#121 José Pacheco - “O que está mal na escola, tal como a conhecemos?"

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José Maria Pimentel
Olá, o meu nome é José Maria Pimentel e este é o 45°. Foram umas semanas muito preenchidas, estas desde que publiquei o último episódio. Desde logo houve as três apresentações do livro, em Lisboa, no Porto e em Coimbra. Correram as três muitíssimo bem, melhor ainda do que eu estava à espera. Tenho obviamente a agradecer aos quatro apresentadores, à Sona Peralta, ao Francisco Mendes da Silva, ao Líza Gacão Herreira e ao Carlos Filhais, mas Também, e essa foi a parte que me deixou mais contente, a quantidade de pessoas que apareceram nas três apresentações. Em todos os casos tiveram muitos ouvintes, muitas caras desconhecidas que eu tive a felicidade de conhecer e foi muito bom ter-vos lá, ter falado convosco. Na apresentação do Porto, por exemplo, foi particularmente interessante porque conseguimos gerar ali uma conversa que foi para lá da apresentação e destas coisas típicas das apresentações de livros em que estão três ou quatro pessoas numa mesa a falar e o público não intervém e no Porto conseguimos ter... Houve ali um conjunto de elementos que se alinharam para termos uma conversa, quase até um debate de ideias sobre muitos temas do livro, que foi excelente, e no caso do Porto agradeço ao Luís em particular ter alinhado nessa conversa com a boa disposição que o caracteriza. O livro também tem estado a ter excelente feedback, tem estado a tanto quanto se é vender bem, o que é sempre bom, porque apesar de tudo, para todos os efeitos é o objetivo. Tem tido também boa imprensa, felizmente, foi divulgado no Eixo do Mal pelo Daniel Oliveira e no Governo Sobre pelo Pedro Mechia. Aproveito aliás para agradecer aos dois. E isso deixa-me muito contente, naturalmente, mas sobretudo deixa-me contente ter o vosso feedback e já tenho recebido ótimo feedback em relação ao livro. Encorajo-vos também a continuar a dar esse feedback, seja eu positivo ou negativo, já agora, porque as críticas também são muito úteis. Portanto, continuem. Se gostarem, digam-me. Se tiverem coisas a apontar, digam também. Para mim é ótimo ter feedback do vosso lado. Finalmente, a versão e-book do livro, ou seja, a versão digital, já está disponível no site da WOOK. Podem encontrá-lo em www.wook.com e pesquisando pelo livro Política a 45°. A versão digital é especialmente relevante para aqueles que vivem no estrangeiro. E eu tenho recebido algumas mensagens de ouvintes que vivem no estrangeiro e que me alertaram para o facto, eu confesso que desconhecia, de que os portes de envio são particularmente caros para quem compra os livros a partir do estrangeiro. Rapidamente ficam num valor próximo do valor do livro propriamente dito, que obviamente é uma chatice. Eu tenho tentado perceber se existe alguma plataforma, algum site que tenha portos mais baratos. Até agora não encontrei e, quer dizer, para ser sincero, não estou especialmente otimista. Quem lê livros digitais, o ebook é obviamente uma ótima solução, porque obviamente, por natureza, não tem portes de envio. De qualquer forma, se eu souber entretanto alguma solução para comprar o livro com portos mais baratos a partir do estrangeiro, também digo, confesso que era um impedimento que eu não estava à espera, e sei que há uma percentagem relevante de ouvintes de 45 graus que estão no estrangeiro, mas enfim, é o quê? Aparentemente não há nada que se possa fazer. De novo, para quem lê livros digitais vai ter o ebook, que já é uma, pelo menos, uma solução parcial. Estas duas semanas também foram duas boas semanas em termos de novos mecenas, portanto tenho muita gente para agradecer. Um abraço especial ao João Teixeira, outro abraço muito especial ao Walter Agrochão e um agradecimento também aos novos mecenas Rui Silva, André Gamito, Tiago Agostinho, Miguel Jacinto, a Inês Ribeiro e a Sofia Ferreira e finalmente ao António Rocha Pinto. Muito obrigado a todos. Suspeito que parte destes novos mecenas sejam novos ouvintes também do podcast e também por isso foi bom publicar o livro porque fez o podcast chegar a mais gente do que chegava antes e isso tem sido muito bom. E com isto vamos ao episódio de hoje. A escola é um caso curioso porque é provavelmente a instituição que menos se alterou nos últimos séculos. A vida em sociedade mudou, e em vários aspectos, a política mudou e muito, os nossos valores alteraram-se, e muito também. Mas a escola ainda é, essencialmente, aquilo que era há 200 anos. É uma instituição que foi pensada para o mundo pós-revolução industrial. Aliás, em muitos aspectos a escola está mesmo pensada como uma fábrica. Desde a standardização dos anos, das turmas, dos processos, enfim, há uma série de aspectos que são muito parecidos com o modo como funciona uma fábrica. Estas características foram tornando a escola cada vez menos adaptada às sociedades modernas e esse desfazamento foi ficando progressivamente mais claro à medida que a ciência, por um lado, e por outro lado, um conjunto de pedagogos com vontade de experimentar e uma certa criatividade foram mostrando que as crianças não são máquinas, mas sim seres humanos, com emoções, com potencial criativo e, sobretudo, com características individuais e ritmos de aprendizagem diferentes que a escola deve ter em consideração. Por isso foram surgindo, já desde o início do século passado, um conjunto de movimentos pedagógicos diferentes, mas que têm em comum o facto de propor uma mudança na escola e na maneira como se ensina. Movimentos como a escola moderna, o método Montessori, o método Waldorf, a chamada abordagem de Reggio Emília e também mais recentemente o método que foi desenvolvido pelo convidado deste episódio, José Pacheco, que este começou para implementar no final dos anos 70 na Escola da Ponte, em Santo Tirso, que depois, décadas mais tarde, levou para o Brasil, em projetos como a Escola Projeto Ancora e a Escola Aberta de São Paulo, e que, mais recentemente, o convidado trouxe de novo para Portugal e implementou numa nova escola, desta vez a Open Learning School. A escola da Ponte tornou-se na altura muito conhecida porque apesar de estar localizada numa zona geográfica desprivilegiada e apesar, ou por causa disso, do método de ensino alternativo que usava, conseguiu que os seus alunos tivessem bons resultados nos exames a nível nacional e, sobretudo, muito melhores do que tinham tido no passado. Mas pergunto a vocês, em que consiste exatamente este método alternativo que o José Pacheco propõe? A pedagogia da escola aberta que o convidado propõe tem várias diferenças importantes face ao ensino tradicional. Algumas comuns a outras metodologias alternativas já implementadas em várias escolas, embora ainda sejam um nicho, outros aspectos verdadeiramente distintivos e, sobretudo, alguns deles, revolucionários face à escola que conhecemos. A abordagem que o convidado propõe traz para a linha da frente, tal como fazem outros métodos alternativos, o reconhecimento da individualidade dos alunos e coloca a tónica em estimular os alunos a aprender por si, autonomamente e seguindo a sua curiosidade e as suas necessidades concretas. Esta é também uma escola em que a família e a comunidade têm um papel ativo. Mas a abordagem que o convidado propõe vai mais longe. Na escola aberta não há, por exemplo, salas de aulas. Não há horários, não há sequer turmas. Os alunos estão todos misturados, independentemente da idade, o que significa que não há sequer ciclos. E mais importante, não há sequer, propriamente, professores. Há tutores. Nem existe, na verdade, matéria pré-definida a aprender, como nós estamos habituados. São os alunos que decidem, em conjunto com os tutores, o que aprender, com base nas suas necessidades. E esse tutor, segundo este método, não é visto, como acontece nas escolas tradicionais, como a pessoa que mais sabe, mas sim como alguém que orienta e guia o jovem para descobrir e assim conseguir crescer. Outra característica distintiva deste modelo, e talvez a mais controversa, é que não há testes. Aquilo que existe é apenas o registro das competências que o aluno conseguiu adquirir através de provas concretas dessa aprendizagem. Este método de ensino que José Pacheco defende implicaria, por isso, uma verdadeira revolução no ensino. Durante esta hora e meia de conversa, discutimos por isso vários dos aspectos desta metodologia. É claro que, como dizia o grande cientista Carl Sagan, alegações extraordinárias requerem provas extraordinárias. Por isso, tentei discutir criticamente as propostas do convidado, sobretudo aquilo que implicaria aplicá-las na prática e a uma grande escala. Sobretudo aquelas mais disruptivas como a ausência de testes ou o facto de os alunos terem aparentemente uma total autonomia sobre aquilo que vão aprender. Sendo que, no global, há algo que me faz suspeitar que a escola atual, com os vários aspectos obsoletos que seguramente tem, talvez não seja assim tão fácil de substituir. É que apesar de modelos alternativos como aquele que o convidado propõe já existirem há mais de 100 anos, a verdade é que ainda ninguém conseguiu implementá-los numa escala suficientemente grande em nenhum país. Seja como for e seja qual for o nosso grau de ceticismo em relação à abordagem que o convidado propõe, há no entanto duas coisas que prometo deste episódio. Primeiro, esta é uma conversa que dá a pensar e que nos leva a olhar com outros olhos para a maneira como o ensino funciona hoje e para a maneira como a escola de hoje está organizada. Segundo, e como vão perceber, José Pacheco é mais do que alguém com ideias interessantes sobre o ensino e a educação. É um contador de histórias nato e um homem, eu diria, com poesia na ponta da língua. Ora ouçam. José Pacheco, muito bem-vindo ao 45°.
José Pacheco
Obrigado pelo convite.
José Maria Pimentel
O que é que está mal na educação? O que é que está mal no ensino? Tu
José Pacheco
queres saber mesmo? Quero, quero.
José Maria Pimentel
Acho que é a pergunta certa para começarmos. Está
José Pacheco
tudo mal. Tudo mal. Quando digo tudo mal, não quer dizer que não haja bons exemplos no campo da educação, mas na base de todos os problemas que nós vivemos na comunicação social, a indisciplina, a reprovação, tudo isso, as doenças profissionais dos professores, suicídio juvenil, etc. Isso é apenas a ponta do iceberg de um problema bem mais profundo. Então quando eu digo que está tudo mal, é porque na raiz deste modelo educacional que nós temos desde há 200 anos, na raiz deles estão exatamente esses fenómenos, esses dramas educacionais. Mas há coisa muito bem feitinha por aí, muito boa. Só que são muito vários. Mas existem, não é?
José Maria Pimentel
Mas está pior agora do que estava há 10, 20 anos?
José Pacheco
Está igual. Bom, está igual, vamos lá. Eu
José Maria Pimentel
estou a perguntar isto porque, por exemplo, no caso de Portugal nós tivemos progressos grandes nos rankings PISA, por exemplo, que à partida sinalizam uma evolução positiva.
José Pacheco
Não, é mentira. É? É. Todos os rankings partem do princípio de que é possível medir. Medição é um dos três paradigmas da avaliação, mas eu não vou entrar no jargão científico, mas preciso a te explicar o que é avaliar. Avaliar não é classificar e avaliar não é aplicar teste. Por exemplo, há uma prova no Brasil chamada o IDEB, não é uma prova, é um índice que cria rankings também, não é? O IDEB no Brasil significa índice de desenvolvimento da educação básica. Serve de referência até em alguns aspectos dentre os critérios e parâmetros do PISA. Mas eu digo que não é o índice de desenvolvimento, o D não quer dizer desenvolvimento, quer dizer decoreba. Decoreba é decorar as coisas. Porquê? Aquilo que acontece é que esse índice de ranking é determinado segundo uma fórmula, que é a prova Brasil e o fluxo escolar, a transição. Muito bem, fluxo escolar existe porque o modelo determina que haja ano, ciclo e se não houver, e porquê que há? Gostaria que me perguntasses porquê que há ciclo, porquê que há ano, ok? Portanto, o fluxo escolar é uma ilusão porque não existe, mas ele conta. Depois, o teste, que é a prova que é aplicada, ela é falível. O teste é um instrumento de avaliação mais precário que existe, quer na sua concepção, quer na sua correção, a subjetividade que ele impõe. Então, se tu fizeres agora uma prova a Brasil e passados, por exemplo, dois meses, aplica a mesma prova, tu vais ver que os resultados são muito abaixo. Esqueceram-se. Porque o que acontece numa prova é que o aluno decora, a decoreba, põe na memória de curto prazo determinado conjunto de informação que sabe que pode sair na prova, devita na prova e esquece, porque não tem significado. Aprendizagem significativa significa, passo o plenarnasmo, atribuir significado àquilo que se aprende. E aquilo que se põe numa prova não tem significado algum. É apenas matéria que o professor debitou, que o aluno vomitou e esqueceu, que a memória esperta dispensa aquilo que... Quando alguém me diz que aprendeu tudo na sala de aula na escola, eu pergunto, sabe fazer raiz quadrada? Nunca encontrei uma pessoa, ou melhor, pessoas de matemática, claro, mas mesmo assim encontrei um que não sabia. Então, e depois eu pergunto, então porquê que não aprendeu? Teve aulas, muitas aulas, fez prova, não aprendeu. E depois eu faço outra pergunta, que essa é bem mais profunda. Quantas vezes durante a sua vida precisou utilizar a raiz quadrada? Eu já perguntei isto, talvez a uns 100 mil, porque no Brasil é mil, dois mil por palestra, eu já fiz mais de 10 mil. Então, nem uma pessoa a utilizou.
José Maria Pimentel
Mas a resposta é não ensinar a raiz quadrada?
José Pacheco
Não. A resposta é saber aprender a raiz quadrada. Se eu quiser saber o que é uma raiz quadrada, como se faz, em cinco minutos eu aprendo. Pego no meu iPhone, estás a ver aqui o iPhone, entro na internet, ponho raiz quadrada e aprendo. Porque preciso. Porque lhe atribuo significado. Tão simples. Ah! Preciso é de aprender a aprender. Preciso de aprender a selecionar informação. Preciso de aprender a analisar e a criticar a informação para ver se é essa que eu quero ou se é fake news. Depois preciso de comparar diferentes informações, depois avaliar a informação e depois avaliar, sintetizar a informação em palavras minhas para a integrar, que é o segundo grande princípio
José Maria Pimentel
da aprendizagem.
