#127 Fernando Soares e Ricardo Marvão - Academia «Próxima Geração»

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José Maria Pimentel
Olá, bem-vindos ao 45 Graus. O meu nome é José Maria Pimentel. E há o último episódio desta temporada, um episódio mais curto que o normal, para fazer uma transição suave para as férias. Minhas e espero também vossas. O tema do episódio é o projeto Próxima Geração, uma academia partidária que quer ensinar os jovens a fazer política. Os convidados são dois dos fundadores desta academia. Um deles provavelmente é-vos familiar porque já foi convidado o episódio 47 em que conversamos sobre empreendedorismo e inovação. O convidado é Ricardo Marvão, que tem uma carreira longa ligada a estas áreas, é por exemplo fundador da Beta-I, uma associação para o empreendedorismo e a inovação, e nos últimos anos tem estado cada vez mais ligado a projetos na área da educação e da formação de competências, como por exemplo a Singularity University, uma comunidade global ligada à tecnologia, criada em Silicon Valley em 2008 e que chegou a Portugal numa parceria entre a nova SBE e a Câmara de Cascais. Outro fundador desta academia próxima geração é Fernando Soares, que é economista, é atualmente gestor de investimentos na Alpac Capital, uma sociedade capital de risco, antes disso passou pelo ensino superior, tendo liderado a direção de desenvolvimento da Universidade Nova de Lisboa e co-liderado uma grande campanha de agregação de fundos que tornou possível a construção do novo campus da nova SBE. O convidado integra ainda o Grupo de Reflexão para o Futuro de Portugal, uma iniciativa da Presidência da República. Este projeto Próxima Geração está integrado na Apolitical Academy, uma academia política global, como o nome indica, a partidária e que está hoje presente já em vários países do mundo. A versão portuguesa, chamada então Próxima Geração, foi lançada este ano e a primeira edição, o primeiro curso, acabou precisamente no fim de semana passado. O objetivo desta iniciativa, Próxima Geração, é melhorar a qualidade da democracia e da sociedade civil em Portugal, focando sobretudo em capacitar os jovens, ou seja, aqueles que terão uma participação cívica e política que vai definir o futuro do país. Esta academia é como que um curso intensivo em que os jovens selecionados são expostos durante 12 semanas a aulas, debates e ainda projetos concretos que lhes permitem ganhar cultura política, competências e perceber o papel que querem ter no futuro do país enquanto cidadãos. Como o Ricardo explica logo no início da conversa, a ideia de implementar este projeto em Portugal surgiu depois de ver o documentário Knockdown the House, que é possível ver no Netflix e que nos mostra como alguns movimentos de base conseguiram trazer para a política pessoas que, até aí, não teriam a mínima hipótese, como é o caso da congressista que, entretanto, se tornou bastante conhecida, Alexandria Ocasio-Cortez. Vi, entretanto, o documentário e vale bem a pena. Quando pela primeira vez soube desta academia próxima geração, achei-a particularmente interessante por dois motivos. O primeiro é que permite resolver, ou pelo menos mitigar, simultaneamente algumas tendências conjunturais que são transversais às democracias, como a polarização ou o afastamento crescente dos cidadãos da política, mas também algumas lacunas históricas, estruturais, que são específicas da sociedade portuguesa, como por exemplo a falta de cultura de participação cívica e política. Como dizia o antigo presidente Ramalhianes, e cito, o 25 de abril trouxe a liberdade e a democracia, mas que é seu sequer é preciso também criar cidadãos. Aqui obviamente há alguma caricatura, mas todos nós reconhecemos e os estudos comprovam que falta ainda em Portugal uma participação cívica e política que possa tornar a democracia mais funcional. O segundo motivo por que achei este projeto tão interessante é que tem um aspecto distintivo de outras iniciativas do género que apesar de tudo tem havido nos últimos anos e que é resultado direto da experiência profissional dos fundadores, o Ricardo, o Fernando e outros. É que esta próxima geração foca-se não só em transmitir conhecimento e divulgar ideias, mas também em desenvolver nos participantes competências práticas, concretas, e a verdade é que essas competências, ou a falta delas, é muitas vezes a maior barreira que existe para se conseguindo implementar aquilo em que se acredita, seja na política ou numa participação cívica mais lata. O Ricardo e o Fernando dão assim um twist progressista à conhecida ideia do velho do Restelo de Camões do saber de experiência feita. Nesta academia, durante estas 12 semanas, os jovens passam a seguir por uma série de desafios práticos, seja fazer a engajação de fundos, criar decretos de lei e aprender a negociá-los, ou mesmo fazer campanhas porta a porta que lhes permitem desenvolver estas competências que são essenciais na cidadania e na política. Este episódio é assim uma boa maneira para terminar a temporada, porque oferece mais uma reflexão muito interessante em relação a uma série de temas que tenho desenvolvido, quer aqui no podcast, quer no livro, muito relevantes para as democracias atuais, como o populismo, a polarização ou o efeito que as redes sociais têm tido na política. Espero que hajam esta iniciativa tão interessante quanto eu. Como disse, a primeira edição acaba de terminar, em breve vai ser possível candidatarem-se à segunda, vejam o site e sigam o projeto nas redes sociais e divulguem-no entre quem tenha interesse e, se puderem acharem bem, apoiem-no também para que possa ganhar escala e continuar a capacitar jovens para serem agentes políticos do futuro. Antes de passarmos ao episódio, muito obrigado aos novos Mecenas do 45°, Hélder Miranda, Tomás Fragoso e ainda Miguel Ferreira e David Teixeira Alves. Como disse, voltamos em setembro com episódios e temas novos. Vão poder ouvir, por exemplo, a neurobióloga Luísa Lopes, do Instituto de Medicina Molecular, a falar sobre envelhecimento cognitivo e como contrariá-lo, Edalina Sanche, cientista política, a falar sobre política africana, Pedro Bernardo, editor a falar sobre livros e o mercado editorial e ainda Maria Manuel Mota, bióloga e diretora do Instituto de Medicina Molecular, a falar sobre a sua investigação e sobre os desafios de fazer ciência. Continuem desse lado, boas férias e deixo-vos então com Ricardo Marvão e Fernando Soares.
Fernando Soares e Ricardo Marvão
Fernando Soares, muito bem-vindo ao 45°. Ricardo Marvão, muito bem-vindo de volta ao 45°. Muito obrigado. Ótimo estar aqui de volta, numa configuração diferente até, mas...
José Maria Pimentel
Exato, mesmo espaço, mas ligeiramente
Fernando Soares e Ricardo Marvão
diferente. Mesmo espaço, configuração diferente.
