#75 Gonçalo Gil Mata - Gestão de tempo & produtividade: da importância do 'foco' ao papel do...

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José Maria Pimentel
Olá, o meu nome é José Maria Pimentel e este é o 45°. Desta vez estou à conversa com o Gonçalo Gil Mata. A ocupação do Gonçalo é colaborar quer com pessoas quer com organizações para aumentar o desempenho dos indivíduos e dos grupos. Isto leva-o a explorar várias frentes, desde a produtividade, à motivação, passando pela liderança e também pela comunicação entre as pessoas dentro das organizações. Um aspecto particularmente importante da produtividade e que nos é familiar a todos, é a dificuldade em gerir o nosso tempo, isto é, fazer tudo aquilo que queremos fazer e sem ao mesmo tempo pagarmos o preço em camadas de stress. E esse é precisamente o tema do livro mais recente do convidado e que serviu de moto à conversa. A ideia do livro é relativamente simples, compreender melhor a nossa mente e com isso não apenas pôr a nulo os obstáculos que nos podem estar a impedir de gerir melhor o nosso tempo, mas também, ao mesmo tempo, até porque nunca conseguiremos fazer tudo, sermos capazes de distinguir entre aquilo que queremos realmente fazer e aquilo que não nos vai propriamente tornar mais realizados ou fazer atingir aqueles que são na verdade os nossos objetivos últimos. Durante a conversa percorremos uma série de temas que podem encontrar listados na descrição deste episódio. E antes de passarmos à conversa queria dar-vos rapidamente nota de uma novidade. Está a partir de agora disponível no site o 45 Graus uma forma mais direta para apoiarem este projeto. Criei esta alternativa porque vários ouvintes me foram alertando para o facto de que fazer um contributo através do Patreon demora algum tempo e tem a desvantagem para algumas pessoas de que implique registar-se num site externo. Assim, embora a possibilidade de contribuir através do Patreon vá continuar a existir, até porque tem a vantagem de um acesso mais direto à comunidade de mecenas, existe agora também uma forma de apoiar o 45° diretamente. Basta ir ao site do podcast em 45°.parafuso.net barra apoiar-o e o processo é semelhante a uma qualquer compra online. E pronto, está feita esta atualização, por agora deixo-vos com o Gonçalo Gil Mata. Gonçalo, bem-vindo ao podcast. Vamos falar de gestão de tempo e de produtividade. Acho que faz sentido começar pelo início, que na prática é começar pelo fim, ou seja, pela finalidade. Porque, antes de mais, é preciso definir porque é que nós queremos gerir melhor o nosso tempo, ou ser mais eficazes naquilo que queremos fazer, porque isso depende daquilo que queremos fazer. O exemplo que é sempre dado é que esta preocupação com a gestão do nosso tempo é uma coisa mais ou menos pré na humanidade, mas que durante muito tempo não teve pelo menos a visibilidade que tem hoje porque as pessoas... Tinha outra calma. Tinha outra calma e provavelmente até tinham menos tempo do que nós temos hoje em dia. Nesse sentido é um paradoxo, não é? Portanto, qual é o nosso objetivo em querer gerir melhor o nosso tempo?
Gonçalo Gil Mata
Essa realmente é a pergunta fundamental. Trabalho nesta área há muito tempo e a maior parte das pessoas define como objetivo gerir melhor o seu tempo, ser mais produtivo, mas sem termos como ponto de partida porquê é que isso é importante, porquê é que é importante sermos eficientes, porquê é que é importante, o que é que queremos fazer com o tempo que achamos que vamos libertar. Sem isso fica mais difícil dar um propósito ao exercício. E por isso acho que é uma das coisas fundamentais para relembrar as pessoas é o que é que é preciso gerir melhor o seu tempo, como é que a sua vida ia ficar diferente se o conseguisse fazer, o que é que ia ganhar com isso, para termos ali a alavanca motivacional para mudar qualquer coisa.
José Maria Pimentel
Sim. Mas, por exemplo, a tua experiência, o que é que as pessoas querem fazer, o que é que as pessoas não estão a conseguir fazer que queriam fazer? Porque isso também pode ser, estou a fazer esta pergunta, porque muitas vezes também pode ser um bocadinho idílico. Aliás, essa é uma das coisas interessantes do tempo, que é democrático, porque todos temos 24 horas. Não é completamente verdade, no sentido em que dinheiro permite, em certo sentido, esticar o nosso tempo, porque podemos subcontratar coisas, muitos serviços, mas ainda assim há um limite para isso, não é? Portanto, o tempo para tu fazeres coisas, no máximo será 24 horas, não é mais do que isso. E já temos a perceber um bocadinho de elixir, querer chegar a todo lado, que é basicamente impossível. Mas da tua experiência, o que é que as pessoas querem fazer que não conseguem fazer da maneira como estão a gerir o seu tempo?
Gonçalo Gil Mata
Olha, da minha experiência, sendo assim muito honesto, as pessoas não sabem responder essa pergunta. Isto é, o que essencialmente faço é coaching, coaching executivo e a maior parte das pessoas têm uma imagem, uma ideia do que é que seria ter um nível de eficiência e um nível de produtividade superior, mas não sabem bem porque é que o querem e esse é normalmente o princípio da conversa, é o que é que para si seria diferente. Eu gosto da ideia do tempo democrático, 24 horas, e é interessante perceber que a nossa percepção de tempo não é idêntica. Tu podes ter o que é mesmo democrática que tu tens 24 horas de experiência por dia. E a tua experiência, mesmo que aches que se calhar a fazer umas tarefas mais domésticas porque não podes contratar o serviço para o fazer. Sim. A tua experiência de realizar essa tarefa tem um espectro de possibilidades muito grande. Tu podes fazê-la num modo completamente estressado porque queres fazer outra coisa a seguir, podes fazê-la num modo completamente zen e de aceitação total, podes fazê-la num... O teu estado mental com que realizas uma tarefa é que é a parte realmente democrática da coisa. Todos temos acesso a esse espectro de estado mental. E há uma relação muito grande entre quanto é que tu estás mergulhado nesta conversa aqui comigo e a tua percepção de tempo. Porque as pessoas querem esticá-lo, mas às vezes sem se aperceber que esticá-lo tem muito mais que ver com o tipo de experiência que têm em cada instante do que provavelmente fazer caber mais coisas. Quer dizer que muitas das pessoas que vêm à procura de uma melhor gestão de tempo querem inicialmente ou intuitivamente fazer caber mais coisas mas acabam por concluir que se calhar querem que a sua experiência da passagem de cima seja distinta. Esse é um
José Maria Pimentel
ponto interessante. Porque fazer mais coisas não é necessariamente o nosso objetivo. É. Ou não contribuir para o objetivo final. Estava a falar e lembrava-me de uma tensão que eu sinto muitas vezes entre desde logo porque uma coisa que é preciso não esquecer e que às vezes é um pressuposto que muitas vezes está escondido nestas frameworks desde tão tempo é que tu não controlas tudo e portanto tens uma agência limitada sobre as tarefas que estás a fazer ou sobre a tua capacidade para as fazer de forma mais eficiente. E portanto há aqui uma tensão entre tu estás completamente relaxado e deixas-te ir e aí estás relaxado mas vais demorar muito mais tempo e provavelmente deixar de fazer algumas coisas que querias fazer ou então tentares fazê-lo mais rápido mas aí estarás mais estressado, mais subtenção mais ansioso mais ansioso a verdade terá lugures entre uma coisa e outra pelo menos eu sinto isso que muitas vezes na prática não é fácil que tu encontras o ponto equilíbrio porque precisas de empurrar com alguma força para a coisa avançar e para conseguires fazer tudo aquilo que queres fazer, quer dizer, entre outras coisas, se tiveres um projeto, qualquer que ele seja.