José Pacheco
E depois de ter produzido conhecimento através da transição da recolha de informação para uma evidência da aprendizagem, eu partilho com outro, com um professor, com alguém, que é a avaliação. Ou seja, eu parto uma necessidade, desenvolvo pesquisa, dentro da pesquisa transformo a informação em conhecimento, produzo o currículo, não consumo o currículo, acéfalo, eu aprendo a produzir conhecimento, e não escutando um papagaio dentro de uma sala de aula. Então, dentro disto, acho que já dei uma ideia aproximada, acontece aquilo que se chama o saber em ação, ou seja, a competência. Que há um senhor chamado Pernod que escreve muito sobre isso, mas também não faz. Portanto, infelizmente nós temos uma decalagem imensa entre a teoria e a prática. E esse é o problema. Sim.
José Maria Pimentel
Disse aí várias coisas que são interessantes. Eu acho que, por exemplo, há vários aspectos, enfim, depois como corrigir é outra questão e sobretudo tornar isso em escala grande, não é? E se calhar não é por acaso que isto tem sido tão difícil de fazer ao longo das últimas décadas e há propostas nesse sentido que têm 100 anos à vontade e que ainda não foram implementadas. Agora, há uma série de aspectos do ensino que nós podíamos dizer que o rei vai nu, porque são coisas evidentemente mal feitas e que nós, no entanto, continuamos a fazer. Uma delas é essa, que é, grande parte daquilo que nós somos ensinados enquanto miúdos, nós não sentimos a necessidade daquele conhecimento. E como não sentimos a necessidade, a nossa mente é como se nos auto-sabotasse, nós até conseguimos, se calhar, obrigar-nos a decorar aquilo para um exame, mas depois rapidamente aquilo, como não nos é útil, esfuma-se. E, por exemplo, a matemática há muito... Claro que a pessoa pode também dizer que parte disso é útil, embora nós possamos não perceber que é útil, mas o facto de nós não percebermos limita essa aprendizagem. Há imensa gente que tem essa relação com a matemática de... Vamos tirar isso o mais rapidamente possível do caminho, porque isto na verdade não me interessa e eu não vejo uma utilidade para isto, e isto é verdade até à universidade, não é só nas crianças.
José Pacheco
Já que falas em matemática, e eu falei da raiz quadrada, eu tenho uma grande coleção de historietas, de histórias, Eu publico uma todos os dias. Publico de manhã cedo. Hoje publiquei a carta 805, que já vai longe. E numa delas eu queria ter contado a história. Se não contei, vou contá-la em breve. Uma menina... Eu estava numa escola brasileira. Eu sou voluntário em várias escolas, gratuitamente, não roubo nada, porque aprendo muito. Eu estava numa das escolas e de repente entrou naquele espaço, que não havia sala de aula lá, havia espaço educativos, entrou uma menina e eu ouvi ela dizer, ó Flana, que era a doutora, eu acho que já sei fazer raiz quadrada. Repara bem, eu acho que já sei fazer raiz quadrada. A doutora perguntou, mas porquê que tu aprendeste a fazer raiz quadrada? Ela disse, lembras-te na semana passada de eu dizer que o meu pai me tinha pedido ajuda? E eu disse, doutora, porquê? Porque lá no bairro fizeram um campo de jogos e agora têm de pintar o chão com as marcações para o penalti, para o lançamento de basquetebol, e o meu pai não sabia. Ele disse que deu isso na escola, mas já se tinha esquecido. Então, eu juntei-me com mais três colegas e fizemos um projeto. Olha, por exemplo, já aprendi o que é um segmento de reta, o que é um ângulo, ângulo reto, ângulo obtuso, já aprendi o que é fazer uma circunferência, calcular a área do círculo, sei que é pi r², sei o que é o pi, eu construí o pi, continuou, continuou, E a doutora disse, mas então, quando eu estava a estudar eu vi que havia uma coisa chamada raiz quadrada que tinha a ver com isso e fui estudar. E a doutora perguntou, e como é que tu estudaste? E ela, tu não te lembras? Nós temos feito uma planificação. A doutora disse, então espera um pouquinho. Pegou no iPhone dela e ligou e pôs na câmara a filmar em vídeo e pôs entre ela e a criança e perguntou, fala-me então das planificações. E ela disse, olha, na segunda-feira, deve estar lembrada, que tu me disseste para eu falar com o professor Nelson, que é professor de matemática. Então eu pus no meu plano, combinei com o professor Nelson e às 10 horas fui ter com ele na biblioteca. E ele me encaminhou para uns sites na internet e olha que lá é fácil de aprender e tal. Pois e depois, na terça deves ter lembrado que eu cheguei aqui com a área do círculo e tu me falaste, tal, tal, tal... E na quarta-feira... Porque eles fazem planificação ao fim do dia para o dia seguinte. Fazem com... Não se prepara a planos, não se planifica uma aula. Ensina-se o outro a planificar. A planificar a sua vida. A ter um projeto de vida.
José Maria Pimentel
O outro, o aluno.
José Pacheco
O aluno, ok? Que é um sujeito de aprendizagem. Estou a falar daquilo que se chama paradigma da aprendizagem. Sim, sim, já lá vamos. Bom, mas vamos abreviar. E a doutora, aquilo tudo a ser gravado em vídeo, e a doutora diz, mas o que é que tu queres? Eu quero que me ponha aí uma raiz quadrada. E a doutora escreveu. Eu deitei o olho, tinha seis dígitos, por exemplo, 390.498. A criancinha mostrou, a doutora viu, está certo. Mostrou para a câmara e perguntou, e agora? Agora vou acabar as marcações, como o meu pai está lá. O que é que ela fez? Partiu de uma necessidade social, do currículo de comunidade, que é uma das dimensões curriculares, produziu conhecimento e aplicou. E lá foi ela. A doutora parou a gravação, mandou para a plataforma digital de aprendizagem, para o portfólio dela. Uma evidência de aprendizagem. Ali está uma evidência. Porque fazer uma arriscada num teste esquece-se, porque a aprendizagem não é significativa, não é integradora, não é diversificada, ativa nem socializadora. Acabei de dizer os cinco grandes princípios gerais da aprendizagem de Levi-Gottes, que de Jerome Brunner, blá blá blá, teoria eu dispenso. Vamos lá, só falta dizer a idade da criancinha, cinco anos, quase seis. Eu tive um aluno com seis anos que cumpriu todo o programa até ao 9º ano. Aos 6 anos.
José Maria Pimentel
Isso é cá ou no Brasil?
José Pacheco
Cá, o Alex. Aos 6 anos. Tinha a parte 7. Tudo. Se ele fosse para a escola, para outra escola, eu já sabia tudo o que ele ia fazer para dentro de uma sala de aula. Os meus sobrinhos aprenderam a ler antes de entrar na escola. Eu ensinei uma criança a ler aos dois anos e cinco meses, brincando com ela. As crianças quando entram na escola já sabem ler. Sabem ler tudo. Entram e deparam com o professor sozinho, a ensinar todos ao mesmo tempo, como se não estivessem no ritmo próprio. Ao fim de algum tempo diz que aquele não acompanha, o outro não acompanha, vai para as explicações. Ensina todos da mesma maneira quando cada um aprende a seu modo, ensina sem atender aos estilos de inteligência particulares de cada um, ensina sem saber qual é a lateralidade predominante, ensina sem saber qual é o repertório linguístico e cultural da criança. Então, o que é que nós esperamos? O que é preciso é que os professores, que são excelentes criaturas, percebam que estão a repetir aquilo que fizeram há 200 anos. É só isso que é preciso. E depois, tomar uma decisão ética de mudar.
José Maria Pimentel
O museu que o José Pacheco defende da aprendizagem aberta, acho que é o...
José Pacheco
É, podes dar esse nome.
José Maria Pimentel
Posso dar outro também, se preferir.
José Pacheco
Podes, ou dar nome nenhum. O que eu faço agora no Open Learning, é Open School, é um trabalho que também já fiz na escola da Ponte, na escola aberta de São Paulo, no projeto Ancora, e que é uma nova forma de aprender. De aprender, porque o problema é que temos um sistema de ensino, de aprendizagem. Quando vieram os computadores, o que é que as escolas fizeram? Fizeram oficinas ou laboratórios de informática para ensinar o que? Foi lixo digital em curto prazo. Depois veio na década de 90 a internet. O que é que se fez? Ensino à distância. Deveria fazer-se aprendizagem da proximidade à distância. E agora no 4.0 o que é que eles fazem? Dão aula à distância. A aula à distância é tão inútil como a aula presencial. Essa coisa de ensino híbrido, é uma porcaria, não serve para nada. É um paliativo do velho modelo, um paliativo que dá muito dinheiro às empresas, há isso, há... Porque os pais não entendem que as coisas são diferentes e que é possível aprender.
José Maria Pimentel
Das suas objeções ao sistema, há uma, que é um daqueles aspectos do Rei Irnú, que eu descrevi há bocadinho, mas que hoje em dia é mais ou menos consensual, que é o facto de se ter que adaptar às diferentes características de cada aluno. Isso é mais ou menos evidente, e aquele modelo standardizado e industrializado está claramente obsoleto nesse aspecto. Há outros aspectos desse tipo de escola que eu acho que são menos consensuais ou mais polémicos que quisermos, entre os quais aqueles que já lidou no início de não ter turmas, por exemplo, ou não ter exames. Não ter turmas, no fundo, é ter miúdos de idades diferentes a partilhar a experiência de aprendizagem. Eu ia dizer sala de aula, mas também não tem sala de aula, portanto... Não vou cometer esse erro. E não ter exames é não ter exames. Por exemplo, os exames em certo sentido são um exemplo de uma coisa que tem uma óbvia limitação porque se está a medir a capacidade de curar, não se está a medir... Primeiro não se está necessariamente a medir aquilo que se quer, que é o conhecimento está-se a medir a capacidade de resolver o exame e depois tem esse problema de longo prazo. Mas alguém podia dizer, bom, os exames são um mal que nós toleramos porque não é uma solução perfeita, mas tem a vantagem de que nós conseguimos comparar entre alunos, conseguimos ter uma escala objetiva para medir, não havendo exames, como é que se mede?
José Pacheco
Essa escala não é objetiva.
José Maria Pimentel
Não, ela objetiva é, pode ser muito enviazada.
José Pacheco
Aquilo que está na lei, vamos falar da lei, é que a avaliação deverá ser formativa, contínua e sistemática. Um teste não é formativo, é excludente, não é contínuo, É periódico e não é sistemático porque atende apenas uma parcela de uma matéria de disciplina. Então, no capítulo da avaliação, as escolas que aplicam testes estão fora da lei. Imediatamente. Fora da lei. Não sabem o que fazem. Não sabem o que fazem. Por exemplo, quando um professor me diz que aplica três testes, soma e divide por três, anota, isso não pode ser feito. O teste tem uma notação de escala intervalar de variável contínua. A classificação, a escala de uma cinco onda, é de variável discreta numa escala ordinal. Basta dizer isto. Pois
José Maria Pimentel
é que tem que arredondar.
