#116 Pedro Gomes - “Sexta-Feira é o Novo Sábado”
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José Maria Pimentel
Olá, o meu nome é José Maria Pimentel e este é o
45°. Atualmente a maioria de nós, sobretudo aqueles que não caem na
maluquice de ter um podcast, tem um emprego de segunda a sexta-feira
e descansa ao fim de semana dois dias. Mas não foi sempre
assim. Ainda há menos de 100 anos, na maioria dos países, a
semana de trabalho era de segunda a sábado, só com um dia
de descanso. E nos últimos anos tem havido cada vez mais pessoas
a sugerir que se dê ainda mais um passo em frente e
se passe para uma semana de trabalho de apenas quatro dias. Há
mesmo várias empresas que já testaram este modelo e reclamam resultados muito
positivos mesmo ao nível da produtividade. A pandemia, com a modificação de
hábitos de trabalho que provocou, acabou por dar um novo vigor a
esta discussão. É por isso muito oportuno o livro do convidado, Pedro
Gomes, que acaba de ser publicado em português. O convidado é professor
associado de economia em Birkbeck, Universidade de Londres, doutorou-se pela London School
of Economics e antes disso fez a licenciatura em Economia no ISEG.
No livro, chamado Sexta-feira é o novo sábado, defende que uma semana
de quatro dias, para além de ser benéfica para as pessoas, daria
também um impulso à economia a vários níveis, estimulando a procura, a
produtividade, a inovação e os salários e contribuindo mesmo para reduzir o
desemprego e o apelo de movimentos populistas. O livro do Pedro foi
originalmente publicado em inglês e nota-se que é mais vocacionado para as
economias ricas, como as dos Estados Unidos e dos países do centro
e norte da Europa, mais do que propriamente Portugal, onde ainda estamos
a pensar como rentabilizar melhor os dias que trabalhamos do que propriamente
ter mais um dia de descanso. Ainda assim, tem muito de relevante
se queremos entender o que pode ser o mundo do futuro, inclusive
no nosso país. O livro é, além disso, escrito por um economista,
mas direcionado a um público alargado, adotando muitas vezes uma análise social
e até psicológica dos efeitos destas medidas. Na nossa conversa, discutimos as
especificidades do modelo que o convidado propõe, os benefícios que, segundo ele,
traria à economia e à vida das pessoas e o modo como
seria implementado, bem como os obstáculos práticos que pode enfrentar. E falando
de livros, os ouvintes mais atentos devem lembrar-se que anunciei, há cerca
de um ano, que estava a escrever um livro a partir do
45°. Posso finalmente anunciar que o livro está prestes a ser publicado.
A obra é uma reflexão minha, a partir de algumas das melhores
conversas do podcast sobre dois temas da área da política, um mais
estrutural e outro mais específico dos tempos que vivemos. O livro é
composto por isso por duas partes que podem ser lidas de maneira
quase independente. Na primeira parte regresso a algumas das conversas da série
Orientações Políticas que gravei em 2019 com convidados como Daniel Oliveira, Rui
Tavares e Isabel Moreira, Adolfo Mesquita Nunes e Francisco Mendes da Silva.
A ideia aqui é retomar e aprofundar o mote dessas conversas, perceber
as principais visões políticas que existem nas democracias ocidentais. No livro, comparo
e contrasto as opiniões dos convidados e junto-lhes o que a história
nos ensina sobre a evolução das ideias e o que a psicologia
nos mostra sobre de onde vêm as nossas preferências políticas e, com
isso, tendo perceber o que explica estas clivagens e as verdades parciais
que cada visão política transporta. Na segunda parte do livro, abordo dois
tópicos mais contemporâneos, a ascensão do populismo, em particular, de direita radical,
e a crescente polarização que se observa em muitas sociedades. Aqui revisito
conversas com convidados como Pedro Magalhães, Susana Peralta, Desidério Murcho e Mafalda
Pratas. Nesta segunda parte, os convidados têm um papel de maior responsabilidade,
porque são eles que me ajudam, através do seu conhecimento, a explicar
e refletir sobre os aspectos mais relevantes destes fenómenos. Ao utilizar os
episódios como ponto de partida para uma reflexão profunda e extensa sobre
cada tema, o livro é escrito a pensar tanto em quem não
ouviu as conversas originais, como nos ouvintes de sempre do podcast, que
aqui vão encontrar mais informação, contexto e ideias sobre os temas que
ali foram discutidos. E quando sai o livro, pergunto a vocês? Segundo
a editora, está planeado que vá para as livrarias em finais de
Abril, sendo que vai haver também uma versão digital. Por isso, até
lá, ainda vai haver novidades. Finalmente, queria como de costume agradecer aos
novos mecenas do 45°, E são muitos. Um grande obrigado ao Nuno
Lopes Guerra, ao Fernando Nunes, ao Luís Fernambuco, à André Esteves, também
ao João Pedro Lopes, ao Bruno Pinto Vitorino, à Sofia Roma, ao
Pedro Gaspar, muito obrigado ao Cesar Carpinteiro, à Helena Sousa, ao Diogo
Costa, ao Fernando Oliveira e, last but not least, ao Simão João.
Até à próxima! Pedro, muito bem-vindo a esta humilde casa.
Pedro Gomes
Devemos fazer por causa da economia, portanto, não é uma política partidária,
não é uma vitória do movimento sindical, é uma inovação social, uma
melhor forma de organizar a economia no século XXI. Agora, a questão
é, exatamente em termos concretos, o que eu defendo é que a
sexta-feira se torne um novo sábado. Portanto, é coordenar toda a atividade
econômica que normalmente ocorre durante a semana nos escritórios, nos bancos, nas
universidades, coordenar a quatro dias, segunda a quinta-feira e coordenar todas as
atividades económicas que ocorrem no fim de semana, nos três dias, sexta
a domingo. Existem muitas atividades económicas que ocorrem continuamente ao longo dos
sete dias, nos hotéis, nos hospitais, jornalistas e vai continuar a ser
durante 7 dias, mas a semana típica de trabalho de cada trabalhador
seria 4. E não se pode fazer de um dia para o
outro. A mudança de 5 para 4 é um processo e vai
demorar... Eu falo em 4 a 6 anos, era o tempo que
eu acho mínimo para fazer essa passagem para a maioria das pessoas,
mas seguramente para chegar a todos, depois ainda demorar mais tempo. Sim,
Pedro Gomes
Tínhamos a produtividade a aumentar tanto, eu falava de 4 a 6
vezes, e nós íamos querer partilhar esses ganhos de produtividade em consumir
mais e trabalhar menos, as duas coisas. Mas a verdade é que
continuámos a consumir, consumimos mais, mas o tempo de trabalho nos Estados
Unidos a partir da década de 40 caiu muito pouco, quase nada.
Portanto, não, a primeira parte estava correta, a segunda parte... E porquê?
Qual é a tua tese? Bem, é uma escolha de quanto trabalhamos
e o tempo de lazer, é uma escolha da sociedade, não é
uma lei de economia, é uma escolha e como sociedade optámos por
continuar a trabalhar mas é... Mas isso é uma
José Maria Pimentel
Tem que vir de cima, sim. Já lá vamos que esse é
um dos pontos interessantes e tu dás o exemplo, dás vários, mas,
se calhar, o mais relevante é quando se passou dos seis dias
para os cinco dias. Portanto, ou seja, os cinco dias que nós
temos agora não foram a norma mesmo já numa época industrial, mesmo
no início do século XX. Mas já lá vamos a essa parte
em relação a isto. Parece-me ter um bocadinho lateral, no fundo, à
tua tese, mas é interessante para perceber, no fundo, como é que
essas coisas funcionam, não é? E aqui, porque aquilo que nós estamos
a discutir não é só se as pessoas gostariam de trabalhar menos
dias, mas como é que isso se relaciona com o nível de
vida. E o que me dá a ideia, o que aconteceu é
que aquilo que quem nos não estava a prever é que as
necessidades fossem aumentando também com a riqueza. Portanto, à medida que o
PIB dos países foi aumentando, mas com ele também foi aumentando o
conjunto de bens e serviços disponíveis e foi sobretudo aumentando o conjunto
de bens e serviços que as pessoas passaram a tomar por essenciais.