Gonçalo Gil Mata
E fazer o tique na lista, não
José Maria Pimentel
é? Sim, independentemente do tique, quer dizer, por exemplo, no caso do podcast há aqui um efeito de compounding, não é? Ou seja, tu deixares as coisas feitas que depois vão alimentar as coisas a seguir e tudo isso requer força. Mas por outro lado, se estiveres demasiado concentrado nisso corres o risco de acrescentar uma dose de stress que não tem um efeito proporcional em termos do objetivo que tu queres, não é?
Gonçalo Gil Mata
Claro e uma das pretensões, respondendo quase novamente à primeira pergunta é as pessoas querem sentir qualquer coisa que não estão a sentir? As pessoas podem querer sentir-se mais realizadas por gerir melhor o tempo podem querer sentir menos ansiedade, que estás a mencionar podem querer sentir-se mais cumpridoras podem querer sentir-se menos em falta, não é? Mas esse é o dos ilhas da questão, é o que nós queremos sentir. Numa versão muito intuitiva, contacto frequentemente com pessoas que acham que se conseguissem fazer caber bastante mais coisas na sua vida deixavam de ter esta sensação de encumbrimento. Ou de desperdício, ou de estar em falta, ou de estarem a ficarem atrasadas por alguma coisa, ou de estarem a ver a vida passar e não estarem a conseguir atingir coisas que acham que era suposto estarem a atingir. Por isso é muito importante levar as pessoas a pensar porque é que realmente haveriam de querer fazer caber mais coisas. Isso acho que é o ponto inicial. Sim,
José Maria Pimentel
falámos há bocadinho para gerações passadas isto não ser necessariamente uma preocupação, não é? Há aqui também um bocadinho um paradoxo que eu acho um paradoxo bom, há quem ache mal, o facto de nós hoje em dia termos muito mais opções disponíveis
Gonçalo Gil Mata
É, o nome de escolhas disparando desce, é o paradoxo da escolha, não é? Exatamente. Baixa a nossa satisfação. Vais escolher uma casa e vês 10 casas diferentes. Na primeira gostaste da piscina, na segunda gostaste do pátio, na terceira gostaste da entrada, na quarta gostaste da localização. Quando vais a escolher a casa, sabes tudo o que estás a perder, o que é um paradoxo engraçado já bastante investigado. E nós hoje, Antigamente a vida era bem mais óbvia. Sim.
José Maria Pimentel
Pré-definida, em certo sentido. Absolutamente. Eu já tive essa discussão com várias pessoas, eu acho o paradigma atual muito melhor. O problema é que exige muito mais de nós porque temos que fazer essas escolhas que são escolhas difíceis. Lá está, a escolha não tem uma necessária correlação com a tua satisfação ou com a tua felicidade, se quiser. Pelo menos no imediato.
Gonçalo Gil Mata
E esse é um ponto muito importante, que é as escolhas não são difíceis. Nós podemos criar essa relação com a escolha. Mas uma das coisas que mais caracteriza a nossa experiência de estarmos vivos e de existirmos, termos uma noção consciente de um eu, é como é que é a tua relação com um sentido de responsabilidade de aproveitar esse privilégio. Se tu te levares muito a sério, escolheres se vais fazer um serão com os amigos em casa, jogar um póquer, ou sair à noite para beber um copo, ou... Pode ser uma grande decisão, mas não tem que ser. Tu escolheres o emprego A ou o emprego B, pode ser uma enorme decisão, mas não tem que ser. A nossa relação com o butterfly effect, que parece caracterizar as consequências do que escolhemos, é um dos pontos mais viscerais. Como é que te queres relacionar com isso? E podes relacionar-te criando uma imagem de que essas escolhas são difíceis podes relacionar-te criando uma imagem de que vais escolher o melhor que soubes daquilo que estás a ver naquele momento toda a gente acerta 9 milhões na semana seguinte, não é? E isso pode aliviar a tua experiência e a ansiedade de teres que escolher bem não vai vires a arrepender-te. Uma coisa que acho que a sociedade em geral vai beneficiar muito com esta onda de metodologias, de gestão emocional e... Acho que as pessoas estão a perceber que não vamos lá por fazer mais coisas e vamos lá por sentir mais coisas. Se calhar depois esta mola também vai passar, mas acho interessante ver que o foco é o que é que tu queres sentir mais vezes na tua vida. Esse é que é o ponto.
José Maria Pimentel
Sim. E uma coisa que está relacionada com isto e com a nossa satisfação, e que já tem que ver muito mais com uma metodologia específica que tu falas no livro e que também já tenho seguido há muito tempo, é aquela questão do foco ou da capacidade de concentração. É muito interessante nós percebermos que há pouco tempo nós temos hoje em dia por norma para estar concentrados a fazer alguma coisa. E há aquele livro muito conhecido do Carl Newport, o Deep Work, que é uma metodologia específica, mas que no fundo tem a ver com tu teres períodos pré-definidos no teu dia e segregados do resto em que tu estás absolutamente concentrado a fazer uma tarefa qualquer. Independentemente da metodologia específica, até da minha experiência pessoal, isso faz uma diferença grande por dois motivos. Por um lado, porque te faz ter, ao estares isolado a trabalhar sobre uma tabernácula de coisas... E dedicado. E dedicado, não é absolutamente dedicado sem distrações, e isso te faz ser muito mais produtivo, não é? Porque nós estamos sempre à alerta, como tu salientas no livro, até por motivos evolutivos temos que estar sempre à alerta para eventuais perigos, e aqui perigos pode ser um e-mail que aparece. Perigos e oportunidades. Perigos e oportunidades, exatamente. Coisas que no fundo sejam mais imediatas do que aquilo que nós estamos a fazer naquele momento. E portanto, isolar nos permite não termos essas interrupções que criam uma série de ineficiências. Isso até nos computadores acontece, ao teres que mudar de tarefa perdes completamente a cadência em que estavas e nós demoramos para aí 15 minutos, não é? Voltar ao estado em que estávamos antes. E ao mesmo tempo, há aqui um efeito de segunda ordem, que é menos óbvio, que é exatamente sobre a satisfação. Há vários estudos em psicologia, eu acho que a terminologia que eles usam até era a wondering mind is an unhappy mind, ou seja, uma mente que está sempre a mudar de assunto para assunto, e isso acontece, se nós não fizermos nada já acontece por si só, não é? Porque a nossa consciência vai para vários sitios, mas sobretudo se estivermos postos a e-mails, whatsapps e por aí em diante, estamos sempre a ter estímulos novos e isso conduz em satisfação, o que é curioso. E a minha experiência, presumo que a tua seja semelhante, é quando me obriga a fazer esse tipo de coisa estar duas horas a trabalhar, ou duas horas concentrada a fazer uma coisa qualquer no final eu estou mais satisfeito do que estava antes, que é curioso. Embora tenha estado em esforço, sinto-me mais em paz, de certa forma.
Gonçalo Gil Mata
Até porque cumpriste qualquer coisa. Edificaste, construíste, não é isso?