José Pacheco
Para além de que há algo que escapa um pouco uma compreensão objetiva, que é não só não medir em termos de capacidade intelectual cognitiva como o momento do teste é um momento de má educação, que pode desenvolver alguma alienação, até alguma patologia, mas sobretudo corrupção. Vou explicar. Na Ponte não há testes. Na Ponte? Na Escola da Ponte, sim. Em outros lugares, não é? Porquê que não há? Há uma razão. Quando me perguntam porquê que não há, eu pergunto porquê que há. E ninguém me explica porquê que tem a ver. Não há. O que há? Avaliação. Mas um dia, foi em 2000, no ano de 2000, vieram as chamadas provas da ferição. E claro, a escola da ponta é uma escola pública, é obrigado a fazer e é bom que faça. Só que os meus alunos nunca tinham feito um teste, não sabiam o que era um teste. E o que é que eu faço? Vou à escola mais próxima e peço um teste. É de 6º ano. Eu estava no 4º ano, ou melhor, não há anos, mas pronto, vamos imaginar. E eu pedi a uma colega minha, de língua portuguesa, um teste. E ela disse, ah, mas é de 6º ano, não tem importância. Ela deu e eu levei para a escola, isto em 2000. Tirei umas fotocópias e pus lá no Preciso de Ajuda Posso Ajudar. Quem quiser aprender a fazer teste vai ter comigo amanhã às 10h no salão de aula. No dia seguinte tinha 37 jovens à minha espera. Porque a gente marca a hora e está lá na hora. Eu pedi para distribuir os testes e disse olha meus amigos, nós agora em maio vamos fazer uma prova de língua portuguesa e uma de matemática. Eu trouxe uma prova de língua portuguesa para vocês saberem como é, que é para não ficarem surpreendidos. Então, eles estão aí, têm regras, e eu vou explicar as regras. São 50 minutos. E logo eles perguntaram, ó pessoal, porquê é que são 50 minutos? Eu disse, eu não sei, já perguntei a muita gente, ninguém sabe, são 50, acabou. Aí é, é assim. Aliás, eu pergunto aos professores, eles não sabem, não é? Por acaso agora eu já sei, mas também não digo, vão aprender. Porque vem do século XIX, esse quantitativo. Aí um deles disse, ó professor, E se eu não souber o que está aqui, vou perder 50 minutos. Baixo, não podes sair. Ai não, não. Olha, e se eu fizer antes de acabar, acabam meia hora, posso ir embora, não podes? Oh pessoal, mas porquê? Não interessa o porquê, vai ser assim e acabou. É assim que eles mandam, é assim que a gente vai fazer. Eu saí, é. É. Está bom, então pronto, toca de fazer. Eu vi o horário, levantaram o braço. O que é que foi? Vem cá, pessoal. Olha aqui este disparate, o quê? Este texto aqui, o texto é da Sofia de Melbrena, não é? A Cavaleira da Dinamarca. Como eles não têm livros de leitura, eles vêm obras completas. Tinham lido toda a obra da Sofia de Melbrae, toda a obra, e viram que aquele bocadinho era do Cavaleiro de Andamar, assim. É, é, mas aqui só este bocadinho, não vais ter tempo em 50 minutos, não vais ter tempo de ler um livro inteiro. Mas não é isso, pessoal. Olha, mas tenho esta pergunta, dá um parva. O que foi que o cavaleiro viu ao longe? Eu disse, pois, tens que pôr aí. Eu tenho que pôr aqui nestas cinco linhas. O cavaleiro viu ao longe a presença da árvore que lhe indicava? Sim. O primeiro parágrafo aqui? Sim. Não, eu faço uma setinha e a pessoa vai ler o que está em cima, é muito mais lógico, porque vai copiar? Aí eu expliquei-lhe que era um item de transcrição simples, expliquei-lhe um item de escolha múltipla, mas estava a perder tempo, eu falei, olha, acabou, toca de fazer. Eles sentaram-se todos e diziam, vai começar agora. Eu fiquei ali. Eles pararam, olharam para mim. O que é que foi? Ó professor, o que é que está aí a fazer? Vai trabalhar, vai embora. Não esteja aqui a perder tempo. É 50 minutos. É, pronto, quando acabar os 50 minutos a gente leva-lhe às provas. Para onde é que você vai? Eu disse, eu não posso ir para o lado nenhum. Mas porquê, professora? Porque no dia da prova eu tenho que ficar na sala. Para quê, professora? Ah, eu não podia dizer que eu não... E diz um mocinho que estava lá há dois ou três meses. Ah, eu sei. Na escola onde eu estive era assim também. E os outros, porquê? Ha, ha, Para ninguém ir copiar. E um aluno dos meus, observa o que foi que ele disse, o que é copiar? O que é copiar? Estás a ver? Ou seja, um professor está na sala, está calado, mas o não verbal fala mais alto que o verbal. Ele está a transmitir valores, ou da falsidade, da mentira, da corrupção, porque ele acredita que eles são potencialmente desonestos. Ele está a transmitir valores negativos, está a deseducar. E eu sinto-me responsável por isso, porque eu sou individualmente responsável pelos atos do meu coletivo. Essa é a minha cultura profissional. Se os outros professores fazem isso, eu não faço, mas eu sou responsável por isso, porque eles são professores como eu. Agora é triste que as pessoas não percebam, é tão simples de ver, tão simples. Eu há pouco falava nos processos complexos de pensamento, pensar sobre pensar, a metacognição quando se faz pesquisa, Isso também é aplicável em teste. Quando veio a prova de língua portuguesa, eu tive que fazer a chamada. Eu fui para a porta, Maria João, e a Maria João disse Oh pessoal, o que é que você está a fazer? Estou a fazer a chamada, aqui diz para fazer a chamada, mas vocês já me conhecem. Eu fiz Aquela cena toda, uma tristeza, não é? Depois diziam no manual do aplicador Colocar os alunos a uma distância prudente Distância prudente? O que é que é isto? Retirar das paredes tudo o que têm As paredes são os intervalos deles, não têm nada Eles sentaram-se onde quiseram O problema é que começa a prova e uma criança levanta o braço. Eles quando querem falar comigo levantam o braço. Eu fiz assim, não, não, não vou. Venha cá, professor, não vou. Se eu for, dizem que eu estou a dar-te a resposta. Não, não é isso, venha aqui. Era uma pergunta de resposta de escolha múltipla e na escolha múltipla eram quatro hipóteses, duas estavam certas, ou seja, estava mal feito o item. Eu fui ao telefone, pedi a uma colega para entrar na sala, eu fui ao telefone e liguei para o Ministério, para o Rebendente da Avaliação e disse, óh, colegas, aqui está um item errado. Não está nada, então, isso é feito por professores universitários, vai ver, e ela foi, apesar de um bocado de tocar o telefone. Eu fui atender, a pessoa chega realmente, é uma coisa incrível, nós pagamos tão bem e não fazem uma coisa dessas, nós vamos anular e assim, e tal, assim, Você estava atento, mas não fui eu. Não, foi uma colega sua. Não. Então, foi uma criança. Desligou. Uma criança? Ninguém no país viu isso, nem professor, nem criança. A minha viu. Eu só rezava para na quarta-feira, no teste de matemática, não acontecer isso. Aconteceu. Começa o teste, passados uns minutos uma criança levanta o braço e diz, oh, vai lhe amar, Deus. Lá fui eu. O que é que foi? Oh, professor, está aqui esta pergunta. Quantos retângulos há nesta figura? Eu sei que é um ciclo, um triângulo, um pentágono, eu sei. Mas agora diga-me, professor, O retângulo de fora também é para contar. Pau! Pau, lhe ama, Deus! Aquela criança nunca tinha andado na universidade, nunca tinha frequentado o curso de psicologia, nunca tinha ido às disciplinas, às aulas de disciplina da percepção e sabia perfeitamente distinguir a questão do campo perceptivo. Então, o Palerma que fez na universidade aquilo não sabia. Lá fui eu outra vez. Ai meu Deus, a cena repetiu-se quando ela pergunta mas foi o senhor que... Não, foi uma criança. Desligou. Ou seja, não só os nossos fizeram tudo bem feitinho, como tiveram discernimento para perceber que aquilo estava errado. Algo que os professores estavam a saber e não sabem.
José Maria Pimentel
Esse discernimento é talvez a parte mais importante de todas. Pois
José Pacheco
é, pensar sobre pensar.
José Maria Pimentel
E como é que isso se ensina? Ou seja, no vosso modelo, como é que eles chegaram lá?
José Pacheco
Tudo se aprende através do exemplo da imitação. E tudo se aprende a partir de um quadro de valores.
José Maria Pimentel
Mas qual é... Ou seja, vamos tentar transportar, não sei quem está a ouvir, para a escola. Qual é a experiência concreta de um miúdo? Ele está na sala, entra na escola e como é que desde o momento em que ele entra na escola até ao momento em que ele aprende a raiz quadrada ou aprende qualquer coisa da história de Portugal, ou de geografia, ou enfim, estudo do meio, quer que seja, não é? O que é que se passa, não é? Como é que é esse processo, Como é que é essa experiência concreta?
José Pacheco
Quando tu dizes, quando entra na escola, estás a falar de um prédio. Não,
José Maria Pimentel
não, eu já sei. Pois é, pois é. Mas
José Pacheco
é a partir daí mesmo que eu tenho de começar a... Mas
José Maria Pimentel
ele tem que entrar em algum lado, não é?
José Pacheco
Tem que entrar em qualquer lado. Tem que sair de casa, pelo menos. Pode entrar na internet, pode nem sair de casa. Pode entrar na
José Maria Pimentel
internet. Mas o contacto com o professor não é essencial? É essencial.
José Pacheco
Não com o professor, com o tutor, que é outra coisa. O professor prepara projetos para os alunos, o tutor constrói projetos com os outros. O professor faz planificação de aula, o doutor ensina o outro a planificar a sua vida. O professor dá aula, o doutor constrói roteiros de estudo e acompanha processos de descoberta. Então, nós podemos aprender em qualquer local. Dentro de uma sala de aula quase nada se aprende, mas pronto, talvez incidentalmente eu aprendi. Dentro da sala de aula aprendi algo que são opostos. Aprendi a odiar e a amar, por exemplo. Se quiseres eu conto-te as histórias, porque essas são só histórias que eu tenho para contar. Mas podes aprender na natureza, observando, podes aprender com outra pessoa que tenha saberes populares,
José Maria Pimentel
tecnologias sociais... Claro, claro. Mas eu aqui estou a fingir-me a aprendizagem nessa escola, na escola de ponto, na escola aberta. Dentro de um prédio. Mas não tem que ser dentro de um prédio, eu digo é a escola com o tutor, com as pessoas daquela escola, com os colegas, enfim, naquele ambiente. É fora de casa, digamos assim. É
José Pacheco
o pressuposto que uma criança tem que entrar numa escola, estar 5 horas, mais uns iecas, depois tem que estar 200 dias letivos, de não sei quantas horas, num ano letivo de 9 meses. Eu pergunto, porquê que há ano letivo? Porquê que são 50 minutos de aula? Porquê que há intervalo? Porquê que todos entram à mesma hora e saem à mesma hora? Porquê que todos têm de fazer xixi ao mesmo tempo? Porquê que há horário? Porquê que há 200 dias? Porquê que o ano letivo aqui começa em setembro e no Brasil em fevereiro? A questão do tempo é fundamental. A criança, o jovem, o adulto, não precisam de entrar em lado algum para aprender. Precisam de ter um projeto de vida, precisam de saber desenvolver pesquisa, precisam de ter um tutor a acompanhá-lo, porque é indispensável, e precisam de saber aprender presencial e remotamente. E para isso é preciso terem aulas. É preciso, por exemplo, aprender a psicologia da aprendizagem, psicologia da cognição, psicologia da linguagem, psicologia da... É preciso aprender a sociologia da educação, é preciso aprender a filosofia da educação, é preciso aprender a história da educação, é preciso a psicologia, é preciso tudo isso, que um profissão não tem acesso. Então, é que talvez o campo das ciências mais vasto, mais complexo, é o das ciências da educação. O que é que fazem? As pessoas entram num curso, ouvem aula, vão dar aula. Isso é uma coisa que já não se usa há mais de 100 anos. Então vai dar aula dentro de uma sala de aula, dentro de um prédio, que abre às tantas e fecha às tantas, e que tem os rituais, e vai fazer papelada, e vai aplicar o teste, e vai às reuniões, para nada. Olhai para os centros de explicações, olhai para os centros de estudo, olhai para o índice de aprovação, olhai para o analfabetismo literal e funcional, olhai para o suicídio juvenil, olhai. É isso que essa escola faz. Mas apesar da escola, há quem se crie pessoa. Mas isso é incidental. Por isso é que eu digo que Eu aprendi duas coisas, a odiar e a amar. O resto aprendi em outros lugares, não aprendi numa
José Maria Pimentel
sala de aula. Sim, mas nesse caso teve que fazer por si próprio, não é? Aquilo que se pretende é que a escola ajuda a fazer isso. E eu estou a perguntar, qual é a experiência concreta de um aluno? Ou como é que se ensina um aluno através desse modelo? Como é que ele é ensinado até ao ponto de chegar... São sete perguntas. Sete. A
José Pacheco
primeira pergunta é quando é que aprendemos? Estamos a falar de aprendizagem. Quando é que a gente aprende? Ao longo da vida? Quando entra na escola? Não. Aprende desde mais ou menos o quinto mês de gravidez. Quando os primeiros neurônios espécies se formam e essa aprendizagem é muito mais no campo do afeto e da emoção do que propriamente cognitiva. Por exemplo, aos sete meses de gravidez, o feto aprende o ritmo da fala. Hoje já se sabe isso. Então, quando é que nós aprendemos? Quando entramos no serviço militar obrigatório aos seis anos, para dentro de um prédio, onde estamos sequestrados durante seis horas por dia, o que é que se aprende em milhares de horas que se passa dentro daquele lugar? Nada de útil, quase nada. Eu digo quase. Então, depois a segunda pergunta é porquê é que nós aprendemos? Porquê? Porquê é que a criança aprende a andar? Porquê a criança aprende a falar? Porquê é que ela aprende a gritar para impor a sua vontade? Se nós respondermos a estas perguntas vamos entender que se antigamente lhe metiam a chupeta para ela escalar agora dão-lhe um computador. E aí começa o problema. Bom, depois a pergunta é onde aprendemos? Aprendemos em qualquer lugar, se houver um projeto para cumprir, com alguém a acompanhar. Com o quê e com quem? Com o tutor, com meios de acesso à informação. Como é que sabemos que aprendemos? Não é aplicando o teste, é construindo evidências de aprendizagem, construção de portfólio, que agora é digital. E por aí vai.
José Maria Pimentel
Mas como é que essas evidências de aprendizagem depois são comparáveis? Porque os testes, com as vantagens que os testes têm, a grande razão para a existência do teste não é avaliar quanto eu sei em absoluto, numa escala absoluta, mas comparar-me com outros alunos e ao longo do tempo, mas sobretudo com outros alunos, que o sistema de ensino precise em algum momento de fazer, não é?
José Pacheco
Não, comparar pessoas não. Comparar pessoas é desumano e já basta desumanização. Eu não comparo pessoas, somos todos diferentes. Sim, mas há pessoas que... Primeiro,
José Maria Pimentel
pode ser, em várias situações, pode ser necessário fazer uma escala, se lá pode haver vagas limitadas numa determinada escola.
José Pacheco
Vaga limitada? É outra questão. Ainda bem que tu estás a pôr essas questões. Já várias vezes me pediram para ajudar quando uma mãe vem a uma escola e a escola diz que não tem vaga. E eu vou com a mãe e digo à direção da escola que pergunto o que é uma vaga. Ela responde, ah, porque as nossas turmas estão constituídas, não temos mais salas de aula. Eu pergunto, porquê é que tem a turma? Porquê é que tem sala de aula? Ah, porque está na lei, se não está não. E mais, o que está na lei é que o direito à educação é inalienável, há um direito sagrado e é de todos. Portanto, a senhora só tem a de matricular. E acabou. Tão simples.
José Maria Pimentel
Mas as escolas podem ter uma capacidade... Não é escola e difícil, é escola, O pessoal, os tutores...
José Pacheco
O que é uma escola? A questão é esta.
José Maria Pimentel
Mas 10 pessoas não conseguem educar um país inteiro, não é? Pode haver falta de pessoas. Quem te disse? Consegue? Quem te disse? Parece uma
José Pacheco
auto-evidência, mas posso estar enganado. Não, nem porque... Basta que haja alguém que acompanhe processos de aprendizagem. Claro que eu não falo 10 pessoas para um país inteiro, aí já estamos a exorbitar, mas eu posso dizer-te que já trabalhei com cento e tal crianças ao mesmo tempo na Guiné. Trabalhei com turmas de 60 alunos em Portugal, no tempo da velha senhora e claro que eu não conseguia ensinar porque eu dava aula naquela altura mas hoje eu posso... Olha, estou à quarta-feira, por exemplo e ao sábado estou com cerca de 800 professores 800! E acompanho-os a todos. Porquê? Porque eu não dou aula. Eu acompanho processos de descoberta, só faço perguntas, a resposta vem como? Em evidências da aprendizagem. Aquilo que eu te falei há pouco da raiz quadrada. Aquilo é uma evidência, ela aprendeu... Mas
José Maria Pimentel
o exemplo das evidências faz sentido, Eu estou a pensar como é que, olhando para ele de outra forma, ele só existe de uma forma binária enquanto aprendeu versus não aprendeu? Não,
José Pacheco
é porque eu quero, eu insisto na mesma pergunta, é o que é uma escola. Naquilo que eu faço, não chamo modelo porque não é um modelo, eu detesto modelos.
José Maria Pimentel
E muito menos... Filosofia?