Fernando Soares e Ricardo Marvão
Assim obrigam as filhas. Muito bem, muito obrigado e muito gosto, sou um ouvinte assíduo deste podcast e muitos parabéns por todos estes anos. Antigo. Antigo, desde
José Maria Pimentel
muito cedo. Muito parabéns e é um prazer estar aqui. Obrigado. Olha, nós vamos falar da vossa academia Próxima Geração. Bem, eu já sei, mas para quem nos está a
Fernando Soares e Ricardo Marvão
ouvir, expliquem lá o que é e de onde é que vos veio esta ideia. Ok, então a ideia começa em 2019. Surgiu um documentário no início de 2019, acho que foi em janeiro, chamado Knock Down the House. E basicamente aquilo era um grupo de jovens que pertencia à campanha do Bernie Sanders e que depois quando o Bernie Sanders acaba por sair da campanha presidencial acabam por decidir montar uma espécie de um think tank ou de uma associação. A associação chamava-se Brand New Congress e gostava de trazer jovens, tipo uma alofada de ar fresco ao Congresso dos Estados Unidos, mas com um movimento muito grassroots, em que conseguiam trazer pessoas que ou eram recomendadas por seus familiares, amigos, ou então pessoas que se candidatavam diretamente e que queriam participar ativamente na política, mas que não percebiam como é que tudo funcionava, como é que eram os mecanismos, como é que se faz o fundraising, como é que se faz uma comunicação, uma visão estratégica de uma campanha. E basicamente essa associação o que fazia é exatamente isso e eu pensei isto era uma excelente ideia para montar uma coisa destas em Portugal será que seria possível? E começa assim a aventura.
Fernando Soares e Ricardo Marvão
Esta ideia foi algo que foi sendo também construída e logo imediatamente ao Ricardo ter a ideia fomos validar um pouco com as diferentes forças políticas, as forças vivas um pouco da sociedade e ficou muito claro que havia um espaço natural no país para aproximar, no fundo, dois mundos que estão relativamente afastados. Por um lado, talvez a geração mais qualificada de sempre do país, nós conseguimos sistematizar e democratizar o acesso à educação, essa geração está muito preparada, entra no mundo corporativo, empenha-se no mundo social, mas está totalmente afastada do sistema político, digamos assim, do sistema tradicional que nós temos. E é desse afastamento entre estes dois mundos que nós acreditamos que existia a oportunidade no caso concreto português.
José Maria Pimentel
Pois, é exatamente isso que eu vos ia perguntar, porque esta iniciativa nos Estados Unidos acontece numa realidade concreta americana, não é? E há um lado disto que tem a ver com o potencial que vocês identificam naquela iniciativa e que é transversal ou que é transportável para várias realidades e depois há o diagnóstico sobre onde é que ela faz a diferença especificamente de acordo com uma realidade. E vocês, no caso português, quais são as lacunas que vocês identificam? São essas que tu falavas agora, mas têm também que ver com uma cultura política que já vem detrás? Por outro lado, tem a ver com desafios mais conjunturais, como por exemplo o papel das redes sociais e o aumento da polarização, por exemplo? Há alguns estudos recentes, temos sorte, o país das duas fundações, que era
Fernando Soares e Ricardo Marvão
a Fundação Francisco Manuel dos Santos e que era a Fundação Globo Banking, estudaram há muito pouco tempo a realidade dos jovens e nomeadamente a realidade da participação política dos jovens. E torna-se muito claro que os jovens Até participam, surpreendentemente temos números bons sobre a participação, mas a forma de participação é sobretudo através das redes sociais, através das petições. Participam votando, pelo menos declaram votar, perto de metade dos jovens que são inquiridos, por exemplo, no estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos, isto é revelado por estes estudos e de facto mostra uma mobilização. A questão é que continuamos a ver baixos números na participação nas candidaturas às juntas de freguesia, nas listas pós-governos, nas eleições europeias, no conjunto de eleições e mais do que o próprio sistema político, digamos sistema partidário, também no mundo das associações e da sociedade civil. E, portanto, é aí que nós acreditamos que existe uma necessidade de contribuir para desafiar esta geração a uma participação que não se fica apenas no ativismo digital. Sim. Há um aspecto que eu acho especialmente interessante na vossa ideia, eu disse-vos
José Maria Pimentel
isto logo quando falámos a primeira vez, porque corresponde a uma mágoa que eu tenho ao fazer o podcast, a autoescrito livre, enfim, a intervenção que eu tenho aqui, que é o facto de eu em certo sentido estar a falar para convertidos. Isto não é bem verdade, mas há uma espécie de círculos concêntricos, não é? Eu posso, que chego até certo ponto, não é? Consigo expandir um pouco a rede, mas há pessoas que eu sei que estão completamente fora porque simplesmente não se interessam por este tipo de programas e, portanto, precisavam, no fundo, há ali um gap, há ali uma lacuna que precisa de ser preenchida. E esta vossa iniciativa é muito interessante nesse aspecto, porque vocês vão pegar nas pessoas, e vocês, por cima, tentam que os alunos, digamos assim, os participantes, nesta iniciativa sejam o mais diversificados possível, vocês vão pegar neles e incutir essa cultura política. E isso é importante porque iniciativas do género da minha, não é, acabamos sempre muito endogâmicas, não é? Tu estás a falar para dentro, para as pessoas que já partilham do, pelo menos
Fernando Soares e Ricardo Marvão
de parte das tuas, dos teus pressupostos e de uma certa vontade de participar. Sim, nós não sabíamos ao início o que é que íamos receber. Falámos com imensa gente, tivemos um ano a preparar isto, só para teres ideia, toda a gente trabalha, somos nove founders e o que nós fazíamos era, fazíamos uma reunião à terça-feira às 8 da manhã, das 8 às 9, todas as semanas durante um ano e foi assim que se construiu o programa, a estrutura, Depois tínhamos um núcleo um bocadinho mais pequeno que trabalhava muito todas as semanas os vários detalhes, mas nós não sabíamos o que é que ia acontecer. Acreditávamos imenso no projeto. Todas as pessoas com quem a gente falava diziam-nos que isto é extraordinário. Tivemos até algumas pessoas na política que até diziam eu só tive pena de não ter tido essa ideia. E portanto, assim que lançámos, nós tivemos cerca de 600 candidaturas no início e sentimos que recebemos pessoas, só para teres ideia, nós temos pessoas dos 16 aos 30 anos, de todo o país, inclusive a Ilhas, e nós queríamos ter o mais diverso possível e, portanto, diferentes meios sociais, económicos, diferentes regiões, grandes centros urbanos e pequenas vilas e foi isso também que fizemos também na seleção dos candidatos. Claro, queríamos os melhores candidatos, mas também queríamos uma boa seleção de candidatos. E realmente este programa tem trazido isso. Eu acho que, claro que ainda temos de trabalhar, acho que podemos aumentar a diversidade. Numa segunda edição acho que vamos trabalhar muito mais. Nós também não tivemos a oportunidade para ir a todos os grupos que nos pudessem ajudar a encontrar essa diversidade total, mas estamos a trabalhar nisso, falamos com imensa gente e acho que a segunda edição vai ser muito melhor. E a diversidade, como é que vocês tentam promover essa diversidade?