José Maria Pimentel
Na verdade eu não sei bem porquê. Não sei se tem a ver com isso, não sei se tem a ver com o cérebro estar paradoxalmente o cérebro estar descansado, em certo sentido, ou seja esteve a correr uma maratona, mas por outro lado não teve que estar nessa ginástica de estar a repartir entre uma preocupação de uma coisa que tens que fazer, mas depois queres responder a mensagem que te mandaram no
Gonçalo Gil Mata
WhatsApp Isso é que é um ponto muito importante, é o saltar de tarefa em tarefa e era capaz de chamar a atenção aqui para dois pontos ligando a noção de foco e de flow Já agora se importa só te explicar o que é flow para quem está a ouvir. Flow é aquele estado onde nós, de uma forma relativamente inconsciente, estamos a debitar alta produtividade, praticamente sem esforço, mas com uma total dedicação, numa descrição assim um pouco informal. Liga-se muito a foco no sentido que os nossos recursos de atenção, aquilo que é a nossa capacidade de processamento na nossa cabeça, têm uma gestão bastante diferente do computador no sentido em que tu no computador mudas de tarefa para tarefa super rápido. Até há shortcuts, alt tab, e coisas que te permitem... Agora estou a ver o e-mail, agora estou a ver outra coisa. A nossa mente é plásmica nesse sentido. O que é que quer dizer? Hoje em dia já não se vê muito, mas um plasma a trabalhar. Quando tu desligas um plasma, ele apaga devagarinho, ele vai apagando. Portanto, a nossa mente é plásmica no sentido que a estimulação das nossas redes neurais é uma estimulação com gradiente, é lenta. Nós não fazemos na nossa cabeça um focus shift, uma alteração de foco rápida, fazemos-la lenta. Imagina por exemplo que nós estamos aqui a falar de recursos adicionais e eu pergunto assim, viste o último jogo da Benfica? Quanto é que ficou? Lembras-te? Diz agora, lembras-te mesmo?
José Maria Pimentel
Não, Não faço ideia. Ah não, ficou 3-1, por acaso.
Gonçalo Gil Mata
3-1? Pronto. Eu não faria ideia até porque eu sou do
José Maria Pimentel
Porto. Eu também, mas eu agora já não vejo futebol praticamente, mas por acaso eu sei. Tu
Gonçalo Gil Mata
sabes quem é que marcou o primeiro golo? Já estás a perguntar também. Já, estou a puxar um bocadinho. Agora, Quando eu te obrigo a fazer este acesso à memória, este acesso até a distrair-te no sentido de porque é que eu gosto de falar futebol e agora digo assim, olha, o que é que nós estávamos a falar mesmo antes de falar futebol? E agora a tua cabeça... Foi uma interrupção de 10 segundos que eu fiz aqui nesta conversa, mas o esforço de dizer assim ah pois, estávamos a falar recursos atencionais e disto de mudar de tarefa para tarefa. Pronto, that's the point. É, o nosso cérebro tem que mudar o foco, tem que pesquisar outra área de memória, tem que fazer outro cálculo associativo, tem que fazer outro racional de léxico, tem que fazer todo um sério de atividades. O que faz com que, se nós tivermos um ambiente de trabalho onde assiduamente somos estimulados a fazer esta alteração de foco, a densidade do processador, a densidade com que te concentras naquilo que estavas a fazer, vai ficar limitada e te vais sentir uma certa frustração em não conseguir gerar progresso. O teu cérebro tem uma noção de eficiência muito bem programada. Nós somos pouco tolerantes à ineficiência. Quer dizer que tu vais mandar-te com menos vontade a fazer coisas que achas que precisariam de um tempo X para fazer e não vais acabar ali. Esse é o primeiro ponto, do ponto de vista direto, que estás a dizer que o foco tem um primeiro resultado, produtividade. Se nós estivermos mais focados e menos interrompidos, somos efetivamente mais produtivos, não só porque evitamos esse custo, mas como deixamos de limitar a densidade com que nós podemos pensar nas coisas. Portanto, criatividade, cálculo de precisamento de decisões, tudo isso são benefícios diretos de eu estar dedicado a uma só atividade. Mas tu não notas, por exemplo, no teu trabalho, que as pessoas
José Maria Pimentel
não têm muita noção disso. Eu, pelo menos, eu acho que nós achamos que somos mais capazes de fazer essa alteração entre tarefas do que somos na realidade. Ah não, não vou só livrear o WhatsApp, vou só responder àquele e-mail ou só ir ao site, ver se só assinou alguma notícia, não é?
Gonçalo Gil Mata
O sentido de ocupação e... Estou muito aterefado. Só se torna evidente no fim do dia. Quando estamos a ir para casa. Sim. Estamos para fogo, não viste nada de jeito. É aí que nós percebemos que a intuição nos pegou uma partida. É, estávamos muito atentos, muito vivaces, muito responsivos. É um bocado como quando vemos aqueles países um bocadinho mais distantes e menos civilizados, de ponto de vista de trânsito, e vemos um total de caos, e achamos, bom, eles conseguem se safar bastante bem, uma tureta para aqui, a outra pessoa ali, às vezes até dão um toquezinho, quando estamos no Camboja ou no Vietnã, ou países assim mesmo...
José Maria Pimentel
Vais ter a Marrocos.
Gonçalo Gil Mata
Hoje em dia a Marrocos já está muito evoluída, mas sim, quem foi à Marrocos há 20 anos atrás sabe o que se há a falar. E o que acontece é, ok, eles são muito bons a resolver aquele caos, mas quanto tempo é que tu demoras para chegar ao aeroporto? Quatro horas. Portanto, a eficiência da coisa nota-se no final do dia. No final do dia, as pessoas olham para o seu dia e sentem que tiveram de fazer muito esforço para esta realocação atencional e não produziram dentro. Quanto ao facto das pessoas estarem sensíveis ou não, Isto remete também para este gap geracional quase dos milenials e desta capacidade notável que esta nova geração tem para conseguir navegar um mar gigantesco de estímulos e estar mais ou menos ok com isso. O que, por exemplo, na minha geração tradicionalmente já é mais aflitivo ter muitos e-mails por ler, ou um badge, aqueles badges que aparecem nos ícones das aplicações carregado de novas coisas para ver no LinkedIn, no WhatsApp, no Facebook, no Twitter, em tudo isso é engraçado como eles estão a navegar muito melhor isso. Por outro lado, é interessante também ver e agora até no princípio do ano vamos fazer um trabalho interessante com 100 millennials de vários dos nossos clientes que vão escolher os mais produtivos de todos e vamos fazer um estudo sobre como é que hoje em dia se pode pegar nas tradicionais abordagens deste tão tempo e adaptar a esta nova geração. Mas inevitavelmente descobrimos que eles não têm a sensação de estar lá como poderiam ter. Quando são confrontados com uma mitologia mais zen, uma mitologia mais de meditação, mitologia mais de mindfulness, ficam surpreendidos e eu acho que essa surpresa tem que ver com como poucas vezes eles estão expostos a estes estados. Por isso eles
José Maria Pimentel
conseguem... A estes estados? Quais, desculpa? De profundidade.
Gonçalo Gil Mata
Sim, sim. Se eu não tiver uma certa experiência de ter estado num estado de flow, num estado de alta concentração e eu se disser, olha, tu concentrado ias debitar mais que eu. Não, estou ótimo. Claro, porquê? Então estás a jantar comigo e estás ao mesmo tempo a responder ao Facebook, não me estás a dar atenção. Estou
José Maria Pimentel
claro que estou. Ah, mas eu consigo, sim, sim. Eu consigo. Estou na boa.
Gonçalo Gil Mata
E ao mesmo tempo estou a jogar este jogo, ao mesmo tempo estou a ver este canal de televisão, estou na ótima. Se tu não tiveres experiência do que é que é um estado de entrega, um estado de serenidade, um estado de profundidade sensorial, um estado que leva a tua cabeça a sentir coisas que de outra forma é só impossível de sentir porque o que nós sentimos são estados mentais. Se tu não tiveres essa tradição, esse hábito, esse ponto de referência tu não notas que estás em falta. E acho que isso está a acontecer com esta nova geração.
José Maria Pimentel
É curioso dizeres isso por acaso. O facto da pessoa não conhecer esse estado torna pouco sensível à ansiedade dele, até porque nós não somos feitos para reparar naquilo que não está lá. Somos feitos para reparar no que está.
