#109 Octávio Mateus - Dinossauros, evolução, História da vida na Terra & mais
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José Maria Pimentel
Olá, o meu nome é José Maria Pimentel e este é o
45 Graus. Neste episódio estou à conversa com o Otávio Mateus, paleontólogo
e professor na Universidade Nova de Lisboa, onde ensina, entre outras áreas,
evolução, paleontologia dos vertebrados e dos répteis e, a principal área de
investigação, dinossauros, sobretudo do Jurássico de Portugal. O Otávio é autor e
coautor de mais de 200 publicações nesta área e já há três
décadas que participa e organiza escavações de dinossauros em Portugal, sobretudo em
colaboração com o Museu da Lourinhã, que é conhecido, como provavelmente sabem,
pela sua importante coleção de dinossauros. Otávio Matheus é conhecido o grande
público, sobretudo enquanto especialista de dinossauros, porque essa é, de facto, a
principal área de investigação dele, mas também porque o imaginário destes répteis
que dominaram a Terra até há 66 milhões de anos é, por
vários motivos, aquele que mais atenção atrai das pessoas. Mas a área
de estudo do convidado, a paleontologia, é muito mais do que simplesmente
dinossauros. É uma área da ciência que vai beber simultaneamente à biologia
e à geologia para tentar explicar a história da vida na Terra
nas suas mais variadas formas desde que ela começou há pelo menos
3.5 mil milhões de anos. Como vão perceber, esta foi uma conversa
cheia, o Otávio é um excelente conversador, na qual abordámos imensos temas.
Falámos sobre a história da vida na Terra, desde os primeiros organismos
unissolares até aos dinossauros, aos mamíferos e ao Homo Sapiens. Falámos do
processo da evolução por seleção natural e do modo como ele é
muitas vezes contraintuitivo, um tema que eu já tinha abordado nos dois
episódios que gravei com o Paulo Gama Mota. Falámos também de fósseis,
que são a matéria-prima principal de um paleontólogo. E claro, falámos e
muito sobre dinossauros. Quantos eram, o que sabemos sobre eles, o que
não sabemos sobre eles e mesmo o que é que os pássaros
vos podem ensinar sobre eles. Porque a verdade é que os pássaros
descendem diretamente dos dinossauros. Aliás, formalmente, os pássaros são um tipo de
dinossauro, porque descendem, são aliás, os únicos descendentes, do grupo ao qual
pertencia nada mais nada menos do que o famoso tiranossauros rex. Antes
de avançarmos para o episódio em si, queria deixar aqui uma espécie
de anúncio de classificados. Aqui há uns meses fiz um anúncio semelhante
à procura de um editor de som para o 45° e aproveito
para agradecer ao Hugo o ótimo trabalho que tem feito desde então,
agora estamos à procura de um ou de uma designer para o
podcast. O objetivo é ajudar sobretudo com conteúdos para as redes sociais.
Por isso, se conhecerem alguém que possa ter interesse neste projeto e
que encaixe neste perfil, enviem por favor um e-mail para 45graus arroba
gmx.com Obrigado. Finalmente, como de costume, queria agradecer aos novos mecenas do
45 Graus. São eles, Juli Piccini, espero estar a dizer bem, Beatriz
Bagulho, espero sinceramente não ter estropeado nenhum dos vossos dois nomes, Miguel
Torres Patrício, Pedro Ribeiro e Pedro Brabo. E pronto, vamos à conversa
com o Otávio Mateus. Otávio Mateus, muito bem-vindo. Obrigado. Olha, tu és
paleontologista, és conhecido sobretudo pela investigação na área dos dinossauros, já vamos
falar sobre isso, mas calhar vale a pena começar por perceber o
que é que é paleontologia e o que é que faz um
paleontologista.
Um paleontólogo.
Um paleontólogo? Um paleontologista? Não
José Maria Pimentel
E, por acaso, é engraçado eu gravar agora contigo porque eu, de
certa forma, fui enquadrando esta conversa em vários episódios, porque gravei, por
exemplo, com as Itamar Tins sobre astrobiologia, portanto, no fundo, falámos muito
como é que terá começado a vida na Terra, mas isso precede
a paleontologia, e depois gravei com o Paulo Gamamotti não só sobre
a biologia evolutiva, que começa aí, no fundo, mas, como tu dizias,
o objeto estudo da biologia são espécies vivas, maioritariamente, e também, por
exemplo, com a Jânia Cunha, sobre a antropologia biológica, mas aí também
mais focada no homem. A ideia que eu tenho é que a
paleontologia tende a... Não sei se se calhar estou enganado, mas a
ideia que eu tenho é que tende a focar-se menos no homem,
ou seja, tende a... Correto,
José Maria Pimentel
fósseis, no fundo é a vossa matéria-prima principal, não é?
É, praticamente a única,
não é verdade? Praticamente a única, sim, exatamente. Sim, nesse sentido é
uma... Pois é, é um desafio grande, não é? Porque não conseguem,
não tem hipótese de estudar, quer dizer, tem hipótese com as espécies
que existem atualmente, maioritariamente, ou aquelas que ainda se conseguem encontrar restos
de DNA, mas a biologia molecular não vos pode ajudar
tanto como
na biologia em geral.
Octávio Mateus
Se a pergunta é conseguimos ressuscitar um dinossauro ou algo desse género
a partir de DNA que conseguimos tirar de fósseis é não, absolutamente
não. Podemos ter um exemplo muito mais próximo a nós, o tigre
da Tanzânia, o Tilacino, que distinguiu-se nos anos 40, creio eu. Ainda
há filmes desse Tilacino, é um marsupial e está conservado em álcool,
temos as células e isso tudo. Mesmo com esse animal, não conseguimos
ainda extrair DNA de modo a poder clonar. Não conseguimos. Ainda por
cima, é um marsupial, nem sequer é um placentário, portanto não precisava
de um hospedeiro como um placentário. Seria muito mais simples e mesmo
assim não conseguimos. No caso de um dinossauro com o DNA seria
quase impossível, mesmo se conseguíssemos tirar algum material genético, apenas conseguiríamos dizer
que... Seriam fragmentos... Sim, nunca seria a
Octávio Mateus
Não temos a sequência completa porque o DNA é relativamente frágil. É
que é uma molécula muito frágil. É extremamente longa. Eu acho que
uma boa analogia será o DNA é como se tivéssemos uma biblioteca
com instruções E ardemos a biblioteca, a biblioteca pega fogo porque tem
a ver com a sua fossilização, portanto, a destruição das células e
depois conseguimos recuperar, apagar parte do fogo e conseguimos recuperar essa biblioteca.
Vamos recuperar alguns livros queimados, percebemos a língua, percebemos o tipo de
letras, percebemos porventura do que é que estão a falar, mas nunca
conseguimos reconstruir toda a história daqueles livros. E o DNA é um
pouco semelhante assim. A visualização vai destruir parte daquelas moléculas, aquela informação
vai ser destruída. Eu acho muito, muito difícil em espécies petrificadas, espécies
fósseis petrificadas, que é uma vez que consigamos recuperar. Em espécies que
ficaram congeladas, como os mamutes, ou como o tilicino em álcool, eu
acho que mais cedo ou mais tarde poderemos lá chegar, mas até
agora ainda não conseguimos,
Octávio Mateus
Muito bem, um fóssil é um resto de um animal, de um
ser vivo, um animal, uma planta, ou outro ser vivo, que foi
alterado por processos diagnéticos, por processos geológicos. A maioria dos fósseis são
petrificação, portanto, ficou enterrado em lodos e areias, houve uma série de
trocas de moléculas e a própria rocha acaba por petrificar o objeto,
portanto, aquele ser vivo, perdendo ele os tecidos moles, portanto, fica normalmente
registado, são ossos, troncos, dentes. É o que é mineralizado. É o
que é mineralizado. Há uma troca dos elementos. Ou seja, a pedra
substitui... Uma substituição que chega a ser completa, portanto com fósseis muito,
muito antigos não temos uma única molécula, se seja ainda original. Mas
até mesmo em casos de dinossauros, às vezes temos as células originais
com todos os aspetos como se fosse uma célula óssea. Sim, menos
o DNA. Nós fazemos secções finas aos ossos, portanto, às vezes cortamos
os ossos, fica uma secção tão fina, podemos olhar no microscópio e
assim ver as células e às vezes são indistinguíveis de um osso
moderno, o que é incrível. O que nos permite ter um conhecimento
sobre a biologia, o próprio crescimento dessas espécies, sabemos, por exemplo, que
os vertebrados que crescem de forma mais rápida são os dinossauros. Não
há nada que cresça tão rápido quanto um dinossauro. Ok, essa era
uma das perguntas que eu tinha para te fazer. As aves crescem
também muito rápido, mas as aves são dinossauros.
Octávio Mateus
naquele caso. Às vezes há casos de mumificação, tal como existem casos
de mumificação relativamente recentes, até com pessoas, se as condições forem ideais,
ou seja, imaginemos que o animal ou a planta ficam num sítio
sem oxigênio, portanto não há bactérias que façam nenhuma decomposição. Esse é
o caso dos poços de Alcatrão. Em Labreia, em Los Angeles, há
um poço de Alcatrão muito conhecido porque apresionam muitos animais, portanto, vários
lobos, leopardes, leões, camelos, elefantes, etc. Ficaram presos naquele alcatrão e o
alcatrão não tendo, sendo completamente não só inerte, mas criá-lo uma capa
que não permite as bactérias sobreviverem naquele sítio e então não temos
de composição. Mumificam.
Essa
mumificação é o primeiro passo para depois haver uma fossilização desse gênero
e em casos extremos temos às vezes fósseis espetaculares com intestinos, com
pele, com músculo, com as garras, com o bico, com as penas
é relativamente frequente, ou seja, continuam a ser raros mas já se
conhecem uns quantos casos. Portanto, em situações extremas, às vezes também temos
fósseis extremos como esses. Requerem quase sempre um ambiente anaeróbico,
Octávio Mateus
Exato, exato. Não, este 100 em particular é a idade com que
nós trabalhamos todos os dias na Lourinhã, a altura mais produtiva. Isto
é mais milhão menos milhão. Claro. Parece ridículo para os ouvintes, porventura,
que um milhão de anos é a nossa unidade de escala, mas
está dentro do nosso erro, 152, mais ou menos. Sim, Claro, claro,
claro. Mas
José Maria Pimentel
é incrível, eu não sabia disso, a coisa é muito curiosa. Bem,
não sabia de duas coisas, já me disseste duas coisas que eu
não sabia. Primeiro, que a fossilização, em muitos casos, não era completa
e, portanto, se preservavam células ósseas. E, em segundo lugar, que a
preservação de sítios mols tinha essa escala. Eu achava que não, achava
que era
Octávio Mateus
um... A substituição, voltando atrás, a substituição das moléculas é gradual. É
muito difícil dizer. Aliás, nós não temos uma definição muito boa do
que é um fóssil. É como há espécie e como há vida.