José Maria Pimentel
Porque, por exemplo, uma das ideias que vocês têm é que existe uma diversidade ideológica, digamos assim. Sendo que o objectivo do projeto, e isso é um ponto que importa esclarecer, não é...
Fernando Soares e Ricardo Marvão
Sim, é partidário. A próxima geração é uma associação partidária e, portanto, não temos partidos que estão liados ou... Não
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era isso que eu ia dizer, mas esse ponto é importante. O que eu ia dizer é que a vossa... A maneira como vocês encaram a política, o que faz sentido, é num sentido mais lato, não simplesmente da participação política partidária, mas de uma participação cívica. Ou seja, vocês querem que estes jovens sejam cidadãos interventivos, independentemente de eles estarem a intervir num partido ou estarem a intervir numa associação local. Certo, é isso mesmo. Ou numa coisa qualquer desse tipo, não é? Portanto, não é estritamente da política partidária, mas ainda assim vocês tentam ter, ou é o vosso objetivo, ter essa diversidade ideológica. E isso criou-me logo uma dúvida de como é que vocês fazem isso, não é? Porque têm que perguntar, vocês perguntam às pessoas, perguntam aos miúdos o
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que é que eles acham. Temos que perguntar e temos que saber. E algumas pessoas dizem logo, não sei, ainda não decidi. Outros dizem que, não, vejo-me mais como esquerda ou vejo-me mais como direita ou mais centro ou o que for, ou liberal ou outra coisa. Mas sim, temos que ter isso em conta e o que queremos na academia e nas edições é realmente ter essa diversidade porque se nós não tivermos o confronto de ideias e que depois eles percebam que têm que encontrar um consenso para chegar a ter nada a coisa, a ter nada objetivo, esse é um dos exercícios a fazer e eles perceberem também do outro lado. Por isso é que também fazemos debates em que temos pontos de vista que se calhar tu discordas completamente, mas tens que o defender para
José Maria Pimentel
perceber o outro ponto de vista. Vocês acham que nos falta essa cultura em Portugal? Sim,
Fernando Soares e Ricardo Marvão
isto Não é só o caso português, isto é global. Esta academia é criada também no contexto da Political Academy Internacional e este movimento está a surgir num conjunto de vários países. Neste caso, a Political Academy começou na Suécia, está presente na África do Sul, está a desenvolver-se para mais de 10 países neste momento. Há um caso de sucesso de um movimento muito semelhante a este que é o Renova Brasil, com milhares de participantes formados nesta ideia da participação cívica, de jovens desafiados a ser mais ativos civicamente e, portanto, esse contexto existe na realidade global. Naturalmente, diferentes países, digamos assim, a única premissa que é restrição, e tu falavas no fundo de um contexto político lá, a única restrição que nós temos é um, digamos, um pró-democracia, portanto estamos a falar maioritariamente nos países mais ocidentais, de uma cultura mais ocidental, e a segunda restrição é a exclusão de movimentos totalmente extremistas, ou seja, nós apelamos a um... Exatamente à diversidade que tu falavas, mas a uma diversidade que leva a uma governabilidade, a uma solução de compromisso, a uma solução executiva. E, portanto, para tornar isto possível, respondendo também objetivamente aqui à tua questão, o que nós fazemos é falarmos com forças vivas da sociedade. Vamos falar com movimentos associativos de estudantes, falamos com as escolas, naturalmente professores identificam, quer dizer, nós estamos a falar de candidatos entre os 16 e os 30 anos que nós procuramos. É muito fácil a um professor perceber onde é que nasce alguém que tem um potencial para mobilizar uma turma, que é interessado na sociedade e que pode canalizar esse esforço não só para as associações de ambiente, para as associações monocausa, também esses estudos que falámos há pouco revelam que os nossos jovens participam maioritariamente monocausa. O que nós temos feito é, vamos a essas associações onde já existem também jovens a participar de alguma forma nessas causas e desafiamos-os a candidatarem-se, mas a pensarem de forma mais sistémica, a pensarem o sistema político como um todo. Não ficarem só nessa causa, porque um programa governativo é um conjunto de causas, é um conjunto de áreas e não chega ir só por um tema. Por outro lado, vamos tentando encontrar veículos através das redes sociais que são também, por muito que sejam desafiantes, são também um bom veículo para chegar a pessoas que estão ativas e tentamos tirá-los do sofá, tentamos tirá-los de trás do computador e agora vamos participar e vamos debater, conforme o Ricardo dizia, vamos pô-los a debater uns com os outros, porque é muito fácil dar um tiro ideológico numa rede social, mas é muito mais difícil fazer o cara-a-cara com alguém que defende uma ideia completamente diferente da nossa. E se tiver como objetivo chegar a uma solução de consenso para permitir a governabilidade, é isso que é a democracia, torna muito mais difícil o debate cara a cara e nós temos de treinar isso. As nossas escolas não treinam este tipo de skills, não desenvolvem este tipo de skills e, portanto, nós procuramos fazer esse approach a diferentes movimentos cívicos, tentamos aproximar-nos das escolas e das fontes de pessoas que tenham um eu e que pensam os outros, independentemente de ser já numa filosofia puramente política. Eu não sei se percebe bem, você pergunta aos professores se, por exemplo,
José Maria Pimentel
já identificaram alunos com esse potencial, é isso?
Fernando Soares e Ricardo Marvão
Sim, desafiamos as escolas, desafiamos as associações, falamos com diferentes, digamos assim, dinâmicas na sociedade. No fundo, encontramos polos onde já existam pessoas que estão sinalizadas como interessadas e obviamente depois há aqueles que são tão interessados que vêm e que se candidatam
José Maria Pimentel
por eles próprios. Mas
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temos situações em que, por exemplo, uma aluna, no fundo, de uma escola que está numa situação de desafios sociais, em que o próprio diretor da escola ofereceu o gabinete para essa aluna fazer as entrevistas connosco e mobilizou fortemente para que ela se candidatasse, porque, precisamente, ela não tem no seio familiar as condições para poder fazer uma candidatura sozinha por ela, mas tenha todo o potencial e está a correr muito bem o desenvolvimento dela através da nossa academia.