José Pacheco
Muito mais réplicas. Não, é tudo. Bom, há um outro conceito de escola que, digamos, Quando eu digo, me parece que fui eu que disse isso, não sei se fui em primeiro lugar porque está tudo escrito há tanto tempo, escolas são pessoas, estas três palavras modificam totalmente o idioma. Escolas são pessoas, não são prédios. Quando eu digo que escolas são pessoas, as pessoas vivem em três grandes contextos educacionais. Na família, na sociedade e na escola, que está vocacionada pelo Estado para ensinar. Então o que eu faço é juntar a família, a sociedade e a escola, que é isso que está na lei. A lei diz que a educação é dever da família, sociedade e escola, não é ou da sociedade ou da escola. Quando Paulo Freire nos diz que a escola não muda a sociedade, muda as pessoas, eu pergunto, e se a sociedade não mudar a escola? A escola não muda as pessoas, mas a sociedade não muda, em termos não ser prejuízo. Então, qual é a instituição onde nós podemos fazer a rotura? A rotura paradigmática. É aqui que eu quero chegar. Porque este paradigma que está aí, da aula, da turma e tudo mais, é o paradigma da instrução, que vem da Prússia Militar, da França dos Conventos e da Primeira Revolução Industrial do século XIX na Inglaterra. É preciso que a sociedade saiba isto
José Maria Pimentel
e não saiba... Esse é o paradoxo, como é que em 2022 continuamos a usar um modelo para uma sociedade industrial, não é isso?
José Pacheco
O que eu disse, ensinar crianças do século XXI para professores do século XX, como se fazia no século XIX. Tu imaginas que um médico, um médico, trabalhar com materiais, ciência do século XIX, matava metade dos doentes. Tu vais a alguma consulta de um médico desses? Não vais. Mas vais para dentro de uma escola fazer isso. No século XIX. É uma coisa... É um absurdo. Não dá para entender. Mas eu estava a dizer alguma coisa. Ah, eu junto família, sociedade e escola naquilo que eu chamo uma nova construção social de aprendizagem e educação. Ou seja... Qual
José Maria Pimentel
é o papel da família e da comunidade aí? É educar cada qual no seu estatuto. Mas aí se a família discordar... Porque, por exemplo, um dos desafios da educação é que a família... Há uma tensão entre a vontade da família e a vontade do Estado, se nós dissermos... A família pode ter vontades diferentes, pode não querer que os miúdos aprendam, pode ter valores que se considerem
José Pacheco
errados, como é que... Pode, pode. Exatamente. Aí é o Estado que tem de intervir. Todos nós temos que aprender. Mas aí
José Maria Pimentel
há uma tensão, não é? E a família pode ficar fora do barco.
José Pacheco
Não, eu não acho que haja famílias que não queiram que os filhos aprendam. Podem é não querer aquele modelo educacional. Entender, por exemplo, se for uma fação política, se for uma seita, querer educá-los. Aí é discutível, mas eu não entro porque não quero. Crença é crença e eu não discuto crenças. Eu apenas peço respostas fundamentadas na lei e na ciência. E esse modelo que aí está, nem está fundamentado na lei nem na ciência. Ele está fora da lei e não tem fundamento nenhum. Quando eu digo o senhor dá a aula, eu dou. Porquê? Não sabe. Repara, se perguntar a um pedreiro porquê utiliza o fio do promo, ele explica. Se eu perguntar a um médico porquê utiliza o estetoscópio, ele explica. Um profissão não sabe explicar. Porquê que há turmas? Não sabe. Porque não há explicação. Não há uma explicação lógica, nem sequer lógica de bom senso. Não há, muito menos científica. O que me espanta e que me surpreende e que me magoa até é ver que há pessoas formadas em ciências da educação, e há muitas já, e que permitem que isto continue como está. E que até alinhem em projetos como esse que está para aí, da autonomia, gestão flexível, não sei o quê, uma porcaria de um projeto que não vai adiantar nada, já acabou, Aliás, como outros, nada modificou. Isso é que me preocupa. Porque até há uns anos atrás, nós não tínhamos gente especializada em Ciências da Educação. Eu sou do primeiro curso de Ciências da Educação. Fui do primeiro, no PUC em 87. E quando eu entrei no curso é que eu percebi que aquilo que tinha feito 20 anos antes tinha teoria por trás. Porque fizemos aquilo por amor às crianças e com intuição.
José Maria Pimentel
Por intuição.
José Pacheco
Podia até ter resultado mal. Resultou bem. Porque nós não fizemos as crianças com o beia. Fomos com muita calma. Passo a passo. Passo a passo, cheio de ameaças e pressões e prejuízos e tal, mas...
José Maria Pimentel
Mas qual é o papel da família e da comunidade neste modelo? Porque isso faz sentido de facto, ou seja, se a escola existir isolada do resto da experiência de vida do estudante, do aluno, significa que o resto dessa experiência não está a ajudar à aprendizagem e até pode estar a desajudar e, portanto, a escola é uma experiência isolada que depois não está integrada no resto da vida e acaba por não acrescentar. Mas como é que se faz essa integração?
José Pacheco
Olha, a família é a primeira instância educacional E os primeiros mil dias de vida são fundamentais. Uma das medidas que nós tomamos é que os avós nunca se afastem dos netos, pelo menos até os quatro anos de idade. Quando eu falo de nunca se afastarem, pode ser o contacto pela internet. Hoje nós temos tudo o que é preciso. Essa ruptura entre gerações é traumática e as pessoas não sabem isso. Por volta dos meia dúzia de meses de idade entregam uma creche e lá vai fazendo a sua adaptação na escolarização precoce. A família, ela tem por dever colaborar com o Estado e a sociedade. Eu vou dar exemplos muito concretos. Eu faço perguntas, por que é que há guerra na Ucrânia? A família tem o dever de refletir sobre isso, porque eu estou a falar daquilo que se chama o currículo universal das aprendizagens essenciais e a aprendizagem da paz é uma delas. O que a família tem é de rever princípios, identificar valores e compreender que aquilo que afeta a Ucrânia nos afeta também, em termos económicos percebe-se logo, mas não só. A família não tem que fazer tarefas de casa. Isso... Nem sei porque é que há tarefa de casa. Tarefas de casa. A família tem, é de... Dado que não teve oportunidade, quando foi aluno, de aprender essas coisas, que tenha pelo menos a oportunidade quando os filhos são tutorandos, sujeitos de aprendizagem. A
José Maria Pimentel
oportunidade que é de aprender também.
José Pacheco
De aprender também, porque não sabem. Ninguém sabe ser pai nem mãe antes de o ser. Não há curso para ser pai nem mãe, aprende-se fazendo. Eu quando tive a primeira neta, eu disse ao meu filho, agora que eu estava preparado para ser pai, já sou avô. É verdade.
José Maria Pimentel
Alguém disse que tinha uma frase muito parecida com essa.
José Pacheco
Mas acho que Não falhei muito, mas me ajudou bastante o fato de eu ser um educador diferente. Vou dar um outro exemplo. Crio que é no ensino secundário, tem uma disciplina em que se fala como agir em caso de pandemia ou endemia ou até lá. E há um conjunto de aprendizagens essenciais, que é o chamado currículo universal, ou de consciência planetária. Repara que a escola tem uma disciplina em que é abordado isso, mas nem sequer ensinou a lavar as mãos. E por isso, muitas vítimas houve por não saber lavar as mãos. Por exemplo, eu estive agora num município onde me surpreendeu que não fizessem a recolha seletiva de lixos, quando têm lá os receptáculos para o plástico, para o amido, o avó. O que é que eu faço com outra pessoa? Criamos uns caixotes para separar o orgânico do plástico, e assim fizemos, as criancinhas fizeram. Vieram os pais, misturaram tudo. Então a família tem que aprender que preservar o ambiente passa também por aí e que não ensinaram isso nessa escola... Como é que se convence a família? Não se convence. Mostra-se se a família estiver disponível para aprender. Eu
José Maria Pimentel
estou a insistir nesta pergunta porque isso é um obstáculo prático muito grande do ensino e algumas das coisas que leva é que o ensino propaga em vez de reverter desigualdades sociais, porque depois em casa tudo aquilo é revertido. E a
José Pacheco
escola reproduz o modelo social e desigualdade, é um berço de desigualdades e não de equidade.
José Maria Pimentel
Isso é verdade, mas mesmo que não o fosse, mesmo que a escola fosse neutra, depois os miúdos vão para casa e aí estão sujeitos à família, isso está mais do que provado, não é? Portanto, eu acho um ponto interessante do seu, do vosso modelo,
José Pacheco
integrar a família e tentar, enfim, colocá-la a remar no mesmo sentido, não é? Vamos lá então. Escolas são pessoas e as pessoas são os seus valores. A primeira coisa que se faz nos projetos que eu acompanho é determinar a matriz axiológica. Quais são os valores que a família tem como importantes? Quais são os valores que a criança traz para dentro da escola? Quais são os valores societais? Então nós teremos que perceber que nós somos valores. Implícito ou explicitamente as nossas atitudes refletem uma matriz axiológica. Quando se definem esses valores, definem-se princípios de ação. Princípios de ação. Tudo isto eu estou a fazer com muitos professores. Quando se definem princípios de ação, desenvolve-se uma intervenção chamada projeto. Projetos humanos são coletivos, ninguém faz nada sozinho. Nesse projeto, que se chama nas escolas projeto educativo, ou no Brasil projeto político-pedagógico, há um conjunto de conhecimentos chamado currículo, que nós teremos de
José Maria Pimentel
aprender.
José Pacheco
Dentro disto e dentro daquilo que o Estatuto da Criança prevê e a lei prevê, a família pode escolher a educação que ela considera. Se há um pai que quer que o filho seja agressivo, que bata nos outros, que seja maior, que seja... Vá para uma escola que faça isso aos filhos. É um crime, mas quem quiser que os filhos aprendam numa escola humanizada, porque nós não somos humanos, nós somos hominídeos. A humanização acontece através da educação, ok? Então, numa escola humanizada, como a Ponte ou outra, ou Open Learning School, nós recebemos alunos, entre aspas, de famílias que têm como valores, por exemplo, a paz, a harmonia, a cooperação, a solidariedade, o respeito mútuo, tudo isso. E portanto, se nós queremos solidariedade, respeito, não podemos ter aula, porque a aula estimula exatamente o contrário. Uma aula não desenvolve autonomia, desenvolve heteronímia, competição, frós. Quando eu olho para um projeto educativo das escolas, quando eu chego às escolas, Eu faço três coisas. Vou ao quarto banho dos alunos, depois ao quarto banho do professor e ao quarto banho do diretor, quando me deixam. É diferente. O quarto banho do aluno às vezes nem tem tampa na sanita, não tem papel higiênico, às vezes não tem, ela é racionada, não tem espelho, o quarto banho do professor já tem espelho, mas o quarto banho do diretor até tem ar-condicionado e tudo mais. Até de ficar e orinar existe hierarquia, que é uma das características do modelo, e é hierárquico, autoritário e corrupto.
José Maria Pimentel
Essa é bem apanhada.
José Pacheco
Intelectual e moralmente corrupto. Se quiseres eu provo. Bom, depois vou à biblioteca, que é o espaço por excelência de aprendizagem. Ou está fechada, ou está vazia, ou quando tem lá alunos. Eu pergunto se estão a pesquisar e eles dizem não, nós fizemos a janeira, estamos à espera de ir ao diretor. Ou seja, é fechada porque é perigosa lá dentro, vazia porque ninguém lá vai, só está lá um funcionário ou dois, e de castigo. Quando eu acabo esse rumo eu vou à sala dos professores e espero por eles lá. E como são meus colegas e eu respeito muito cada um deles, e tenho um filho que é professor, eu converso com eles. E o que eu escuto é, ah, já falta pouco para a apresentação, ah, já falta... É isto. Porque não vêem qualquer significado naquilo que fazem. Com as exceções, claro. E, portanto, o que me preocupa é que a sociedade ainda veja... Ainda creia que a escola é aquela que deve ser. E que sempre foi assim. Não foi! Esta escola só tem 200 anos. Só tem 200 anos. E há mais de 100 anos. Mas há 200 anos também não havia grande escola, não é? Havia, já havia. Só que era outro tipo de escola.
José Maria Pimentel
Mas olha, a escola, se assim chamávamos, a antiguidade, não era tão diferente assim. Não tinha o lado industrializado, mas o lado da preleção, ou seja, do professor, era idêntico? É
José Pacheco
curioso? Não, é não. Na América Latina, por exemplo, na América Latina, porque estiveram lá os jesuítas, criaram o trivo e o quadrivo, aquela treta toda. E era ótimo. Não havia aula. Cuidado. Era diferente. O que havia era um tipo de currículo imposto que normalmente os religiosos tinham de aprender. Depois quando começou as guerras da independência, O Simão Bolívar, o grande libertador da América Latina, conseguiu com o Santander, que era um general, impor uma constituição em Nova Granada, que agora é na América do Sul, no norte da América do Sul. E o que é que ele fez? Chamou Lancaster. Quem era o Lancaster? Era um sujeitinho, um educador inglês que levou para lá o quê? A aula. Ou seja, ia para as igrejas, que não havia prédios de escola, e ensinava através de monitorização, que é, ensinava 10 e os 10 ensinavam 100 e para e vai. Aí entrou e depois o Pedro II do Brasil teve a bem feliz ideia de chamar também alguns desses lá para o Brasil. Então instalou-se, existe desde há 200 anos. Só que há 100 anos atrás, mais ou menos há 100 anos, uma senhora chamada Maria Montessori, um senhor chamado Jean Dieu, outro Keilo Pétrica, um Steiner das Waldorf, o Freinet da Escola Moderna, o Deckeroli de 213 e para aí vai. O que é curioso é que isso já tem 100 anos. Tem cento e tal anos. O primeiro foi aqui no Portugal, em Portugal foi muito cedo, em 1915 o Adolfo Lima na escola oficina número 1 de Volha do Operário fazia isso, chamada Escola Nova. Imensos, imensos, Faria de Vasconcelos e tudo mais, depois da Irã de Lisboa, toda essa gente, Bento de Juscará, São António e Sérgio, tem uma peleia do Agostinho da Silva, pronto. Então todos eles dizem que o centro não deve ser o professor, deve ser o aluno. E o que é que nós temos hoje? O centro é o professor. Pior, nas formações de professores dizem que o centro é o aluno, estão a dar aula sentado no professor. O que eu chamo de esquizofrenia básica. Porque diz uma coisa e faz outra. O que fica? Aquilo que a pessoa sente, aquilo que a pessoa vivencia. Dar aula, quando eu vejo metodologias ativas em sala de aula, é impossível. Em sala de aula a pedagogia é inativa. A metodologia é inativa.