Nós sabemos perfeitamente o que é vida. Mas Ali há aquelas fronteiras
em que não sabemos muito bem. É a mesma coisa com as
espécies. Sabemos o que é uma espécie, mas ali na zona fronteira
há uma nebulosa difícil e no fóssil é a mesma coisa. Se
alguém deixar o resto do animal dentro de um cimento fresco e
ele ficar lá morto, até que ponto é que aquele cimento fresco
vai penetrando dentro do resto daquele animal e vai se tornando um
fóssil. Ou mesmo, seja, não seja cimento, seja uma argila, seja o
que for, a partir de quantos anos é que é um fóssil,
a partir de quanta substituição é que é
Octávio Mateus
difícil. Na arqueologia, nós chamamos às vezes, a vestígios humanos ou associados
a humanos, que são subfósseis. Portanto, já tem ali uma certa alteração
diagenética, mas ainda tem tem muita matéria orgânica, consegue-se tirar DNA, por
exemplo, mas consegue-se tirar, não DNA, mas conseguiu-se retirar colagênio de ossos
de tiranossauro rex com 66 milhões de anos e é o colagênio
dessa idade, o que é impressionante, colagênio também é uma molécula muito
mais resistente. Aliás, tem essa função também para dar resistência
Octávio Mateus
sem oxigênio. Quando lhe é isso, alguma coisa em cima... Claro, tem
de ser enterrado. O que pedisse o oxigênio de... Tem de ser
enterrado, tem de ser um sítio que esteja a afundar em subsidência.
Exato, exato. Um pouco
como a cidade do México está a afundar, e a uma velocidade
incrível, e Jakarta também, ao retirar-se a água dos lençóis friados e
com o peso da cidade, está a afundar a vários centímetros por
ano. Isso faz com que qualquer animal que fique num riacho, por
exemplo, e que morra aí, seja coberto por argilas e arnitos. Esses
terrenos vão afundando e resistem pelo menos um milhão de anos, pois
podem voltar outra vez à superfície e então estariam disponíveis a paleontólogos
do futuro. Seria essa, cobertos rapidamente, não serem comidos por compositores ou
necrófagos e ficarem em subsidência, ficarem a serem enterrados cada vez mais
fundo. Se ficarem lá embaixo durante aquele tempo todo, não é?
O que também é outro. Por exemplo, no topo
de uma montanha nunca seria um bom sítio. Exato. Pode ser assim
remoto. E Está muito exposto também. Está muito exposto e as montanhas
estão sempre a erudir. Exato. Quase por definição. Tu
Octávio Mateus
de haver... Exatamente, exatamente, é isso mesmo. A quantidade de fósseis que
nós temos depende de uma série de fatores, mas basicamente são quatro.
Se é um sítio bom para os animais ou para aquele organismo
viver, por exemplo, imaginemos que queremos dinossauros. Queremos um sítio bom onde
eles tenham vivido. Portanto, tem que ter água doce, tem que ser
continental, então não pode ser o mar, água doce, vegetação, um ecossistema
saudável. Tem que ser um sítio bom para eles fossilizarem, ou seja,
o esqueleto tem de ser enterrado e tem de haver uma geoquímica
à volta da rocha, à volta daqueles ossos, nem muito básica, nem
muito ácida para os ossos ficarem preservados. Portanto, tem que ter condições
ideais para conservar. Todas essas rochas vão mergulhar por causa da questão
da tectónica e, mais cedo ou mais tarde, estar à superfície. E
isso também é essencial, porque se estiver a mil metros de profundidade,
não serve nada. E, por fim, tem que estar acessíveis a paleontólogos.
Se houver uma floresta, campos agrícolas, uma cidade ou um deserto em
cima, nós não vamos aceder àquelas rochas. Portanto, tem de ser um
sítio bom para viverem, para fossilizarem, para essas rochas estarem à superfície
e para serem acessíveis. E só assim é que temos acesso àquele
dinossauro que queremos. E, na verdade, não há assim tantos sítios no
mundo com estas condições. Cá em Portugal o melhor sítio é sem
sombra dúvida a zona da Lourinha e Conselhos Limítrofos, mas não quer
dizer que têm estas condições, porque as rochas são da idade certa,
ambientes continentais, perfeitos para viverem, para fostilizarem e por isso tudo que
disse. Mas não quer dizer que no Minho não fosse ainda melhor
para eles viverem. Houve-se ainda mais dinossauros no Minho. Acontece que não
temos uma única rocha da idade certa e dessas condições. Portanto, é
impossível descobrirmos dinossauros no Minho e enquanto na Lourinha temos quase pedra
sim, pedra não.
Octávio Mateus
a tectónica. A tectónica está sempre a baixar e a levantar determinadas
camadas. Portanto, cada vez que há uma formação de uma montanha, os
Alpes ou os Pirineus ou os Himalaias são precisamente o movimento das
placas ou microplacas que levantam aquela rocha, mas muitas outras mergulham debaixo
delas e, portanto, algumas estão acessíveis, outras não. E neste movimento, algumas
têm que estar, se se levantam demasiado, acabam por ser erudidas e
depois ao nosso nível temos rochas mais antigas. Se não levantam o
suficiente, temos rochas mais recentes. Ou seja, ali um sweet spot. Exato,
exato. Que vai nos dar a idade certa que nós queremos.
Octávio Mateus
ou não? Com certeza, com certeza. Como estava a dizer, se queremos
animais continentais, queremos rochas que sejam produzidas em ambiente continental, obviamente. Não
queremos mar, não queremos granito, de certeza, não queremos uma lava porque
é impossível encontrar um fóssil. Temos rochas sedimentares e dentro das rochas
sedimentares, ambientes continentais, por o caso de dinossauros. Granito não, porquê? Desculpe,
deve ser uma pergunta básica. O granito é uma rocha de profundidade,
o granito é produzido no interior do manto, portanto, não é uma
rocha sedimentar, é milhões de anos mais antiga que qualquer dinossauro, normalmente,
portanto, é impossível encontrar um fóssil no granito, absolutamente impossível. E aquele
exemplo que eu dei de Minho, Minho tem muito granito, portanto, também
podemos procurar.
Octávio Mateus
para os humanos. Exato, é excelente para fósseis humanos. Usamos outros isótopos
de estroncio, é a mesma lógica, são isótopos radioativos, portanto, têm um
decaimento de meia vida e, portanto, se medirmos esse decaimento conseguimos, tendo
a premissa que esse decaimento não altera ao longo dos milhões de
anos, conseguimos medir esse decaimento e pronto, é tão simples quanto isso.
Contudo, esses isótopos aparecem só em alguns sítios, nem sempre temos, não
é pegar numa rocha, dar-lhe um martelado e o martelo diz-lhe o
valor, porque isso não acontece. Às vezes só conseguimos em certas conchas
ou em alguns elementos que se têm basaltos, por exemplo. Portanto, o
que fazemos é uma biostratigrafia. Isto é, nós olhamos para o tipo
de rochas que existem, o tipo de fósseis que existem nas rochas
e comparando o tipo de fauna que nos vai dar uma idade
relativa. Quando dizemos que as rochas são do Jurássico, isto foi porque
rochas tinham fauna do Jura nos Alpes. A fauna semelhante ao Jura
acabou por dar o nome Jurássico. Os geólogos viram que essas rochas
estavam abaixo de uma rocha que formava um giz, um querré, que
deu o critássico e fizeram esse empilhamento dos estratos, percebendo que havia
uma relação entre estas rochas todas. Isto foi muito antes de saber
uma idade. Já Darwin, e na altura não tínhamos datas nenhumas, Darwin
já conhecia bem os estratos que o Devon e que estava ainda
antes do Mesozoico, no Mesozoico e o Triásico antes do Jurássico e
este antes do Cretáceo, etc, etc. Nós já sabíamos esta idade relativa
só vendo as camadas e correlacionando as camadas. Esta ciência chama-se estratigrafia
e isso permite-nos uma idade relativa. Nós não precisamos de olhar para
um edifício para conseguirmos saber a idade aproximada daquele edifício. Aquele estilo
arquitetónico, nós conseguimos ver se tem 50 anos ou se tem 100
anos, não é? Ou se tem 300. Aquele estilo arquitetónico pode ser
comparado àquele tipo de fauna. Daquele tipo de fauna já nos dá
uma pista da idade mesmo que não tenhamos. A idade ao certo.
A idade ao certo ao milhão de anos, calibrada com os isótopos.
E qual é o fóssil mais antigo que existe? Os fósseis mais
antigos conhecidos são vestígios de bactérias em superfícies de rochas, muito semelhantes
Octávio Mateus
começou a vida, não é? Sim, sim, sim, Sim, mas esse é
o registro mais antigo que temos, a vida de certeza que apareceu
antes. Nós vamos sempre...
Claro, pode ter sido... Nós temos
sempre o registro fóssil, é diferente da biodiversidade real. O registro fóssil
é sempre mais incompleto, a biodiversidade
é outra história,
claro está. O mais antigo que temos é de 3.600 milhões de
anos e sabemos por algumas rochas que alguns isótopos têm a espécie
de seres biogénicos, já existiram muito antes disso. Mas isso não é
realmente um vestígio de um animal, é apenas um indício de vida
na Terra. E continua assim durante 2.000 milhões de anos. É uma
vida muito pouco ambiciosa em termos estilo de bactérias ou equivalentes ou
arqueas e assim foi, mas esse tipo de registro é muito comum,
continua hoje esse tipo de vida, aliás, quando nós temos nas nossas
cozinhas ou casas de banho ou nas paredes uma película meio de
algas, lodos e isso tudo, é esse tipo de película de bactérias
que já existiam há 3 mil milhões de
Octávio Mateus
Sim, são aquelas que têm, basicamente, acho que a ver se consigo
pôr 3.600 milhões de anos em poucos minutos. Começam pequenas células, na
verdade, começam primeiro moléculas que se replicavam e tinham algum poder de
hereditariedade. Portanto, manter alguma informação e replicar essa informação. Antes ou depois,
criaram uma membrana e fizeram uma célula, basicamente. Essas células não tinham
núcleo. Quando ganharam o núcleo, são os eucariotas. As nossas. Que são
as nossas, somos eucariotas. Essas células, passados milhares de milhões de anos,
começaram-se a aglutinar e formar pequenas colónias e são o início de
seres multicelulares. Portanto, É um pouco mais desenvolvido. Esses seres unicelulares, a
partir do momento que começaram a organizar em tecidos, com diferenciação de
funções daquelas células, deixaram de ser apenas uma colónia. No caso das
esponjas, por exemplo, ainda não temos isso. As esponjas são dos mais
antigos animais que existem há cerca de 630 milhões de anos. Desculpa
interromper, eu vi um link que
Octávio Mateus
anos. Exatamente, o que é fantástico. A confirmar essa investigação que esses
colegas fizeram, põe muito para trás o início da vida, ou melhor,
o animal mais antigo, melhor dizendo, há muitos anos, e até antes
do criogénico, o que é interessante, porque numa altura que a terra
teve completamente congelada e esses animais já existiam, essas esponjas já existiam
e sobreviveram esse período. Portanto, essas colónias começaram a criar as tantas
tecidos, tecidos mais diferenciados, então temos, por exemplo, os corais, ganharam um
sistema bilateral, portanto, começamos a ter animais com
o
lado esquerdo e lado direito, parte de cima e parte de baixo.