José Maria Pimentel
Lembra-me de outra pergunta que eu vos queria fazer, que é, em certo sentido, um dos grandes méritos desta iniciativa é incutir cultura política neste sentido mais lato em pessoas que não tenham acesso a ela no seio familiar. Porque aquelas que já têm acesso não é que não possam beneficiar, porque este lado do debate e da cultura de compromisso é um lado importante que eu acho que dificilmente existe mesmo em muitas pessoas que vivem nessa situação ou crescem nessa situação. Mas a verdade é que se tu viveres numa família, quer dizer, culturalmente privilegiada, provavelmente tens acesso a essa cultura. Portanto, onde faz mais a diferença é em miúdos que não venham desse background. Por outro lado, isso cria-vos a dificuldade de chegar a eles, porque se calhar eles também não têm acesso a esta informação. Sim,
Fernando Soares e Ricardo Marvão
torna-se muito claro que no nosso país a política é muito hermética. Todos nós sabemos quem é que entra na política hoje em dia em Portugal. Entram tipicamente pessoas que estão na família de alguém que já fez política, Tipicamente passa de pais para filhos, passa de amigos para amigos, passa de circuitos próximos. Em grande medida a política faz também de pessoas que estudaram nas grandes universidades e nas universidades de elite e passa por um conjunto de cursos, o direito, a economia, a ciência política. Nós queremos quebrar esta barreira E esta barreira é quebrada não só desafiando, digamos assim, a nova geração a participar, mas desafiando também o sistema político a ser mais aberto. Os partidos, as associações, os think tanks, ser mais aberto em termos de gerações que participam e que estão no ativo, a ser mais aberto em todos os temas de diversidade que nós falamos, em todas as representações dos diferentes núcleos da sociedade. Representação racial, representação de diferentes estratos sociais, representação das diferentes regiões do país E, portanto, nós desafiamos, tentamos desafiar um pouco os dois lados e não só os jovens na sua participação ativa. Quer dizer, o mundo ideal seria partidos a recrutarem tal como as empresas competitivas fazem processos de recrutamento para apanhar o melhor talento, porque não há um dos partidos políticos a ir em busca dos melhores talentos para os seus projetos, para as suas refeições, para as suas decretes de leis, para as suas equipas parlamentares. E, portanto, eu acho que Nós acreditamos que o desafio deve vir de ambos os lados e só assim nós podemos almejar, rejuvenescer o sistema político e democrático.
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Já agora aproveito para acrescentar aqui um ponto que é de muitas conversas que tivemos uma das coisas que sentimos foi e também da conversa que tivemos com a political o curso na political é muito focado em uma coisa de nove meses em que tens tipo 12 estudantes que fazem o curso e muitos nos diziam pá isso não mexe a agulha e o nosso objetivo e eu também venho do lado da inovação e das startups... Não
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mexe do quinto, Roberto, porque é muito dilatado no tempo. E é muito
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pequeno. É tipo, se eu injetar 12 estudantes ou 12 jovens na política, mesmo que seja no formato específico de partidos ou num formato mais lato, é pequenino. E, portanto, o que nós pensámos foi como é que a gente consegue acelerar o processo? E o nosso objetivo é mil jovens até às próximas eleições, daqui a quatro anos. E, portanto, isso é um objetivo ambicioso. Como é que tu consegues fazer isto se não for 12 em 12 a cada nove meses, tens que acelerar o processo. E portanto o que decidimos foi criar um programa que tem 12 semanas, que neste primeiro piloto tem só 25 alunos, mas o objetivo é fazer crescer esse número e provavelmente vamos ter que, passado um ano, vamos ter que repensar a forma como estamos a acelerar porque senão não chegamos aos mil. Mas temos essa ambição e acreditamos que é possível ela chegar. E portanto, se tu só consegues isso, se pensares de forma diferente também a forma como tu trazes os jovens para a política e depois, se tu tiveres essa quantidade de jovens a entrar na política, aí sim começas a ver mudanças. Certamente há alguns destes jovens que vão querer ser eleitos ou vão querer ir a votos. Há muitos que já nos disseram que querem criar alguma coisa, querem criar uma associação de apoio ao voto, querem criar uma associação de bairro para apoio aos idosos ou outra coisa qualquer. E portanto estes jovens, se forem bem escolhidos, e claro a escolha destes jovens é muito importante, não é? E essa seleção é muito importante e por isso é que nós passámos quase um mês a fazer a seleção dos jovens. Nós fizemos um processo, teve para aí cinco etapas até chegarmos à conclusão e até pô-los a trabalhar em conjunto para ver. Uma coisa é quando tu fazes uma entrevista one-on-one, Outra coisa é quando metes os jovens a colaborar num tema e tu assistes a eles, como é que eles trabalham. Será que este jovem está completamente a não deixar falar os outros? Será que este jovem pensa uma ideia e depois insiste, insiste, insiste e nem sequer ouve os outros? Sim, sim, sim, tipo um martelo, sim. Mas isso faz parte do
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processo de seleção, ou seja, isso que estás a descrever ainda é o processo de seleção. É o processo de seleção, sim. É uma coisa à séria. Sim, e vocês, grande
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parte do investimento está aí. Está aí e também está no ser prático, ser rápido a pensar que novas ideias é que podemos introduzir, ter o feedback em cada sessão que a gente tem com os jovens e eles dizem-nos, é pá, isto está super interessante, mas cá devia ser mais desafiador. Então introduzimos, por exemplo, agora este último fim de semana fizemos um exercício de gestão de crises. Às 5h30 da manhã toda a gente foi acordada, depois de termos estado até à 1 da manhã a trabalhar, às 5 e meia da manhã toda a gente é acordada e diz, senhor Presidente da Assembleia, houve agora um acidente de avião do Presidente da República em Cabo Verde, ainda não sabemos o que é que está a acontecer, tem aqui o brief, daqui a 30 minutos há uma conferência de imprensa com os jornalistas lá em baixo, esperemos possível lá em baixo. E toda a gente tem que se levantar e tivemos vários casos, tivemos decorrer um incêndio na Serra da Gardunha à ministra da Administração Interna e portanto ela tinha que descer e fazer a conferência de imprensa ou há um sismo no Algarve e há X mortos e neste momento precisamos de acalmar a população. Tudo isto com o exercício em que puxámos pelos jovens, depois temos estado a trabalhar até à uma da manhã, fazer com que eles percebam que isto é a realidade. Eu até tive uma conversa depois, estávamos na altura no fundão, tive uma conversa com o vice-presidente do fundão e ele a dizer-me, isto acontece mesmo? Quando foram os ensenhos da Gardinha eu tive quatro noites que não dormi e que foi preciso fazer conferências de imprensa e que eu não tinha duas horas de sono e eu nem conseguia pensar. Tu agora já descreveste parte da maneira como eles são selecionados
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e como funciona. Mas para quem nos está a ouvir, qual é o programa? Há um conjunto de jovens que são selecionados, vocês estão na edição piloto, portanto isso ainda pode, entretanto, levar alguns ajustamentos. E eles depois, uma vez entrando, o que é que o espera? Como é que é a experiência? No fundo temos um programa de educação
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informal, digamos assim, isto não pretende substituir os tradicionais cursos de ciência política, de economia, do direito, eles fazem todo o sentido. Nós queremos é trazer algo muito prático, um toolkit, um conjunto de ferramentas que eles podem usar no dia a dia. Nós temos três grandes blocos e após essa seleção muito rigorosa, que é parte do segredo do sucesso do programa, é de facto uma seleção rigorosa e com todos esses critérios de diversidade que falámos, nós arrancamos com uma parte de, digamos assim, de liderança e de conhecimento, em que os desafiamos a perceberem quais são os seus valores, quais são os valores da sociedade portuguesa, quais são, digamos, os papéis que cada um quer ter na sociedade. Depois entramos num segundo bloco muito prático, em que trabalhamos ferramentas, o como, digamos assim, as ferramentas de comunicação que fizemos. Agora nós vamos a dois terços do programa de piloto. Tivemos este fim de semana, inclusive, no fundão a treinar as competências, a comunicação, os diferentes tipos de comunicação, o media training, a capacidade escrita, tudo isso. E fechamos com um ciclo que é já muito aplicado de políticas públicas, virado para as políticas públicas, para a quantificação das mesmas e para que eles possam escolher e apresentar diferentes áreas de atuação onde se podem, no fundo, envolver. Aplicar, sim. Mas tudo isto com desafios muito práticos, como escrever um decreto de lei, como apresentar uma lista a uma junta de freguesia, como escrever um manifesto, este tipo de situações de simulação, mas também as cotativas junto à população. Eles passaram horas a ouvir população, foram todos forçados a ir às suas juntas de freguesia e falar com os executivos da junta, ou seja, aproximar de facto e forçá-los a sair da zona de conforto em situações muito práticas e num programa que está desenhado totalmente orientado já por missões, ou seja, cada uma das 12 semanas tem uma missão que eles são desafiados com exercícios práticos, sessões inspiracionais e com trabalhos, muitos deles, desenvolvidos no terreno.