Gonçalo Gil Mata
Principalmente se nunca esteve.
José Maria Pimentel
Sim, sim, nunca esteve. Pessoalmente, qual é o teu método? Qual é o método que tu recomendas? Por exemplo, a maior parte das pessoas que nos estão a ouvir de uma forma ou de outra não vive numa cabana no meio do mato, não é? Portanto, dependendo do tipo de ocupação que tiver têm estímulos externos, têm imensas que responder, ou telefonemas que entender, ou uma série de coisas que portanto de certa forma é fácil da pessoa pensar, não, mas eu na verdade tenho que estar sempre ligado. Quanto tempo é que te parece necessário para a pessoa estar isolada, não
Gonçalo Gil Mata
é? Focada, concentrada a fazer uma determinada coisa. E eu acho essa pergunta interessante. Vou fugir-te um bocadinho, mas depois vou responder ela. Em primeiro lugar, tu estares nas caraíbas, não quer dizer que estejas zen. Há uma relação meia intuitiva, mas ao mesmo tempo não verdadeira, de que nós vivemos a experiência das nossas circunstâncias. E não é verdade, nós não vivemos a experiência das nossas circunstâncias, nós vivemos a experiência da nossa atribuição de significado às circunstâncias. Há uma parte, há um moderador no meio disto, por isso muitas vezes é que nós devemos tentar aplicar o método de tranquilizar-nos cinco minutos por dia e não funciona. Não funciona porque ou exigimos sobre as circunstâncias ou exigimos... Eu adoro aqueles profissionais, tanto budistas, mesmo com muita experiência, que dizem, não, esquece a história do tapete e do templo no meio da montanha. Zen é meditar a cada respiração. Portanto, há aqui um confronto, tem que dizer assim, ouça, não tem a ver com método, tem a ver com um determinado mindset que pontua disponibilidade sensorial. Se eu estiver a pontuar, se eu de alguma forma, não é fabricado, se de alguma forma, tu estando exposto a estados de serenidade, a estados de tranquilidade, a estados de uma perceção de controlo e de auto-eficácia que não tem a ver com o caos que te rodeia, se tu tiveres acesso a isso e pontuares isso, tu tens essa oportunidade as we speak, tens essa oportunidade no meio do caos de mais uma bomba que reventou no email com um cliente que está zangado e que é preciso e um chefe que se queixou e a apresentação no borde e tu podes sempre, sempre, estás sempre a um pensamento de distância, te dizer, ipa, que caos, para que vai? Bem, provavelmente o planeta vai continuar a girar e algo, vamos fazer alguma coisa disto. Faremos mais se conseguirmos aceder a um leque de opções. Faremos menos se começarmos aqui a ah, ah, ah, ah, para o lado, para o outro, para o lado, para o outro... E portanto, a relação que pontua o estado emocional de tranquilidade também é uma relação de eficiência. Tu sabes que se tiveres a comandar uma equipa, por exemplo, que está bastante ansiosa, bastante estressada, bastante turbulenta e tu estás a liderar esta equipa, tu sabes que precisas de fazer esta equipa pulsar num estado de maior controle, de maior serenidade, de maior confiança, para que eles produzam mais. Não há a relação de ser o stressado ou ser mais rápido. Essa relação é uma curva normal. Se tu não tiveres zero stressado eventualmente vais estar mais letárgico, provavelmente um pouco ativo. Se tiveres ultra stressado vais bloquear e vais sequestrar os teus recursos mentais nessa estressa e, portanto, o ponto de equilíbrio não é uma corba linear, não é? Quanto mais gás dermos mentalmente mais gás dermos no mundo da produtividade. Não, isso não acontece assim. Sobretudo em equipa, não? Sobretudo em equipa. Portanto, nós temos a âncora de serenidade igual a produtividade é uma coisa que poucas equipas vêem com esta objetividade. E como tal, são menos sensíveis a procurar isso e acham que mais atividade é melhor. Portanto, voltando agora à resposta, em termos de método.
José Maria Pimentel
Desculpa interromper-te, mas agora puxaste a conversa para outro tema importante que é a questão do stress ou por oposição na serenidade, na capacidade da pessoa não se deixar levar pelos estímulos. Isso também é importante, a minha pergunta tinha mais que ver com a questão do foco, no sentido em isolar-se desses estímulos para estares concentrado a trabalhar uma determinada coisa. É
Gonçalo Gil Mata
que o stress é antagónico ao foco até certo ponto, porque se tu tiveres...
José Maria Pimentel
Não, completamente. O que eu quero dizer é... Uma coisa é tu não conseguires isolar-te dos estímulos e não conseguindo isolar-te deles, como é que lidas com eles? E aí essa capacidade de te distanciar, por exemplo, é muito importante. Outra coisa é para te concentrares podendo fazê-lo, isolares dos temos. E a minha pergunta tem exatamente a ver com isso, é que muita gente pensará, e isto tem um fundo verdadeiro, ou mais do que um fundo, que é difícil de tu separar-te absolutamente desses temas, porque não te podes propriamente fechar numa sala sozinho.
Gonçalo Gil Mata
Porque Pode haver incêndios que tu vais arrepender mais tarde. Esse é que é o interessante, as pessoas não resistem a uma mensagem. Tenho 9 e-mail porque começam logo a ver quantas coisas é que podem estar a correr mal e até que ponto é que eu vou estar em falta se continuar focado em vez de ir apreciar a novidade. E é importante nós cadenciarmos, ritmarmos, fazer uma espécie de semáforo que possam fazer esperar as novidades durante X tempo. E isso é uma recomendação que eu dou, talvez a mais simples e mais prática recomendação que eu dou para as pessoas acederem a níveis de foco elevados é apreciarem os estímulos que têm à sua volta e tentarem cadenciá-los. Agora tu perguntas, Salmas, eu vou receber um e-mail do meu administrador a dizer, urgente, mande-me por favor não sei o quê. E eu estou num periodo zen, foco e nem vejo e passa a demorar, ele está-me a ligar a dizer não viu o meu e-mail? O importante neste exemplo que é o que mais surge quando se defende um método de trabalho mais cadenciado tem que ver com como é que está montado o processo das emergências. Se o processo das emergências estiver montado em cima de um canal que tem tudo e um par de botas, a noção de emergência vai nos obrigar a apreciar tudo. Era como se eu distribuísse sirenes de urgência a todos os carros de Lisboa. Não vai funcionar. Porque aí não há um sentido de urgência. Portanto, as pessoas usarem o canal generalista como é o e-mail para coisas que precisam de uma resposta rápida, é um contrasenso na sua ciência. E até
José Maria Pimentel
porque o e-mail é uma coisa que de certa forma ainda não nos habituámos bem. Por exemplo, é muito comum usar-se o e-mail ainda como se fosse uma carta.
Gonçalo Gil Mata
Acho que lá desaparecem antes de nos habituarmos a ele. Não me parece, apesar de tudo. Não me parece, as estatísticas não põem de brincadeira. Mas é
José Maria Pimentel
muito comum, por exemplo, tu recebes um e-mail de alguém com quem trabalhas frequentemente tu dizes caro, não sei o quê, depois termina, cumprimento. Isto é um aparte, mas tudo aquilo
Gonçalo Gil Mata
é escrito como se fosse... Por isso é que o WhatsApp e companhias disparam, não é? Sim. Fazem shortcut a isso tudo.