E, portanto, nós temos uma série de coisas que para nós são
essenciais e nas
Pedro Gomes
Não, o consumo genérico, se nós numa economia estática, digamos, que não
cresce, Se queremos ter mais lazer temos de consumir menos bens, se
queremos consumir mais bens temos de trabalhar mais, portanto. Mas numa economia
em crescimento isso não acontece. Ou seja, quando a economia está a
crescer podemos usufruir... Imagina que a produtividade
duplica,
podemos consumir duas vezes mais bens, podemos trabalhar metade do tempo ou
podemos ter as duas coisas. Por isso, mesmo tendo mais necessidades, não
implica necessariamente que temos de trabalhar, podemos na mesma partilhar os ganhos
de produtividade nestas duas vertentes.
Pedro Gomes
Isso já tem alguma coisa a ver com a tua tese, não
é? Não aos 15 horas, mas é possível. Há aqui uma diferença
que eu acho que é muito importante e é preciso dissociar. É
preciso dissociar as horas de trabalho da questão da coordenação em 4
mais 3. Estão as duas relacionadas, mas eu acho que essencialmente o
que está a falhar na análise é mesmo pensarmos nesta coordenação. O
que é que vai implicar? Como eu vejo é que muito do
que nós fazemos na semana de trabalho cinco dias conseguiríamos fazer tão
bem da mesma maneira numa semana de quatro e que aquele tempo
de lazer ia trazer mais à economia em várias dimensões possíveis. E
eu sou um economista, um economista mainstream, mas é essa a visão
que dissocia o salto que eu faço relativamente aos economistas. Normalmente, quando
pensam no assunto, pensam quando estamos a trabalhar, estamos a contribuir para
a economia, quando estamos em tempo de lazer é como uma câmara
onde entramos, estamos felizes mas nada do que nós fazemos acrescenta ou
afeta a economia. E então os economistas percebem esse valor do bem-estar,
mas que é muito difícil de quantificar e percebem o facto de
trabalhar menos horas reduz a produção de bens e serviços. E então
toda a discussão que existe à volta da semana de trabalho de
quatro dias parte desta análise, que é vamos ser muito felizes e
vale a pena. Algumas pessoas dizem é importante, mas outras pessoas dizem,
e com todo o direito, dizer eu não valorizo tanto o tempo
livre, eu gosto daquilo que faço. Então a discussão fica muito vazia
porque é quanto é que valorizamos este tempo, esta felicidade e depois
parece que é inevitável este custo para a economia. Mas o que
eu digo é vamos ver o que é que fazemos no tempo
de lazer e vamos ver que, na verdade, James Tobin, num prémio
Nobel de Economia, dizia todo o ato de lazer traz um benefício
econômico a alguém. Então muitos do livro, muitos dos argumentos é exatamente
o que é que fazemos no tempo de lazer e como é
que melhora a economia. Sim, sim.
José Maria Pimentel
E vamos aí porque eu acho que tem alguma maneira de dividir
a conversa, que é primeiro perceber os argumentos que tu dás, porque
é que tu defendes que esta é uma solução boa, e depois
discutir porque é que tu defendes especificamente este modelo rígido, digamos, rígido
não, mas standardizado, de segunda à quinta-feira, não é? No fundo, alterares
aquilo que é o modelo padrão da economia e não simplesmente estás
a dar liberdade às pessoas para trabalhar menos, não é? E depois
perceber porque é que o governo tem um papel aí e uma
série de coisas. Já agora, tu és agnóstico
Pedro Gomes
cinco ou teres quatro dias a trabalhar menos oito horas, por exemplo?
Sim, isso lá está. É questão da implementação E aí o que
eu digo é preciso ser muito flexível porque a implementação pode ser
diferente, por exemplo, nos Estados Unidos ou em Portugal, em diferentes setores
de atividade para os restaurantes ou para os professores universitários e mesmo
dentro de vários setores, empresas diferentes podem implementar de formas diferentes. A
implementação é uma parte importante mas é a parte central na discussão.
É sempre a primeira pergunta que eu tenho é é preciso corte
20% do salário ou é preciso trabalhar mais duas horas nos outros
dias? Mas na verdade não é por uma coisa ser fácil de
implementar que deve ser implementado, não é por uma coisa ser difícil
de implementar que não deva ser implementado. Portanto, eu acho que é
muito importante separar estas duas perguntas. Primeiro é porquê é que é
uma melhor maneira de organizar a economia no século 21? E então
aí eu dou os argumentos económicos. Porquê é que é um bom
ideal? E depois é, ok, vai haver os custos para a economia
de transição, que é mais a questão da disrupção, de termos de
mudar como
fazemos
as coisas e isso é sempre difícil. Eu acho que vai ser,
é mais fácil do que as pessoas pensam à partida e é
esse o meu argumento. Mas então primeiro separar estas duas questões, primeiro
tentar justificar porque é que é um bom modelo e depois pensarmos
quais são os ajustamentos para chegarmos lá. Sim, mas aqui a implementação
afeta o
José Maria Pimentel
modelo, Ou seja, uma coisa é discutir se é implementado de forma
gradual, de forma abrupta, se se implementa em todos os setores, se
é standardizado ou se permite que algumas pessoas tenham um horário flexível,
enfim, o que quer que seja. Outra é discutir se se mantém
ou não se mantém o número de horas, porque se tu mantens
o número de horas, o argumento da utilização daquele tempo para outros
fins, não acho que se perca totalmente. Por causa da coordenação no
dia. Exatamente, e do commuting, que é uma das coisas que tu
falas, do tempo que as pessoas perdem para o trabalho, mas pelo
menos dilui-se bastante.
Pedro Gomes
Sim, os oito argumentos que eu dou, depois da forma como implementar,
pode potenciar alguns e minimizar outros, mas aí já depende muito do
contexto e falarmos da economia portuguesa seria diferente, certamente, da americana, mas
da questão das horas propriamente ditas já são muito diferentes. Na economia,
As pessoas não trabalham só todas 40 horas. É diferente para os
médicos e, portanto, já é diferente à partida para os vários setores.
E, portanto, dizer que tem de ser de uma forma quando já
na economia todos os setores trabalham de forma diferente. Então... Não, mas
a questão
Pedro Gomes
diminuir outras. Para alguns setores, por exemplo, trabalhar mais meia hora ou
uma hora nos outros dias compensa já um quarto ou metade do
ajustamento. Portanto, não tem de ser... Acho que implementar toda a economia
com mais duas horas é exagerado e é de evitar. Mas, pontualmente,
em alguns setores, aumentar de meia hora de trabalho nos outros dias
ou uma hora, se as pessoas quiserem, e eu acho que muitos
trabalhadores querem, eu acho que é melhor aumentar duas horas de forma
generalizada para a economia, aí os benefícios vão ser muito mais pequenos.