José Maria Pimentel
Contribua para a continuidade e crescimento deste projeto no site 45graus.parafuso.net barra apoiar. Veja os benefícios associados a cada modalidade e como pode contribuir diretamente ou através do Patreon. Obrigado. Vocês agora estão a dois terços desta edição piloto, o que significa, como estava a dizer há bocadinho, que isso ainda é normal, que ainda vai ter ajustamentos, o que mostra que vocês vão aprendendo, não é? Porque uma coisa é a teoria, outra coisa é depois pôr em prática. Como é que tem sido a experiência até agora? Tanto do ponto de vista da organização, como do ponto de vista do contato com os jovens? Porque eu imagino que isso para vocês também seja uma experiência interessante de dar uma escoltação, se quisermos, das novas gerações, não é? Para saber o que é que vai na cabeça das pessoas, o que é que eles estão a pensar, o que é que os preocupa, o que é que os move, em que direção é que eles se inclinam nos vários assuntos políticos e na maneira de participação, como é que tem sido? Assim, eu posso
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dizer que como é que tem sido para mim, basicamente tem sido brutal, porque A forma, depois de tanto tempo a trabalhar nisto, depois de ver o resultado com os jovens e ter o feedback deles, a pessoa sente-se mesmo orgulhosa do trabalho que está a ser feito. O que eu também sinto é, os jovens estão, claro, quando começámos eles não se conheciam, agora há uma camaradagem enorme, estão sempre a falar, discutir temas, ouvem muito mais, percebem que podem discutir ali assuntos que se calhar em casa ou que os outros amigos não conseguem. Este fim de semana fizemos o... Perguntámos, como é que vocês explicam o que é que vocês estão a fazer? É fácil explicar? Perguntar aos pais ou perguntar aos amigos e eles dizem mas é uma academia de política, são muitas palavras, são jovens e depois mas como é que isso funciona? O que vocês fazem lá? O que acontece durante esse fim de semana? É tipo parece que é assim uma coisa um bocado...
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Exotérica, não é? As
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pessoas não conseguem explicar bem. E mesmo para os pais, mas tu gostas, mas estás feliz. E pronto, e isso é o suficiente para os pais, ok, então pronto, se ele está feliz e está a gostar, eu não preciso perceber exatamente o que é, mas está ok. E acho que é isso que tem sido para nós, pelo menos para mim, tem sido esse o feedback e tem sido ótimo ter cada vez mais o feedback. Acaba o fim de semana e eles... Há uma chorrada de mensagens não só de novo feedback, mas também de obrigado, criei aqui quase uma tribo que me percebe, que percebe o que é que eu estou a pensar, mesmo que venha de outra ideologia política e que me ouve e que eu consigo ter uma discussão com
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essa pessoa sobre imensos temas. Uma nota também é muito interessante ter o feedback dos participantes e eles têm interesses, no fundo, digamos, de muitas áreas políticas diferentes, portanto, eles vêm com backgrounds e já com alguns interesses. Nós estamos a falar sobretudo de jovens que ainda não estão nem nas juventudes, nem nos partidos. Alguns deles têm já uma experiência ou outra e também alguns têm experiência em associações. Mas, mais do que o feedback dos participantes tem sido também interessante ouvir o feedback dos oradores que nós temos tido, dos políticos que temos tido, dos agentes de inovação. Nós temos exposto desde já a presidentes de junta, a autarca, as presidentes de câmara, vice-presidentes, Deputados, vamos agora exposto também a membros do Governo e tem sido muito interessante porque é consistente entre todos os partidos que não existe este tipo de programas, sobretudo a partidários. Aliás é muito interessante este feedback que o Ricardo estava a dizer, muitos deles dizem aos pais e aos amigos que estão num programa de formação de políticos e as pessoas ficam com o ar preocupado. Mas, eles depois dizem, mas a partir de háreo. Ah, muito bem. Então, as pessoas no fundo, o que nós temos sentido, também sendo muito transparente, é que revela-se no feedback dos nossos participantes algum preconceito face aos políticos e isto tem servido e nós estamos muito satisfeitos com isso para desmistificar o papel dos políticos, que há bons políticos, que há pessoas a trabalharem para o dos outros, a fazer um trabalho que deve ser reconhecido, que deve ser, digamos, nós este fim de semana desafiámos-los a fazer uma love letter para um político que eles admirem. Ou seja, é necessário também trazer o lado bom daquilo que está a ser feito na política e assim como tem sido feito muito trabalho para reconhecer o trabalho dos professores, é preciso também reconhecer os políticos, não estamos aqui a dizer se são muitos ou poucos, mas que fazem também um bom trabalho em pó das populações e dos países e das organizações. E, portanto, nós temos desafiado a pensar em um pouco diferente toda esta sociedade e toda esta participação. O que tu queres realmente é também estes formatos
Fernando Soares e Ricardo Marvão
diferentes e portanto como formatos diferentes não só nós pensamos bastante mas também a rede da political também nos ajuda a pensar e esta love letter até veio da rede da political em que eles próprios também tiveram a ideia começaram a fazer viram que ele tinha tração e disseram vamos experimentar isto vamos experimentar nas várias academias é uma carta ou
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um e-mail ou o que for para um político dizendo eu admiro o seu trabalho, por x e y, é isso? É isso. É
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como se fosse uma carta aberta a
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um político que tu admiras. Então é até uma piada essa iniciativa. E vocês, em certo sentido, uma das razões que torna útil esta iniciativa é precisamente a baixa reputação que têm os políticos, digamos assim. Daí o facto disto ser apolítico seria importante, mas por outro lado, estamos a falar de
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político, é partidário.