José Maria Pimentel
Mas o e-mail também pode ser usado assim, na verdade. Mas como tu dizias, mesmo com isto não é um método urgente ou não deve ser um método utilizado quando... E deixa-me só complementar com uma coisa muito rápida, que
Gonçalo Gil Mata
é as pessoas só conseguirão implementar cadência para cederem a níveis de focos superiores se souberem o que andam a fazer. Porque se tu não soubesse o que andas a fazer Tu começas a movimentar os teus critérios de sucesso e de performance e de resultados no teu dia, não para fazer acontecer aquilo que no fim do mês vai contar, mas para manter as pessoas à tua volta contentes. Portanto, tu começas a cair na responsividade em vez de produtividade. Começas a responder muito rápido em vez de estar concentrado. Quando fazes isso, a pergunta que eu sugiro fazer-se é o que é que o senhor está a fazer? O que é que o senhor anda a fazer? Qual é a sua missão? O que é que quer obter no fim do mês? O que é que de alguma forma vai fazer mexer os resultados que lhe competem e que se vai medir no final de trimestre, para que é que o senhor serve? E esta pergunta, para que é que eu sirvo, é uma pergunta que poucas pessoas sabem responder, mesmo num contexto organizacional. Para que é que eu sirvo aqui dentro? E quando nós não sabemos responder isto com clareza parece que nós servimos para responder a e-mails ou para responder a solicitações, ou para responder a estímulos e como deslocamos o nosso foco para manter as pessoas à nossa volta mais ou menos bem servidas mas temos que balancear isso. Até porque se não balancearmos isso, é uma festa. Todo o CSS para todo lado, toda a gente é incluída em tudo, e até falta a percepção de isto não é a maneira séria para nós trabalharmos. E
José Maria Pimentel
tem um impacto também na tua motivação. Por vezes não é óbvio, não é? Ou seja, tu não tens noção de qual é o fim último, qual é o propósito, tem o impacto na motivação, e aliás, tu há pouco estavas a falar, eu depois interrompi-te, mas queria voltar a isso, começaste por falar do menor foco sobre a
Gonçalo Gil Mata
ineficiência, depois ias falar sobre a questão da satisfação. Jogo eu, não é? Sim. E a dizer que se tu tiveres sempre de olhos postos no depois sempre de olhos postos no que é que vais fazer a seguir sempre de olhos postos no epá, deixa-me rápido ir buscar os miúdos, bem rápido ao supermercado porque tem que ser rápido para depois à noite tenho que libertar um bocadinho para brincar com ele. Em condições. E esse tipo de mindset às vezes é traiçoeiro porque... Eu gosto de dar este exemplo, porque acho que muitas pessoas já o terão vivido, que é a história de nós irmos buscar o miúdo ao infantário e de estarmos a chegar ao supermercado, para sermos muito rápidos para depois a seguir ao jantar, libertarmos de tempo para estar com medo ele está a tentar nos contar uma história e nós estamos ao mesmo tempo a receber um telefonema para depois conseguirmos estacionar o carro rápido num sítio mais perto, para conseguirmos ser mais eficientes e ele está a tentar contar a história e nós estamos a prestar zero atenção. Não nos ocorre que parar ali dois minutos seria a coisa mais intensa que nós podemos fazer pela nossa relação com aquela criança. E não nos ocorre porque nós temos um plano e o plano é acelerar tudo para seguir ao jantar e ter tempo. Quando eu seguir ao jantar nós vamos conversar com ele, ele vai dizer agora já não me apetece. Tipo, tu veste-me ignorar estas horas todas, deixes-me chegar aqui para cumprir o teu plano. Isso não é a essência da nossa relação. E
José Maria Pimentel
a tua disposição provavelmente também não será
Gonçalo Gil Mata
a mesma porque tiveste-te sob stress para conseguir chegar ali. Portanto, eu Acho que é preciso rever um bocadinho nestas metodologias tradicionais desde tão tempo em que as pessoas encontram os slots certos e... E vou dar a tua pergunta do método. Não concordo que devamos pedir às pessoas que encontrem slots específicos no seu dia para o fazer, acho bem que o façam servir, mas não servirá para a maior parte das pessoas. Para a maior parte das pessoas o atalho será, hey, hello, é já, agora, neste momento, é agora que o miúdo quer contar a história, é agora que nós temos que suspender tudo o resto se isto for realmente uma prioridade. E se não for, nunca vai ser. Não é
José Maria Pimentel
depois do jantar. Sim, tens de ser flexível. De certa forma, sim. Fazendo aqui uma transição para aquilo que nós queremos fazer. Por exemplo, aqui no ambiente de trabalho, essa é outra coisa interessante que tu abordas no livro. Uma coisa que eu achei interessante, porque acho que já todos passámos por isso, é quando tu tens uma determinada lista de tarefas, mais ou menos organizada, e há aquela coisa que tu sabes que é importante estar lá sempre, mas tu não te consegues fazer fazer aquilo.
Gonçalo Gil Mata
Certo. Essa é uma tema interessantíssimo, porque as pessoas às vezes dão o passo significativo e que eu acho muito recomendável de conseguir estruturar aquilo que têm para fazer. Essencialmente dividem em quatro ou cinco áreas e penduram lá os itens que estão pendentes em cada coisa. E este é um exercício fácil de fazer e que é talvez o primeiro passo para, por exemplo, substituir às vezes uma lista desorganizada que está no nosso e-mail, porque os e-mails acabam por ser a lista de tarefas dos preguiçosos, eu digo, é brincadeira, não é? Não dá trabalho nenhum, alguém está lá a escrever os itens, eles acumulam-se, mas não estão estruturados, não são as nossas prioridades, são as prioridades dos outros, então é uma bússola respeitarmos como prioridades dos dias,
José Maria Pimentel
as prioridades dos outros.