José Maria Pimentel
Desculpa estar insistindo neste ponto, é só porque para mim são... E
depois já vamos aos seus argumentos, que é no fundo o maior
sumo disto, mas para mim são duas coisas diferentes. Uma é tu
discutires qual é a estrutura da semana padrão de trabalho e aí
pode ser cinco dias, oito horas por dia, quatro dias, dez horas
por dia, podes ter mais do que uma versão e a outra
é o total das horas de trabalho. Sendo certo que tu podes
argumentar que... No primeiro tu podes argumentar, por exemplo, que tens ganhos
por ter menos commuting, não é? Perdes um dia de ligação. No
segundo, até é interessante porque, por exemplo, nós... Tu dizias em maior
bocadinho, não é que de facto naquela altura em que a Cairns
fez a previsão o número de horas de trabalho por dia das
pessoas continua a diminuir, mas depois estabilizou ali num platô. Mas para
profissões mais bem remuneradas há uma espécie de paradoxo que tem acontecido,
para aí na última década, que tem aumentado.
José Maria Pimentel
portanto mesmo o facto de ter mais um dia livre. Sim, e
tu tens um argumento muito interessante nesse aspecto que é, enfim, provavelmente
Já tinha feito algumas reflexões nesse sentido, mas não completamente, que é
esse aspecto da coordenação e de horários flexíveis não serem necessariamente tão
bons como se possa pensar, porque nós tiramos muito benefício também de
estarmos coordenados no nosso lazer. Ou seja, eu ter uma tarde livre
de segunda-feira pode me dar jeito, se eu tiver que tratar de
coisas para mim, mas como lazer, a não ser que eu seja
uma pessoa muito solitária, não vai acrescentar muito, porque as pessoas que
eu conheço estão todas a trabalhar. Enquanto se houver uma estrutura em
que de repente passe a haver quatro dias mais três dias livres,
ou seja, ali um dia livre extra que todos temos, não é
todos, como tu dizias, há heterogeneidade e há pessoas que estão a
trabalhar ao fim de semana, mas a maior parte das pessoas têm
e isso cria uma espécie de jogo de soma positiva e esse
eu acho um argumento muito interessante.
Pedro Gomes
A economia é sobre a criação de valor e a criação de
valor pode ser de várias formas E uma que eu falo é
a questão dessa... O valor do lazer depende de quantas pessoas na
tua rede que estão disponíveis de estar, de facto, sem trabalhar uma
quarta, quando todos os teus amigos estão a trabalhar e a tua
mulher tem menos valor. Portanto, cria-se valor ao coordenar o lazer. Essa
é a razão porque normalmente os casais coordenam o timing da reforma.
Há muitos estudos
sobre isso
que tentam coordenar exatamente porque quando está um reformado e o outro
a trabalhar a vida pode estar reformada. O primeiro em geral. Não
tem tanto valor aquele tempo. Mas há a coordenação do lazer e
a coordenação do trabalho. Mas o mais importante eu acho que é
a questão da coordenação do trabalho e é muito importante porque há
sempre aquela visão. Por que é que tem que ser o Estado
a implementar? Porquê é que tem que partir de cima? E o
essencial é o chamado problemas de coordenação. E então, para perceber, numa
empresa, vamos ver que era a semana de trabalho de quatro dias,
mas cada um escolheu o dia que quisesse. Então, eu não estava
lá a segunda-feira, o patrão não estava à terça, o meu colega
não estava à quarta, o cliente à quinta, o funcionário à sexta.
Cria problemas na comunicação e na decisão dentro da empresa. E isto
é mais importante agora porque a economia tornou-se muito mais especializada e,
portanto, já nem é um funcionário de IT, agora é o especialista
nos e-mails, é o especialista no outro software, etc. E se as
pessoas não estão a trabalhar, cria esses problemas E esses problemas que
estão por trás da questão do right to disconnect, o direito a
desconectar. Quando nós queremos descansar, mas se o mundo continua, se a
empresa continua e precisam de ti, podes estar de férias no Algarve,
mas vão te ligar se um projeto de 10 milhões de euros
está dependendo de uma assinatura tua ou de um fecheiro teu vão
te ligar. E é exatamente é um daqueles problemas em economia que
é típico, os coordination failures, os problemas de coordenação em que é
preciso uma entidade superior vir
José Maria Pimentel
e coordenar o problema. Aliás, eu digo-te até que quando eu li
esta parte do livro, primeiro torci um bocadinho a ouir isso, porque
pensei, bom, estamos a pôr o... A coisa que é um bocadinho
autoritária, ainda por cima de uma altura em que o raio de
ação do Estado está claramente numa tendência de expansão e foi uma
coisa que a pandemia acelerou. Trouxe um bocadinho de ionismo, mas depois
pensei exatamente isto. É um problema de coordenação clássico, na verdade. É
como muitos outros. É como, sei lá, se tu queres que de
repente se passe a usar o sistema métrico em vez do sistema
das polegadas, tem que ser o estado implementado, porque senão é que
acontece como no Reino Unido e nos Estados Unidos, que eles continuam
a usar aquilo. E há outro caso engraçado que eu me lembrei
logo, que é do calendário. O nosso calendário é bastante tosco, porque
nós temos 365.25. Os meses não batem certo. Há meses com 30,
há meses com 31, há meses com 28 ou 29. E há
um sistema que, já não sei quem aqui vetou, mas que casa
absolutamente certo. As semanas têm, não sei se tinham todos 5 dias
ou 10, casava tudo absolutamente certo. Não havia desvios anuais. Só que
nunca foi implementado porque nenhum
Pedro Gomes
não usavam. Portanto, a semana de trabalho de 4 dias tem sido
implementada por várias empresas como prática de gestão e a decisão que
os gestores têm de fazer é vamos dar um dia de folga
diferente a cada um dos trabalhadores, segunda, terça, quarta, quinta e sexta,
que piora a coordenação dentro da empresa ou damos todos a sexta-feira,
que cria o problema da coordenação com os clientes e com os
fornecedores. E esta é a única razão mais apontada para as empresas
que depois não mantém a semana de trabalho de quatro dias, é
exatamente este o problema de coordenação de vendas. E é por isso
que cada empresa a desviar-se tem um custo adicional. E mesmo assim,
os ganhos de produtividade são tantos nas empresas que têm experimentado que
compensa estes problemas de coordenação. Mas o que significa que se o
Estado viesse... Não tem de ser o Estado. O Estado é a
forçar um bocadinho, mas depois são as práticas, as normas na economia,
toda a gente coordenar nessa sexta-feira e iam haver estes ganhos.
Pedro Gomes
chegam a implementar, não é? Exato, e daí se conseguimos juntos fazer
essa mudança. A questão da coordenação também tem uma dimensão internacional que
é interessante. Sim, exatamente. Porque agora em janeiro houve a mudança dos
Emirados Árabes Unidos para o fim de semana. Eles tinham um fim
de semana islâmico, que era sexta e sábado, porque o dia para
rezar era sexta-feira, e foi só aplicado ao setor público, que tem
muitos riscos, que eu sou muito... Mas nos Emirados Árabes Unidos pode...
