu estares completamente fechado ao feedback? Porque feedback também pode ser... Eu já tive críticas no podcast que me foram muito úteis. Que me custou ler na altura, mas depois pensei, não tem razão. Não, Não, eu estou super aberto ao feedback, só que o feedback não existe. Só que é difícil filtrar. Só que
Salvador Martinha
não há muito feedback. Pois. Isso é uma coisa engraçada. Imagina, no nosso meio existe pedor em dar feedback, pessoas escondem-se. É
José Maria Pimentel
uma coisa que me irrita mesmo porque eu adoro feedback. Adoro, ou seja, não é bom receber, mas encorajo, não é? Ou seja, é uma coisa que eu procuro a longo prazo e as pessoas não...
Salvador Martinha
É um ato de generosidade. É um ato de generosidade, exato. As pessoas não querem... Imagina, sabes o que eu acho que acontece? É tipo, as pessoas são um bocadinho... É quase como se tivessem o seu negócio e diziam assim não vou dizer aquilo se ele descobre que está a fazer isto mal. Estás a ver? É indiferente. Mas
José Maria Pimentel
as pessoas davam mal muitas vezes. Ou seja, eu acho que isso é porque... Enfim, eu sempre falo o que falo. No outro dia fui cortar o cabelo e tipo estava a cortar o cabelo e eu estava no... Pronto, é aquela coisa. Estás naquela cadeira, ele está ali por trás com a tesoura e o espelho estava muito longe. E eu pensei, isto está muito longe. Quer dizer, uma pessoa já cortou o cabelo dezenas de vezes ou centenas de vezes a longe ou seja não estava bem e disse que o meu nome é verdade é muito longe veja lá quer dizer se ninguém tiver dito isto mais nem vier a dizer não vale a pena e eu não estou longe
Salvador Martinha
mas mudou depois ou não já lá
José Maria Pimentel
foste não voltei mas ficou-se um bocado mais carrancudo e depois é porque eu tive a perder tempo não voltaste como após dois não não vou ter porque não cresceu foi a foi a semana não
Salvador Martinha
é muito curioso não sabemos não resultou mas no momento não gostou no momento claramente não gostou Mas vou dizer uma coisa em relação ao humor. As minhas relações na comédia, os meus amigos da comédia, muitas delas, para além das experiências mesmo que tivemos em espetáculos juntos, Eu fui fortalecendo as minhas relações por feedback mútuo. É isso que aproxima. É verdade. É verdade entre dois colegas, é bom.
José Maria Pimentel
Se não há verdade, há um afastamento. E aí estás mais livre para dar feedback porque a outra pessoa também vai dar a ti. Portanto, não estás...
Salvador Martinha
Claro. Às vezes é difícil porque imagina, não gostas e é chato estar a dizer. Tenho que se gerir mas eu acho que é importante. Se tens um amigo da comédia e há um silêncio, é estranho, não é? Não estás a ser bem amigo. Nem para dizer que é bom, olha, grande a série, grande a projeto, grande a stand-up. Ou se está alguma coisa que não estás a gostar não estás a iluminar um bocadinho porque tu podes uma crítica, estás a iluminar um bocadinho, não é? Estás a dar uma pista, só estás um bocadinho no escuro e diz assim Se é, podias melhorar isto no teu podcast, ficava muito melhor Claro,
José Maria Pimentel
é uma grande ajuda E a questão é, a crítica, faço as críticas assim e gosto de as encorajar nessa perspectiva e a crítica pode não estar certa Se eu te fizer uma crítica, se eu olho para o espetáculo teu, não achei muita graça aquela parte. A minha ideia ao dizer isto não é que aquilo não tem graça, é dizer, olha, pega neste data point, nesta observação e agora pensa, um, isto ressoa com a tua experiência ou não? Faz sentido ou não? E depois se mais alguém disser tu pensas ok agora tenho duas pessoas no mesmo sentido mas não é eu não estou a dizer aliás que faz sentido entender a crítica assim eu não estou a dizer que essa é a verdade, estou a dizer que tem essa impressão claro claro e vale o que vale pode não ser verdade sim
Salvador Martinha
sim às vezes as pessoas imagina eu também não faço imagina vou a um restaurante de um chefe e eu por humildade e porque não percebo nada de cozinha, nunca digo nada. Portanto, imagina, não gostei de qualquer coisa, de uma maneira assim. Falta nada. Porque eu não tenho conhecimento. Tanto que também às vezes é uma questão de humildade. Também
José Maria Pimentel
há aquilo clássico, não sei se já vos aconteceu, que estás à mesa, vem a comida, as pessoas dizem Ah, acho que não está nada bom, não sei o quê. Depois vem um empregado, Então, está tudo bem? Está tudo ótimo.