José Maria Pimentel
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José Pacheco
difícil? Existem explicações de natureza sociológica, psicológica, etc. Posso dizer-te que há uma corrente da sociologia, que tem vários autores, que não vou referir, não vale a pena, mas posso dizer, por exemplo, de Filipe Verdi, que diz que a escola reproduz o modelo social e escolar, ou seja, reproduz a sociedade de quê? Porque todos os rituais, tudo aquilo que na escola se passa, é para reproduzir o modelo económico, social que existe. Para que as pessoas continuem a ser consumistas, para que as pessoas continuem a competir umas contra as outras, que acabe em guerra, em última instância, não é? É isso que acontece. Mas há uma coisa que eu estranho mais, é que a primeira escola no mundo, escuta bem José, a primeira escola no mundo que conseguiu passar o centro no professor para o centro no aluno foi a escola da Ponte, uma escola portuguesa, Há 46 anos. E o que aconteceu? O Ministério fez tudo para acabar com ela. Porque acabou com muitas que tentaram. Connosco não conseguiram. Mas criaram moça. Mas porquê que o Ministério queria acabar com a escola? Porque o Ministério não tem educação, tem burocracia. Tem burocracia! Aliás, o Ministério erra naquilo que faz e está fora da lei. Porque se tu olhas para o artigo 48º da Lei de Bássimo Sistema Educativo, nos três primeiros pontos, Tu vês que o Ministério está fora da lei. Diz lá, por exemplo, que os professores devem residir na comunidade onde trabalham. Por exemplo, sistema de colocações é assim? Não é. A pessoa vai para longe e acabou. Segundo, deve ser democrática a educação. Não é. Não é. Porque o diretor pode pensar diferente, mas a ordem que vem de cima ele tem de cumprir, tem dever de obediência hierárquica. Terceiro, diz lá que nas decisões de política educativa deve prevalecer critério de naturalidade científica sobre as administrativas. O que acontece? O que prevalece é a critério de naturalidade administrativa. Então, fora da lei, totalmente. O que aconteceu na Ponte foi um milagre, praticamente. É uma história de sofrimento e resiliência. Eu um dia vou escrever a história da Ponte, porque ninguém a conhece. Eu a conheço porque estive lá 30 anos e depois estou há 16 anos praticamente fora, não é? Mas aquilo que eu ia dizer, nós criamos condições de passar o centro no professor para o centro no aluno, ou seja, do paradigma da instrução para o paradigma da aprendizagem. Mas em meados deste século que passou, começa a emergir com as novas tecnologias, as tecnologias digitais, a ideia de que o centro não é o aluno, o centro é a relação, o centro é a comunicação, o centro é o vínculo que se estabelece, Ou seja, o paradigma da comunicação. Estamos no tempo 4.0 no paradigma da comunicação a trabalhar no 1.0 do paradigma da instrução. Nem sequer no da aprendizagem.
José Maria Pimentel
Mas o paradoxo aí, nós podemos ter uma explicação em relação ao sistema, não é dizer que o sistema é tão, digamos, opressor que é difícil fazer essa mudança, mas os professores têm alguns graus de liberdade para, pelo menos, movimentar-se um pouco nesse sentido. Não necessariamente para fazer essa transição toda, porque aí se calhar entrava-lhes o Ministério e outros... E os pais, enfim, uma série de coisas em cima que os impediria, mas pelo menos para convergir um bocadinho nesse sentido. E muitas vezes não o fazem, que é um certo paradoxo, porque o que acontece é um professor que consiga que coloque o centro no aluno, dessa forma parece que se está a desprivilegiar, mas é ao contrário, está a ter uma relação mais motivadora, que o preenche mais e sobretudo se conseguir criar esse vínculo. E todos nós nos lembramos, os melhores professores que nós tivemos, normalmente, conseguiam justamente criar esse vínculo. Portanto, é um certo paradoxo, porque é melhor para os professores. Se calhar dá mais trabalho, também. Ou exige mais certa coragem, talvez.
José Pacheco
Tu disseste que os professores têm uma certa margem de autonomia. Eu vou-te dizer que têm toda a margem de autonomia.
José Maria Pimentel
Assim queira. Mais ainda, então, eu estava a admitir que podia não ter toda.
José Pacheco
Porque quando eu deixei de dar aula, eu não tenho nada contra a aula, eu dou aula quando é preciso, não tem problema. Mas quando eu deixei de dar aula, os inspectores iam lá e queriam me obrigar. E eu perguntava porquê que eu tenho de dar aula. Eles não sabiam explicar. E se eles não explicavam, eu não fazia. E quando eles diziam, ah, mas eu sou superior e hierárquico. Eu sei que é superior e hierárquico, mas tem que me explicar porque é que eu tenho de dar aula. Ah, porque tenho de dar aula, não, desculpe. O senhor tem que me apresentar. Ainda Não havia lei de bases. O artigo 48º, que no princípio era o 45º, depois que o Jorge Avizanjo passou é o 48º, ainda não existia. Eu estava com uma lei do tempo da ditadura. Mesmo assim eu perguntava e que não me dava uma explicação, eu tinha toda autonomia. Se não me explico o que é que eu tenho de dar aula e não dou. Faço outra coisa e a outra coisa está fundamentada cientificamente. Essa é a grande diferença. Quando me dizem, ah mas a escola não tem aula, a escola da ponta não tem turma, eu pergunto o que é que tem? Dizem que não tem, não tem, não tem. Era uma casa muito engraçada, não tinha teto, não tinha nada. O que é que tem? Eu explico a diferença entre uma escola comum, que tem aula e tudo mais, e a escola da ponta, é só esta. É que na escola comum o direito à educação não existe. E na escola da ponta, nestas escolas, todos têm direito à educação. É esta a diferença. E é uma boa educação, uma educação integral, que vai ao encontro da multidimensionalidade do ser humano, do intelecto, mas também do afeto, da emoção, da ética, da estética, da espiritualidade e tudo mais. Essa é a diferença. Enquanto houver aula e turma e tudo mais, não há direito à educação para a maioria. Mas por que os professores não fazem essa mudança aos próprios? É uma cultura. Porque o maior obstáculo à mudança sou eu, é o professor, a sua cultura profissional. E A cultura profissional é aprendida por contágio, por imitação, por exemplo, repara, quando um médico entra num curso de medicina, ele faz o curso e depois vai fazer residência no hospital, faz o estágio e depois. Um engenheiro entra na faculdade de engenharia, um aluno, sai engenheiro e vai fazer as suas aplicações no estágio, num gabinete de engenharia. O professor não é assim. O professor entra em estágio aos seis anos. Agora até mais cedo. Está há doze anos a ouvir aula. Entra na faculdade, dizem que o centro é o aluno, mas dão aula. Eles vão dar aula. Obedecer um diretor que obedece um ministério. Teve o dever de obedecer, era uma coisa horrorosa. Falta de dignidade profissional. O diretor não concorda, mas tem que fazer, tem que mandar fazer. Por isso é que a escola da Ponte não tem diretor, ou que não tinha. Agora já está um pouco deteriorada porque um infeliz do Nuno Cato arranjou complicações lá na escola. Mas a coisa vai virar porque agora temos o João Costa, temos o João Costa e temos o António Leite, que eu conheço muito bem, cuidado, em um governo de maioria absoluta. Não há desculpa nenhuma neste momento. Eu falo assim, para
José Maria Pimentel
uma agitada... Mas maioria absoluta é mais controle que irá ter,
José Pacheco
não é? É, mas um controle no bom sentido. Porque João Costa sabe muito bem que depois que há fora o 54 e o 55 de 2018. E é para cumprir, não é para fazer de conta que faz. Acha
José Maria Pimentel
que ele vai dar mais autonomia às escolas?
José Pacheco
Eu quero acreditar que não vai dar mais alguma autonomia. Vai reconhecer a autonomia da escola. Também vamos falar um pouquinho disso. Quando em 1976... Eu peço desculpa te falar assim tão empolgado porque eu não consigo falar de outra maneira. Eu estou velho e são cinquenta e tal anos nesta história. Enfim, eu não entendo porque é que as coisas continuam como há cinquenta anos. A teoria mudou, mas a prática é igual. Então, quando nós começamos eu percebi que eu não tinha autonomia nenhuma. Tinha, mas não tinha. Eu arriscava-me processos disciplinares, ameaças, tipo situações terríveis. Fui muito prejudicado, muito prejudicado. Eu fiquei em primeiro lugar em alguns concursos e tiraram-me de primeiro lugar os políticos, porque eu era perigoso, não é? Bom, quando vem a Lei de Bases de Sistema Educativo, em 86, a autonomia aparece lá, termo, só que faltava regulamentar. E com João Barroso e outras pessoas, Lá fomos ajudando a fazer aquilo que se chamou o Enquadramento Jurídico da Autonomia das Escolas, decreto-lei 43-89 de 3 de fevereiro. Eu sei até os artigos todos deitinhos, ok? Mas, repara bem, três anos para fazer um documento básico. Em 89 começámos a desenhar, mais o João Barroso, o decreto que sairia em 1998, nove anos depois. E em 2004 foi criado e celebrado o primeiro contrato à autonomia do mundo, entre uma escola pública e o Estado, a Escola da Ponte. Repara, de 76 a 2004 são 28 anos, ok? Tudo bem. 98 é um momento extraordinário porque se reconhece à escola a capacidade de desenvolver um projeto e um modo que todos aprendam. Quando eu chego a alguma escola e pergunto a um professor olha o que é que diz no seu projeto educativo da escola sobre avaliação? A pessoa não leu. Está para ser o primeiro professor que tenha lido o projeto. Mas está na lei que a escola existe porque tem um projeto. E as pessoas têm que fazer tudo em função do projeto, mas nem conhecem o projeto. Cada um na sua sala de aula vai fazendo aquilo que pode, coitado, e faz muito bem às vezes até. Bom, acontece que em 2008 resolvem mudar a questão. Por exemplo, uma das coisas. No decreto de 98 era possibilitado que não houvesse diretor de escola, que houvesse conselhos de direção, ou seja, em vez de haver um órgão unipessoal, comandão, capataz, não é? Era um órgão inclusivo. É. Em 2008 introduzem novamente o diretor. Para quê? Maior controle. E o diretor o que é que é? A maior parte dos diretores do agrupamento, neste momento, eles estão há mais de 20 anos no posto. A maioria nunca põe os pés no chão da escola, nem sabe o que lá se passa. Delega no seu vice a questão pedagógica. O que é que ele está ali a fazer? É um amanuense? Se é um amanuense, vai tirar um curso de administração e fique num escritório, que não vá para a escola. Porque aquilo que ele faz não tem critérios de natureza científica por trás. Ele apenas obedece ordens de superiores hierárquicos. E é muito pior no ensino dito superior. Aliás, a palavra já é terrível. Ensino superior. Eu prefiro a aprendizagem inferior. Porque repara bem que as palavras produzem e reproduzem cultura. Em que é que a universidade é superior? Superior a quê? Em quê?
José Maria Pimentel
Presupõe um outro. Presupõe um que vem antes.
José Pacheco
Tá bem, porquê é que há esse sítio secundário? É secundário ou é preparatório da faculdade? Porquê é que há ciclo? Porquê é que há ano? Eu só pergunto porquê. Se alguém me explicar eu calmo para sempre. Como ninguém me explica, eu pergunto. E se quiserem que eu haja em função de ano e ciclo, eu pergunto, é ciclo ou é ano? Porque eu estive na experiência dos ciclos e sei muito bem porquê que é ano. Porque os editores e livreiros quiseram vender livro por ano e não de quatro em quatro anos. Por exemplo. Mas
José Maria Pimentel
acha que é só por isso? Ou seja, tem
José Pacheco
que haver... Não é só por isso. Não
José Maria Pimentel
é. Quando existe uma organização em larga escala, como um país, ela tem que ter um certo planeamento e portanto uma certa compartimentalização
José Pacheco
das coisas, não é? Tem. Porquê? Ou não? Acha que não? Não, acha. Não acho. Eu falo e fundamento. Eu sei que tu queres dar com isso, mas o achismo não existe para mim. Estou proibido de achar. Eu apenas pergunto. Porquê que há? Porquê que tem a ver? Sabes? Ninguém sabe. Ninguém sabe. Se não, apresenta-me alguém que me diga porquê que há.
José Maria Pimentel
Tem a ver no sentido em que o ensino é como o edifício, não é? Pelo menos em certo sentido.
José Pacheco
O ensino, dizes bem, o ensino. A aprendizagem não.
José Maria Pimentel
Não, a aprendizagem. A aprendizagem é a nossa aprendizagem. Aquilo que nós aprendemos, nós vamos construindo... Sim, ao longo da vida. Sobre bases, não é? E isso também segue o nosso próprio desenvolvimento cognitivo, que varia de pessoa para pessoa, mas que tem uma correlação com a idade. Acha completamente absurdo que o sistema esteja organizado... Como está? Enfim... Com certeza! Acho que não devia haver anos de todo, ou seja, devia haver uma mistura completa entre um miúdo de 3 anos e uma pessoa de 18? Eu
José Pacheco
não faço assim, eu não falo dessa maneira. Eu pergunto porquê que... Vou-te fazer uma pergunta muito simples para tu talvez seja melhor perceber porque não tem a ver propriamente com o registro cognitivo. Porquê que o quarto de banho do aluno não é o mesmo quarto de banho do professor. Sabe se explicar-me? Lá em casa há quarto de banho de pai e quarto de banho de filho? Ok? Primeira pergunta. E por aqui vou. Dá para entender? Ok. Então, quando me dizem ah, tem que ser por... Eu pergunto, porquê tem que ser por ciclo? Eu trabalhei numa experiência chamada experiência de fase única, em 1976. Foi uma experiência muito importante e participei no relatório final. E aquilo que eu percebi é que não tinha de haver fase, nem ano, nem nada. Nós aprendemos ao longo da vida. Aliás, em 1990, em Juntiem, houve uma declaração que Portugal assinou e que mostra isso. Porque é que tem de ser dividida em ciclos? Não tem de ser dividida em ciclos.