José Maria Pimentel
Exatamente, é partidário e não ideológico, digamos assim. Diverso no que toca às ideologias, se quisermos. Mas isto tem o potencial de, precisamente, reabilitar o próprio papel do político e terminar com, terminar ou pelo menos mitigar aquilo que é. Exatamente. Que é um bocado a ideia que todos nós temos que existe uma espécie de selecção adversa na profissão de político. Quem vai lá parar não é quem... Claro que há muitas exceções, mas não são as pessoas com mais mérito ou com mais empenho, mas as pessoas que têm mais jeito e mais vontade de passar por aquele período das juventudes partidárias e do caciquismo e toda aquela vida interna dos partidos que nós estamos habituados. Sim, um exemplo disso claríssimo numa das primeiras sessões que nós tivemos. Nós
Fernando Soares e Ricardo Marvão
tivemos um participante nosso que disse claramente que depois da apresentação que o político lhe fez, que nós tínhamos convidado, tinha ficado com uma ideia totalmente diferente e não sabia se tinha uma má ideia dele pela cronista que lê, que está sempre a dizer mal dele, ou se era mesmo uma opinião que ele já tinha formado e mudou totalmente a ideia porque conheceu o trabalho e a pessoa. Isto faz também parte do papel da nossa academia, que acreditamos nós, é no fundo desmistificar exatamente o que tu dizias, o papel que muitos dos políticos estão a ter, mas por desconhecimento, por falta de cultura política, tal como referias no início, as pessoas tipicamente não acedem. E aqui estamos a falar de jovens que tipicamente já são minimamente informados, minimamente curiosos, minimamente desafiadores.
Fernando Soares e Ricardo Marvão
E tivemos o mesmo exemplo com um presidente de junta com quem falamos e que foi espetacular e eles ficaram tipo wow ser presidente de junta pode ser diferente, pode ter um impacto na vida das pessoas, não é tipo ah pá ser presidente de junta ou junta de faraguesia, tipo alguém conhece, alguém sabe, tu moras aqui já agora porque não sabes onde é que é a tua junta? Sei, sei. Já lá foste? Por acaso não. Se calhar também nunca foste à nenhuma assembleia da junta E aqui nós desafiámos... Escolheste-me expor dessa forma, p, o Ricardo.
José Maria Pimentel
Acho que convida-te para o podcast.
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Mas nós tivemos a mesma coisa com os jovens todos. E dissemos, ok, agora vocês vão e vão falar com a vossa junta. E vão tentar perceber o que é que eles fazem. E como é que eles podem ser úteis e como é que a junta ajuda o cidadão e por acaso este fim de semana até descobrimos coisas que eu nem sequer sabia, que a licença do cão e que os cemitérios e há várias coisas que são das juntas e que são só das juntas, pronto, e que eu não fazia ideia.
José Maria Pimentel
E à esse lado eu estava a falar da má reputação dos políticos, mas também há muitos políticos bons a que a pessoa não tem acesso, ou quando tem acesso é via televisão, ou via média em geral, o que acaba por criar uma barreira, não é? Esse tipo de iniciativas em que tu estás no mesmo espaço que a pessoa, e os podcasts por exemplo acabam por ter, não estás no mesmo espaço mas por ouvires a voz e por estares estendido e teres tempo, acaba às vezes por ter um efeito parecido ou eu noto que tem um efeito parecido, isso te promove uma certa empatia, de parte a parte, não é? Consegues perceber melhor o que é que vai na cabeça da outra pessoa e ela própria também perceber o... Enfim, as necessidades, digamos assim, dos eleitores. Tens toda a razão e os nossos cursos têm decorrido em abordagem, numa
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abordagem muito informal. Nós temos tido, de facto, políticos que têm exposto, além do trabalho que fazem naturalmente e de promover o trabalho que fazem, contam muito a história pessoal. Porque entraram na política? Como é que geram o equilíbrio e o trade-off, digamos assim, o custo de oportunidade de estarem na política versus não estarem numa carreira num mundo privado? Como é que as famílias se envolvem? Como é que geram a relação com a família estando na política e expondo-se? E, portanto, esse lado mais humano dos políticos, num registro informal, permite que todos, no fundo, acedam a uma forma de estar mais humana e mais... Quer dizer, são pessoas como todos nós. E temos conseguido, e ficamos muito contentes com isso, temos conseguido mostrar desse lado B dos políticos que cá está, que é filtrado na abordagem da comunicação social e nas barreiras que existem entre os políticos e os cidadãos. E portanto, isto também tem servido para isso. Por
Fernando Soares e Ricardo Marvão
acaso, uma das coisas que é muito interessante num podcast e que não funciona na televisão em geral é... O podcast é um long format, pelo menos a maior parte e este é um bom caso disso. Pode ser. E é isso um dos temas que nós temos puxado é como é que tu consegues fazer uma conversa com o presidente da câmara long format, ter duas horas de conversa com ele. É que toda a gente consegue em 20 minutos mais ou menos enganar o que quiser, não é? Ou mais ou menos falar o que quiser, mas com duas horas tu consegues ir mesmo a fundo nos temas e consegues ter uma abordagem completamente diferente
José Maria Pimentel
da conversa. E ver se a pessoa tem unhas para aquilo ou não. Certo.
Fernando Soares e Ricardo Marvão
E também conhecer mais em detalhe quem é que é esta pessoa que está aqui à minha frente. E depois passas a perceber muito melhor, ok, a vida da pessoa, a carreira, os desafios que teve, por aí fora. Portanto, é isso também que nós queremos. E nestes fins de semana, por isso é que eles estão três dias connosco não há uma coisa de estamos aqui duas horas e toca andar não, vocês vão passar três dias connosco e vão passar, gente, só para teres ideia nós acabamos tipicamente à meia-noite uma e no dia seguinte está toda a gente de pé, quer dizer, quando vão haver situações de crise, às 8 da manhã já está toda a gente na próxima sessão. Este
José Maria Pimentel
quem está a ouvir está cheio de vontade de ir para isso, para dormir mal. Assim
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esperamos e temos tido muita procura, muita gente que nos aborda, não só nos mais novos, na geração na qual nós focámos este programa, mas também na geração
José Maria Pimentel
dos 30, 40,
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50. Temos que ter muita gente a pedir para desenvolvermos um programa. Para pessoas que já têm 10, 15 anos de experiência na vida, digamos, não tão envolvidas na sociedade civil e gostariam de contribuir de alguma forma e, portanto, estamos a ter a considerar no futuro poder ter algo para uma geração diferente.