É capaz de funcionar de forma diferente e passaram a partir do
1 de janeiro a ser o fim de semana de sábado, domingo
e para os funcionários públicos que tinham a sexta-feira para trás ao
fim da tarde para poderem rezar. Mas foi porque o domingo, para
todas as empresas que tinham os contactos internacionais, o domingo não se
fazia nada porque estava tudo fechado no ocidente. Então, eles privilegiaram a
coordenação com o ocidente contra a coordenação com os seus parceiros, os
outros países da região. E lá está, se fosse a semana de
trabalho de quatro dias, com sexta, sábado e domingo, para além dos
benefícios da coronação, até em termos religiosos, porque os muçulmanos podiam rezar
à sexta, os deus ao sábado e os cristãos
José Maria Pimentel
Enfim, eu acho que mostra algumas vantagens desse tipo de esquema, quer
dizer, que aos olhos de um ocidental não superam as vantagens, mas
claramente é um país onde isso pode ser implementado. Como eu te
disse, para mim este é o ponto mais forte do teu argumento,
no sentido em que a pessoa percebe que de facto há um
grande mérito em isto de ser implementado top down e não apenas
em algumas empresas fazerem isso da mesma forma que criam horários flexíveis
às pessoas ou permitem trabalhar part time porque de facto existe aqui
este problema de coordenação e ele tem que ser... Esses ganhos de
coordenação são... Lá está um jogo de soma positiva, portanto são coisas
de networking, se tiveres mais pessoas a reger-se por aquele tipo de
lógica, crias valor e pelo contrário, se tiveres a criar heterogeneidade, estás
a destruir valor porque estás a ter as pessoas a avançar em
cada sentido. Mas enfim, agora que já estabelecemos aqui vários aspectos essenciais
da tua tese, se calhar Vamos avançar para os argumentos propriamente ditos
ao nível do impacto, que eu acho que é onde está aqui
mais sumo. Tu divides em oito, se eu não me erro, oito
argumentos. E, se calhar, vamos percorrer um por um. Um deles é
porque é possível, isso já argumentaste. O segundo é que tu argumentas
que esta medida vai aumentar o consumo. No fundo vai impulsionar a
economia através do consumo. De indústrias de lazer, turismo,
Pedro Gomes
entretenimento. Porque no fundo é com o tempo livre que as pessoas
têm. Sim, porque para consumirmos nós precisamos de dinheiro, mas precisamos mais
do que dinheiro, precisamos de tempo e é no tempo livre que
viajamos, que vamos aos restaurantes, ao cinema, ao teatro e, portanto, há
muitas indústrias associadas que iam ter um estímulo direto à procura. Eu
gosto muito de pensar no caso europeu, imaginar o que seria um
fim de semana de três dias para os holandeses e os alemães,
onde é que eles iam passar o fim de semana? Três dias
que não ao sul da Europa. Portanto, ia estimular o turismo. Por
exemplo, Inglaterra consome-se mais vinho. Três vezes mais pessoas bebem vinho ao
fim de semana.
Pedro Gomes
É ao fim de semana. O que é que podia representar para
a indústria de vinhos portuguesa? Sim. Por isso é mais em termos
de procura. E nós podemos fazer exatamente o mesmo raciocínio dentro do
país. Se calhar um fim de semana de três dias, se calhar
mais pessoas em Lisboa com três dias iam para o interior, passar
o fim de semana, que ia estimular. Os restaurantes iam ter mais
pessoas, se calhar iam abrir outro tipo de salas de cinema ou
teatro que fecharam por todo o interior, se calhar iam voltar a
abrir e aí se calhar mais pessoas iam se voltar para o
interior. Esse é uma forma também da regionalização, de tentar promover
a
economia nestas regiões, mas em geral sim, vai estimular. É um argumento
de procura, portanto nem todos os economistas concordam. Há economistas que não
concordam com esta visão da economia mais keynesiana da procura, mas esta
visão da economia é a visão, por exemplo, da administração Biden quando
faz o pacote de medidas de gastos públicos exatamente para estimular a
procura agregada E eu acho que é uma outra forma de pensarmos
nesse estímulo partindo das pessoas dando tempo.
Pedro Gomes
Este argumento foi utilizado quando se passou de 6 dias para 5
dias, por exemplo, por Henry Ford, que foi o pioneiro da semana
de trabalho de cinco dias como prática de gestão, ele dizia qual
dos meus trabalhadores há de querer comprar um carro se ele passa
seis dias na minha fábrica? E, por exemplo, na China, a China
implementou a semana de trabalho de cinco dias muito mais tarde, foi
em 1995 e não foi, não prejudicou em nada a economia chinesa.
E até lá era o quê? 6 dias? Eram 6 dias, sim.
Curioso.
E não prejudicou em nada a economia chinesa, antes pelo contrário, só
fortaleceu a economia da China, o poder econômico aumentou muito mais nos
anos 2000. E porquê? Porque a economia foi muito mais sustentada, não
pelas exportações, mas pelo mercado interno. O mercado turismo interno chinês agora
vale 10% do seu PIB porque eles começaram a viajar exatamente porque
tinham esses dois dias. Agora nós... Eu sei que eles começaram a
viver mais recentemente, não é? Sim, mas internamente. E depois construíram os
centros de desporto e salas de espetáculos, parques temáticos que são gigantescos,
tudo para satisfazer essa necessidade que vinha desse tempo livre. Agora, nós,
o que acontece muitas vezes, nós também temos o fim de semana
de dois dias, mas como trabalhamos intensamente segunda à sexta-feira, sobretudo porque
a mulher agora tem outro papel na sociedade que não tinha há
50 anos, estava em casa e agora trabalha, e então muitas vezes
a organização da vida de casa tem de ser feita naquele primeiro
dia no sábado e na verdade
o único
dia que temos de descanso é o domingo.
José Maria Pimentel
Não, e também parece-me que as escolas podiam ter mais desvantagens do
que o resto da economia, porque precisamente é esse papel mais... Ou
por outra, pode-se perder mais do que se perde na economia, mas
provavelmente ainda voltamos lá. Em relação ao consumo, o teu argumento parece-me
interessante, mas tu... Parece mais ou menos incontestável, que se as pessoas
tivessem mais um dia, iam gastar mais em bens e serviços relacionados
com lazer, mas ias ter uma diminuição, provavelmente, do consumo, ou quase
certa, de bens de não lazer, sobretudo aqueles que eram adquiridos por
empresas. Tu achas que... E aqui eu diria, neste segundo grupo, é
possível que haja muitos que tu argumentas que são supérfluos, que são
no fundo coisas que só existem porque, sei lá, a gasolina gasta
nos autocarros, por exemplo, para as pessoas fazerem o commuting. Só existe
porque as pessoas têm que ir para o trabalho, que ele não
está... Provavelmente acrescentaram o valor. Mas há outros que estão mais ligados
à competitividade da economia e à capacidade exportadora, não é?
Sim, sem dúvida. Algumas coisas... E com
mais valor acrescentado, sobretudo, desculpa.
Pedro Gomes
Algumas coisas íamos consumir menos, mas íamos consumir mais daquilo que importa
verdadeiramente às pessoas. Há de facto, já não íamos aos restaurantes a
almoçar ao pé do trabalho, mas íamos ao restaurante mais perto de
casa. Há mudanças, mas no cúmplito geral, acho que sem dúvida, íamos
consumir mais. Agora, eu acho que o argumento que podes fazer, fazendo
o contraditório, é algumas pessoas que teriam mais tempo, mas não teriam
dinheiro para gastar mais. Então, aqui voltamos à questão da desigualdade e
ver que a desigualdade tem dois lados e tem o lado baixo
e o lado de cima. Mas quando vemos as economias mundiais, o
que por exemplo diz o Economy, é que há um excesso de
poupança nas economias mundiais e é isso que está a gerar as
bolhas especulativas no imobiliário, no mercado bolsista, nas criptomoedas, exatamente por haver
esse excesso de poupança que vem sobretudo do lado da desigualdade do
lado
Pedro Gomes
quatro dias. Portanto, trabalha mais intensivamente e consegue produzir mais nesses dias.