José Maria Pimentel
Mas não há uma mudança? Ou seja, eu entendo isso, mas Esta relação não é estanque, não é direta e homogénea, mas existe uma diferença na aprendizagem num meio de três anos ou de uma pessoa
José Pacheco
de um ano. Com certeza! Mas isso é evidente, não é? A questão é outra. Eu pergunto sempre porquê é que tem de haver antesclaridade... Por exemplo, porquê é que tem de haver monodecessência no primeiro ciclo? Porquê é que é um professor sozinho no primeiro ciclo? E depois tem uns 10 ou 12 no segundo ciclo? Por acaso não sei porquê. Ninguém sabe. A questão é essa.
José Maria Pimentel
É que tem a ver com o vínculo. Com a importância que se reconhece ao vínculo naquela idade.
José Pacheco
E depois perdes o vínculo. Uma vez convidaram para um
José Maria Pimentel
debate. E com a especialização também. Tem a ver com a especialização?
José Pacheco
Tem. Ou seja,
José Maria Pimentel
um educador de infância, por suposto que não precisa do grado de especialização.
José Pacheco
Aí teríamos muito de conversar sobre formação de professores. Mas podemos ir por aí. Mas aquilo que eu ia acrescentar era que um dia fui convidado para um congresso sobre traumatismo na transição entre ciclos. Ok, eu fui. E sentaram-me numa mesa com um psicólogo e uma socióloga. A psicóloga falou, disse que essa transição do primeiro século para o segundo causava transtornos incríveis, que a criança ficava muitas vezes com febre, que tinha sudação espontânea, até incontinência urinária. Eu fiquei espantado, eu nunca tinha sabido. O drama era bem maior. O sociólogo, então, as implicações na família, um problema sério. Quando chegou a minha vez, o que é que eu vou dizer? O que é que eu faço? Eu pergunto, não é? Quando eu chego a algum lugar eu pergunto, num web discurso. Eu perguntei, o que é que querem saber sobre isso? Ficou tudo calado, que aliás é regra, não é? Ninguém pergunta nada, não é? Eu um dia fui fazer uma pesquisa para saber porquê é que os professores não fazem perguntas. Eles só dão respostas, não é? Há perguntas que nunca foram feitas. Então, a conclusão desse estudo foi um estudo lá na América do Sul. É este, é que até aos 6 anos de idade, cerca de 100%, perto de 100% das crianças fazem perguntas de modo espontâneo. Porquê? Porque o céu é azul, de onde é que vem os vaivés, essas coisas todas. No fim do ensino básico, menos de 10%. E no fim do ensino secundário, menos de 1%. Por isso é que eu quando chego ao chão de uma escola e pergunto a uma criança, o que é que tu queres saber? A criança pergunta-me, eu posso dizer? Eu posso dizer! Acabaram-lhe com a curiosidade, Proibiram-me de perguntar.
José Maria Pimentel
A escola faz muito isso.
José Pacheco
Claro. Depois quando eu pergunto, o que é que tu queres ser, então aí a coisa é bem pior. Bom, mas concluindo, eu estava naquele debate, perguntei o que é que quero e ninguém falou, eu disse então pronto, se ninguém pergunta eu vou fazer perguntas. Três perguntas. Há traumatismo na transição? Porque há transição, não é? Se deixar de haver ciclos, deixa de haver transição, não é? Então, se deixado haver transição, deve haver trauma, não é? E acabei. Ficou tudo lá para mim. Ou seja, o que eu perguntei, por que é que há? Um dia um inspector disse-me, o senhor tem de ir para a sala de aula. Mas porquê? Porque é a continuação da família. Eu disse, mas quem eu saiba na família tem um casal. Portanto, arranjo-me aí uma mulher para vir para aqui que somos um par. E ele começou a sair. Ou seja, vim treinar-me no bom senso ou na brincadeira. Ele veio para a coisa para a brincadeira. Que é mesmo o que a gente tem de levar, ser um pouco o infante grande dentro de nós, porque senão não se aguenta, acaba-se no psiquiatra. É tão cretino a maneira como se organiza o sistema e com tão trágicas conclusões e efeitos que é, bem profundos, e continua-se a insistir nesta porcaria de sistema de ensino, é isto que eu não consigo entender.
José Maria Pimentel
Falou aí agora da curiosidade dos miúdos e da escola, no fundo, matar um pouco essa curiosidade, e realmente é isso que acontece, é outra das críticas que é muitas vezes feita, e é evidente que é verdade, porque colocas os alunos numa lógica de lhes servir no prato aquilo que eles têm que aprender e eles não terem sentido crítico e não irem atrás da curiosidade que têm. E, portanto, faz todo sentido que a escola reverta esse movimento. Mas, por outro lado, também pode haver miúdos cuja curiosidade não seja tanto assim, não é? Ou que não tenham essa vontade, ou a sua experiência não é essa.
José Pacheco
Pode ter sido historiador na família também, não é? Opa, porquê é que é assim? Pode não
José Maria Pimentel
ter. Nem porquê é assim. Imagino, pode não ter uma apetência por pensamento abstrato, pode não ter curiosidade por determinados temas. Como é que se põe um miúdo a aprender história se ele não tiver curiosidade por aquele tipo de temas? Ou não se põe? Também é uma resposta possível. O meu filho André,
José Pacheco
a minha especialização é alfabetização linguística, portanto eu ensinei a ler muito, a criança é muito jovem, muito adulto. Em três meses eu ponho uma pessoa a ler, em três meses, não a preciso mais, Porque me especializei nessa área, sei várias abordagens metodológicas, etc. Mas o meu filho nunca teve a potência para a leitura escrita, ele tinha para os números. Ele hoje é professor de matemática, é excelente, e é um homem que lê muito e escreve. Ele tem um blog e tudo mais. Não me preocupa. Eu tenho é que perceber qual é o potencial daquele ser humano, o que é que ele quer fazer da sua vida, quais são os pontos fortes, digamos, que tipo de personalidade ele manifesta, etc, etc, etc. E isso a partir de logo...
José Maria Pimentel
Mas quando diz não o preocupem, não o preocupa em que sentido? Ele há de chegar lá quando aquilo lhe for útil?
José Pacheco
Não. Sim, sim. Cada um de nós é único e repetível. E cada um de nós tem talentos, vocações, que importa desenvolver. As salas de aula são cemitérios de talentos. Cemitérios. Então, vou-te dar alguns exemplos. Posso? Porque quando eu estou a falar da forma como tenho falado até agora, me sinto mal até. Eu gosto mais de ilustrar, porque é muito mais fácil. Vamos lá. Chega uma menina, nove anos, que não quer aprender
José Maria Pimentel
nada.
José Pacheco
É-lhe perguntado o que é que tu queres fazer. Nada! O Océano é meu pai, não me pode obrigar. O que é que tu queres ser? Eu quero ser rapper. Ok. A pergunta é, posso te ajudar a ser rapper? Ele olha para mim e diz, você é mesmo professor? Sou. E quer me ajudar a ser rapper? Quero. Essa menina aos 9 anos começou a aprender a ler, a compor, a escrever, a cantar, a dançar, criou uma microempresa com uma tia de rap e aos 13 anos foi participar na abertura dos Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro. É uma das maiores rappers do Brasil. É Missy Sofia. Estou a falar de gente. Pessoas. Escolas são pessoas. Mas ela aprendeu a Raios
José Maria Pimentel
Quadradas, por exemplo? Sim, tudo. Tudo que precisava. Mas que utilidade é que... Não, aquela resposta a isto, possível, quer dizer, não, ela não teria que aprender a raiz escolar. Não
José Pacheco
sei se aprendeu. Se aprendeu,
José Maria Pimentel
aprendeu porque precisou. Mas se não precisar, não aprende.
José Pacheco
Não, mas são as aprendizagens essenciais.
José Maria Pimentel
Não, não, estou a lhe perguntar isto porque há duas hipóteses. Eu estou a tentar perceber qual é a sua proposta. Se é que os miúdos vão aprender tudo aquilo que é necessário estar estabelecido no programa. Se nós lhes criamos essa necessidade ou... De
José Pacheco
maneira nenhuma. Se há coisas
José Maria Pimentel
que podem não ser necessárias para eles aprenderem. Repara,
José Pacheco
Eu andei em eletrotecnia. Era um excelente aluno de eletrotecnia. Eu hoje nem a instalação de uma lâmpada sei fazer. Porquê? Porque não aprendi. Porque não tinha significado. Porque tinha de fazer aquele curso para ter uma vida... Enfim, que ganhava muito bem. Vou dar mais dois exemplos. Um exemplo é este. Estava aí uma menina de 9 anos que não queria estudar. Eu lhe perguntei o que é que tu queres ser? Ela, cientista. Mas porquê? Porque eu vi numa revista que os Estados Unidos, a NASA, aqueles que mandam fotões para o espaço, eles dizem que o ser humano vai desaparecendo da Terra e estão à procura de um planeta onde possa viver o ser humano. E é isso que preocupa? É. Ela fez um projeto do currículo da consciência planetária, ou seja, das aprendizagens essenciais, que é a aprendizagem da solidariedade, por exemplo, ou da consciência da preservação ambiental e aos 13 anos foi para a NASA convidado, foi para Washington. Dá para entender? Outro exemplo e último, criança na ponte, Já agora vou voltar à escola da Ponte. Um jovem com Trisomia 21, síndrome de Down, com 9 anos, nem sabia ler o nome dele e o relatório dizia que ele nunca iria aprender a ler. Perguntei-lhe o que é que tu queres ser? Ele disse, eu posso dizer que podes. Guarda-redes. Projeto de vida para eu ser guarda-redes. Quando Portugal ganhou o campeonato europeu de futebol de salão em 2018, o guarda-redes da seleção nacional portuguesa é o André Mesquita. Tem a medalha de ouro do Conselho de Santo Tirso. E aos nove anos a psicóloga disse que ele nunca iria aprender a ler. Que iria passar a vida numa sala de apoio a fazer joguinhos idiotas, como passam. Dá para entender o que eu estou a falar. Então, porquê que há aula? Porquê que há turma? Expliquem-me. Porquê que há psico? Porquê que há prova? Porquê que há diretor? Porquê que o quarto bem do aluno é o mesmo professor, porquê que todos têm que entrar à memória, ser à memória, porquê que há anulete, porquê que... Se me explicarem porquê que há, Este velho se cala para sempre, se remete para a ignorância que tem. Enquanto não me explicarem, eu pergunto, porquê que
José Maria Pimentel
é? Não acha, por exemplo, que... Isto não é necessariamente uma justificação, mas... Grande parte da gestão de organizações grandes, isto aplica-se, enfim... Pode-se aplicar a empresas, pode-se aplicar à política, é muito mais do que maximizar o resultado, é minimizar os riscos, ou seja, minimizar os casos em que a coisa corre mal. E é mais ou menos evidente, acho eu, para toda a gente, que o sistema atual não é um sistema que produza muitos bons resultados nesse sentido. No sentido em que a aula de facto é um cemitério de talentos, muitas pessoas que teriam talentos imensos que não são aproveitados ou têm curiosidades que são completamente contrariadas e cuja aprendizagem não segue, o método de aprendizagem não segue o tipo de personalidade que aquela pessoa tem. Mas do ponto de vista do Ministério, ou seja, do ponto de vista de quem está a gerir, compreende-se, acho eu, em certo sentido, que há já o receio de que se o sistema fosse completamente livre, havia escolas que iam fazê-lo bem, mas outras escolas que iam perder-se completamente pelo caminho. De repente, tínhamos uma geração de alunos que não tinham
José Pacheco
aprendido nada. Não, e teria de haver aquilo que não existe, que é um conjunto de pessoas que fossem acompanhando as escolas todas, escola pública, e vissem realmente se havia escolas que precisariam de alguma ajuda, de alguma...
José Maria Pimentel
Mas esse acompanhamento é que é um eufemismo, não é? Porque o que eles estariam a fazer era a controlar.
José Pacheco
Não, não, é diferente. Por exemplo, quando eu falo da avaliação de desempenho do professor, pensam que é a caça às bruxas. Ele tem maus resultados nos alunos. O que acontece é que muitos dizem que quanto mais a prova, melhores professores são. Não é nada disso. Quando havia algum professor que não cumpria um projeto dentro da Ponto, dentro de um projeto Ancro ou outro qualquer, dois professores acompanhavam durante um tempo para que ele percebesse como é que ele deveria agir. A avaliação de desempenho é para isso que serve, para ajudar o outro a perceber que tem de... Compreendes? Não é estar a penalizar o outro, a prejudicá-lo, não, nem a dispensá-lo. Todo ser humano é educável, todo ser humano precisa de ajuda desde que nasce. Então, é nesse sentido que eu digo que deveria haver, não uma inspeção geral, porque até a Finlândia acabou com isso, acabou com os exames e tudo mais, mas deveria haver um corpo de pessoas no Ministério que fossem acompanhando as escolas e que ajudassem aquelas que porventura não estivessem a garantir o direito à educação. E
José Maria Pimentel
disse agora, todo ser humano é educável. Isso é verdade?
José Pacheco
Todo, todo. Dentro, claro, dos limites de cada um, de cada qual. Eu aqui não falo, a minha dúvida não tem a ver com capacidades
José Maria Pimentel
cognitivas. Digo, pode haver alunos que não tenham curiosidades para ir além, ou não sei... Estou a fazer um bocadinho de advogado do diabo, não é? Como é que se educa um aluno psicopata, por exemplo, neste ambiente que vive do vínculo e da relação social, por exemplo? Isso perde-se, não é?
José Pacheco
A questão era ir antes, saber porquê é que ele é psicopata. Nos casos já é genético, não é? Não, cuidado, cuidado com isso. Há questões de ordem genética, isso há, mas a maior parte... Não,
José Maria Pimentel
porque a psicopatia tem uma explicação evolutiva, não é? Isso não implica dizer que a pessoa X que está ali é psicopata por razões genéticas, implica dizer que existe na população a psicopatia na genética, digamos
José Pacheco
assim. É um trabalho que tem de ser feito entre a psicologia, a recense social e tudo mais, lógico. É um trabalho de equipe que ajuda a pessoa a ultrapassar os seus limites, os seus traumas, as suas... Mas isso são casos particulares. Excepcionais. O que é preciso perceber é que o currículo que existe, que está aí, parece que é comprido, ele não é cumprido. Por exemplo, vou-te dar um exemplo muito simples. No ensino do primeiro ciclo, são dez disciplinas, só se dá português e matemática. Música, há uma cantoria no Natal, educação física é quando...