Repara que os pões não têm parte de cima e parte de
baixo, os corais já têm, É
uma
novidade curiosa. Os corais mais ou menos organizam-se e sabem o que
é. No seu desenvolvimento ontogenético, sabem o que é que é a
parte de cima e organizam-se dessa forma, parte de cima e parte
de baixo. A parte de cima normalmente tem os tentáculos, a parte
de baixo são césseis. A parte de baixo está presa ao coral
ou as alforrecas que fazem exatamente o oposto. Ah,
José Maria Pimentel
câmbrica, sim. Ok, eu tinha ideia, tinha sido nessa altura. Isso foi,
desculpa, agora já me perdi nas datas, a explosão do câmbrico foi
quando? A explosão do Câmbrico foi aos 600 mil anos. Juro que
há uma discussão ainda a decorrer sobre isso, sobre quão explosiva foi
essa explosão, digamos assim, porque no fundo a tese é que, e
é o que mostra o histórico de fósseis, é que de repente
surge uma diversidade enorme e não só uma diversidade enorme, mas a
maioria das... Não é das espécies, é uns degraus acima das...
Octávio Mateus
Nós temos um viés sempre, em tudo, e então na paleontologia o
registro fóssil é muito incompleto. E quanto mais conhecemos do nosso registro
fóssil, de sítios diferentes, que não sejam a América do Norte e
a Europa, que são sobremostrados. Então às vezes encontramos cada vez registros
mais antigos ou mais completos desse registro. E a explosão, seja como
for, foi incrível. Em poucas dezenas de milhões de anos tivemos uma
radiação evolutiva, o nome é esse, de animais relativamente simples. Temos as
principais linhagens que sejam as esponjas, os corais, os protostómios que dão
origem aos insetos, aos anelídeos, etc. Os deutrostómios que dão origem a
nós e aos equinodermos. Portanto, toda essa radiação, o Maurício do Mar,
toda essa radiação foi muito, muito rápida e talvez tenha sido o
resultado de uma corrida ao armamento evolutivo. Os seres começaram a sofisticar-se
cada vez
Octávio Mateus
isso fosse exponencial? Logo a seguir ao criogénico, foi importantíssimo. Houve aquele
momento de efeito bola de neve em que toda a terra, mesmo
no Equador, estava gelada e aí não havia muitos ecossistemas. Foi logo
a seguir a isso, demorou a acelerar, a diacara logo a seguir.
A diacara já
é muito,
muito diversa, mas é muito pouco abundante. No câmbrico, o que nós
vimos é uma explosão da diversidade que já existia e da abundância
que foi, entretanto, adquirida no Câmara. Agora, ao ouvir, estou com uma
pergunta que é interessante na sequência disto, que é nós
José Maria Pimentel
sabemos que a evolução não é teleológica, ou seja, que a evolução
não tem realmente um objetivo, não é? Mas, por motivos lógicos, entre
os quais essa questão dessa espécie de corrida hormonamente entre as espécies
e eu diria, não só a própria passagem do tempo e o
efeito incremental, a verdade é que a vida se foi tornando mais
complexa, digamos assim, ou seja, tu passaste do... Ainda não acabamos essa
cronologia, mas começaste com os prokaryotes, eukaryotes, multicelulares, depois fostes desenvolvendo aquilo
que tu falavas há bocadinho, baixo e cima, esquerda e direita, foste
envolvendo diferentes órgãos, diferentes tecidos, uma sofisticação... Tirando desta equação o cérebro
humano, e nesse caso estaríamos a falar de um evento muito mais
recente, cento ou cem mil anos, no caso do Homo Sapiens. Portanto,
tirando o cérebro humano da equação, quando é que a vida, nos
outros aspectos, atingiu o grau de complexidade equivalente ao das espécies
Octávio Mateus
atuais? Nós estamos sempre a sofisticar cada vez mais. Portanto, nunca vai
atingir tão sofisticado, excepto se distinguirmos espécies, do que no dia de
hoje. Ou seja, quando for o hoje. Portanto, estamos sempre a sofisticar.
É um pouco uma economia, uma vez mais. Todos os dias há
um negócio que tem uma ideia um pouco diferente de sobreviver. E
nas espécies é a mesma coisa. Todos os dias há ali uma
pequena estratégia, uma nova enzima que faz algo diferente.
E isso
vai acumulando. E é gradual. É muito difícil dizer quando é que
chegamos à sofisticação do que hoje. Então, mas deixa-me pôr isto de
outra forma. Daqui a um milhão de anos, se não extinguirmos demasiadas
espécies, daqui a um milhão de anos
Octávio Mateus
tinha músculos, que tinha... Super sofisticado. É muito sofisticado. Sim. O meu
ponto é esse, não é? É difícil executar um dinossauro tirando a
parte cognitiva. Mas, claro, nós estamos aqui a confundir tempo com sofisticação.
A sofisticação tem a ver com a posição na árvore da vida
e a acumulação de características novas. Essa é a subesticação. Portanto, nós
e um dinossauro, eu diria que estamos de igual
forma...
Exécutivos. Exécutivos. Estamos em uma subesticação diferente, claro que está, mas os
dinossauros fazem coisas atualmente que nós não fazíamos. Portanto, nomeadamente voar. As
10 mil espécies de dinossauros que temos atualmente fazem coisas que nós
não conseguimos, nós mamíferos não conseguimos. E os dinossauros do mesozoico, que
não voavam, pelo menos não todos, não faziam o mesmo que as
aves atualmente, mas faziam coisas... Quantas vezes os grãos-taros atuais são as
aves? São as aves, claro que está. Em termos de metabólicos são
muito semelhantes às aves. Mas atualmente continuam a existir bactérias e esponjas
e corais, que são menos sofisticados. Não é por ser hoje que
são mais sofisticados. É por ser a posição da árvore de vida,
claro que está. Claro,
Octávio Mateus
aqui já temos que tomar algumas decisões para que linhagem é que
vamos. Se vamos para aquela que dá origem aos insetos, ou por
exemplo, ou se vamos àquela que dá origem a nós mesmos. Vamos
por essa. Os animais começaram a ter o que é uma parte
da frente, uma parte de trás, a parte de cima e a
parte de baixo. A parte da frente e a parte de trás
é importante porque finalmente ficou decidido onde é que é a boca
e onde é que é o ânus. E isso é importante até
no desenvolvimento corporal. Porque animais mais primitivos estavam no mesmo sítio, basicamente.
Essa parte da frente desenvolve-se mais como uma cabeça, como é lógico,
e começaram a segmentar o corpo, tal como o anelídeo e tal
como a minhoca é segmentada. Nós evoluímos deste tipo de animais, simplificamos
a segmentação, praticamente agora já não se vê no nosso corpo, mas
ainda temos. Só um parênteses relativamente à segmentação, vemos nas nossas vértebras,
que são uma série de segmentos iguais, nas costelas ou no famoso
músculo six-pack que os atletas têm no abdômen. Isso são os somentes
dos músculos e são as tais segmentações equivalentes ao que uma minhoca
tem. Este tipo de desenvolvimento foi acompanhado por uma notocorda, que é
um desenvolvimento ótimo que permitiu uma série de nervos irem da zona
da cabeça até à ponta da cauda e uma estrutura mais ou
menos flexível que permitiu esses organismos começarem a locomover-se de forma ondulada,
um pouco como ao peixe. Então já tínhamos, além de começar a
parte da frente do animal a desenvolver tudo que se fosse partes
sensoriais. Portanto, os olhos desenvolveram-se na parte da frente do corpo, o
olfato, o sabor, etc. Portanto, temos ali uma sala de controlo do
próprio organismo e a começar a desenvolver-se alguns glândios que deram origem
ao cérebro. Portanto, aqui já temos algo muito semelhante a um peixe.
Essa nota acórdica e esses segmentos se substicaram, se ganharam ossos e
vértebras e temos os vertebrados e temos um peixe. Portanto, um animal
com segmentação, claramente com uma zona central no corpo, com tudo que
seja aquisição de informação, nomeadamente a visão. É concentrado. Temos um peixe
pouco sofisticado, mas temos um peixe. Esse tipo de sofisticação vai melhorando
cada vez mais. A linhagem que dá origem a nós desenvolve barbatanas,
barbatanas lubadas que, em parte, de forma um pouco complicada, mas não
vale a pena estar aqui a promenorizar, mas dá origem aos nossos
membros e aparecem animais semelhantes a anfíbios que ainda estão dependentes de
pôr os ovos na água. Mas temos um animal semelhante a uma
salamandra, por exemplo. Os tetrapodes, não é? Os tetrápodes. São os com
quatro patas. Tetra de quatro podes de patas. Sempre dependentes da água.
Aparecem duas invenções evolutivas, entre aspas, que permitiram conseguirem libertar-se da água,
foi o ovo amniótico, portanto, a partir do momento que começaram a
ter um ovo com uma casca, é como se tivessem parte do
oceano portátil e, portanto, permitiu-lhes conquistar desertos. Os cetrópitos aí já estavam
a caminhar em terra, o que também foi essencial. Aquelas patas e
o desenvolvimento de um pescoço já lhes permitia caminhar em terra. Até
Octávio Mateus
pele. Correto, suam, mas suam menos. Ao mesmo tempo, criaram precisamente o
pelo para termorregulação, para controlar a temperatura. Os ovos, que é uma
invenção fabulosa, às tantas era uma complicação e o melhor era que
eles eclodissem dentro do próprio organismo. E, portanto, temos animais que eclodem,
que os ovos eclodem dentro do próprio organismo, como os cangrusos, os
marsupiais.
Octávio Mateus
Para poder desenvolver aquele embrião. Reparem, o tipo de sangue da mãe
e da criança pode ser diferente. Portanto, numa situação qualquer, a outra
era explícita como se fosse uma agressão. Mas ali não. O corpo
da mãe trata da cria como sua, mas precisa de um tradutor
daquele tipo de sangue e isso é a placenta. Isso permitiu os
mamíferos placentários também no fundo terem esta radiação evolutiva, semelhante àquela que
tivemos no câmbrico, naquelas formas todas que hoje conhecemos como mamíferos. Dentro
disto, um grupo muito semelhante a ratinhos, mas que estava um pouco
mais especializado num ambiente arbóreo, desenvolve-se cada vez mais com uma caça,
porventura, uma caça noturna, precisava de olhos grandes, sociais, portanto precisavam de
um cérebro um pouco maior, estamos a falar claramente de primatas, quer
eu dizer. Dentre desses, há uma espécie que tem uma sofisticação em
termos de cérebro, em termos de inovação, torna-se bípede e a parte
bípede é essencial, ao mesmo nível que o nosso cérebro, é essencial
para o nosso sucesso, tornam-se especializados em caça de megafauna, em caça
de grandes animais e para isso precisavam do cérebro para sofisticar a
sua caça, porque até um leão é fácil de caçar para quem
não tenha um cérebro. Basta um pouco de veneno e está feito.