Reduz a questão do burnout e o stress, torna mais eficiente. Depois
há uma questão, nós pensamos sempre, se trabalharmos mais um bocadinho, eu
sei, trabalhamos mais, não produzimos tanto, estamos cansados, mas fazemos sempre qualquer
coisa. É essa a ideia. Fazemos sempre qualquer coisa. É melhor do
que não ter feito,
Pedro Gomes
Mas depois há uma questão, que é a questão dos erros, que
nunca se fala, mas nós podemos fazer
mais. Para o desfazer,
não é? Mas os erros no processo de produção têm muitos custos.
Às vezes passamos mais horas a reparar um erro e isto é
transversal em fábricas, por exemplo uma fábrica de têxtil ou uma fábrica
de calçado, um erro é a diferença entre uma camisa ser exportada
para Paris por 200 euros com bons materiais e ser vendida a
5 euros no mercado de rua. Portanto, há a questão dos erros
que até podem ser ainda mais profundos. Por exemplo, a Boeing, quando
teve de recolher os Boeing por causa dos problemas do controle, são
uma sequência de erros que tiveram um custo enorme para a empresa.
Muitos desastres, o Chernobyl, o Exxon Valdez, o derrame de petróleo, estavam
associados a problemas de distúrbios de sono. Isso tem imensos custos em
termos de seguros. Podem ser as lemas em tribunal, por exemplo, nos
hospitais em Londres, em Inglaterra, as estatísticas, 12% do que se gasta
na massa salarial dos médicos é em problemas de negligência, custos de
tribunal e depois compensações. Porque as pessoas, quando estão mais cansadas, é
quando cometem mais erros e isso... A literatura
científica
é enorme, Por exemplo, com médicos, com polícias, acidentes de trabalho, condutores.
Quando têm, de facto, muitas horas e estão cansados. A
Pedro Gomes
estás a dizer. Pode ser muito negativa. Portanto, esta é a outra
dimensão. A questão do absentismo, se calhar nos nossos trabalhos não aparecer
um dia não é muito importante. É um efeito de segunda ordem.
Mas, por exemplo, em lares de terceira idade ou para médicos, quando
o médico está doente e não vem, tem de se encontrar alguém
para substituir, para cobrir o túnel. E normalmente é um tarefeiro ou
trabalhador temporário que é pago a 2, 3, 4 vezes a taxa
horária. Então o absentismo tem uns custos muito elevados para algumas empresas.
E há um exemplo de uma empresa nos Estados Unidos que implementou
um lar terceira idade que implementou semana de trabalho de quatro dias
e no lar trabalha-se por túneis, portanto tiveram de contratar mais pessoas
e gastaram mais em contratar mais pessoas. É impossível ganharem produtividade. O
que eles verificaram é que o que eles gastavam com os trabalhadores
temporários reduziu tanto que compensou porque eles descansavam mais. Portanto, quando estavam
com uma dor de cabeça, vou ou não vou, mas o fim
de semana já está aí ou tenho três dias, já não preciso,
vou e depois descanso. É
Pedro Gomes
Sim, mas dentro do negócio. E o que isto significa é que
é preciso ter uma visão muito global da empresa para ver os
benefícios que traz. Porque, às vezes, estamos focados numa grande empresa num
departamento, pode aumentar os custos desse departamento, mas, por exemplo, reduz os
custos no departamento de recursos humanos porque as pessoas não se despedem,
porque gostam de trabalhar quatro dias e, portanto, não é preciso recortar
tanto, não é preciso treinar tantos trabalhadores, dar formação porque eles se
mantêm na empresa. Os ganhos vêm de outras áreas de negócio e
é por isso que as empresas que têm implementado são normalmente empresas
mais pequenas em que o CEO tem uma muito boa visão de
toda a produção, de como funciona a empresa e o que se
diz, não é tanto que aumenta a produtividade, é que melhora o
negócio. Porque lá está, a produtividade não é necessariamente a produtividade individual
do trabalhador, mas depois é como funciona.
Pedro Gomes
duas falácias nessa visão muito individualista da produção. Primeiro é uma equipa
e tu podes ter uma equipa de oito pessoas e sete funciona
muito bem mas não funciona bem com a oitava e o que
se produz está necessariamente associado à produtividade da pessoa. Portanto, às vezes,
não é a produtividade de um trabalhador porque é uma equipa. E
a segunda, por exemplo, num restaurante. Qual é a produtividade de um
restaurante que tem um excelente chefe, uma excelente canção à altura, um
empregado de mesa, mas não tem clientes. É zero. Eles estão lá,
se vêm poucos, não se vendeu, a produtividade abaixa. Se aumenta, se
têm mais clientes, então a produtividade vai ser alta. Aumentos da procura
traduzem-se em aumentos de produtividade. Isto funciona nos restaurantes, nos hotéis, nos
cinemas, nos teatros. Portanto, aquele aumento da procura...
José Maria Pimentel
Interessante, por acaso, esta tua resposta fez-me olhar para isto de forma
diferente, porque eu inicialmente, quando vi o teu argumento, a minha reação
foi, ok, isto é evidente, não é? Porque o que tu tens
na prática, olhando para a produtividade individual, se tivesse um gráfico, quer
dizer, agora Nós não temos imagem aqui, mas tens ali no oeste
do X, tens o número de horas.
José Maria Pimentel
Parece mais ou menos evidente pela nossa experiência que a produtividade começa
a ir elevada nas primeiras horas, é possível até que cresça um
bocadinho no início, mas rapidamente começa a descer, ali à segunda ou
terceira hora provavelmente a produtividade começa a descer e a curva vai
para aí abaixo, o que significa que se nós retirarmos a última
hora a produtividade média provavelmente aumenta. Mas a questão é compensar. Agora
o produto é que podia não aumentar necessariamente. Mas esta foi a
parte que eu achei muito interessante a tua explicação porque de facto
eu não tinha pensado dessa forma. Primeiro eu não tinha pensado no
outro lado, na contribuição negativa, não é? Que tu por trabalhar mais
uma hora não é só a tua produtividade já estar muito abaixo
do que esteve, é que pode já estar negativa. E nós dois
passámos recentemente pela experiência de escrever um livro e há vários perodos
em que a minha produtividade teve negativa porque eu estava cansado e
portanto basicamente estava a destruir, estava a destruir, quer dizer, estava a
reescrever coisas que já estavam bem escritas. Isso é evidente. Mas se
calhar mais interessante ainda do que isso, é esse o aspecto de...
Mais interessante do que isso, porque esta aqui, parece-me que será a
verdade, em atividades muito intensivas como é por exemplo a escrita, aliás
os escritores profissionais normalmente têm hábitos de escrita. Não sei se já
apanhaste de...
Muito regulares.
Muito regulares e normalmente são tipo cinco horas. Não fazem mais do
que isso, porque sabem que a partir dali já não estão a
fazer. Mas o segundo aspecto, se calhar, ainda é mais interessante, porque
este não se aplica a todas as profissões. Quer dizer, para quem
está a trabalhar numa fábrica pode já não ser bem verdade e
mesmo nós todos no nosso dia a dia. Mas o aspecto da
coordenação, esse aspecto é interessante, não tinha pensado nisso.
Pedro Gomes
Isso passa porque as economias estão cada vez mais especializadas, os nossos
trabalhos e uma empresa é uma equipa e todos precisam de funcionar.