Salvador Martinha
Claro, não queres magoar. Eu acho que a crítica é muito associada a magoar. E magoa! Magoa, mas pode envelhecer bem. Essa mágoa pode ser convertida em uma evolução. E tu
José Maria Pimentel
e eu, pessoas que trabalham e têm um lado criativo, Eu acho que para crescer tem que desenvolver essa abertura à crítica. É desagradável no início... Acabamos de fazer uma t-shirt,
Salvador Martinha
aquelas frases tipo Crítica mágoa é transformada em evolução. Aquelas frases. Em inglês fica melhor.
José Maria Pimentel
Sim, sim, sim. Está um bocadinho longa. Temos que... Temos que cortar. Temos que editar. Sim, certo. E às vezes há críticas erradas. Por exemplo, eu dizia, fizemos já críticas difíceis e pessoas, ou caso às vezes, tipo alguém que põe um comentário, mas no início custa e depois não. E depois há outras críticas que não fazem sentido nenhum. Sim, tens que
Salvador Martinha
filtrar. Podes não respeitar a crítica. Claro, uma crítica muito comum. E
José Maria Pimentel
essa era uma coisa engraçada porque eu demorei tempo a perceber porque aquela não era válida. Não era válida, ela é válida até certo ponto, mas no final do dia não é válida. Era uma crítica que vinha de pessoas conhecidas, quando eu lhe disse que gostei imenso, mas é muito longo. Durante muito tempo eu vivi com aquela, muito longo, faço coisas muito longas. Só que, ao mesmo tempo, eu percebi que a duração natural do podcast era em torno de hora e meia. Porque por uma coisa nós falávamos em off, que é no início a pessoa ainda está ali artificial, estás a criar rapor com outra pessoa, aquilo a partir da meia hora começa a crescer e normalmente depende nesta, numa conversa como esta. Não por acaso já passamos hora e meia porque normalmente é mais longo, mas normalmente está ali entre a hora e um quarto, hora e meia, hora e um quarenta e cinco. E portanto, se eu cortasse atrás disso, o episódio ficava deficiente. Eu percebi mais tarde que o que acontecia era... Ah, percebi mais tarde porque fui recebendo feedback entre outros ouvintes a dizer que queriam episódios mais longos. Ou seja, as pessoas que gostarem de ouvir este episódio vão ficar com pena aquele termínio. E percebi que aquelas pessoas que me tinham dado feedback de que os episódios eram demasiado longos eram pessoas que normalmente não ouviam podcasts. Estavam a ouvir porque era meu. Claro,
Salvador Martinha
mas essa crítica, por exemplo, é estúpida, vamos considerá-la. Não é, mas eu encorajo, estás a perceber? Eu é que decidi que ela não era válida. Mas é claramente uma pessoa inesperiente, quem disse não tem cultura de podcasts toda a gente sabe que os podcasts de conversa são bons, é longos, por o contrário eu por exemplo tenho uma série que é o somenino para ir, amigos meus que eu respeito a opinião disseram muito longo, faz cortes, errado, era mais longo às vezes as pessoas não gostam querem dizer e se calhar a pessoa que disse do longo queria dizer outra coisa
José Maria Pimentel
e não
Salvador Martinha
se escolher também uma carta de crítica tem que tirar a carta para criticar Por isso é que depende muito de quem vem, de como estruturou a crítica.