Gonçalo Gil Mata
E diria que o benefício então é estruturar, e depois vão dar o segundo passo, que é pá, agora tenho que fazer isto, agora está aqui tão evidente que esta é a mais importante e esta, pronto, não lhe pego. Passa-se o dia todo, não pega... Este fugir com o rabo à seringa é uma parte muito importante e há várias explicações para nós chegarmos ao final de um dia e não termos feito uma coisa que claramente tínhamos identificado como prioritária. A principal razão é que nós temos medo daquilo. Essa é a razão número um. E medo é o quê? É ou porque aquilo é altamente ineficiente, não tem valor acrescentado nenhum e estamos em external compliance. O que é external compliance? É quando eu estou a fazer aquilo porque é suposto fazer aquilo mas eu não acredito que aquilo... Os típicos exemplos disso são os relatórios, não é? Certo. Se não fazem relatórios, os relatórios não lhes servem para nada. E às vezes nem têm a percepção se eles são importantes ou não. Ou às vezes têm a percepção de que eles não são importantes se eles estão a fazer aquilo para não levar na cabeça. Isso é muito importante. É a noção de isto é ineficiente, eu tenho tanta coisa para fazer que acrescento valor ao cliente e vou estar aqui a fazer report de uma coisa que ninguém vai ler. Ou há alguma variação desta. Portanto, a percepção de utilidade da tarefa é um dos grandes travões. E ainda bem, porque nos evita fazer coisas que são desnecessárias. A segundo é a minha expectativa de auto-eficácia, que é isto, é quanto é que eu acredito que vou ser capaz de realizar aquilo com sucesso? Ou porque a tarefa tem bastante disposição, ou porque obriga a decisões graves, ou decisões com consequências, ou porque eu não sei fazer bem aquilo, não domino o tema, acho que vou falhar, tudo o que remete para eu se fizer isto, estou a arriscar ficar mal na fotografia, estou a arriscar a minha própria noção de self e de identidade. Como desbloquear? É uma pergunta gira, não é? Claro. Porque assim, eu penso, ok, percebi, se calhar isso acontece, mas então o que é que eu faço? Bem, eu diria que um primeiro passo é perceber se há alguma decisão que está a obstruir a clarificação da ação. O que é que eu quero dizer com isto? As tarefas não nos chegam sob o formato de tarefa. As nossas linhas de ação, os nossos itens pendentes, não nos chegam trabalhados nesse aspecto. Eles chegam por via de, eipa, o cliente reclamou que não sei o que mais. Assim, e então? Pronto, esta pergunta aí então, o que é que é para fazer? Quem é que vai fazer o quê? Que é uma pergunta que na nossa cultura em particular, uma cultura mais latina, mais quente, está poucas vezes numa reunião, que é o que é que é para fazer? Está aqui o tema, sim senhor, mas olha, qual é o pequeno pedaço da ação que vai mobilizar este tema para frente? Se for à Suécia ou à Noruega, isto é mais ou menos um mindset um bocadinho mais estereotipado, ou na Alemanha, chama-se action oriented, mais orientado à ação. O que é que isso quer dizer? Quer dizer que tu destinos... É consequente. É consequente e não só consequente, é... Pede a tomada de decisão que vai clarificar a ação. Tu executares uma tarefa ou decidis que tarefa há para executar, existe coisas diferentes da tua cabeça. Eu gosto de chamar isto de o general e o robô. O general toma a decisão e gera o risco e o robô executa. O robô é viciado em execução e está sempre a funcionar. Quer dizer que se ninguém te clarificar a ação nessa tarefa que está pendente tu vais ter a ação disponível para fazer. Clicas no telemóvel, abrir-me novas mensagens, novo e-mail para aqui, nova mensagem para colar, pequeninas coisas e evidentes, arrumar a secretária e de repente ocupas o robô e não ocupas o robô nas tarefas que interessam. Porquê? Porque as tarefas que interessam não estão claras de ponto de vista do que há para fazer. Portanto, isto vem do tempo da David Allen, como te eu lija Getting Things Done, para quem gosta do tema conhece certamente, e que é, se eu não souber responder à pergunta What's the next action? Qual é a próxima ação? Eu dificilmente estou a perceber que o problema não tem nada a ver com o estando de tempo, não tem nada a ver com... Tem a ver com eu não tive a coragem de tomar uma decisão. Como é que eu vou ponderar este quadro? Pá, mas vai ser com um prego, vai ser com uma bucha, vai ser com um autocolante. Se eu não decidir coisas à volta da tarefa, eu não posso pôr o robô a trabalhar nela porque o robô não toma decisões.
José Maria Pimentel
Não tem instruções. Não tem instruções. Sim. E muitas vezes estás a fugir de tomar essa decisão. Claro.
Gonçalo Gil Mata
E porquê? Isso é que é. Sim, exatamente. É porque as decisões doem. Exatamente. As decisões doem por tudo que nós estamos a arriscar na decisão. A menos que a nossa relação com a decisão seja mais pacífica, emocionalmente mais pacífica. Quando nós encaramos a decisão como uma inevitabilidade da nossa vida e como quase uma consequência de existirmos e não levamos as decisões tão a sério... Não tão a afetar o ego, por exemplo. Claro, tudo fica mais simples. Tudo fica mais simples.
José Maria Pimentel
Eu acho esse um ponto muito importante. E tudo existe em coisas até mais corriqueiras em certo sentido. Importantes mas mais mundanas como, por exemplo, pessoas que querem deixar de fumar e andam... Quer dizer, não é difícil. Tabacas das poucas coisas mantêm defensores, não é? Não há ninguém a dizer, não, não, só o Sal, se já pensaste em começar a fumar era capaz de ser bom. Ninguém diz isso, não é? Portanto, toda a gente, quase, eu diria, quase toda a gente que fuma quer deixar de fumar. Se calhar não é toda a gente. Mas muitas pessoas. Tem um amigo que dizia que fumar tinha sido a melhor coisa que tinha acontecido na vida porque, eu estava a dizer isto de uma forma provocadora, porque ele dizia que antes de fumar era um bocado mau aluno porque tinha, lá estava a dificuldade em concentrar-me. E isso tem a ver até com a questão do foco. Eu lhes disse a partir do momento em que eu comecei a fumar na faculdade, comecei a fazer pausas de 5 minutos a cada hora, por exemplo, e que funcionava como um pêndulo e de repente tornei-me muito mais eficiente, subi a média e isso fez com que no global, se eu não exagero, aquele fator esteja melhor do que estava antes. Não, vou pôr uns cartazes, vou colar, que se vão ao lua, não. Comece a fumar. Talvez não dê, mas para a maior parte das pessoas isso não é bom e, no entanto, há muitas pessoas que não se conseguem fazer... Deixar de fumar e todos nós quer dizer, eu não fumo, mas tenho várias coisas alterei, e muitas delas, as piores nem tenho noção disso, em que estou mais ou menos na mesma situação, coisas que queria fazer
Gonçalo Gil Mata
e não consigo. Claro. O Deixar Fumar é extremamente denso, acho que podemos deixar para outra conversa, toma-nos aqui muito tempo, mas acho muito importante a parte do Deixar Fumar que vejo pouco retratada, é que as pessoas têm um benefício incrível e que às vezes passa debaixo do radar em relação a fumar, que é conseguem aceder regularmente a intervalos de tranquilidade e de serenidade de saberem que estão a fazer justamente o que é suposto estarem a fazer que é aqueles 4 ou 5 minutos à volta daquele cigarro. E eu não vejo isso muito referido quando as pessoas falam em deixar de fumar por isso acho interessante que tenhas tocado no ponto-chave. E eu acho que o ponto-chave tem que ver com as pessoas não terem um substituto para conseguirem se ter esse momento de serenidade e isso era uma coisa que eu acho que devia estar na agenda das pessoas que estão preocupadas em sensibilizar a sociedade para deixar de fumar, mas esse é outro tema.
José Maria Pimentel
Mas é um ponto interessante. Mas
Gonçalo Gil Mata
em relação a muitas coisas que nós queremos fazer e não estamos a conseguir fazer e eu convidava as pessoas a pensar sempre em vocês querem mesmo fazer isso? Porque às vezes não querem. É surpreendente, no mundo do coaching que eu faço diariamente, é surpreendente o número de vezes que as pessoas acham que querem uma coisa e depois descobrem afinal não quero isso. Por isso, quando nós pegamos na chibata e auto-fustigamos de que não estamos a fazer aquilo que era suposto deixarmos a fazer assim, mas quem é que inventou o que era suposto? É um alívio tremendo quando as pessoas chegam à conclusão que metade dos seus sonhos não querem mesmo fazê-lo. Ah, pois não, eu não queria de todo viver numa ilha deserta. Não, eu não queria de todo ter um barco de uma trabalheira dá-se-me a variar e depois é preciso lavá-lo e depois é preciso pagar as taxas e depois é... E toda a gente tem um livro enorme quando vende o barco mas toda a gente sonha com o Ferrari, mas eu pergunto-me as pessoas têm mesmo ideia se querem fazer as coisas, levam a sério esta pergunta? Ou assumiram de barato que é suposto fazer aquela lista toda e já está? E estou a falar de sonhos, como posso estar a falar de tarefas do dia a dia.