É como uma máquina tem de estar bem aliada e quando uma
peça não está a funcionar, então não funciona. O argumento da produtividade,
nós, como se discute tanto futebol aqui em Portugal, toda a gente
percebe quando os jogadores jogam três dias, três em três dias, os
comentadores todos à terça, quarta e quinta a dizer há duas semanas
a jogar três em três dias, estão muito cansados, há mais lesões,
cometem mais erros e toda a gente acha, percebe, consegue perceber, mas
não conseguimos pensar que em todos os trabalhos é assim. Agora, outro
ponto que eu acho muito importante é porquê a semana de trabalho
de 4 dias agora? O que é que está... Então é preciso
ver, as economias mudaram muito nos últimos 50 anos e os trabalhos
que nós temos agora mudaram. Agora são... Os economistas falam em trabalhos
não rotineiros, abstratos. Antigamente era o trabalho de fábrica que era rotineiro,
agora é não rotineiro e abstrato, que é muito mais mentalmente intensivo.
E se há 80 anos os problemas eram na fábrica o síndrome
de moção repetitiva... Sim, do Chaplin. Do Chaplin. E foi por isso
que quando se passava para cinco dias para eles descansarem mais dos
problemas físicos agora é os problemas mentais. É o aumento do burnout,
o aumento do stress e com os custos enormes para a economia.
E para além desta questão dos trabalhos que nós fazemos na economia
mudaram, A estrutura demográfica também. Há 50 anos a mulher lá está,
não trabalhava, estava em casa, agora trabalham os dois. Trabalham os dois
trabalhos intensivos, com ambição, têm filhos, têm de voltar, buscar a escola,
cozinhar, arrumar a casa e o tempo em casa não é tempo
de descanso. A pressão ainda parece que aumenta mais quando o homem
e mulher vêm os dois com os problemas do trabalho e depois
têm de tratar de casa. Portanto, isto são mudanças estruturais que acontecerão
ao longo de 50 anos, que tornam a semana de trabalho de
4 dias mais importante agora, mais virada para o século XXI e
não se calhar há 50 anos. O teu argumento não é que
José Maria Pimentel
ela devia ter sido sempre assim, é que agora está na altura
de ser assim. Exatamente. Contribua para a continuidade e crescimento deste projeto
no site 45graus.parafuso.net barra apoiar. Veja os benefícios associados a cada modalidade
e como pode contribuir diretamente ou através do Patreon. Obrigado. Mas há
aqui um facto inconveniente neste argumento, que é aquilo que eu falei
no início da conversa, que é o facto de em muitos dos
trabalhos mais bem remunerados as pessoas estarem a trabalhar mais. E esse
é um paradoxo. E tu dizes, estão a trabalhar mais mas não
deviam. Mas em muitos casos falamos de empresas particularmente bem geridas, ou
pelo menos à partida bem geridas. E no entanto nós vimos isso.
E por exemplo, isso é uma das coisas muito comuns, por exemplo,
em áreas de consultoria, por exemplo, que as pessoas trabalham muitas, muitas
horas. E eu sempre assumi, lembro-me de pensar, porque é que isso
aconteceria? Provavelmente há ali algum certo lado de competição, mas há outro
lado em que, claramente, as pessoas, a maior parte daquelas pessoas, gostariam
de trabalhar menos e se calhar nem se importavam de lhe cortarem
uma fatia do ordenado, mas trabalham de menos horas. Mas dá a
ideia de que aquela atividade funciona melhor com equipas pequenas a trabalhar
muitas horas do que com equipas maiores a trabalhar metade das horas.
José Maria Pimentel
Mas tu achas que... Ou seja, eu inicialmente achava isso, mas na
verdade nós falamos de... Neste exemplo que eu dei são empresas que
têm um contacto muito próximo com o cliente e portanto o cliente
não é um cliente difuso, é um cliente muito concreto que está
a pagar para os serviços. São empresas com uma atividade relativamente contida
e portanto é relativamente fácil ter essa visão do todo. Também, para
o bem e para o mal, com um enfoque muito grande no
lucro, digamos assim, no bottom line, no resultado. E portanto, dir sim
a que havendo um problema aí, ele já tinha sido resolvido. E
são, ao mesmo tempo, desculpa, eu estou aqui a fazer fazer outro
challenge ao teu argumento. Mas são ainda, podia dires isso, bom, não,
mas são atividades em que não são particularmente cansativas e não são
particularmente exigentes ou não são particularmente variadas. Pelo contrário, não só são
bastante abstradas, como são bastante variadas do ponto de vista dos desafios.
Eu
Pedro Gomes
posso dizer... Eu tenho um grande amigo da universidade, trabalha numa daquelas
grandes consultoras, e agora eu já acabei a licenciatura, já foram 20
e tal, um bocadinho menos de 20 anos, portanto ele já está
numa posição mais sênior e eles gostavam de contatar muito mais pessoas
e não conseguem. E muitas vezes muitas pessoas saem. E então eu
acho que aí os ganhos de produtividade se calhar pode ser naquele
trabalho, naquela área, pode ficar... Pode ser mais difícil a gestão, mas
os ganhos viriam de outras áreas, por exemplo, a questão
dos recursos
humanos. Ele diz que passa muito tempo a fazer entrevistas porque as
pessoas de facto têm um trabalho intensivo e depois saem. E então
os ganhos viriam na questão do...
Pedro Gomes
retenção. Porque uma pessoa que entra não entra logo a funcionar a
100% porque não conhece a empresa e essa é uma das razões
por essas empresas que implementam a semana quatro dias dizem a retenção
passou a ser 100% ninguém sai. Claro, para algumas empresas tu queres
que as pessoas saiam, mas nestas empresas de topo que são muito,
precisam de uma obra qualificada, tu queres manter o mais possível e
então os ganhos vêm nessa área específica. Então, pode haver, se calhar,
os ganhos de produtividade dentro da área de negócio, se calhar podem
não ser tão grandes, mas virão então de outras áreas do negócio.
Sim, sim. E na verdade eleventa a área
José Maria Pimentel
Eu falei de consultoria, mas podia ser banca de investimento, se calhar
até é pior. Ora bem, outro argumento que tu tens, também que
eu acho muito interessante, nós já falámos do argumento do lado da
procura, digamos assim, de aumentar o consumo daquilo que interessa, não é,
dirias? E, sobretudo, libertar algum excesso de poupança, não tanto em Portugal,
infelizmente, mas nas economias ocidentais. Falámos do lado da oferta, digamos assim,
ou seja, do lado do trabalho da produtividade. Há outro argumento do
lado da oferta, mas não é diferente do texto, que eu acho
muito interessante e, na verdade, para mim seria dos argumentos mais naturais
que é aumentar a inovação, ou seja, ao dares às pessoas mais
tempo livre elas não só vão ser, discutivelmente, mais felizes porque vão
fazer mais coisas de que gostam, mas também vão no fundo é
o argumento do Tobin, ao seguir os seus interesses vão acabar por
inovar e por contribuir a prazo elas próprias para a economia, que
é um ponto interessante, até lembrou-me de resto de um episódio que
eu gravei com o Pedro Oliveira, que era exatamente sobre o user
innovation, portanto, inovação pelo utilizador, que no fundo é isto que estamos
a falar. Pelo consumidor. Sim, enfim, Não sei se queres devolver o
argumento, mas é.
Pedro Gomes
é a inovação. É o criar novos produtos, é o criar novos
processos, novas formas de fazer o mesmo e novos produtos, novas ideias.