Salvador Martinha
Se calhar o longo era um eufemismo. Não vale nada. O teu podcast está muito bem com o tempo que está. Podia ter mais tempo. Claro, claro. Eu por acaso fiz uma versão... Esta é a tendência
José Maria Pimentel
dos podcasts. Eu fiz uma versão que agora, por acaso, reativei, que chamei-me a Coritiz e Graus Express, que é um clipe entendível, ou seja, é uma coisa que faz sentido sozinho, mas é um clipe de uma conversa mais longa, que é pensar em pessoas que não... Lá está. Porque eu acho que existe esse público, por isso é que eu dizia. A crítica não é absurda, eu acho é que, na ponderação das duas coisas, prefiro fazer os episódios longos. Mas cortando uma parte ali de 15 minutos, autocontida, que possa interessar a pessoas que não têm mais tempo, é uma maneira de um bocado quadrar esse círculo. E isso é interessante, mas no limite, claro que sim, esta conversa, a conversa que nós estamos a ter tornou-se claramente mais interessante com o
Salvador Martinha
passar do tempo. Mais interessante, quer dizer, mais... Claro, claro, passa-se a frutar mais. Passa-se a frutar mais. Não sei o quê, ali tivemos um bocado perdidos, aqui recuperámos os... E no
José Maria Pimentel
início estás um bocado ali a... No início estás a tentar... Alinhar. Quase como se fosse uma dança. Estamos a
Salvador Martinha
fazer metas. É um tango isto.
José Maria Pimentel
E no início estás ali, pisas o pé, sem querer, fazes uns movimentos em falso. É uma coisa engraçada. Olha, antes de terminarmos, só houve uma coisa que eu não te perguntei, pensámos há bocadinho, que é outra peculiaridade dos humoristas, eu acho que já te ouvi dizer isto, é que criam uma ligação, eu acho, particularmente íntima com o público. Eu acho que já te ouvi dizer, por exemplo, que... E é verdade, quer dizer, e também é a sensação que eu tenho, que as pessoas, imagina, tu se vais num espectáculo, que as pessoas vão ter contigo no final e têm uma vontade que não teriam se fosse um escritor, por exemplo. É como se te conhecessem, não é? E esse é um lado engraçado também.
Salvador Martinha
É, porque eu acho que os humoristas iniciam um diálogo com o público que é diferente, por exemplo, de um músico. Um músico que escreve as canções, aí vai ele, tal. Agora hoje em dia é diferente. Porque os músicos já vão a podcasts, já dizem coisas, já têm as suas opiniões. Agora, uma pessoa que acompanha o meu podcast, por exemplo, o Ar Livre, conhece-me com muitas dimensões. Por exemplo, o público da rádio ou o público deste programa que eu estou a fazer de São Benito no país não consegue chegar lá. Mas no geral os humoristas falam direto com as pessoas. Já viram isto e aquilo? Não,
Salvador Martinha
não sei o quê. Tu estás a
Salvador Martinha
falar, tu estás sempre a agarrar o
José Maria Pimentel
espectador. E eu acho que dá uma ilusão de não ter pose. Até podem tê-la, pode ser uma representação, mas a sensação ao ouvir é o linguajar que tu... Imagina, no teu caso, mas no caso da maioria dos humoristas, a linguagem que tu usas é muito mais coloquial, é íntima, é a linguagem que tu usarias a falar com os teus amigos. É íntimo, tratas por tu a pessoa, não é? Sim, sim, sim. E depois é engraçado porque, por exemplo, no meu caso, eu acho que tenho até uma postura muito relaxada para este tipo de programa. Mas eu noto quando vou, sei lá, ver o livro e as pessoas chegam, as pessoas estão um pouco acanhadas. Não sabem muito bem. É engraçado notar isso porque eu também consigo colocar no lugar delas e também já me aconteceu o mesmo daquele lado. Ok, eu conheço esta pessoa, mas não sei bem como é
Salvador Martinha
que vai ser ao vivo. Uma coisa muito gira, que às vezes são aquelas coisas que não sei se as pessoas têm noção disto. Imagina que é giro de ser humorista e para quem está, por exemplo, às vezes há amigos meus um bocadinho mais sensíveis à minha mulher, tipo, acham isto muito acredito da parte das pessoas. As pessoas riem-se. Se tu meteres uma câmara em cima de mim, eu ando pela rua e as pessoas riem-se para mim. Tipo, há uns que dizem coisas, mas sorriem. Isto é muito gratificante. Passam por mim pessoas, fazem-se ao cima. Riem-se, Isso é muito bom. Só de passar as pessoas tão-se a rir, riem-se. Ou seja, eu represento para aquela pessoa alegria. Isso
José Maria Pimentel
acontece muito?