José Maria Pimentel
Muitas vezes esses sonhos, aliás, têm muito a ver com a nossa cultura, não são bem coisas realistas, são as mesmas coisas que se diz para o ar. Uma das que
Gonçalo Gil Mata
se surge mais é, eu pergunto assim ouça, o senhor quer mesmo arrumar uma garagem? E é muito engraçado quando as pessoas dizem assim rapaz, estive a pensar nisso não, eu não quero arrumar garagem, eu não vou desperdiçar um domingo arrumar uma garagem, quando tenho tão pouco tempo e eu, ah, ótimo, outro, uma outra coisa sim pôs-as, óbviamente! É que
José Maria Pimentel
das duas, ou fazes, ou fazes ou decides que não vá ou decides que não fazes e estás bem com isso
Gonçalo Gil Mata
claro porque senão não faz sentido e falaste do ego que é uma coisa estruturante nisto que é, quando eu quero arrumar a garagem não provavelmente porque preciso de lá meter coisas que não cabem, que seria a funcionalidade mais objetiva de ter a garagem, ou porque não consigo meter o carro, ou porque meto o carro e não abro a porta, ou porque há uma razão, uma razão mais do for do objeto, do for do real, do for do resultado, e as pessoas convertem inconscientemente isso numa noção identitária. O que é que isto quer dizer? É, eu gostava de ser aquele tipo de pessoas que têm a garagem arrumada. Ah, isto tem sumo. Porquê? Porquê gostava? Não sei, sinto-me em incumprimento por não ter aquilo arrumado. Ah, mas se estivesse arrumado não fazia nada com aquilo? Não, não fazia nada com aquilo, eu não tenho nada para fazer na garagem. Ah, Então é só para sentir que está em cumprimento. Ah porra, deixa-me contar-lhe uma coisa, essa sensação não vem da garagem. Como assim? Bem, não vem da garagem, quer dizer, o senhor arrumaria a garagem, manteria-se-ia com o sentimento de incumprimento porque não lava os dentes o suficiente, ou porque não tem o peso direito, ou porque acha que devia dar mais atenção aos filhos, ou porque não faz ginástica, ou porque... A sua máquina, que está por trás desse raciocínio, a dizer I'm not good enough, é um loop mental que é muito útil para nós fazermos coisas, e foi uma estratégia interessante em uma parte mais jovem da nossa evolução, mas é uma voz que não tem correlação com o real. Portanto, se ela debitar tarefas e tarefas e tarefas e tarefas uma parte de nós vai saber que está a ser aldrabado pela própria voz e não vai pegar-lhes porque, em boa verdade eu acho que me vou sentir ótimo quando arrumo à garagem mas vai ser mesmo só temporária, vai ser uma satisfação muito temporária. Portanto, aquilo nunca vai reverter num real valor. Eu só acho que vai. As pessoas têm que perceber que o que acham que é suposto fazerem pode ser mal da cabeça. O teu inconsciente é mais perto do que tu, nesse caso, não é? Absolutamente. Esse é um exemplo
José Maria Pimentel
curioso, não é? Até porque hoje em dia nós, lá está, porque estamos cada vez mais ligados, temos acesso a muitas coisas que nos servem de modelo e é fácil cairmos nessa armadilha de sentirmos que queremos ser o tipo que tem a garagem arrumada ou queremos ser a pessoa que vai todos os fins de semana correr, amanhã, ou uma coisa qualquer de género quando se calhar na verdade não queríamos bem aquilo ou então nós dos um, ou queremos e fazemos ou então se não queremos, mais vale deixar a coisa cair, né?
Gonçalo Gil Mata
E nesse aspecto, Zé Maria, eu acho que devemos olhar para o fenómeno das redes sociais com alguma atenção. Concordo, sim. Porque nós estamos a ver uma parte muito pequena da vida das pessoas e a criar uma imagem muitas vezes de insatisfação. Mas é inocente. Eu, Há duas semanas ou três, tive uma cena muito engraçada ali perto do Oceanário. Tinha de lá com o meu filho e vi uma rapariga, não sei, jovem, nos seus 20, máximo 30, a andar normalmente, com um ar de cabisbaixo, normal, uma pessoa normalíssima. E de repente vi a parar, olhou assim para a paisagem, parou, tirou o casaco, tirou a mochila, ficou no telemóvel, fez um sorriso ultra luminoso, tirou uma selfie e depois voltou ao seu arcabisbaixo, voltou a vestir o seu casaco e a mochila e voltou a andar como uma pessoa normal. Ora, que se eu estiver a seguir esta pessoa e ela fizer isto regularmente no seu dia, com que ideia é que eu fico da vida desta pessoa? Que é uma pessoa radiosa, luminante, está sempre a sorrir, e eu adoraria ser assim. E isto acontece regularmente neste fenómeno de nós termos pequenas televisões que não são de todo realistas alimentar uma ideia de que uma pessoa feliz e realizada é uma pessoa que está com um sorriso luminoso em todo lado. Ou
José Maria Pimentel
que é realista está dessa forma. As redes sociais, sobretudo o Instagram, tem muito esse perigo. Provavelmente terá a ver com termos que nos adaptar a isso. Sobretudo para determinadas coisas e dependendo também da tua propensão a isso, mas está-te sempre a contrastar com modelos de pessoas que estão no extremo da distribuição e aquilo tende a ser sequer a mesma coisa irrealista da vida delas, ou estão num restaurante excelente. Exato, porque não são as
Gonçalo Gil Mata
pessoas que estão no extremo da distribuição, são os momentos que elas fotografam que estão no extremo da definição. A pessoa pode estar altamente deprimida e ainda assim conseguir momentos no extremo da distribuição que traduzem a ideia. Eu
José Maria Pimentel
acho que há as duas coisas. Há esse extremo da distribuição que na verdade é uma observação falsa, no sentido em que aquilo nem sequer é real.
Gonçalo Gil Mata
A observação é realista, é pouco representativa.
José Maria Pimentel
Mas ela nem sequer estava feliz naquele momento como transparecia pela fotografia. Nesse sentido nem faz parte da distribuição, não é uma coisa irrealista. Mas também há um efeito de seleção do extremo da distribuição no sentido em que imagina que tu és um tipo que gosta de ir ao ginásio e dá atenção à tua forma física. Se tu começas a seguir pessoas dos ginásios, vamos assumir que isso existe, há de existir mais ou menos, no Instagram, por exemplo, as pessoas que tu vais ver, aquelas que lá estão, são as que estão em melhor forma, por exemplo. Claro, portanto, o monto de referências estarás sempre à cabeça. Está completamente enviesado, está completamente no extremo, não está no... Aquela coisa de tu medires o teu grau de satisfação pelo vizinho pela casa do vizinho ou pelo carro do vizinho nas redes sociais é ao contrário, o
Gonçalo Gil Mata
vizinho é qualquer pessoa, não é? Portanto estás a ver o... Claro, estás a ver o melhor do mundo quase sempre e eu acho que outra observação engraçada que tu disseste que é se é falso ou não o momento da felicidade. Claro que hoje em dia a tecnologia está tão disponível que nós conseguimos captar momentos de pura felicidade, mas os momentos de pura felicidade não devem ser desperdiçados com uma fotografia. Se fossem mesmo de pura felicidade não tinha fotografia. Faz lembrar o Walter Mitty, o filme com Sean Penn, o Sean Penn é um fotógrafo, e essa altura vai fotografar uma das coisas raríssimas, um leopardo, um espeteu, e num momento chave ele não tira a fotografia e o outro fica escandalizado porque aquilo era tipo, do topo do topo, ele disse que não há momentos que são demasiado sagrados para se estragar em como a fotografia. Eu acho que essa mensagem é mesmo uma mensagem poderosa porque eu pergunto-me se nós estaremos cientes de que esta vontade de captar para reviver está a degradar o momento presente. E eu não sou dizer que sim ou que não estou a dizer que estaremos cientes em fazer as contas porque podemos querer reservar aqui ou ali ser a pintar na nossa vida aqui ou ali momentos que são tão simples e tão intensos, tão memoráveis, que não queremos parar para ir buscar o telefone e tirar a foto, não queremos. Claro, com o futuro, rapidamente vais ter isto na retina e vais passar à frente, quase que se teres a não vais obstruir, não tens que selecionar. Mas agora estás a perder o foco, não é? Para voltar à... Mas estás a perder o foco. Para ir buscar, estás a perder o foco, não é? Diz assim, e eu estou aqui, altamente, contigo, porreiro, tipo... Ei, não tirem a fotografia! Este pensamento de não tirem a fotografia é antagónico ao pensamento do agora. O pensamento do agora é um pensamento de plenitude. É um pensamento de neste momento. É um pensamento de total disponibilidade sensorial e total liberdade para que as pessoas recursos mentais absorvam tudo que há para absorver. É de observação, não é de juízo crítico, nem é de planeamento, nem é de previsão, nem é de cálculo, nem é de capacidade de construir, nem é capacidade de prever, e a fotografia é. Portanto, há aqui um paradoxo quando eu vejo fotografias de pessoas muito felizes há aqui o que eu penso assim, de um ponto de vista técnico em termos de neurociência há aqui uma coisa que eu não...