Um elefante basta um arame agarrado a uma árvore e faz-se uma
armadilha. É fácil matar, ou seja, matar um animal a grande porte
se tivermos um cérebro sofisticado. Esse cérebro sofisticado, ajudado obviamente por um
aspecto social e da transmissão de conhecimento, faz o que somos hoje.
Pronto, aí está a história
Octávio Mateus
fala de dinossauros. Já vai com não sei quantos minutos. Quando é
que surgem os dinossauros? Os dinossauros aparecem a meio do triásico, estamos
a falar há 230 milhões de
anos.
Ok, e quantas espécies é que nós sabemos que existem? Atualmente 10
mil. 10 mil? Atualmente. Sim, claro. São as aves atuais. Ah! Mas
isto é, relembro sempre porque não devemos esquecer, as aves descendem de
dinossauros. Sim, sim, eu queria falar disso. As aves são mesmo dinossauros.
Mas pronto, obviamente quando se faz essa pergunta estamos a falar do
registro fóssil de dinossauros do Mesozoico. E temos umas 1.200 espécies conhecidas,
talvez 1.500, não sei. Todos os dias aparecem novas espécies de dinossauros,
todos os dias. Portanto, não sei a última contagem. E obviamente isto
é uma ínfima parte do que existiu da biodiversidade de dinossauros e
o mais grave é que nós nem sequer sabemos se isto representa
1%, 5%, 10%, 50%, 90% ou 99%. É curioso que é uma
pergunta tão simples que é o nosso registro fóssil quanto é que
representa na biodiversidade real? Não fazemos a mais para a lei de
ideia. É uma pergunta tão básica e nós não sabemos. Eu tenho
um palpite e o palpite vai para baixo, quer dizer, não consigo
dizer
Octávio Mateus
responder neste momento. Temos um estudante de doutoramento, o Dario Straviz, que
está a tentar resolver isso, mas não sei se vai dar, portanto
nem vou por aí. A pista é, usamos os fósseis recentes, os
subfósseis, tentar... Comparar com a diversidade que existe. Exatamente. Eu estava a
pensar uma coisa diferente. Os fósseis muito recentes, vemos qual é a
qualidade desse registro fóssil e o quanto mais antigos menos existem e,
portanto, isso dá-nos uma pista de, pelo menos, qual é que é
a qualidade desse registro. Sabemos que em espécies em Portugal o nosso
registro fóssil não é mais que 10%, é cerca de 11% de
mamíferos relativamente aos que existem atualmente.
Octávio Mateus
registro fóssil. Mas não conseguimos controlar a extinção e há momentos em
que grupos se tornam muito abundantes e depois
entram
em declínio ou o contrário e isso nós não conseguimos controlar. Por
isso é que é importante olharmos para os dias de hoje, ou
seja, os últimos um milhão de anos, que é praticamente hoje, e
com isso ser o próximo para o passado. Mas se recuamos mais
que um milhão de anos, o próprio planeta também mudou. É curioso,
outra coisa que nós não sabemos é a curva da biodiversidade ao
longo do tempo. Ou seja, se fizermos um gráfico onde temos o
número de espécies conhecidas nesta ordenada e nas abecilhas, cá em baixo,
o tempo, sabemos no Câmara que havia menos espécies e hoje já
há mais espécies, portanto, de alguma forma houve um crescimento. Mas não
sabemos se houve um crescimento muito acelerado no início e depois estamos
estáveis, estabilizou e praticamente não há novas adições de número de espécies,
se foi relativamente constante, portanto é uma reta e não uma curva,
no fundo, ou se o gráfico manteve-se cá embaixo
e depois
subiu de repente um pouco como os números do crescimento humano. Nem
isto nós sabemos com toda a segurança. Sabemos a curva do registro
fóssil, não a curva da biodiversidade. Claro, que pode ser bastante diferente.
Que pode ser diferente, claro. Eu acho que foi muito próxima a
uma reta, mas muito perturbada pelas extensões. Portanto, torna-se quase aqueles gráficos
da bolsa, por exemplo, altos e baixos, mas com uma tendência claramente
subida. Acho que foi mais ou menos desse género, mas na verdade
não sabemos.
Octávio Mateus
espécies primitivas, sobretudo. Exato. Foram os trilobites, por exemplo, que foram nicaladas
completamente. E uma série de grupos que nós hoje nem ouvimos falar
e portanto passaram à história e não nos são tão familiares. A
extinção do KPG, o Cretáceo Paleogénico, que extinguiu os dinossauros há 76
milhões de anos. Essa sim, foi isso que permitiu os nichos abrirem
e os mamíferos proliferarem no que são hoje. Isso teve um impacto
brutal na nossa existência. O Cermotriássico também, obviamente, mas esta é mais
recente, há um impacto mais direto. Sim, mais direto e mais identificável.
Ou seja, se os dinossauros não estivessem... Nós não estávamos cá. Curiosamente,
E essa é uma história que eu acho absolutamente fantástica e Portugal
é importante para dar essa nota. A diversidade de mamíferos no Jurássico
era maior que a de dinossauros e isso é fantástico. Pois não
fazia diferença. Ou seja, é pouco conhecido. Nós vemos que o Mesozoico
era dos répteis e dos dinossauros em particular. Os dinossauros dominavam, de
facto, os ecossistemas. Mas, entre os pés dos dinossauros, estavam pequenos mamíferos,
não maiores que ratos e ratazanas, e mais ou menos com o
mesmo aspecto corporal, mas com uma diversidade biológica interna
muito
grande. Na verdade, já existiam, além de uma série de grupos já
extintos, como os docodontos e os multituberculares, já existiam os monotermados, que
são o ornitorrinco, ou melhor, não o ornitorrinco propriamente dito, mas equivalente
a esse grupo, os marsupiais e os placentários. Todos mais ou menos
com a mesma forma de ratos e ratinhos. Já existia uma série
de estratégias de reprodutivas, estratégias alimentares, estratégias da bioquímica do próprio corpo,
muito diferentes. Essa biodiversidade escondida explodiu em diversidade real e em tamanhos
e ecossistemas com a ascensão dos dinossauros. Aqueles nichos ficaram todos abertos
e essa diversidade que já existia ocupou rapidamente todos os nichos. E
por isso é que em cerca de 10 milhões de anos, o
que é relativamente pouco em termos da história da vida, após a
ascensão dos dinossauros, em 10 milhões de anos, já temos mamíferos tão
diferentes como baleias, morcegos, cavalos ou primatas em menos de 10 milhões
de anos. Quer dizer que, antes disso, todos estes grandes grupos já
estavam quase lá e depois foi sobretudo a parte externa que evoluiu
e não tanto a parte da biologia interna.
José Maria Pimentel
Sim, sim, Ou seja, do fundo as principais mutações já tinham ocorrido,
não é? A principal evolução já tinha ocorrido. Não, eu estava a
tentar encontrar uma causalidade última por trás disso, ou seja, porque é
que havia maior diversidade nos mamíferos? Era porque, precisamente porque eles tinham
que, de certa forma, contentar com as sobras? É uma simplificação, não
é? É uma excelente pergunta, não sei a resposta. Porque é que
tínhamos maior diversidade
Octávio Mateus
Exato. Não sei se isto faz sentido. Pode ser. O facto de
serem também tamanhos pequenos abre-lhes mais nichos. Exato. Há mais nichos para
animais pequenos do que para animais grandes, obviamente. E essa pluralidade de
nichos talvez tenha a ver com a pluralidade de espécies, sim. Parece-me
um raciocínio completamente plausível e lógico e uma boa linha de investigação.
Tanto que, para dar agora uma chega, nós precisamos de mais paleontólogos.
Há tantas perguntas para responder e perguntas fabulosas, tantos fósseis para serem
estudados em museus e muitos mais ainda no terreno. Nós precisamos de
mais paleontólogos. Nós, na Universidade Nova, temos o mestrado em paleontologia, que
é o único no país. E quase todos os nossos alunos ou
estão empregados ou estão a desenvolver o doutoramento e às vezes precisamos
de contratar mais palentólogos e não temos palentólogos para contratar. Pode parecer
que dá desemprego, mas os dados mostram exatamente o oposto. Praticamente não
temos desemprego na paleontologia. Claro que os valores é que são muito
pequenos, quer dizer, vai para a paleontologia uma fração do que vai
para a economia ou para a biologia até.
Octávio Mateus
qual foi, pronto, partecido de uma iniciativa minha, e
em
menos de dois meses partimos de zero para 130 associados. 130 pessoas
no país, que não têm de ser palentólogos, têm de ser interessados
em palentologia, 130 pessoas decidiram inscrever-se numa sociedade que queremos que seja
vibrante e que, em globo, todos aqueles estejam interessados em palentologia. Não
é a sociedade portuguesa de palentólogos, é a sociedade portuguesa de palentologia.
Portanto, os ouvintes estão mais que convidados a participar e podem fazê-lo
Conseguimos um endereço de uma página que é tão simples quanto palaintologia.pt.
E
José Maria Pimentel
Deve ser, eu não retivo os nomes, mas é provável. O modelo
tradicional que existe, no fundo, tem dois ramos em que tu tens,
eu vou tentar explicar isto de maneira que as pessoas que estão
a ouvir entendam, mas acho que não é muito difícil. Todos nós
conhecemos mais ou menos três tipos de dinossauros, são o Tyrannosaurus Rex,
os Percranivus. Os Sauropteropteros. Exatamente, Tu depois vais complementando com os termos
técnicos. Os herbívoros grandes de pescoço alto. São os sauróptes. Exatamente. E
os ceratópos, dos quais é mais conhecido como triceratópos, que são aqueles
que têm um ar mais ou menos de... São os ornitíscos. Ornitíscos,
sim. Que parece vagamente um
rinoceronte. E
normalmente, ao contrário do que seria de esperar, o que eu acharia
é que os dois herbívoros estavam juntos, ou seja, os de pescoço
alto e os tricerótopos estavam no mesmo lado e depois os trinoceros
rex e família estavam do outro lado. Mas o modelo tradicional não
era esse, é que tu tinhas os rinocerontes sozinhos e depois mais
à frente, ou seja, num ramo separados, mas cuja separação tinha ocorrido
mais tarde, entre os saurópses, os de pescoço comprido e os... E
os tiróptes, os carnívoros. E os carnívoros, exatamente. Mas este paper depois
punha
Octávio Mateus
isso em causa, que eu achei interessante. Exato, e a verdade é
que ainda não está bem resolvido, mas vamos lá, aquilo que nós
sabemos, há três grandes grupos de dinossauros, os carnívoros, os pteróptes, os
sauroptes, um grupo mais amplo, os sauropodomorphos, mas é tudo, herbívoros pescoço
e comprido, como o brontossauro, e uma série de outros herbívoros, bípedes
e quadrúpedes, que inclui o iguanodon, o stegossauro e o triceratops. Os
dois primeiros pensavam-se ter uma série de características em comum, por exemplo,
sacos de ar dentro do corpo, que se tornam mais leves e
ajudam na respiração, por exemplo.