José Maria Pimentel
Educação física é um desastre.
José Pacheco
A expressão dramática nem se fala, a expressão plástica acabou. Eu pergunto, isso está dentro da lei? E depois fazem a coadjuvação, ou seja, vai um professor de educação física do segundo ciclo fazer um favor e o professor para onde é que ele vai? Vai a fazer não sei o quê. O que é que é isto? O que é isto? Depois fazer recuperação das aprendizagens. Baila-me, Deus, recuperação das aprendizagens. O que é isso? Durante a pandemia, eu continuei a trabalhar com os meus projetos, os nossos, da mesma forma que antes e depois. Aqueles jovens não perderam um dia porque tiveram permanentemente em contato com o seu doutor, presencial e remotamente. Se a escola estivesse organizada dessa maneira hoje não teríamos aquilo que temos, que é uma grande evasão, pessoas que não voltaram... Há
José Maria Pimentel
muita gente que diz que a escola pública teria que ter muito mais meios para conseguir fazer isso. Isso é uma coisa que as escolas privadas conseguem fazer, mas que no ensino
José Pacheco
público... Não precisa de mais meios. Precisa é dos meios. Precisa de uma boa formação. Precisa da autonomia. Se houver autonomia verdadeira, que a escola da Ponte já teve e parece que perdeu, agora vou saber, e houver uma boa formação de professores, e se não houver um controle hierárquico como existe, que é um controle burocrático, administrativo, as coisas mudam totalmente. Eu tenho muita esperança que este governo faça aquilo que está no programa de governo. Eu vou cobrar.
José Maria Pimentel
Só isso parece-me um bom motivo para depois ouvir esta conversa daqui a quatro anos. Lembrei-me agora de uma pergunta, porque o José já falou várias vezes da competição e da maneira como a escola estimula a competição e, de certa forma, como isso é estimulado na própria sociedade e isso é pernicioso. Mas isso não faz parte também da natureza humana?
José Pacheco
Não. Também faz.
José Maria Pimentel
Ou seja, não é para si... Vamos... Vou até provocá-lo. Não é motivador para si, José Pacheco, ser uma referência nesta área, por exemplo? De maneira nenhuma. Zero?
José Pacheco
É acidental. Eu não fiz as coisas que fiz
José Maria Pimentel
sozinho. Eu não estou a dizer que foi só por isso, mas isso não o motiva?
José Pacheco
Não, eu não... Olha, o pássaro Dodó reuniu os animais todos e perguntou querem fazer uma corrida? Eles dizem sim. Então partida. Cada um foi e voltou. Eles perguntaram quem ganhou? Todos, porque cada um correu dentro do seu circuito. Então...
José Maria Pimentel
O global não teve um grande fim, não é? Pois não.
José Pacheco
Exatamente por isso, não é? Exatamente. Exatamente por isso. Porque o nosso é competitivo. Pois que não. A competição pode estar dentro dos genes, não é? Mas eu penso que a colaboração, a cooperação é bem mais forte no ser humano. Porque se fosse pela competição já não existiria a espécie.
José Maria Pimentel
E é um jogo de soma nula, por natureza. Ou seja, concordo consigo nesse aspecto, mas estava aqui a fazer um pouco de advogado do diabo, dizendo isto de outra forma. Concordo consigo, mas acho que nós temos também na nossa natureza um lado competitivo que não é necessariamente negativo. Competitivo no sentido de nos afirmarmos e isso puxa também pelos outros, não é? E no ensino também acontece isso, não é? Se eu... Vamos usar a analogia da turma por um momento, não é? Se eu for o melhor aluno e surgir outra pessoa na turma que também é muito bom aluno, nós vamos puxar um pelo outro, não é?
José Pacheco
E o que é o melhor aluno?
José Maria Pimentel
Vamos deixar de lado o que é que isso significa, não é? Mas o primeiro é conseguir marcar o campo da miúda que nós falámos no início da conversa, não é? Que tem aquele desafio de marcar o campo e fazer o retângulo, não é? Se ela estiver com o irmão ou com a irmã a competir, isso também a estimula, não é? Esse lado também é... Eu gosto muito de jogar.
José Pacheco
Eu gosto muito de jogar e até gosto de fazer batota quando estou a jogar. Porque o jogo é o jogo. Eu adoro jogar a sueca, jogar xadrez. Eu jogo muito xadrez. Todos os dias jogo xadrez. Mas o xadrez é um jogo onde a pessoa é informada de que está em perigo. É o único jogo. Olha, cheque, cuidado, o teu rei está em perigo. Ou seja, é uma gentileza que me apaixona. E depois, porque no final se cumprimenta o outro. Não importa quem ganha, o que importa é jogar. Eu gosto de jogar, mas nunca na perspectiva da competição. Mas acredito que haja competição, digamos, entre animais, entre... A sobrevivência gera muitas vezes competição, não é? Eu não posso ocupar o espaço do outro, a sobrepopulação cria a necessidade de competir.
José Maria Pimentel
Mas eu aqui falava, desculpe, eu aqui falava da competição enquanto nos seus aspectos positivos, que ela tem obviamente negativos, mas pode também ter um aspecto positivo da pessoa puxar uns pelos outros. E isso no
José Pacheco
convívio social não é... Eu defendo... Olha, eu vou-te dar exemplos.
José Maria Pimentel
Mas enfim, eu não sou... O pedagogo aqui não sou eu. Não, somos todos, somos
José Pacheco
todos. Mesmo que não saibamos, somos todos. Quando eu introduzi a prática dos xadrez na ponte, aquelas crianças diziam, podemos jogar em equipe? Porque já estavam completamente... Eles jogavam três de cada lado, discutiam qual era o lance. Curioso, não é? O que não é, por acaso não é nada, não parece nada mau método. Depois, criam equipes primistas. Por que é que não é moço e moça juntos? Quando houve um campeonato de futebol, diziam, por que é que a gente não joga junto? Até porque o melhor jogador era uma moça, que tinha um ponto na pé incrível, ela era forte. Então eles queriam que ela tivesse, mas não deixavam. Porquê que há? Há uma coisa que a gente tem de se perguntar. O que é isso de competir? Eu compito, compito comigo. Todos os dias eu ponho em causa as minhas certezas. Todos os dias eu questiono a minha arrogância, perco, perco todos os dias, todos os dias eu questiono os meus saberes, não sei nada, eu quero é aprender. Quando a criança entra na escola, apresenta-se de um cardápio, que todos têm de concluir, sem saber porquê, têm de competir porque por uma centésima não entrou na universidade, entrou o outro, o outro é o inimigo. Que raio de cultura é esta? Claro que a Maria Montessori já há 100 anos dizia que uma escola que gera competição gera guerra. É, digamos que a última consequência é essa. Os países competem, as ideologias competem, os interesses econômicos competem, Os blocos competem e quem fica no meio são os milhares que morrem ali inutilmente. É isso que esta educação, não é escola só, que esta educação produz. Em pleno século XXI, enfrentamos uma tragédia como aquela que está a acontecer e que não é só na Ucrânia. Vai para a Somália, vai para a Líbia, vai para outros lugares, que lá está a acontecer o mesmo. Só que a comunicação social só mostra aquilo que é preciso mostrar, que alguém quer que mostre.
José Maria Pimentel
Mas lá não se pode dizer que seja problema da escola, não é? Porque são países mais subdesenvolvidos ao nível do ensino também.
José Pacheco
É também. É o mesmo. Em todo o mundo é o mesmo modelo.
José Maria Pimentel
O modelo será o mesmo, mas não está tão disseminado. Nós há bocado falámos disto, en passant, e tinha curiosidade de voltar a isso. Nós tivemos quase que a Eva a falar do método, da maneira de ensinar, da maneira de aprender, mas também é interessante falar do que é que se ensina, do que é que se aprende. Independentemente da maneira como se ensina ou como se aprende, acho que há muitas coisas que os alunos aprendem não lhes são úteis, não servem. Quer dizer, sei lá, É útil, por exemplo, um aluno decorar os reis de Portugal, como nós decorávamos na primária? Ou não? Este é fácil, se calhar, dizer que não. Mas há outros em que, se calhar, é útil. Se a pessoa também não decorar nada, chega ao fim e não tem nada nos bolsos.
José Pacheco
Ah, é importante. A memória é muito importante. Mas tu falaste d'un passant. É uma das expressões do xadrez. À passant, j'adoube. Sabes o que isso significa, bom. Mas não vou voltar aos xadrez.
José Maria Pimentel
Pode voltar aos xadrez.
José Pacheco
Tu falas-me daquilo que a gente aprende. Ok, então vamos lá. Quando eu andei na escola, em pequenino, eu aprendi algumas coisas que continuo a saber. Por exemplo, isto que eu vou dizer-te. Peneda, Soais, Jujarês, Larouco, Barroso, Falperra, Cabreira, Marão, Padela, Montesinho, Nogueira, Bóris, quais continuam? Continuam. São cerca de um minuto. Sabes o que é isso? Isso é o sistema galaico-odoriense do Norte de Portugal, das Serras. Isto não me fez mais sábio, não me fez mais feliz. Nunca utilizei nada disto. Ah, até posso até com o quanto de... Sim, esse eu também aprendi. Eu me mimico tudo a tigre lá. Quem descobriu os Açores? Tu sabes? Quem descobriu os Açores? Não sei, claro não. Ah, eu sei. Percebes? Foi quem? Foi quem? Gonçalo Velho Cabral. Se eu perguntar várias coisas, porquê é que eu sei? Porque a partir dos 60 anos, a memória de longo prazo sobrepõe-se à de curto prazo. Se tu me disseres um nome agora, daqui por um minuto já não me lembro, mas lembro-me disto que aprendi em traspas, aprendi em traspas. Não aprendi, eu decorei há 60 anos. 60 e tal anos que eu aprendi isto. O que é que isso fez? Está na minha memória, ocupa-me espaço que falta para outras coisas. Queres ver outra? Aos 9 anos puseram-me a fazer o discurso da primeira comunhão. Eu receio o discurso, até com as imagens, porque tinha gestos que eu tinha de fazer. Aqui num podcast não dá para mostrar os gestos, mas posso dizer-te que era assim. Queridos companheiros e companheiras, estavam separados, claro. Neste dia soleno, tinha que bater no coração, a prasma proclamar, a prasma, eu quero que um indivíduo de 9 anos sabe o verbo a prazer? Tu sabes o que é que quer dizer a prasmo agora? Eu também sei. A prasmo proclamar bem alto junto do altar de Deus. Tinha que virar para trás porque o altar estava atrás. Foi antes do concílio vaticano de 2º. O quanto somos felizes. É este o dia mais lindo e mais feliz das nossas vidas. Reunidos nesta igreja, de Nossa Senhora da Vitória, eu apontava à Santa que estava do lado direito, vimos recordar o dia em que os nossos padrinhos, eu apontava para os padrinhos, são 10 minutos, está tudo aqui, eu bato e não sai. É uma maldição. Aquilo que me fizeram foi uma maldade. Pior ainda, fiquei a odiar o padre que me dava uma vergasta cada vez que eu não sabia dizer a palavra a praxe. E fiquei a odiar o professor que me dava com a cabeça no quadro quando eu, eventualmente, não sabia dar a determinada resposta. Aprendi a odiar. E depois aprendi a amar como uma professora. Ou seja, O que se aprende não é preciso aprender. E aquilo que não se aprende deveria ser aprendido. Um dia mandaram um recado para a casa de uma mãe de aluno. E o recado dizia, se o filhão é idiota, nunca vai aprender nada, o melhor é ficar em casa", e ele ficou. Tomás Edison, aos 12 anos. Outro professor chamou a mãe e disse que o filho era desatento, estava a vida a fazer risquinhos e mais risquinhos, não estava atento às aulas, e a mãe tirou, aos 13 anos. Pablo Picasso. Outro tinha mais notas em matemática e em física, foi retirado aos 15. Einstein. Posso continuar. Aos 10 anos o Mahatma Gandhi também passou por essa situação. Quando Steve Jobs foi para a universidade, ele só fez uma disciplina. Caligrafia. Caligrafia chinesa. Foi por isso que ele fez o Tibijón. Era chinês, não era? Era chinês? Era. Depois, por exemplo, Salman Khan, que inventou essa coisa de vídeo, ele quando foi para o MIT, Nem uma disciplina ele foi fazer. Por isso é que ele foi salmanicano, um grande analista e um grande pedagogo. E poderia estar numa lista imensa, sem falar em todos os milhões que aprendem apesar da escola. Apesar da escola. Porque se aprende muito na rua e também na escola, se aprende, é
José Maria Pimentel
evidente. Há uma... Eu acho que talvez a área em que essa contradição é mais visível é nas línguas. Porque como nós, em miúdos, estamos a aprender uma segunda língua qualquer na escola, antigamente era mais francês, hoje em dia, claramente inglês, estamos a fazê-lo, mas não temos uma utilidade para aquela língua e portanto essa aprendizagem ocorre de maneira muito lenta normalmente e depois quando a pessoa passa a ter uma utilidade para aquela língua porque vai sair à noite ou porque vai estudar fora ou porque faz erasmos ou alguma coisa de qualquer género de repente A primeira vez que eu fui a Paris eu perguntei
José Pacheco
se quisermos à Boulevard Saint-Michel e eles respondiam e não entendiam Até que um deles, eu percebi que ele disse, «Boulmich». Eu, «Boulmich», é «Boulevard»? «Boulmich», «Michel». «Oui, oui, ah, sei lá!» Bom, porquê que eu aprendi francês? Porque me apaixonei pela professora. Tu queres ouvir a história ou não te interessa? Interessa, é claro. Porque foi com essa professora que eu percebi que o centro não é o aluno. O centro é a relação, é o vínculo que se estabelece. Eu fiz o curso industrial de motoreleticista, entrei no secção preparatória do instituto e tal, tal, tal. E quando decidi ir para professor, tinha que fazer disciplinas de áreas humanísticas. Até aquele momento, até aos 17 anos, eu só tinha tido professor homem. Não havia mulheres engenheiras, não havia. Era tudo homem, tudo homem. E então veio uma professora de francês. Aos 19 anos, saída do instituto. Eu tinha 17, ela tinha 18 ou 19. A professora era de um ano e pouco. Eu quando vejo aquela mulher levitando, Eu me apaixonei à primeira vez, foi uma coisa incrível. E eu ia para as aulas, não escrevia nada, ficava a devorar. Como eu sou estrábico, pensei que ela não tivesse percebido que eu estava a olhar para ela. Eu ponho-me na primeira fila e eu ia devorando, porque a aprendizagem é antropofágica. Eu aprendo o outro, não aprendo com o outro. Um professor não é engenhocalista, transmite aquilo que é. Então, eu absorvia tudo. Eu ia para os testes, era melhor. E durante as aulas eu apenas escutava e olhava o que ela escrevia no quadro. Eu aprendi francês porque estabelecia um vínculo fortíssimo, afetivo e emocional. Quando chegou o último dia, eu estava triste porque era o último dia de aulas dela, e naquele tempo, tempo da ditadura, quando acabava a aula, os professores diziam, podem sair, a gente tinha-se para de pé, fazer a saudação, e não fazia. Aliás, muitas vezes tive problemas por causa disso. Assim como nunca andava o Indomacidade, nem os pequenos luzitos, em rei como a parta não fazia. Sempre fui assim muito chato, muito teimoso, insuportável a São Taurino. Ainda hoje estávamos a falar sobre isso. Bom, chega ao fim da aula e eu disse bom, agora vou ter dia, mas vou ver se depois encontro um dia e tal. Aí ela diz, podem sair o José Pacheco fica. Eu, bem, lhe amadeiros. Quer dizer, é a última aula, eu vou deixar de a ver, ainda por cima ela me vai castigar porque quando ficava alguém era para ser suspenso ou expulso ou qualquer coisa. Eu, não pode ser, ela vai fechar a porta, sobe as escadinhas até à secretária dela, abre a bolsa, tiram...