E o motor da inovação na economia americana, nas economias europeias, está
a falhar. Fala-se da morte do crescimento, da morte porque as ideias
estão cada vez mais difíceis de encontrar. E isto é uma visão,
que é a visão dos economistas, que vêem a inovação como o
número de investigadores, portanto é tudo nos departamentos de investigação e desenvolvimento
das empresas ou nas universidades, que desenvolve novos produtos e portanto parte
de tudo dessa temos de investir na ciência, na tecnologia e, basicamente,
essa visão. A inovação vem das grandes empresas de investigação e desenvolvimento
da Apple. Há depois uma outra que eu acho muito interessante, nova
da Mariana Matsukato, que diz que há muita inovação que vem do
Estado, mas eu acho que há uma parte que vem, uma grande
parte da inovação que vem das pessoas e eu encontrei, eu tinha
a ideia, comecei a ver muitos casos de estudo e depois encontrei
a fundamentação teórica por um prémio Nobel de Economia, Edmund Phelps, que
já depois de ter ganho o prémio Nobel, os economistas escrevem livros
depois de ganharem o prémio Nobel.
Pedro Gomes
todos. E ele fala no grassroots innovation, ou seja, a inovação vinda
da base, que são pessoas normais como eu e tu, que têm
um problema e que pensam nessa numa solução e que resolvem os
problemas concretos e pode ser dentro do emprego, com a satisfação do
trabalho, estão contentes e depois resolvem os problemas que fica dentro da
empresa, mas o que eu acho é que muita desta grassroots innovation,
inovação de base, vem do tempo de lazer, que dá tempo de
explorar a tua paixão, como tu fazes com este podcast e não
há nada em economia que estude. Isto então eu fui mais à
parte das tão acasos de estudo e o melhor exemplo, porque eu
falo muitas vezes no Henry Ford no livro, era o Henry Ford
vinha de uma família de agricultores, portanto relativamente pobre, era muito inteligente
e apaixonou-se por carros. Então, trabalhava numa fábrica de eletricidade do Thomas
Edison seis dias por semana e construiu o primeiro carro com motor
de combustão interna a trabalhar todas as noites e todo o sábado
à noite durante três anos. Portanto, Ele tornou-se o melhor empresário, no
Henry Ford, o melhor empresário do século XX e possivelmente sempre, não
pelo que fazia no seu trabalho, mas pelo que fazia no tempo
de lazer. Ele era também um trabalhador anónimo, com milhões de trabalhadores
americanos e foi no tempo de lazer que inovou. E só tinha
um dia e ele trabalhava o sábado à noite, presumo, para descansar
no domingo. Mas a Apple também começou assim, o Steve Jobs não
tinha um emprego, mas o colega de invenção Steve Wozniak trabalhava na
HP um ano até terem construído o primeiro Macintosh. E o último
exemplo que eu tenho, não tenho no livro, é o Wordle, que
é este jogo que está a fascinar todo mundo,
a
pôr nas redes sociais, que é esta variante entre o Mastermind e
o Scrabble, que era um trabalhador do Reddit que pensou no jogo
para a sua namorada e depois durante a pandemia fez e agora
o jogo foi vendido por um milhão ou mais de um milhão
de dólares ao New York Times, que é muito mais do que
ele ia ganhar provavelmente em 10 anos de salário. Portanto, a sua
contribuição para a economia foi do tempo de lazer. Então, se depois
vamos a escritores, portanto, Pessoas, Zé Regis, o Seramagos, vamos a músicos,
aqui em Portugal, o Carlos Paredes, o António Variações. Pedro lá do
Einstein também. O Einstein que trabalhava nas patentes. O Pedro Almodóvar que
trabalhou 12 anos na telefónica enquanto estava a escrever guiões. Então há
um sem número de exemplos. E esta concepção, ou esta visão, parece-nos
muito estranha porque de uma perspectiva moral, filosófica, vemos sempre o trabalhar
como contributo para a sociedade. Mas há uma visão mais antiga, da
Grécia antiga, que via o lazer como o tempo nobre. Aristóteles falava
nós havia muitos cravos, portanto nem todos as pessoas eram cidadãos, mas
todos os cidadãos eram investigadores e trabalhavam o que tinham de trabalhar
para serem independentes, não para acumular riqueza, mas para depois terem esse
tempo livre e qual é que foi a sociedade, a civilização mais
inovadora que contribui mais para os fundamentos de nossa sociedade ocidental atual
foram os gregos. Portanto, há uma concepção filosófica
José Maria Pimentel
por trás que depois traduz-se na própria economia. Eu acho este argumento
muito interessante. Também tu dizias que o teu principal argumento era o
meu argumento natural também E acho que ele até pode ser descascado
de várias formas, porque há um lado de... Tu dizes, as pessoas
têm mais tempo, têm mais tempo para inovar, isso é quase aritmético,
quase direto. E pode até ser no trabalho, pode até ser terem
mais tempo livre no próprio trabalho, ou pode ser alguma coisa do...
Ligada a um hobby do dia a dia, quer dizer, são coisas
que requerem tempo e as pessoas passam a ter tempo para se
aplicar e resolver esse problema. Depois também podes ter até questões relacionadas
com a própria saúde mental e o estado de espírito, e portanto,
se as pessoas estiverem mais descansadas e melhor com a vida, têm
mais disponibilidade para isso. E depois há o outro lado, que é...
Enfim, parece um bocadinho cor-de-rosa, mas eu acho um lado interessante que,
e eu lembro até, já não é a primeira vez que eu
falo disto no podcast, lembro-me de falar disto logo num dos primeiros
episódios com o Arlindo Oliveira, que era sobre inteligência artificial, e tu
hoje em dia, de facto, tens muitos investigadores a investigar sobre esse
tipo de áreas e, portanto, à procura da inovação. Mas aquela é
uma procura ortogonal, não é? Ou seja, eles têm um problema e
estão a tentar aplicar o máximo de horas possível e de atenção
possível e de recursos cognitivos possível para resolver. Mas a criatividade, aliás,
há um livro até do John Cleese que fala um bocadinho disso,
a criatividade normalmente vem quando tu não estás à procura,
José Maria Pimentel
E tu se pensares, isto é um bocadinho romântico, mas tu pensares,
há uma série de autores, de cientistas até que fizeram grandes contribuições
na era pré-moderna, no sentido pré-contemporânea, que tinha muito mais liberdade de
tempo. O Darwin, por exemplo, ele trabalhava, até há um livro sobre
isso, ele trabalhava três ou quatro horas por dia, quer dizer, e
o resto do tempo ele não estava propriamente, não estava a jogar
snooker provavelmente no café, não estava, e se estivesse, se calhar, não
havia problema, não é?
Pedro Gomes
Há o Bertrand Russell, tem um ensaio em Praise of Idleness a
favor da ociosidade, não sei como será a tradução em português. E
ele fez este argumento, Era também na linha do Keynes que devemos
trabalhar menos e ele fazia este argumento muito bem. E ele dizia
que toda a civilização evoluiu da classe do ócio. Portanto, o Darwin
apareceu assim, mas ao lado do Darwin estavam, Ele falava em 10
mil fidalgos que não pensavam em mais nada do que caçar ou
punir os caçadores furtivos. E o que ele diz é exatamente... O
argumento está lá no Bertrand Russell, eu pensei, mas depois está mais
bonito como ele escreveu, mas é exatamente isto de dar a todas
as pessoas essa hipótese, dar aos professores a possibilidade de lerem outras
coisas para poderem ensinar com outros métodos, é dar a possibilidade às
pessoas de se calhar investirem na política ou estudarem mais, é um
dos outros argumentos, a questão de fazer mais voluntariado ou fazer ter
mais tempo e eu acho que é, de facto, o mais forte.