Octávio Mateus
Não, é uma coisa que... Repara, Se nós temos um ganso ou
um cão do mesmo tamanho, qual é que pesa mais? Do mesmo
tamanho, do mesmo volume. Um ganso pesa muito menos. Uma ave é
muito, muito leve. Ah, curioso. Porque a ave tem enormes sacos de
ara. Não são enormes, são numerosos sacos de ar que penetram dentro
dos ossos, estão ao lado dos músculos, ficam nos interstícios das vértebras,
o que fazem relativamente mais leve em comparação ao seu volume, função
número um, está ligado com a respiração e isso é absolutamente essencial.
Os nossos pulmões funcionam como um reservatório de ar que inspiramos, enchemos
este reservatório, o e-expiramos, expelimos esse ar. Portanto, o fluxo de trocas
gasosas é bidirecional. Portanto, as nossas células têm que fazer esse fluxo
dos dois lados, o que não é tão eficiente. O que os
dinossauros descobriram, inventaram do ponto de vista evolutivo, claro que eles não
inventam nada e nem descobrem nada, mas a evolução evolui nesse sentido,
é que com esses sacos de ar eles inspiram para dentro de
sacos de ar e depois passa pelos pulmões de forma unidirecional e
isso faz um sistema circular de fluxo do ar em vez de
encher um reservatório e esvaziar um reservatório, que é o nosso sistema
de mamíferos. Essa forma circular faz com que a respiração do dinossauro
seja muito mais eficiente que a nossa de mamíferos. Quando diz eficiente
é com só menos energia. Consegue extrair mais energia com menos oxigênio.
Octávio Mateus
surgiu. Sabemos que isto aconteceu e tinha essa vantagem, reduzir o peso
relativamente ao tamanho, facilitar a respiração, e tinha ainda outra vantagem. Os
grandes dinossauros, ou melhor, qualquer volume grande, inclusive um animal grande, tem
menos área para o volume, proporcionalmente para aquele volume. Portanto, um animal,
um elefante, tem menos superfície corporal relativa do que um ratinho, exatamente
mesmo que fosse a mesma forma de um elefante.
Octávio Mateus
Porque o volume cresce de forma geométrica e a área de forma
aritmética. Ou seja, tem menos superfície para perder calor. Um animal grande,
ao mover-se, cria muito calor e não tem tanta superfície para o
perder. Por isso é que nos polos, em ambientes frios, é mais
eficiente ser-se grande. Exato. Precisamente por causa disso, porque conserva-se mais calor.
Ora, um dinossauro gigantesco não tinha problema em
ganhar calor, tinha problema
em perder calor e sacos de ar aumentava-lhe também a superfície para
perder esse calor. Portanto, este saco de ar é uma inovação evolutiva
extraordinária que permitiu perder peso relativamente ao seu volume, facilitar a respiração
e facilitar a termorregulação. E voar. E voar. Tornou-se tão eficiente que
agora as aves têm uma sofisticação em termos metabólicos que nos dão
10 a 1 nesse
Octávio Mateus
vez construído uma cidade, é mais difícil reelaborar o trajeto das ruas
ou para uma casa, porque já tem aquela construção histórica em cima.
O nosso corpo já tem uma construção histórica em cima, em um
legado que às vezes não é possível recuperar. Por isso é que
os nossos olhos não são tão eficientes como deviam ser. Exato, sim.
Por isso, o nosso nervago, que o Paulo Gama Motta falou sobre
isso, vai do nosso cérebro, dá uma volta na aorta e depois
vai até a laringe. Então é uma volta desnecessária, sobretudo para quem
tem um pescoço gigantesco, como uma girafa ou um saurópodo, que são
vários metros de cabo de nervo absolutamente desnecessários. E
o sauropodo
também tinha isso? Todos os tetrápodos, porque descendem de peixes que tinham
o coração encostado aos pulmões e muito próximo do cérebro. Portanto, quando
o pescoço aparece naquela história dos tetrápodos, o nervago fica, entre aspas,
aprisionado atrás da aorta e portanto tem que dar a volta pela
aorta, portanto o cérebro vai ao coração e depois vai à laringe.
E isto é válido para todos os tetrápodos porque descendemos de peixes
onde isso não acontecia, onde o coração iria alimentar as guelras, o
arco branquial que deu origem, o quinto arco branquial, creio eu, que
dá origem à nossa laranja.
Octávio Mateus
episódio. E isso é também o nosso legado, porque evoluímos de quadrúpedes,
não é?
Sim, sim,
sim. É esse o problema. Portanto, vamos carregar, pelo menos durante uns
quantos milhões de anos, o peso de... O custo de termos se
tornados bípedes, enquanto tivemos centenas de milhões de anos que éramos quadrúpedes.
Para que nós somos a primeira espécie, desde sempre, de todos os
nossos antepassados que evoluíram ser bípedes. E isto em pouquíssimo tempo. Obviamente
tem um preço. Tem o preço dos nossos problemas de coluna, dos
nossos problemas na própria construção do parto, do ânus, do crânio, etc.
As hemorroidas, por exemplo, são problemas associados a uma mudança de posição
e a ter muito peso também sobre a parte traseira do nosso
corpo. Tudo isso tem implicações gigantescas. Tudo o que nós fazemos, tudo
o que acontece na evolução tem um pequeno preço. Sobrevivem aqueles que,
apesar disso, conseguem e, apesar disso, têm vantagens. Sim,
Octávio Mateus
porque está na água e consegue... Mas eles desenvolveram uma série de...
Primeiro, há uma resposta muito simples, porque podiam.
Parece
ridículo, mas o nível de oxigênio e de oxicarbono e de gravidade
e isso tudo podia não permitir. E parece óbvio, mas esta é
uma premissa grande. E depois eles desenvolveram, por exemplo, só para dar
aqui uma analogia, no carbonifero havia libelas com um metro e meio
de envergadura, gigantescas, dos maiores insetos que uma vez existiram. Hoje isso
já não era possível. Mas tem a ver com o oxigênio, não
é? Exatamente, porque o nível de oxigênio da altura era maior e
como os insetos não têm um sistema de respiração centralizado, têm um
sistema distribuído por espiráculos ao longo do corpo, ter mais oxigênio permitia
entrar mais oxigênio naquelas células todas e permitia que eles terem aquele
tamanho gigantesco. Hoje a libela nunca poderia ter... Os insetos, na verdade,
não atingem dimensões daquele tamanho. Na altura os dinossauros puderam chegar a
esses níveis e a prova que puderam é que chegaram. E com
um desenvolvimento de estratégias evolutivas muito curiosas e deixe-me só dizer meia
dúzia delas, nem tanto. Primeiro, simplificaram as mãos e os pés numa
forma muito semelhante à
Octávio Mateus
Mas o cavalo, ou melhor, o cavalo não é tão semelhante à
dos elefantes nesse caso, mas comparável. Os cavalos evoluíram para correr, basicamente,
um animal todo desenvolvido para correr. Aquela corrida, facilmente, podem partir um
dedo, que é morte certa, porque tornam-se presas fáceis. Portanto, durante o
decorso evolutivo, o que lhes aconteceu é que simplificaram a mão para
correrem diretamente num só dedo. Tem o mesmo número de falange naquele
dedo, mas perderam os outros dedos todos. Portanto, eles andam na ponta
do dedo médio. Acho que
Octávio Mateus
E Darwin fala sobre isso. Mas, no fundo, eles simplificaram as mãos
para conseguirem controlar aquele peso todo e aquele stress físico sobre as
mãos e os pés. Os dinossauros saurópticos fizeram o mesmo. Reduziram, neste
caso, o número de falanjas e andam diretamente sobre a palma da
mão, sobre os metacarpos, que são estes ossos que nós temos alongados
na palma da nossa mão, perdendo as falanjas quase todas. Foi uma
simplificação diferente dos cavalos, o cavalo reduz os dedos, os dinossaurópticos reduzem
as falanjas. A outra estratégia é os sacos de ara gigantescos. A
outra é, curiosamente, um cérebro pequeno. Um cérebro grande, à proporção do
nosso, tinha de ter um coração gigantesco para conseguir bombear o sangue
todo, com oxigênio e tudo que era necessário. Um dinossauro sauropod com
30 metros tinha um crânio com cerca de 40 centímetros e um
cérebro mais pequeno que um punho fechado, muito mais pequeno que o
nosso, enquanto que o tamanho dele, o tamanho do corpo era várias
vezes o nosso, centenas de vezes o nosso, mas isso era uma
estratégia evolutiva muito inteligente, porque permitia comer no docelo das árvores, levantando
a cabeça sem simplesmente desmaiarem com falta de oxigênio, algo que nós
temos esse custo. Nós, às vezes, só por atarmos o sapato e
levantarmos demasiado rápido, sentimos um pouco tontos, porque numa fração de segundo,
tivemos um pouco menos de oxigênio no nosso cérebro. Aí está também
aquilo que falávamos há pouco dos custos dos trade-offs da evolução. Esse
tipo de estratégias permitiram os dinossauros saurópticos, e entre outros, atingirem dimensões
absolutamente gigantescas, as maiores que alguma vez existiram em animais terrestres.
Octávio Mateus
mas também desenvolveram tamanhos gigantescos. Mas tens razão no sentido que uns
desenvolveram armadura e outros não. Mas o terceiro autópodo também era gigantesco,
não tão grande como o sauropodo, mas também gigantesco. A este crescimento,
este gigantismo, chama-se a lei de Cope e acontece com muita frequência.
Durante períodos estáveis, as linhagens tendem a aumentar, o seu tamanho máximo
tende a aumentar, portanto, vimos isso nos cavalos. Os cavalos de há
50 milhões de anos eram o tamanho de gatos e agora têm
o tamanho que têm. As baleias estão a aumentar de tamanho, aliás,
nunca houve baleias tão grandes como existem atualmente. As espécies, durante ambientes
estáveis, tendem a aumentar de tamanho. É mais eficiente do ponto de
vista energético. Conseguem escapar aos predadores, requer mais comida, curiosamente, como é
óbvio. Pois é que tem que ser um ambiente estável. Em épocas
de crise ecológica, os grandes são os primeiros a extinguir
isso.