José Maria Pimentel
Escadas em cima, desculpa, eu vi. Tinha, tinha umas escadinhas. Não, mas isso também é simbólico, não é? É, com
José Pacheco
certeza, com certeza. Medieval. Então, vai, abre a bolsa, tira um disco de vinil e um livro. Eu não estava a entender nada. Ela desce e fica aí a meio metro de mim. Eu sentia a arfar e a vontade imensa de lhe dizer alguma coisa que é suposto que se diga quando se ama alguém e ela diz, olha, eu fui a Paris nas férias da Páscoa trouxe-te um disco de Jacques Brel e um livro de poesia para que nunca te esqueças de mim, ela me amava, só que eu era aluno ela era professora, Havia um vazio ali constitutivo que me impedia. Eu fiquei ali feito louro, peguei no disco e ela ficou à minha espera e eu não fiz nada. Por que é que eu não fiz nada? Porque eu era aluno, ela era professora. Dá para entender? Como se criasse ali um vazio constitutivo aí ela foi saindo, meus colegas interaram então foste punida e tal e eu guardei aquela coisa toda ainda hoje eu guardo o disco, desfez-se com o tempo isto foi há 50 e tal anos mas o livro eu tenho
José Maria Pimentel
e voltaram a falar?
José Pacheco
Nunca mais a vi mas continua a amá-la profundamente e não sei se ela é viva se for viva tem 72, 73 anos já e deve andar por aí. Mas não é isso que está em causa, o amor é uno e múltiplo e eterno se existe. Eu tive mais dois professores que me ensinaram outras coisas. Este ensinou-me que educar é um ato de amor, um ato de vínculo, mas o Pedro Almeida Melo, o grande poeta Pedro Almeida Melo, foi meu professor três anos seguidos de História Universal e Língua Portuguesa, dois anos de Língua Portuguesa. Ele dizia, aqui a nota é da poesia, se vós disseres poesia ou fizereis poesia, vós tereis uma nota boa. O que foi que aconteceu? Fernando Pessoa, José Régio... Para mim, eu fui educado a dizer e a compor poesia. Publiquei um livro de poesia aos 19 anos. Depois percebi que não era poeta, nunca mais publiquei, mas aos 19 anos. E, antes disso, aos 10 anos, o padre Lima, padre, entra na sala e pergunta o que é que tu queres saber? O que é que tu queres saber? É isso que eu faço. Eu disse, eu quero saber o que era a minha rua antes de ser a Rua do Vitório. Ele, é isso que tu queres? É. Não, sei lá, eu mandei aquela, né? E ele então vem cá, pegou num papel e escreveu duas coisas. Vai à biblioteca, entrega isto ao bibliotecário. Daqui por meia hora tem que estar aqui para me dares a resposta. As perguntas estão aqui. Foi aquela que tu disseste. Eu cheguei ao bibliotecário e ele, o que é que tu é que quer fazer? Está na sala de aula? Não, foi o padre Lima que mandou. O quê? Isto. Ah, lá está o padre e tal. Disse, olha, pega naquele livro. Eu peguei, li, voltei, glória total, expliquei aos meus colegas o que é que eu estava a fazer, a partir de uma necessidade, produzi conhecimento e partilhei com os outros. Eu aprendi o que era a minha rua e a partir daí nem te conto o que aconteceu, porque era a Ilha dos Tigres, onde não entrava ambulância nem polícia. É, aí é que tínhamos uma história longa, mas não vale a pena neste momento. Porque ninguém imagina o que lá se passa. O que se passava, na rua já era um lugar histórico, um lugar turístico.
José Maria Pimentel
E isso era onde?
José Pacheco
A Rua da Vitória, ali entre a Rua da Estapa, não sei se conhece o Porto, e a Rua São Pinto da Vitória, a Rua da Bateria da Vitória. Era onde se morria antes dos 30 anos de idade. Fome, sífilis, tuberculose, faca, bala, tortura política, guerra na África, cirrose. Eu vi morrer muita gente. Então
José Maria Pimentel
é isso. Esse lado é interessante porque quando só nos estão a debitar matéria, quando nós não estamos a ir atrás de uma necessidade, de uma curiosidade ou de algum problema que temos que resolver, é verdade que nós vamos absorver muito menos aquilo que estamos a aprender, não é?
José Pacheco
Com certeza. Quase nada. Quase nada, sim. Agora, nestas escolas que eu acompanho, não sou eu que faço, não é? Hoje eu estava a falar que a presença da República é distingue, eu nunca comendo da ordem da gestão pública. Eu peguei na comenda e entreguei na ponte. O projeto é coletivo. Agora, quando eu falo de projeto e falo de escola, estou a falar de pessoas, pessoas em coletivo. E desse coletivo, cada um aprende aquilo que precisa de aprender para se realizar enquanto pessoa, ser um elemento social útil e ser feliz. É para isso que serve a educação, para se realizar socialmente, ser útil socialmente e ser feliz. Então, quando se define um conjunto básico de aprendizagens essenciais, a reisquadada não está lá. Ela não é essencial, mas lavar a mão está, dá para entender. É isso, José. É que nós não podemos instituir um currículo prescrito, pronto a vestir. Já dizia o Formosinho, uma vez que estava a falar com ele, o Formosinho é um grande amigo, professor do Universidade do Minho, que se aposentou já, ele dizia, pois é, Zé Pacheco, isto é o currículo pronto a vestir. Todos têm de vestir igual. Não, não têm. Cada um tem o seu currículo subjetivo, cada um tem o seu currículo de comunidade, cada um tem o seu currículo universal. E no currículo universal são exatamente aquilo que é necessário aprender para poder conviver com os outros, ou aprender a conviver. A respeitar o outro, a respeitar a natureza, a respeitar o direito à paz. É isto que a escola não ensina. É isto que se aprende na Open Learning School, se me permites referir. É isto. É um direito. O direito a conhecer, o direito a ser, o direito a conviver. Que a escola que está aí não dá. E que a escola aberta de São Paulo, a Open Learning, a escola da Ponte, a escola do Projeto Ancora e outras. Felizmente já dão. Isto que eu te estou a dizer agora, com quase 71 anos, tu vais ver, não demora nem 10 anos em todas as escolas. Em todas.
José Maria Pimentel
Acha que é dessa? É.
José Pacheco
Já não vai demorar muito. Porque chegou a um ponto insustentável.
José Maria Pimentel
Então, acho que é uma boa maneira de acabarmos. Quando tu quiseres. Mas, já agora, Como falou da Open Learning School e de outras escolas deste género, vou voltar onde nós estivemos para aí há uma hora, que era na experiência concreta dos alunos, dos estudantes nesta escola. Por exemplo, falando dos tutores, e não professores, tutores, qual é o papel da sabedoria do tutor neste esquema? Ou seja, o aluno vai por ele próprio buscar o conhecimento ou... No fundo o que eu estou a tentar perguntar é, o professor ensina? O tutor ensina? Ou isso nunca acontece em nenhum momento? Porque parte da razão de ser do nosso sistema, e isso até Aí podemos ir à Antiguidade, é o doutor, digamos assim, partilhar a sabedoria que tem com o aluno. E isso é algo que nós fazemos em qualquer momento. Estamos a fazer aqui agora, não é? Já está a partilhar comigo a sua sabedoria da experiência de vida que tem nesta área. E isso acontece nesse modelo também? Ou ele é exclusivamente focado no aluno ir por ele próprio e buscar o conhecimento.
José Pacheco
Eu estou a aprender contigo. Aliás, quando eu estou com alguém e não aprendo, eu me arrependo de ter estado. E estou a aprender, estou a aprender porque as perguntas que tu fazes me levam a refletir. Sim,
José Maria Pimentel
eu também acho que aprendemos sempre uns com os outros, mas não ia fazer uma elogio em causa própria. A palavra
José Pacheco
certa, com, não é para, é com. E portanto, o professor aprende com o jovem, o jovem aprende com o professor, com, não é para. Não se prepara para a cidadania, educamos na cidadania, com os outros. Quando o discípulo está pronto, o mestre surge. As nossas crianças, na ponta, inventaram uma expressão, que é a aula direta. Quando eles procuram e não conseguem, vêm até com o professor para que ele discuta, dizem o que já fizeram, mostram a bibliografia, pesquisa isto e isto, não entendem, e o professor, fazendo duas ou três perguntas, dá-me a perceber que eu estou a falar de uma teoria que não importa agora referir. Então, em toda aprendizagem há ensino, mas no ensino nem sempre há aprendizagem. E porquê é que há? Para aquilo que eu já falei, não quero repetir, porque aprender é inevitável. Ensinar sem necessidade de aprender é inútil. O Adolfo Lima, em 1915, aliás, Almadano Gregos e o Adolfo Lima, em 1915, foram duas frases que eu fiquei para sempre na mente. O Almadano Grego dizia que, quando eu nasci, todos os tratados que visavam salvar o mundo já estavam escritos. Só faltava salvar o mundo. Eu traduzo para a minha pouca sabedoria. Quando eu fui para o professor, todos os tratados para mudar a escola já estavam escritos, só faltava mudar a escola. E o Adolfo Lima dizia uma reforma radical talvez não seja possível uma reforma não radical é inútil e é isso que se tem feito o António Novo o diz esta linha de reforma é inútil porque cria, são paliativos do velho modelo, ou seja, vai adiando a rotura, e ela é necessária, ela é inevitável, Porque se houver essa cultura paradigmática, se a teoria que está por aí, que é tanta, estivesse na prática, talvez não tivesse acontecido uma guerra. Já vai havendo, acho eu, uma ruptura que o velho mudeu, só que ela vai acontecendo...
José Maria Pimentel
Tem acontecido fora do sistema da escola pública, tem acontecido nos privados, na prática, o que ao mesmo tempo vai alargando o fosso entre um e outro. Mas não é bem assim. Eu vejo
José Pacheco
muitas escolas particulares que fazem propaganda falsa.
José Maria Pimentel
Pois, pois, também tem hype à volta.
José Pacheco
É, muita fake news pedagógica. Eu não sou moniquaísta, mas sei distinguir aquelas que enganam, porque Os pais que têm grande poder aquisitivo podem pagar uma mensalidade, não é para ser que eles estão a aprender o mesmo. Aquilo que se aprende na escola pública é o que se aprende na maioria das escolas particulares. Não há grande diferença, claro. Tem mais material, mais tecnologia digital, tem piscinas, tem a ocupação de tempos livres, tem aquelas coisas todas que enfim... A Open Learning School, volto a dizer, ela é diferente. É diferente porquê? Porque aquilo que ela anuncia, faz. É tão simples. É tão simples. O que ela propõe, ela faz. Neste momento está a decorrer uma formação em que a Edilene Morical e a Cláudia Santos, que são duas pessoas que estiveram na escola de Projetoncora, Elas fazem formação porque elas já fizeram, compreende José? Elas fizeram, não é blá blá blá teórico, elas fizeram. E sabem fundamentar teoricamente. Dá para entender a diferença. Agora, quando deixo os professores e eu escuto, aula invertida, o que é isso de aula invertida? A aula invertida é fazer Selecção Afro-Hungria e a Elisa em 1921, não é inovação. Bom, eu agora não quero entrar por aí porque diriam que eu tenho uma língua viperina e que só digo mal das coisas. Não, eu digo é que eu acredito nos professores. E se eu me liguei à Open Learning School foi porque eu encontrei um pai preocupado com a educação dos seus filhos. E por coincidência esse pai é um empresário. E por coincidência pode investir numa escola para os seus filhos e para outros filhos. Isso bastou para eu ajudar e continuarei a ajudá-lo, com certeza. Boa, acabamos assim. Pode ser.
José Maria Pimentel
José Pacheco, Obrigado.
José Pacheco
De nada.
José Maria Pimentel
Este episódio foi editado por Hugo Oliveira. Visitem o site 45graus.parafuso.net barra apoiar para ver como podem contribuir para o 45 Graus através do Patreon ou diretamente bem como os vários benefícios associados a cada modalidade de apoio. Se não puderem apoiar financeiramente, podem sempre contribuir para a continuidade do 45 Graus, avaliando-o nas principais plataformas de podcasts e divulgando-o entre amigos e familiares. O 45 Graus é um projeto tornado possível pela comunidade de mecenas que o apoia e cujos nomes encontram na descrição deste episódio. Agradeço em particular a Ana Raquel Guimarães, Julie Pichini, Família Galaró, José Luís Malaquias, Francisco Hermano Gildo, Nuno Costa, Abílio Silva, Salvador Cunha, Bruno Heleno, António Lima, Helena Monteiro, Pedro Lima Ferreira, Miguel Van Uden, João Ribeiro, Nuno Pinheiro, João Baltazar, Miguel Marques, Corto Lemos, Carlos Martins e Tiago Leite.