Salvador Martinha
Muito acontece muito. Era giro, por exemplo, vamos meter uma GoPro na cabeça do Ricardo Lusperreira, do Bruno Nogueira, da Joana Marques. É lindo. É só, abres latas. Ser uma ideia gira para um programa. Abres riso só. Riso. E isso eu fico contente. Às vezes estou na minha vida, estou meio chateado, não sei o quê, e vem uma pessoa simpática e faz só. Vê-se e rize. Está a saber? E isso faz-me sentir bem. Não dizem nada. Passa por ti a rir, isso é engraçado. Não, porque às vezes não é o riso de cumprimentar, é o riso só de reconheceu e riu-se para ela. Tipo assim. E não é intencional, não é? Não é intencional, não estás a rir para mim.
José Maria Pimentel
Há outras pessoas que se riem para mim, há outras que se riem só para ele. É um resquício daquilo que nós falávamos no início. Daquela reação inadvertida que o humor
Salvador Martinha
cria, não é? Boa, temos um feixe. Incrível, não é? É! Ele ficou contigo. Deus, como é que se faz isto? Eu o chamo de callback. Sabe aquela comédia Que é uma coisa que já chateia. No espetáculo de stand-up também é sempre com callback. Porque dá a sensação, como este podcast deu, que fecha. E as pessoas ficam... Ah, isto fechou. Uma certa harmonia, não é? As pessoas sempre têm
José Maria Pimentel
um quentinho a sentir. Vamos fechar a propósito. Fechamos com a tua recomendação.
Salvador Martinha
Vou recomendar o espetáculo Inside do Bob Burnham, já viste? Não pronto, recomendo a toda a gente Luís Figueiredo já viu é dos meus humoristas preferidos E tem graça este conceito, estávamos aqui a desenvolver os dois. É um tipo de humorista que eu considero um artista. Eu acho que a palavra humorista... Eu, por exemplo, só para terminar, eu não me identifico... Imagina, quando eu comecei, nos Recibes Verdes, assinava humorista. Porque dá para ser artista de TV ou humorista. Mas eu sentia, eu sou uma farsa, não é? Quem é que diz que eu sou humorista? Ainda não sou, ainda ninguém me
José Maria Pimentel
conhece. Não tem ali nada... Então, então, punha humorista.
Salvador Martinha
E punha humorista. Mas aí, na chave, eu é que me estou a dizer que sou. Depois passei para a fase tipo, não, já sinto que sou. Depois passei para a fase de escrever e as pessoas sabem que eu sou. E agora estou numa fase em que eu não me identifico com esta assinatura eu não me identifico, sabes as pessoas que não se sentem bem no seu corpo e no seu género eu não me sinto bem, não é não me sinto bem, me sinto bem a ser humorista mas não esta palavra não me define, eu não acho que seja isto, não acho que sou salvador humorista E quando olho para o Bo Burnham, eu não o considero humorista. Para mim é um artista. Portanto, eu recomendo este espetáculo deste artista, que é o Bo Burnham. E que foi durante a pandemia, ele fez um espetáculo, produziu e realizou todo o espetáculo em casa. Portanto, ele realizou, ele depois já realizou séries, já assistiu como ator, compôs, fez tudo. E é um exemplo de um humor que é um humor leve, mas que ele tem uma sensibilidade e ele tem uma densidade enquanto humorista a entregar, que te emociona. Portanto, ele... Não é tipo, este gajo faz pensar, não é essa... Ele emociona-te! E não consegues explicar porquê. Porque se eu te mostrar o guião dele aqui, tu não irias perceber que ele te emocionava. Tem a ver com a performance dele em entrega e a própria densidade dele, o carisma dele, que te emociona como ele entrega. Como emocionava o Robin Williams. Exato, sim. Pessoas que têm ali uma tristeza...
José Maria Pimentel
Lá está o neuroticismo que falámos há bocadinho. O Robin Williams é um caso... Mas eu acho que no caso dele era visível, não é? Ou seja, havia
Salvador Martinha
ali uma... Entre o triste e o... Imagina, o Bob Burnham é como o Robin Williams. Está contente e está triste. Sim. E é muito a giro de o veres isso. E eles dominam isso. É muito a giro o público ver isso. Não é? Este gajo é só contente, muito linear. Este gajo é triste. Não. Como eles brincam com isso. Porque as pessoas identificam-se. As pessoas são tristes e são alegres. Exato, claro, claro. Portanto, estamos fardos de coisas lineares.