José Maria Pimentel
E há várias iniciativas que vocês têm no programa, que eu falo por mim, pelas quais eu nunca passei, não é? Andar a bater de porta a porta, atuar ao nível da Junta de Freguesia, quer dizer, há uma
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série de iniciativas que, ou por outra, dizendo de outra forma, todos nós beneficiaríamos de algumas dessas iniciativas. Sem dúvida. E mesmo também compreender os desafios, por exemplo, mesmo sendo político, um político no interior, num concelho com 5 ou 6 mil pessoas, ou um político numa autarquia com centenas de milhares de pessoas, são funções completamente diferentes. Eles têm aprendido que, se calhar, quando estivemos com o Presidente da Câmara de Campo Maior, ele disse-nos que a maior parte dos habitantes minimamente ativos do Conselho o conhece e o cumprimenta, ou se ele não passa em terminadas ruas ao fim de algumas semanas, todos lhe perguntam o que é que se passa com ele. Portanto, há um sentido de proximidade e de uma responsabilidade de prestação de contas totalmente direta, muito diferente, por exemplo, do que temos conversado com deputados e com governantes que estão um pouco mais distantes da população. E, portanto, mesmo essa perceção do que são as diferentes realidades da política e da proximidade aos cidadãos também ajudam a compreender e a desmistificar o que é a vida de alguém que, no fundo, está a trabalhar em prol da sociedade.
José Maria Pimentel
E há um aspecto particularmente interessante desta vossa iniciativa, porque vocês não estão apenas a tentar dinamizar a sociedade civil, digamos assim. Esta iniciativa é ela mesma proveniente da sociedade civil, porque vocês não são... Isto não é a vossa profissão, vocês têm... Vocês os dois e os restantes criadores deste projeto têm carreiras, têm trabalhos full-time e isto não parte, não é uma iniciativa que venha, portanto, do Estado, seria ótimo, não é? Mas é complementar essa iniciativa e no fundo foram vocês que se mexeram, quer dizer, a acordar mais cedo para ter reuniões das 18h às 9h e isso é interessante e vocês têm carreiras diferentes, ou seja, têm experiências diferentes que eu imagino também tenham influenciado a própria construção deste programa, ou seja, de certeza, quer dizer, eu tenho suspeito fortemente que a própria construção deste programa que vocês descreveram, reflita também as vossas experiências, aquilo que a vida vos ensinou que pode ser útil naquilo que funciona e que não funciona, as competências que são mais ou menos úteis. Totalmente, é claro que
Fernando Soares e Ricardo Marvão
vamos falar com muita gente, mas usamos muito a nossa rede, usamos muito a nossa experiência do passado, acho que houve uma boa seleção também dos founders que têm experiências muito diversas e que cada um traz algo diferente à academia. Mas,
José Maria Pimentel
por exemplo, a ti, no teu caso, a tua experiência é, enfim, neste momento já não é só isso, mas
Fernando Soares e Ricardo Marvão
vem bastante do mundo do empreendedorismo, por exemplo. Como é que isso influenciou? Por exemplo, o facto de, como é que nós atingimos isto mais rápido? Ok, vamos usar uma metodologia de aceleração de startups, mas diretamente para fazer aceleração de políticos. O que é tipo quando pensas ok vou acelerar um político. Mas é possível e estamos a fazer e estamos a fazer com bons resultados. Claro que há... E nós fomos... E o Fernando já falou disto... Que é muito importante, estamos a falar com jovens, é muito importante sermos transparentes que nós é a primeira edição, nós não sabemos exatamente como é que vai ser o resultado final, acreditamos imenso no projeto, queremos muito ouvir, de maneira a melhorar em cada semana o programa e para isso temos que lhes dar pelo menos a transparência de que nós não temos as respostas todas e há aqui coisas que se calhar vão correr menos bem, vocês são um bocado o guinea pig, não é? Mas estamos aqui para todos, estamos todos no mesmo barco e estamos todos a aprender e portanto se eles tiverem essa mente aberta ajuda-nos imenso e portanto é assim que estamos a levar o curso. A primeira edição é uma aprendizagem para uma segunda edição que vai ser muito mais robusta, muito mais... Mas a primeira edição é sempre uma primeira edição, não é? Tipo, a primeira vez que fazes eles vão todos dizer não, eu tive na primeira edição.
José Maria Pimentel
Exato, pode não ter sido a melhor,
Fernando Soares e Ricardo Marvão
mas foi a primeira. E eu senti... Eu inaugurei. Sim, e eu dei imenso feedback. Ah, tu tens isto porque eu dei esse feedback. Exato, exato.
José Maria Pimentel
Pois, exatamente, estava a pensar nesse aspecto. E outro aspecto que eu acho que também destina a vossa abordagem e que suspeito também é resultado da vossa experiência é que vocês podiam-se ficar pelo lado lírico da coisa, digamos assim, de passar este conhecimento, de engotir um determinado espírito, mas sem o medir. E vocês têm uma preocupação em medir os resultados também, dentro daquilo que se pode fazer neste tipo de iniciativa, cujos grandes resultados são a prazo, não são no imediato, mas vocês tentam também de alguma forma ter aqui indicadores
Fernando Soares e Ricardo Marvão
que permitam medir o impacto e os resultados que estão a atingir. Sim, claramente hoje não se pode estar em projetos transformadores, em projetos de educação e isso tem que ver também com a nossa experiência em implementar diferentes projetos. O Ricardo na inovação, eu trabalho também na educação, nós temos pessoas na área da economia, em muitas áreas diferentes, pessoas que já fizeram outros movimentos cívicos como o Política para Todos, Temos representados nos fundadores também diferentes geografias do país, o que é muito importante. Nós queremos tirar as pessoas, nós estamos a fazer questão de grande parte dos fins de semana e dos projetos que acontecem na parte presencial fora dos grandes centros urbanos, para que toda a gente conheça o interior. O país real. O país real, digamos assim. E os diferentes países que também constituem Portugal, as diferentes forças sociais, as diferentes regiões. Sobre a medição de impacto, nós desafiamos a Gulbenkian para nos ajudar, se há alguém que tem trabalhado sobre isto em Portugal é a Fundação Carlos Gulbenkian. E não é difícil, nós no fundo o que nos propomos é acompanhar o percurso destes jovens após o programa e perceber se participam ativamente em associações, em projetos da sociedade civil, se se candidatam e o nosso objetivo é mesmo ter uma percentagem de pessoas que se candidatem e uma porcentagem de pessoas que participem civicamente. E participar civicamente é de todas estas formas que nós já falámos. E, portanto, o que nós vamos fazer é acompanhá-los e dinamizando também essa rede, como as escolas tradicionais fazem, as redes de antigos alunos, para que eles também se possam ajudar mutuamente, ir partilhando os desafios que vão tendo nas suas vidas da participação cívica e que, de edição a pós-edição, se construa uma rede que possa, ela também, da sociedade civil para a sociedade civil, que se alimente e que se apoie mutuamente nesse designio de serem todos um pouco mais ativos e mais participativos. E esse follow-up é interessante, porque isso permite-vos também, de certa forma,
José Maria Pimentel
depois calibrar o programa, porque se vocês perceberem que há determinada competência que está em falta, que lhes está... Competência ou ferramenta que ficou em falta e que foi aquilo que
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impediu muitos deles de dar esse passo podem rever o programa e acrescentar isso. Cá está, aquilo que tu falavas é trazer uma abordagem da inovação, da iteração útil das edições que vai trazer um aperfeiçoamento do produto, digamos assim, portanto isto é trazer inovação para a educação mas também para a política, digamos assim.