Porquê? Porque a economia, o capitalismo, avança ou só funciona quando há
inovação. Sim, essa é uma espécie
José Maria Pimentel
de paradoxo do capitalismo, é que o capitalismo precisa de pessoas, aquilo
que no fundo alimenta a expansão da economia, que é essa inovação,
precisa de pessoas que não estejam simplesmente a produzir e portanto precisas
ter esse lado, esse é um argumento interessante. E eu acho que
há outro, há um argumento que está relacionado com este, que não
tem tanto a ver com a inovação per se, mas tem a
ver com a... É outro dos argumentos que usaste, tem a ver
com a liberdade. Este é um bocadinho mais moral, mais ético, mais
filosófico. E aqui a pessoa podia dizer... E leves, podemos pegar nesse
exemplo do Darwin. Tu dizias e bem, a pessoa pensava, ah o
Darwin que bonito, tinha tempo, fez aquelas contribuições todas. Sim, mas para
cada Darwin havia 99 tipos que não estavam a fazer nada de
jeito. Estavam a caçar como tu dizias. Portanto, é um bocadinho romântico
achar que a contribuição seria necessariamente positiva das pessoas passarem a ter
mais tempo livre. Mas, por outro lado, eu tive essa reação inicialmente
quando estava...
José Maria Pimentel
é muito maior. É muito mais do que os 99 que tiveram
sem fazer nada. Exatamente. Sim, sim, sim. Absolutamente. Mas eu ia até
mais longe do que isso. Já não tem a ver necessariamente com
a inovação. É que eu acho que nós também podemos pensar que
ao dar mais tempo às pessoas não é só os outros 99
tipos não estarem a fazer nada, nenhum contributo positivo, é que eles
podem estar a fazer coisas que nós consideramos negativas. Digamos assim, maus
hábitos, seja do ponto de vista moral ou até do ponto de
vista social, ou seja, coisas que... Sei lá, vícios ou coisas que
tenham externalidades negativas para o resto da sociedade. Mas, na verdade, eu
não consigo provar isto, mas eu suspeito que grande parte desses hábitos
que nós vemos que são maus para as próprias pessoas e até
podem ter externalidades negativas para as sociedades, esses hábitos resultam também em
muitos casos das pessoas estarem precisamente pouco motivadas no trabalho, demasiado estressadas
e trabalhando mais. Sem
Pedro Gomes
Mas é curioso, esse argumento do... As pessoas vão fazer coisas... Eu
li... Li-a-se quando se falava da semana de 12 horas para 10,
que diziam que as pessoas estão bem a trabalhar. Se não estiverem
a trabalhar vão apenas beber, jogar. E a mesma coisa dos seis
para os cinco. Aqueles tinham uma dificuldade adicional, que era o argumento
religioso que Deus só descansou ao domingo e, portanto, esse foi mais...
Agora esse pelo menos não se pode reciclar. E agora também se
vê nas redes sociais. Ah, quatro dias vai tudo ver pornografia em
casa. Portanto, eu tenho uma visão mais positiva e menos paternalista do
homem e mulher, das pessoas. E então o que eu acho é
que vamos dar liberdade e vamos entrar então no outro ponto que
faz. Vamos dar liberdade às pessoas, vamos dar tempo e liberdade para
as pessoas escolherem. E se as pessoas tiverem dinheiro vão gastar mais.
Se as pessoas tiverem uma ideia na cabeça vão tentar fazer acontecer.
Se estão numa ocupação que está em declínio se calhar vão tentar
estudar para mudar de ocupação. Se têm pouco dinheiro podem trabalhar mais
se quiserem. O mundo lá tem ter um segundo emprego, fazer os
pescados. Foi muito comum quando se passou da semana de trabalho de
seis dias para cinco dias e pode funcionar para uma parte da
população que quer continuar a trabalhar para ganhar mais dinheiro e tem
essa liberdade. É por isso que o argumento que se diz liberal,
porque é que o governo há de dizer às pessoas que devem
trabalhar aquilo que quiserem, porque é que o Estado tem de dizer
se têm de trabalhar cinco dias ou quatro dias. Eu acho que
há muito mais liberdade de trabalhar mais numa semana de quatro dias
do que existe agora liberdade para trabalhar menos numa semana de cinco
dias. E temos pessoas que podem conduzir o Uber, podem abrir uma
empresa em casa e fazer consultoria, um trabalho mais individual e menos
coletivo, mas que permite se quiserem fazer mais dinheiro, trabalham e nada
impede, ninguém impede de ter um segundo de fazer pescados e, portanto,
acho que há uma resistência de uma ala mais liberal à ideia,
porque tem uma ideia pré-concebida, mas não há nada de liberal e
iliberal na semana de trabalho de 4 dias. Aliás, quando vamos ler
o Friedrich Hayek, que é um dos pais do liberalismo clássico. Vamos
ao caminho da servidão, ao capítulo 3. E ele dizia que o
Estado deve fazer muito pouco, quase nada, mas uma das poucas exceções,
das três exceções, era limitar o tempo de trabalho. Porque não limita
a competição, porque afeta a todas as empresas da mesma forma. Não
afeta a concorrência. Aliás, podemos ver que é uma forma de fomentar
a concorrência, de pôr um bocadinho de pressão e as empresas que
se adaptarem melhor vão ganhar a cota de mercado. As empresas que
não se quiserem adaptar vão simplesmente aumentar o preço, não alteram os
processos de gestão, não alteram nada, podem refletir no preço e depois
perdem cota de mercado. Portanto, vai fomentar a destruição criadora, que é
outra vez uma
Pedro Gomes
Força a adopção de novas tecnologias, novos meios de produção e, portanto,
nós atualmente temos adotado muito a automatização porque as máquinas são mais
baratas. Portanto, a empresa tem a cenoura e o trabalhador tem o
pau e o que de certa forma o resultado é deprimir mais
os salários. O que acontece ao fazer através de um processo legislativo,
portanto, de cima para baixo, o que acontece é ao contrário, vai
ainda fomentar mais inovação ou mais automatização, a adoção de mais práticas,
mas é porque as empresas têm o pau e os trabalhadores vão
ter o benefício de mais tempo de trabalho, mas vai ser nesse
sentido, vai também promover essa adoção de novas práticas, de novas máquinas
e, portanto, aumentar
José Maria Pimentel
a produtividade. Sim, no nosso caso nós temos um modelo económico em
muitos sectores baseado no custo de trabalho baixo e isso leva a
que as empresas não tenham necessidade de inovar ou, por exemplo, de
adotar tecnologia, não é como falavas neste caso, e isso é um
aspecto interessante. Olha, vamos passar à implementação da ideia, nós já falámos
disso um bocadinho, no fundo aquilo podia correr mal e é perfeitamente
possível que a pessoa acredite na bondade desta ideia e, no entanto,
acha que ela é inexequível. Quais é que tu achas que são
as principais limitações? Aliás, deixa eu fazer a pergunta ao contrário. Imagina
que eu... Fazer aqui uma experiência mental. Imagina que eu era uma
pessoa do futuro, vinha do futuro e dizia-te Pedro, tentaram implementar isto
a partir do governo. O governo tentou implementar como tu sugerias e
não resultou. Mas não dizia mais nada e depois desaparecia. Qual era
o teu palpite? Ou seja, o que eu quero saber é o
que é que pode falhar e quais são os pontos em que
tu tens maiores dúvidas do teu vendedor? Vou dizer, o
Pedro Gomes
modelo Emirati, não é? Exatamente. E eu acho que isto é um
erro tremendo. Isto já foi experimentado no estado de Utah, nos Estados
Unidos, em 2011, com um governador republicano, John Huntsman Jr. Que implementou
da forma como a Bélgica vai tentar agora o Compressed Work Week,
portanto 40 horas em 4 dias, reduziu os custos para o Estado,
os trabalhadores estavam contentes, as pessoas do Estado estavam satisfeitas, na maior
parte 60 contra 20% contra.