E esse é o preço a pagar. Essa é, no fundo, a
resposta do sucesso dos dinossauros e do fracasso dos dinossauros, porque atingiram
tamanhos tais que, numa crise que foi muito grave, que requeriam tanta
comida, tinham um metabolismo tão acelerado, o que lhes dava vantagem relativamente
aos outros, por isso foram tão bem sucedidos, mas como não havia
comida suficiente, extinguiram-se. Sobreviveram todas as espécies que podiam hibernar ou, pelo
menos, ligar o botão standby, entre aspas, não é? Portanto, ficar em
isolamento e ficar assim durante meses sem se alimentar, o que muitos
lagartos e crocodilos conseguem fazer,
Octávio Mateus
Sim, ou aqueles que apesar de ter um metabolismo acelerado, com pouca
comida conseguiam sobreviver, como uma ave pequena, um bassariforme também de um
pardal com uma maçã que se mantém, alimenta durante meses. Para um
dinossauro grande, uma maçã já ia. Portanto, essa necessidade imensa de comida
foi a causa da extinção dos dinossauros em eventos de crise. Uma
vez mais, uma comparação que eu gosto de fazer, a economia, que
devia ser assim também, portanto, na economia ser pequeno permite respostas muito
mais ágeis e menos necessidade na vida alimentares ou na economia de
dinheiro, mas como as leis são sempre feitas para os mais poderosos,
Octávio Mateus
pequenos. Mas, no final do Cretáceco, a crise alimentar foi tão grande
que eles não tiveram tempo
de
se adaptar, portanto, de evoluir, e, portanto, extinguiram-se. Nesse caso do nanismo
insular é muito curioso. O que acontece é que os animais de
muito grande porte tendem a ficar muito mais pequenos, anões. E os
animais pequenos tendem a ficar grandes. Ou seja, dando exemplos concretos, até
há 8 milhões de anos, 8 mil anos, quero dizer, existiam nas
ilhas mediterrânicas, Sicília, Malta, Creta, etc, elefantes tamanho de São Bernardo. Um
pouco maiores que São Bernardo, um metro de altura, o que é
fantástico. Adultos, se for falar de adultos. Isso porque aquelas ilhas não
tinham comida suficiente para alimentar manadas de grande porte de herbívoros. E
muitas manadas, portanto, das duas uma ou se extinguiam ou reduziram o
tamanho, o que fizeram. Do outro lado da escala temos uma série
de lagartos pequeninos como os lagartos-galeotas nas Canárias, que são aparentados às
nossas lagartixas, mas têm 10 vezes o peso de uma lagartixa. São
animais que podem ter quase meio metro de comprimento total. Isso Porque
o facto de não terem predadores, que as ilhas têm sempre menos
predadores, e de tentarem ocupar mais nicho por aquele tamanho, tendem gradualmente
a aumentar de tamanho. Portanto, as ilhas têm esse...
Octávio Mateus
Ou o input de outras ilhas. Ou seja, possivelmente, em algumas ilhas
eles desapareceram, mas como havia ali uma série de ilhas no Mediterrâneo,
havia, há uma série de ilhas no Mediterrâneo e havia migração, dispersão
de ilhas e para o continente, se calhar havia inputs que permitiam
repopular quando houvesse uma extinção. Temos que considerar isso, porque quando a
ilha está muito, muito remota, muitas vezes extingue-se. Como o caso dos
humanos na ilha da Páscoa. Ah, claro,
Octávio Mateus
As penas são um excelente isolante térmico e, por isso, as usamos
para casacos e, por isso, elas evoluíram. Claro que depois foram reaproveitadas
para o voo, para display sexual, para chocar os ovos, etc. Com
muitas coisas ao longo da evolução, não é que surgiu um determinado
fim? Exato, exato. Esse processo é a exaptação. Exato. Quando aparecem para
um fim e depois acabam por ser reaproveitadas para outro. O caso
das aves do Jurássico, o Archaeopteryx, por exemplo, que atualmente não sabe
bem se é uma ave ou se ainda é um réptor muito
próximo às aves, mas ele tem dentes, algo que as aves já
não têm, portanto tem um focinho ainda muito dinossauriano e não tinha
bico e tinha dente, as aves acabam por perder os dentes e
formar um bico, mas tinha asas muito semelhantes às as aves atuais,
mas com garras nos braços. Nós conhecemos as aves que têm garras
nos pés, mas não nas asas. Mas o Archaeopteryx, sim, tinha garras
nas asas. Mas que serviam para quê? Serviam para agarrar, tal como
os braços do tirano aos Rex.
Octávio Mateus
Que é o normal, não é? Todos os animais têm, todos os
vertebrados têm normalmente garras e dedos funcionais, obviamente todos os tetraptos e
aqueles também, mas tinham penas associados. Curiosamente, há uma série de avos
atualmente que ainda têm garras nas asas. Hoje em dia estamos a
falar de todo o grupo das ratites, que inclui os casuais, os
nandusas, as avestruzes, etc. Tem uma unha que não se vê, é
vestigial.
Octávio Mateus
exato. E há uma espécie que se chama o Owatsin, da América
do Sul, que em embrião ainda tem garras nas asas, o que
lhe permite trepar nos ramos e se cair, vivem em zonas de
pântanos, podem ser rapidamente comidas por crocodilos, portanto é-lhes útil manter aquelas
garras, pelo menos em estado embrionário. Isso é uma característica primitiva que
os arqueoptéricos tinham. As aves têm ainda uma característica muito dinossauriana, que
são as escamas. As aves têm escamas nas patas. As patas são
muito, muito semelhantes às pegadas que encontramos de dinossauros. Algumas no Lourinhé
têm escamas. Tem uma impressão digital com 150 milhões de anos, absolutamente
extraordinária e vemos cada uma das escamas individuais. Mas há muito tipo
de escamas e aquelas são de aspeto dinossauriano, não são imbricadas como
as telhas de um telhado que existem nas escamas de um peixe,
de um lagarto ou mesmo de um gorgodil. São escamas lado a
lado, como as escamas de uma pata de uma galinha. Aliás, nós
olharmos para uma pata de uma galinha e ampliarmos, as camas aumentam
de tamanho, mas o padrão é tal igual àquele que encontramos em
pegadas de dinossauro com 150 milhões de anos. Mais uma evidência da
origem dinossauriana das aves. Muito curioso isso. O que nos levanta aqui
uma questão da própria taxonomia. Quando Linneu faz aquela classificação das espécies,
Ele cria cinco classes de vertebrados. E atenção, Linneu não conhecia a
evolução. Foi não, foi antes. Não tinha sido postulada sequer. Portanto, não
podemos dizer que ela era fixista, no sentido que não acreditava na
evolução. Não, não tinha sido postulada. Sim. Algo menos descoberto o mecanismo
certo. E ele classifica as espécies como se fossem em gavetas. As
gavetas estão em estantes, estantes que estão no armário, o armário que
está no quarto e o quarto está numa casa. As espécies ou
estão numa gaveta ou estão na outra. Não podem estar em duas.
E esses compartimentos simplificaram e pareciam lógicos, mas a verdade é que
a evolução não ocorreu assim. Ocorreu como se fosse numa árvore. E
o que nós agora descobrimos é que o ramo das aves está,
na verdade, naquele ramo ainda maior dos répteis. Portanto, a classe das
aves é, na verdade, a que está dentro da classe dos répteis,
o que faz com que estes títulos lineanos de filo, classe, ordem,
família e isso tudo deixam de fazer sentido se começarmos a olhar
para este
tipo de...
Se tentarmos classificar as aves, por exemplo, uma classe não pode ser.
E o mais simples é abolirmos completamente este tipo de categorias lineanas,
de filos, classe, etc. E começarmos a olhar para a classificação das
espécies como uma árvore. Pode saltar um nível no fundo, não é?
Ou seja, não tens que
Octávio Mateus
do céu da árvore após um milhar de ramificações.
E não
vamos usar o mesmo número de categorias para uma folha que esteja
cá embaixo ou uma folha que esteja lá em cima. Infelizmente ainda
se ensina em Portugal uma classificação lineana que não prevê a evolução
e não atualiza isto, o que é gravíssimo na minha opinião. Nós
temos que alterar o que se ensina nas escolas para não ensinarmos...
Podemos ensinar isto do ponto de vista histórico, do ponto de vista
da etimologia, da história da ciência, mas não como classificamos as espécies.
As espécies já não podem ser classificadas assim. Claro que todos os
meus colegas biólogos não tratam de taxonomia de grandes grupos, vão dizer,
sim, sim, mas nós usamos... Pois claro, mas quando começamos a pensar
nos grandes grupos, onde é que eles se encaixam, estas categorias lineanas
deixam de fazer sentido. Ou
José Maria Pimentel
seja, elas funcionam a uma escala mais pequena, não é? Com o
zoom, não é? Exato, com o zoom in. Mas depois fazes o
zoom out e aquilo já... Já perdemos aquilo. A contradição. Exato. E
sim, tem um paralelo interessante disso, que há várias áreas em que
tu tens, até na física, não é? A física neotoneana, por exemplo,
funciona, mas calma, mas depois a escala do universo já deixa de
funcionar. É muito interessante isso. Olha, a conversa já vai longa. Correto.
Vou tentar fechar aqui várias coisas que tinha deixado abertas e que
fomos discutindo. As aves, pela relação que têm com os dinossauros, permitem
ao mesmo tempo também, ou permitem provavelmente, com algum grau de conjetura,
complementar o histórico de
Octávio Mateus
fósseis que existem, no fundo, a evidência fóssil que existe. Exato, chama-se
isso um parênteses filogenético, um phylogenetical bracket, em que nos permite dizer
uma série de coisas sobre dinossauros mesmo sem dinossauros mesozoicos, portanto não
as aves, mesmo não tendo essa informação. Ou seja, os primos dos
dinossauros, entre aspas, o parênteses próximo atual dos dinossauros são os crocodilos
e os descendentes são as aves. Tudo o que for válido para
um crocodilo e uma ave é quase certeza válido para um dinossauro.
Porque eles evoluíram neste parênteses filogenético, neste parênteses evolutivo, em que um
dos parênteses é o crocodilo, o outro parênteses é a ave. Isto
não prova, mas dá-nos uma série de premissas que nos permitem pelo
menos especular algumas situações. Com um grau de confiança grande. Isso porque,
dentro daquele parênteses, não vai haver tantas transformações assim que tem que
ocorrer uma só vez, que é dentro daquele parênteses evolutivo, que transformem
os dinossauros completamente. Para onde é que podemos utilizar este tipo de
analogias? Os dinossauros tinham o coração de quatro câmaras ou de duas,
como a maioria dos répteis? As aves e os crocodilos têm de
quatro. Portanto, mais provável é que os dinossauros também tivessem de quatro
câmaras. Como é que eram os rugidos dos dinossauros? Uma pergunta muito
badalada, não é? Porque o cinema quer ter o rugido de um
dinossauro, não é? Os crocodilos fazem rugidos? Não. As aves fazem rugidos?
Também não. Os dinossauros com a certeza não fazem rugidos.
Na
verdade, os crocodilos silvam, as crias às vezes fazem uma espécie de
um piar para chamar a mãe e as aves piam, sabemos isso.
É mais provável que um dinossauro como o Tyrannosaurus rex
Octávio Mateus
Jurassic Park. O que eles fizeram foi misturar três sons. A ver
se me lembro. Acho que era o rugido de um leão, o
barir de um elefante e o motor de um Ferrari. Sou capaz
de estar errado, mas acho que foi mais ou menos isto. E
misturaram, numa mesma mistura, misturaram esses sons e fizeram aqueles rugidos do
filme, que quase certeza que estão errados. E nós sabemos isso por
este parênteses filogenético e comparando sempre os crocodilos e as aves. Portanto,
sim, as aves dão-nos uma janela para compreender como é que eram
os dinossauros 9 anos, os dinossauros do Mesozoico. Sim, porque a evidência
fóssil... Para o regido é nula, é quase nula. Para o regido,
Octávio Mateus
da informação, diz-se por alto, obviamente não me diga, mas é extraída
a partir dos ossos. Começa logo por onde é que aparece aquele
dinossauro, dá a geografia e o ambiente onde eles aparecem, não é?