José Maria Pimentel
Sim, exatamente. Bom, para terminar, olhando para o futuro, próximos passos, o que é que está na agenda? Vocês estão a dois terços da primeira edição, eu sei que tem algumas novidades, entretanto, frescas. Sim, então, se calhar
Fernando Soares e Ricardo Marvão
deixo o Fernando dar uma novidade e outra outra. Então, nós queremos fazer uma segunda edição já a partir de setembro, outubro e portanto vamos abrir candidaturas provavelmente agora durante o
José Maria Pimentel
mês de julho. Como é que as pessoas podem candidatar? Através do vosso site, presumo, não é? Sim,
Fernando Soares e Ricardo Marvão
através do site. Depois deixo na descrição. E nas redes sociais. Hávemos de pôr também uma indicação para as pessoas poderem clicar no formulário para poderem se candidatar. Mesmo no próprio formato da candidatura e depois das entrevistas, depois de termos tido o feedback, provavelmente também vamos mudar um pouco, mas essa é uma novidade e queremos muito fazer esta segunda edição, provavelmente com mais jovens. E se calhar passa aqui ao Fernando para dar uma segunda novidade.
Fernando Soares e Ricardo Marvão
A segunda novidade é que, além da agência Erasmus, além do IPDJ e do conjunto de autarquias que nos estão a apoiar, tivemos esta semana a notícia do auto-patrocínio do Presidente da República, o que nos orgulha muito, e consciente da importância da participação cívica dos jovens e neste que é o ano europeu da juventude. Portanto, para nós é muito importante este apoio porque ajuda na mobilização e na validação da importância de uma academia como esta.
José Maria Pimentel
Sim, dá-vos um selo de qualidade, digamos assim.
Fernando Soares e Ricardo Marvão
Exatamente, e de patrocínio da causa pública e do interesse público. E, portanto, temos que agradecer a todas as entidades que acreditaram no projeto desde o início. Estamos, obviamente, disponíveis para ser apoiados, tal como tu também o fazes com outras entidades da sociedade civil, individuais, empresas, instituições, fundações. Não comprometemos o financiamento desta academia com movimentos partidários, portanto, neste momento é totalmente independente do sistema partidário e, portanto, queremos agradecer a quem já nos apoiou. Estamos disponíveis para quem nos quer apoiar e, ao mesmo tempo, queremos também agradecer-te a ti a promoção que te permite, através deste teu podcast, que tem claramente uma audiência cada vez maior E, portanto, agradecer-te a tua disponibilidade para nos receberes e apoiares a promoção deste projeto. Também tu, um agente da sociedade civil, com um projeto também da sociedade civil para a sociedade civil. E, portanto, temos isso em comum, partilhamos esse espaço em comum e muito tens feito para também essa divulgação do conhecimento que existe no país e dos portugueses e que ele seja e chegue a todos que seja do conhecimento de uma rede mais alargada de pessoas e
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portanto agradecer de sermos parte desta tua iniciativa. Já agora deixa aqui também, falamos aqui também do financiamento mas realmente esse é um ponto importante que eu e o Fernando já estamos nisto há muitos anos e já financiámos muitos projetos, eu acho que não tive nenhum projeto tão difícil de financiar como este e portanto Deixo aqui um pedido de se alguma organização, alguma instituição, até indivíduos, que também já tivemos financiamento de indivíduos, se quiserem apoiar a academia e acreditamos que isto é... E é o feedback que temos. Toda a gente diz, projeto magnífico, é tão importante ter os jovens a participarem, mas depois para chegar à frente é difícil. E, portanto, deixo aqui o pedido, se por acaso alguém tiver
José Maria Pimentel
interessado em apoiar a academia, estamos todos ouvidos. Sim, sim, bom, não faz todo sentido, porque eu percebo que a política seja um terreno em que as pessoas evitem muitas vezes meter-se e aqueles que quereriam meter, vocês querem evitá-los por razões compreensíveis, porque querem manter o espírito a partidário, mas a verdade é que este tipo de coisas precisam de financiamento, senão não conseguem cumprir a sua missão. Para terminarmos, tu, Ricardo, já falaste disso no início, mas fica reforçada a recomendação do, que neste caso não é um livro, é um
Fernando Soares e Ricardo Marvão
documentário, do, lembra-me lá como é que se chama? Chama-se Knock Down the House. Exatamente. Está no Netflix, não é? É um documentário, por acaso não sei, mas não é muito difícil encontrar e é um ótimo documentário e está muito bem feito, nota-se mesmo tipo grassroots mesmo no documentário e acho que é uma ótima forma de perceberem também o que é que é esta academia claro que o nosso é diferente do americano e não têm as mesmas verbas mas dá para perceber o tipo de ajuda que nós damos a
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estes jovens. Sim, eu vou ver, já me tinhas falado e eu já estava curioso e agora vou ver de certeza, portanto fica à recomendação. Portanto, Ricardo e Fernando, obrigadíssimo por terem vindo. Obrigado. Obrigado. Este episódio foi editado por Hugo Oliveira. Visitem o site 45graus.parafuso.net barra apoiar para ver como podem contribuir para o 45graus, através do Patreon ou diretamente, bem como os vários benefícios associados a cada modalidade de apoio. Se não puderem apoiar financeiramente, podem sempre contribuir para a continuidade do 45 Graus, avaliando-o nas principais plataformas de podcasts e divulgando-o entre amigos e familiares. O 45 Graus é um projeto tornado possível pela comunidade de mecenas que o apoia e cujos nomes encontram na descrição deste episódio. O link está na descrição deste episódio.