José Maria Pimentel
E lá está aí. A comédia tem várias dimensões, não é? Que ressoam com várias dimensões da pessoa. Para falar no Robin Williams, o tópico clássico que sempre que se fala de comédia é na maneira que parece um bocadinho paradoxal com aquilo que tu dizias há bocadinho do estatuto do comediante ter subido, mas apesar disso, no que toca ao cinema e às séries a comédia continua em segundo plano face ao drama, não é? Isto é um problema clássico, não é? Fala-se disto desde sempre, não é? Se for olhar para os Oscars, não tens praticamente os Oscars a
Salvador Martinha
dizer. Por isso é que os humoristas gostam de arriscar e fazer coisas ali no... Tipo o Afterlife de Ricky Gervais, não é?
José Maria Pimentel
Mas é sem achar a puxar para o drama, precisamente. É isso. É... Mas porquê é que a comédia não chega lá? Porquê é que não tem esse reconhecimento? Porque eu acho que às vezes
Salvador Martinha
parece que ser alegre é fácil, parece que fazer rir é... Parece que há...
José Maria Pimentel
A tristeza é mais profunda do que a
Salvador Martinha
alegria, sim. Sim, é tipo... Vem-te com aquela camada. Repara uma coisa, já reparaste que todos os cartazes de artistas do mundo são sérias? Qualquer espetáculo de uma banda, não se riem. O riso não é considerado profundo nem sexy. Eu fui fazer uma produção para a GQ, uma revista. Eles não queriam que eu risse muito. Ou seja, sério é que é. Sério, denso. Os modelos não se riem, não é? Tipo, não vejo... Ah, estás a rir, isto não é profundo, isto não tem camadas, isto não vale. É como se não valesse. Como se fosse menor, estás a rir, não é?
José Maria Pimentel
Porque a seriedade cria-se essa dimensão do... Afonso, era o Afonso, não é? Sim, é muito fictício. Era o Afonso. Era o nome para protegê-lo. Exato, para protegê-lo. Vamos chamar-lhe Afonso. Sim. A seriedade tem esse mistério, não é? A seriedade eleva-te, não é? Torna-te mais distante. E o riso aproxima-te, não é? Por isso é que nós também usamos o riso precisamente para nos aproximar, não é? Que é uma coisa que vem dos animais, isto é antiquíssimo. Porque eu acho que a fragilidade aproxima-nos. Se tu tiveres com um amigo que
Salvador Martinha
se dá um bocadinho à morte, sabes aqueles amigos que está sempre tudo bem? Correu tudo bem, deu bem, o trabalho é muito bom, ganha um grande ordemada, a mulher dele é muito fixe e não sei o quê. Isto, há um afastamento disto. Quando tens um amigo que é frágil, também não é o amigo que está sempre down, mas o amigo frágil, aproxima-te porque nós somos iguais. Nós temos derrotas, nós temos vitórias. Se calhar como a comédia era muito linear, pode haver esse afastamento. Agora que a comédia está a ficar mais profunda, pode ser que qualquer dia exista um Oscar.
José Maria Pimentel
Eu acho que nas séries isso já é mais... Também está separado por categorias, não é? No caso das séries estão separadas, tens o Emmy para
Salvador Martinha
comédia, que ajuda. Ah, sim, nas séries já limpa. Mas tu tens grandes séries de comédia. Mas realmente é verdade, porque é que um Oscar
José Maria Pimentel
não... Porque é que não vai um Oscar para comédia, não é? É a pergunta de sempre. Pode ter que ver com aquilo que eu falava há pouco. Mas é a minha opinião, acho que o humor resulta menos bem em cinema. Acho que o humor não dá-se muito bem com séries. Se calhar vou pensar nisso. É melhor vir para o cinema. Vou pensar nisso. Vou levar a tua recomendação para casa. Dessa mente. Que vamos, olha, grande conversa. Gostaste? Obrigado. Foi ótimo. Senão não tínhamos gravado quase duas horas.
Salvador Martinha
Boa. Também gostei muito. Muito obrigado e parabéns. Obrigado.
José Maria Pimentel
Este episódio foi editado por Hugo Oliveira. Contribua para a continuidade e crescimento deste projeto no site 45grauspodcast.com Selecione a opção Apoiar para ver como contribuir, diretamente ou através do Patreon, bem como os benefícios associados a cada modalidade.