Mas, pois, os ossos dão-nos a forma, o aspecto geral do corpo,
o peso, a altura, o comprimento, etc. Serão carnívoros, serão herbívoros, também
pelo tipo de dentes, que isso torna-se relativamente fácil de identificar. Depois,
quando temos partes moles, então já temos o aspecto externo do animal
ou podemos ter parte do intestino, que eu saiba existe um dinossauro
bem preservado com parte do intestino, que é o Shipionyx, Podemos já
dizer um pouco mais sobre o tipo de alimentação, por exemplo. Se
temos pegadas, podemos ver como é que é o aspecto do pé,
algo que não conseguimos ver a partir dos ossos apenas porque há
muito tecido mol, há muitas almofadas do pé, um pouco semelhante às
almofadas de um pé de um cão, que só conseguimos perceber quando
temos uma pegada. Se temos duas pegadas, podemos ver o tamanho da
passada e
podemos ver, por exemplo, que eles não saltavam como um canguru, davam
passos como nós fazemos, não é? Se temos um trilho em contínuo,
podemos medir essas distâncias e o tamanho do pé e podemos saber
a velocidade de um dinossauro. O que é espetacular, passado milhões e
milhões de anos, sabemos que aquele dinossauro andou precisamente àquela velocidade, ou
pelo menos muito aproximada à velocidade que se estima pelos cálculos que
se pode fazer com aquele trilho. E se temos vários trilhos a
interagir, podemos perceber como é que era o tipo de interação entre
animais, se eles fugiam, se eles lutavam, etc. Outro tipo de evidências
são os ovos, porque permite perceber como é que eles cresciam, como
é que eles se reproduziam, tudo que seja ligado à reprodução, tudo,
se ao seja, mas muito ligado à reprodução e depois os exótipos
conseguimos ver por onde é que eles andaram, porque às vezes temos
exótipos de traço que nos dizem se estavam mais próximos do mar
ou mais próximos de uma montanha, se tinham uma temperatura mais alta
ou uma temperatura mais baixa, portanto, dão uma série de outras coisas
biológicas, portanto, vamos buscar esta informação toda, ossos, dentes, ovos, pegadas e
isótopos. Eu acho que uma interrogação que subsiste é se eles eram
de sangue quente ou sangue
Octávio Mateus
Tu és um aluno espetacular. Mas, exatamente, pelo bracketing, pelo parênteses filogenético,
os crocodilos são de sangue frio e as aves são sanguentas. E
realmente os dinossauros se calhar também tinham esta variedade. Os dinossauros mais
primitivos do Triásico, pelo menos alguns com a certeza que eram de
sangue frio, mas os Teroptes, os carnívoros, já tinham uma série de
acumulações filogenéticas, de adaptações, que já estavam a aproximar-se o metabolismo acelerado,
portanto, de sangue quente. Qual
é a vantagem
do sangue quente? O sangue quente é uma vantagem fenomenal, é que
nós não estamos dependente do ambiente externo para a nossa atividade. Um
lagarto fica absolutamente inerte e letárgico com temperaturas muito baixas, por isso
não existem lagartos nos polos ou ambientes árticos. E enquanto um mamífero,
como consegue fazer a sua própria temperatura, consegue estar ativo mesmo quando
está frio. Isso permite a um animal de metabolismo mais acelerado, leia-se
sanguiente, estar ativo durante a noite, estar ativo nos polos, estar ativo
quando os outros não estão. Mas tem um preço. É a comida.
Nós transformamos comida em calor. A maioria da nossa comida é transformada
em calor. Um crocodilo não tem que fazer isso. Um crocodilo, um
dragão de komodo, que são répteis enormes, se comerem um veado, só
precisam de se alimentar meio ano depois. Nós, se conseguíssemos comer um
veado, não conseguimos, não é? Se conseguíssemos comer um veado, ficávamos empanturrados,
mas passado dois dias já dizíamos, já comi qualquer coisa. Não era?
Portanto... Tem muita piada isso. Porque nós gastamos muita da nossa energia
nesta temperatura.
Octávio Mateus
vezes. Exato, exato. Eu tenho uma tartaruga que às vezes só precisa
alimentar uma vez por semana. Ela também tem muito espaço para se
alimentar, mas se eu não alimentar durante um mês, eu deduzo que
ela sobreviveria sem grandes problemas. Se eu deixar de alimentar um hamster
durante três dias, ele morre, como é óbvio, porque tem um metabolismo
muito mais acelerado. É o preço desta vantagem e, uma vez mais,
o metabolismo acelerado, leia-se uma vez mais, sanguente, deu essa vantagem aos
dinossauros, fez com que em competição eles suplantavam qualquer outro porque eram
super ativos, eles eram animais que cresciam rápido, morriam rápido, mas viviam
rápido, nasciam mais rápido que os outros, com mais ovos, portanto eles
suplantaram os répteis com quem competiam, claramente, mas precisavam tanto de alimento
que se distinguiram. Mas há um aspecto curioso na questão dessa pergunta
qual é que é a utilidade do sangue quente. É que, porventura,
não evoluiu como sendo uma vantagem, ou necessariamente
como
uma finalidade. Foi um subproduto do grande crescimento. Foi por arrasto. Foi
um subproduto. Naquela corrida, normalmente, que já falámos, em que eles cresciam
tanto, tanto, tanto, para crescer é preciso muitas trocas gasosas,
muito a
acontecer nas próprias células, muitas células a dividirem-se e isso cria calor.
Inevitavelmente, é isso que cria calor, na verdade. Portanto, esse calor foi
um
subproduto,
porventura, desse crescimento rápido, que lhes também trouxe vantagem porque permitiram utilizar
esse calor para essas vantagens todas de estar mais ativos nos polos
ou à noite ou em qualquer outra situação fria. É curioso também
pensarmos que a função principal pode não ter sido o metabolismo, pode
ter sido o arraste por um crescimento mais acelerado. Sim, é muito
engraçado isso.
Octávio Mateus
fóssil, a especiação e a curva da biodiversidade. Então está tudo mais
ou menos relacionado. Nós não sabemos quanto tempo vive uma espécie, não
sabemos quantas espécies existiram.
Quanto tempo dura.
Quanto tempo dura cada espécie, não é cada indivíduo, mas quanto tempo
é que vive em média cada espécie, até se poder considerar outra?
O que entra logo por outra questão, o que é uma espécie?
Mas quanto é que vive em média um género? E isso mudou
ao longo do tempo? Muda de espécie, ou de grupo para grupo?
E se sabemos que sim, o que muda? E se têm implicações,
quantas espécies existiam a cada momento? Qual é que é a curva
da biodiversidade? Qual é que é a qualidade do nosso registro fóssil?
Tudo isto são perguntas a qual ainda não temos resposta. Temos assim
uns lameires, ou seja,
Octávio Mateus
Mas a espécie, se usarmos o critério, uma definição, quero dizer, de
uma espécie de um grupo de indivíduos que se reproduzem entre si
e pode ter descendentes férteis, aí já temos alguma definição um pouco
melhor. Claro que nós não conseguimos reproduzir com uma pessoa que viveu
há mil anos atrás, pela própria questão da física do tempo, não
é? Mas éramos claramente a espécie dessa pessoa de há mil anos
atrás. E há 5 mil anos. Seríamos a mesma espécie, nós humanos,
da mesma espécie de há 5 mil anos? Em princípio, sim. E
dá 10 mil. Ou dá 20 mil. Há de haver um momento
em que a espécie já não se consegue reproduzir uma com a
outra. Eu acho que, usando uma vez mais as analogias, um bom
exemplo é capaz de ser as línguas. Nós entendemos muito bem com
os galegos. Ou se quisermos ainda melhor, eu compreendo 99.9% do que
os meus irmãos dizem porque vivemos em conjunto, portanto, excepto se ele
tiver uma palavra que eu não conheça. Mas se calhar um pouco
menos do que alguém que seja um vizinho que conhece uma série
de palavras ou uma série de conceitos que eu não conheço e
já tem menos afinidade. Com alguém que vive nos Açores, porventura, eles
ainda têm, ou no Brasil, ainda têm menos palavras ou mais palavras
que não são comuns, ou uma gramática ligeiramente diferente, ou expressões diferentes.
E assim, a mesma coisa para os nossos colegas gregos, espanhóis, etc.
As espécies e as línguas vão se afastando e enquanto que há
pessoas que percebem bem o espanhol, há outras que percebem menos o
espanhol. Ou seja, há indivíduos que conseguiam ainda reproduzir-se com o ano
passado e outros que já não se conseguiam reproduzir com o ano
passado. Portanto, é um gradiente de afastamento no tempo e no espaço
que é válido para as espécies e é válido para as línguas.
Mas, neste caso, as línguas é muito interessante porque permite-nos mais ou
menos visualizar como é que porventura seriam as espécies e a questão
é que nós não sabemos, até não conseguimos separar o que é
uma língua, o que é um dialeto. Mas quando tu dizes, desculpa,
quando tu dizes, quando não sabes quanto tempo é
Octávio Mateus
Quantos milhões de anos existiram aqueles animais com aquela morfologia que tinham
descendentes férteis entre si? Antes deles se ramificarem
ou
se extinguirem? Antes deles se ramificarem em duas diferentes. Quando se extinguiram
é algo que pode-se medir, é fácil. E aí é um evento
exógeno de qualquer forma. Exato, mas se há um desenvolvimento de uma
espécie A que se transforma na espécie B, que se transforma na
espécie C e essa C porventura ramifica em D, E, F, isso
tudo, quanto tempo é que exige cada uma destas espécies? Isto é
importante para preencher as lacunas da árvore da vida
e as
lacunas do número de espécies a um determinado momento. Se queremos saber
a curva da biodiversidade, às vezes só temos um ponto, mas temos
que extrapolar esse ponto viveu durante quanto tempo e não sabemos fazer.
Simplesmente não sabemos se as espécies viviam em média meio milhão de
anos, 10 mil anos, um
Octávio Mateus
Não, mas continua a ser essa. Ah, ok. Continua a ser essa,
portanto está muito ligada. Ah, ok, estou a esquecer. Estou
a esquecer. Está muito
ligada. Mas há uma outra resposta que está um pouco ligada. Qual
é que seria o meu dinossauro favorito ou aquilo que eu gostaria
de saber? E a resposta é aquilo que eu não estou à
espera. Aquilo que eu quero saber é aquilo que eu não estou
à espera. No sentido que, se é algo que eu já estou
à espera, mesmo que nós não saibamos, não é? Já colocas hipóteses,
não é, Jé? Sabemos que, mais cedo ou mais tarde, teve de
haver um ano passado para aquele dinossauro que já conhecemos. Mas se
aparecer um dinossauro completamente inesperado, isso é o que eu quero saber.
Eu quero aprender aquilo que nem sequer imagino que existe. É como
Octávio Mateus
Há 166 milhões de anos acontecem dois acontecimentos brutais, catástrofes, que alteram
para sempre o nosso planeta e ocorreram ao mesmo tempo e tem
embaralhado os cientistas para ver qual é que é a causa principal,
mas eles ocorreram ambos. Foi o impacto de um meteorito gigante, estamos
a falar de 10 quilómetros de largura do tamanho do Evareste, que
caiu na bacia do Yucatán, no México, e outro, um mega-volcão, onde
é hoje andia, estamos a falar de um volcão absolutamente gigantesco, não
como estes volcõezinhos que existem em Las Palmas ou na Islândia, com
todo o respeito. O tamanho daquele vulcão continuasse a ser gigantesco, obviamente,
mas estamos a falar de uma província vulcânica, todo o norte dandia
são basaltos os resultados da lava desse vulcão. Andia é um subcontinente.
Na verdade, quase um terço dandia é basalte dessa atividade volcânica. E
uma atividade volcânica que durou um terço de milhão de anos a
explir lava e cinzas. Obviamente, isso teve impacto no ecossistema. Esta atividade
estava em plena ação, esta atividade volcânica, quando o meteorito cai, agravando
a situação já frágil do ecossistema. Portanto, houve o equivalente a um
inverno nuclear, o céu ficou coberto de poeiras, o impacto do meteorito
criou incêndios pelo planeta todo, as plantas deixaram de fazer fotossíntese, a
química nos oceanos alterou-se completamente. Portanto, toda a gente foi afetada, todas
as espécies foram afetadas, algumas sobreviveram e outras não. Aqueles que requeriam
muito alimento, como os dinossauros, foram logo os primeiros e não conseguiram
sobreviver. O que é curioso é que como isso acontece, os dois
acontecimentos ao mesmo tempo, e sabemos que ambos aconteceram, não?
Octávio Mateus
um destes? Só um destes. A maioria dos colegas talvez tenha sido
mais para o impacto do meteorito. Eu gosto muito da explicação volcânica,
mas um não retira o outro. Portanto, ambos aconteceram. É apenas qual
é que foi a principal. Por
que favorece o
impacto do vulcão? Porque há coisas que não consigo explicar com o
impacto do meteorito. O meteorito, para já, houve um declínio da fauna
antes do impacto. Portanto, no final do Cretáceo já havia um declínio
de fauna, muito acentuado. É antes do impacto, mas já depois do
vulcão. Exatamente. Nos últimos momentos, no último meio milhão de anos, já
havia um declínio, um terço de milhão de anos, na verdade, já
havia um declínio grande da fauna, que com a certeza que estava
ligada ao vulcão. E há algumas coisas que eu ainda não percebo,
não sei explicar. Nós temos um meteorito que caiu no que é
hoje a Bacia do Iocatão, em pleno oceano, não muito profundo, mas
oceano, no México, que criou tsunamis absolutamente gigantescos em modelo que atingiram
todo o Atlântico e, porventura, com ondas suficientes e com efeito chicote
que as próprias ondas criam, que atingiram todo o planeta mesmo estando
do lado oposto. Isto é o que o modelo mostra, mas não
é o que as rochas mostram. E nós podemos pôr o modelo
todo que quisermos no computador, o que manda são os dados que
encontramos no terreno. Isso é mais difícil, enganar os dados que encontramos
no terreno do que o computador. Ora, os dados no terreno não
mostram esse tsunami na Europa e em África. Encontramos perto da América
do Norte, e evidências muito evidentes de um tsunami, mas não tão
grande quanto aquilo que era expectável. Estamos a falar de um tsunami...
Só a Cartera deve ter feito uma elevação de 2 ou 3
mil metros, só a cratera. Portanto, as ondas têm de ser centenas
de metros, mas não vemos isso nas rochas e devíamos ver, porque
o registro da sedimentação está muito relacionado com a velocidade da água
que transporta os sedimentos, porque quanto mais energia, blocos maiores, blocos tamanho
de uma casa, se fosse um tsunami. E apenas areias e lodos,
se for água, muito calma. E o que nós vemos é muito
mais areias e lodos, não vemos blocos tamanhos de casa ser transportados
por tsunamis na Europa e em África, que está do outro lado
oposto, em linha reta, à zona de impacto. E eu não percebo,
portanto, essa parte ainda se está por compreender. Ah, e além disso,
há uma correlação muito, muito óbvia entre vulcanismo e extinções. A primeira
grande extinção, que nós já falámos, do permotriásico, há 250 milhões de
anos, coincide com a maior atividade volcânica de sempre, o chamado Siberian
Traps, os traps da Sibéria. A segunda maior atividade volcânica está ligada
à segunda maior extinção de sempre, que extinguiu os dinossauros. A terceira
maior atividade volcânica está relacionada com a terceira maior extinção, ou uma
das... Um candidato à terceira. A terceira está ali em pé de
igualdade com outras quantas, mas no final do Triásico, tem a ver
com a abertura do Atlântico e todos os vulcões relacionados com a
abertura do Atlântico. Portanto, se fizermos um gráfico onde colocamos extinção em
massa com grandes atividades volcânicas, há uma linha reta e uma correlação
muito óbvia. Logo, nós sabemos que a atividade volcânica extingue e extingue
com muita frequência e tem grande capacidade de extinções em massa. Ao
mesmo tempo aparece o meteorito. Qual é que é o causador principal?
Não
José Maria Pimentel
Claro, pois, evidente, senão não estávamos a falar disto. Exatamente. Olha, última
pergunta antes de passarmos ao livro. Uma coisa que deixámos lá muito
no início da conversa, que era a questão do DNA e depois
falámos da questão de haver tecidos moles, já falámos disso várias vezes,
dinossauros preservados. Onde é que tu colocarias a probabilidade de se encontrarem,
se virem a encontrar, já percebemos que nunca a sequência completa, mas
fragmentos de DNA de dinossauros. Para dinossauros mesozoicos, seriam
Octávio Mateus
fósseis o mais recente possível, com 66 milhões de anos. Mesmo no
final. Portanto, quanto menos tempo passar, menos probabilidade de acontecer. E nós
temos fósseis absolutamente extraordinários na China, nos Estados Unidos, da cidade, em
que têm sido recolhidas moléculas. Portanto, se tivesse a apostar, sim, em
alguns desses fósseis preservados em lagos anaeróbicos, onde houve muito pouca transformação,
registros sedimentares muito peculiares, muito calmos, mas pois que aquelas rochas não
tivessem estado a grandes profundidades, porquanto mais fundo, mais quente e, portanto,
não queimaria essas moléculas. Portanto, tinha que estar a estudar muita geologia
para perceber qual é que era o ambiente ideal para preservar aquelas
moléculas, pois se calhar ia lá e não havia um único fóssil.
Octávio Mateus
Exato, da Mary Schweitzer, que sugere isso. E possivelmente ela tem razão,
não estou a dizer que não, mas é tão difícil controlar o
laboratório de modo que não haja nenhuma contaminação, porque quando tiramos o
DNA de um osso, só o próprio osso, que está próximo da
superfície durante milhões de anos, pelo menos milhares de anos, será que
alguma bactéria, algum microorganismo conseguiu penetrar lá e deixar um vestígio de
DNA? Claro. O que nós vamos ter é só vestígios, nunca vamos
dizer que aquilo é de bactéria ou que é de anossauro, atenção.
A contaminação não é num laboratório apenas, é a contaminação do próprio
osso no terreno, pode ser grande. E, portanto, ela recebeu muitas críticas.
Eu acho que ela é uma excelente investigadora e pode ser que
ela tenha razão, mas é muito difícil calibrar e verificar. Mas, mais
cedo ou mais tarde, vamos descobrir.
Octávio Mateus
é nada. Não é nada, só o sejo. Mas diabos, dinossauros têm
66. Pois, exatamente. E são os mais recentes de todos. Exato. Tirando
os passos.
Exato,
exato. Olha, finalmente chegamos ao livro. Muito bem. Há um livro escrito
por um colega meu que se chama Steve Brusset, que se chama
Ascensão e Queda dos Dinossauros. Gosto particularmente por várias razões. Acho piada
porque as nossas descobertas aparecem relatadas nesse livro, não é razão porque
eu acho que o livro é excelente, porque está muito bem escrito,
mas ele conta a história, um dos capítulos tem a ver com
a ascensão dos dinossauros durante o Triásico e relata as descobertas que
fazemos no Triásico do Algarve, no Conceito de Loulé, em que descobrimos
o Metopossauros algarvensis, uma salamandra de tamanho de uma pessoa, dois metros
de comprimento, precisamente numa altura em que os dinossauros competiam com outros
seres, inclusivamente com estas salamandras, pela predominância. Pois no final do triássico
é que eles realmente dominaram completamente. Portanto, o que o Steve Brussett
faz neste capítulo e em todos os outros é contar uma história
de vida da experiência dele, um bocado da história da ciência, com
uma questão científica por trás, neste caso é a competição com outras
espécies e porque é que os dinossauros levaram a melhor e as
outras espécies não, escrito de forma absolutamente brilhante. Há muito tempo que
eu não lia um livro de ciência, um livro sério, divulgação científica,
mas um livro de ciência, em que nos prende como se fosse
uma novela. Não conseguimos parar de ler aquele livro, com histórias muito
interessantes, tanto pessoais como da história da ciência, sempre ligadas ao conhecimento
dos dinossauros e à prática da paleontologia. Muito bem feito, Extinção e
Queda dos Dinossauros, por Steve Brusset. Eu já tinha apanhado o livro,
já o
Octávio Mateus
recomendação vou movê-lo uns degraus para cima. Sim, sim. Se não fosse
esse, eu ia a um livro muito mais antigo, 1859, Origem das
Espécies. Continua a ser um livro, bem sabemos, é talvez o livro
mais influente de sempre, com exceção dos livros religiosos, claro que está,
pelo menos dois livros religiosos, mas como livro científico é talvez o
livro mais influente sempre, Origem das Espécies, muito bem escrito e que
mostra uma capacidade de raciocínio e uma genialidade. Sim, é extraordinário. Quem
nos dera a nós ter uma fração
José Maria Pimentel
dessa genialidade, esse vale a pena ler. Eu ouvi-te a falar do
livro, estava-me a lembrar, eu tenho uma amiga que é uma personagem
e ela... Há um site, não sei se tu usas, que é
o Goodreads. Uma aplicação também. É uma espécie de rede social de
livros, mas aquilo funciona muito mais como uma maneira de tu teres,
pelo menos para mim, teres os livros que leste guardados e podes
classificá-los e tirar notas, podes fazer um monte de coisas. Mas também
é uma rede social, portanto tu vês os livros das pessoas e
ela tinha, há pouco, dois ou três livros e um deles era
a origem das espécies. E eu pensei, coisa bizarra. Pronto, tudo bem,
porque não é um livro contemporâneo, né? Certo, certo. Mas é um
bocadinho estranho. E depois dava quatro estrelas em cinco. E eu pensei,
quer dizer, se tu vais por a origem das espécies, ao menos
dá
José Maria Pimentel
Este episódio foi editado por Hugo Oliveira. Visitem o site 45graus.parafuso.net barra
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Leite e Abília Silva. Www.opusdei.pt