José Maria Pimentel
As duas coisas são mais ou menos mutuamente exclusivas. Um bocadinho. Eu, por acaso, não... Eu não estou a dizer para as pessoas não tirarem fotografias, não é? Eu não gosto de tirar fotografias em viagens mais ou menos por causa disso.
Gonçalo Gil Mata
O momento chave é quando, a semana passada, o meu filho fez anos, e ao invés de ter as pessoas a bater palmas, quando decidias uma salva de palmas, tem toda a gente com o telefone a tirar uma fotografia e quase não salvo
José Maria Pimentel
palmas. Tem que se inventar um programa, uma aplicação da câmara que tenha palmas incorporadas para resolver esse problema. Olha, voltando àquilo que estávamos a falar há bocadinho, dos objetivos, até se calhar repescando o exemplo do tipo, quero arrumar a garagem, mas admitindo agora que ele quer de facto arrumar a garagem. O que é que queres dizer com isso?
Gonçalo Gil Mata
Ou seja, admitindo que... Há uma funcionalidade. E que aquilo de facto o preenche, não é? Que aquilo não é
José Maria Pimentel
uma coisa que ele não quer fazer realmente mas que aquilo é de facto um objetivo dele e que o preenche. Então
Gonçalo Gil Mata
Vamos supor que ele tem que meter o carro na garagem e não está a conseguir, e por isso... Ou comprar uma bicicleta nova tem que a pôr e não está a conseguir porque não tem a garagem arrumada. Tens de lhe dar um objectivo. Ah, ok, estou-te
José Maria Pimentel
a perceber, sim, sim. Porque se for pelo lado da realização... Tem
Gonçalo Gil Mata
que ter uma causa. Se for pelo lado da realização... A realização não funciona assim. Isso não servia. Mas se fosse pelo lado da realização, da objetividade, e não pelo lado da realização, não pelo lado identitário, mas pelo lado funcional...
José Maria Pimentel
Mas o lado identitário, desculpa, o lado identitário também não é irrelevante, não é?
Gonçalo Gil Mata
Não é irrelevante, é só não é preenchido pela tua realização circunstancial. Ok, então mas eu vou te explicar onde é que eu queria chegar e se calhar um exemplo melhor para isso. Mas imagina aquele que eu tinha comprado da bicicleta e queria mesmo arrumar a garagem para meter lá, precisava
José Maria Pimentel
de espaço para a bicicleta. Estou a pensar se isso é um exemplo demasiado corriqueiro para aquilo que eu queria falar, porque um aspecto que tu falas no livro, e que eu sou um bocadinho cético e portanto gostava que me persuadisses, é aquela questão de ter um objetivo e já não sei como é que tu o defines, mas é visualizar o objetivo. No fundo, imaginar-se lá. Como é que isso funciona exatamente? Porque isso parece aquele livro do segredo, não é? Como é que isso funciona? Exatamente. Como é que isso funciona exatamente e
Gonçalo Gil Mata
o que é que isso faz no nosso cérebro para ser benéfico? E acho que as pessoas conseguem perceber isto de uma forma... Olá, não vou dar aqui uma aula de neurociência cognitiva, mas vamos só apontar dois ou três aspectos importantes que configuram a nossa mente da ação. Eu diria que nós somos mobilizados por dois pontos fundamentais. Um é percepção de valor. É eu quero arrumar a garagem porque eu tenho um benefício como tal. E vamos até supor que pode ser o benefício da realização porque eu não me apercebi que eu não me ia sentir realizado, achava que sim e como tal fui por aí. Ou porque eu tenho um objetivo funcional de parlar a bicicleta e não cabe. Esta percepção de valor tem a ver com a noção de economia comportamental. Se tu movimentas-te para situações que são melhores no teu esquema de valoração. Até podes estar, dizeres, num esquema de valoração enviesado, mas isso é outra história. Mas há alguns da tua cabeça que diz assim aquela situação vale pontos, eu quero atingi-la. Isso dá-te a motivação, dá-te o combustível, dá-te o drive, dá-te a vontade de o fazer. A segunda parte que te mobiliza é uma noção de ok, mas como é que é essa noção de meta? Onde é que ela é? Estás a ir daqui para o Algarve e dizes assim porquê queres ir para o Algarve? Ah, porque vou lá, vamos passar férias, ok, está bem. E como é que é chegar lá? Chegar lá é no momento em que eu tiver estacionado o carro e tiver a tirar as malas para o apartamento e ter a pensar, ah que quentinho que está aqui, mais porreiro, vou dar-me um banho. A imagem de que tu chegares lá é diferente da percepção de valor de que tu ires para lá, ok? E muitas vezes em liderança os líderes falham isto, porque acham que a noção do objetivo... Não vêem a decomposição do objetivo em imagem e valor. Às vezes apontam só para o valor. O valor é mais cognitivo e a imagem é mais emocional? Não. Valor é mais emocional-valorativo, imagem é mais visual. Imagem é a criação imagética de um filme que tu consegues observar, ver, quase medir e dizer assim, ah, é isto que tu queres, ok? Não é porque é que tu queres. É que consegues ver a garagem arrumada. Pronto, conseguires ver a garagem arrumada permite-te calcular os passos para chegar até lá, enquanto que tu sabes porque é importante arrumar a garagem não te permite calcular a ação nenhuma. Permite-te só ter vontade de chegar a um sítio que tu ainda não definiste qual é. Não sei se estás a ver a diferença. Sim. Isto no princípio é subtil, mas de ponto de vista, como mapeia aquilo que me funciona na nossa cabeça. Dominar isto é dominar a mobilização, ou individual ou grupal. É dizer assim, eu não só quero ter claro o benefício de ir para lá, como eu quero saber o que é que é o do A. E portanto visualizar o do A, e o segredo e todas as mitologias de Peniel que são à volta do não, tens de visualizar já... Às vezes até um ponto em que ficam sem o substrato do porquê que queres chegar lá. Ah não, maratona! Eu quero é visualizar-me a cortar a meta, eu quero é visualizar-me a fazer este treino, eu quero visualizar-me a fazer três vezes por semana. E há uma febre de sucesso que me parece até um pouco... Bem, espero que seja uma
José Maria Pimentel
moda exagera,
Gonçalo Gil Mata
porque parece-me superficial e pouco relacionada com esta ideia de valor. Portanto, eu estou a dividir imagem e valor. Valor é porquê é que tu vais, imagem é o que é que é a garagem arrumada. Se tu não tiveres uma ideia sobre o que é que é a garagem arrumada dificilmente vais conseguir coordenar a ação para arrumar. Mas seguramente, se quiseres desbloquear ou arrumar a garagem fazer um primeiro passo para arrumar Esse
José Maria Pimentel
era outro ponto que... É uma coisa que a gente
Gonçalo Gil Mata
gira. As microações. É. As microações são truques muito fáceis para se experimentar. Eu, por exemplo, nesse do arrumar a garagem levando aqui o exemplo da Isau-Fortão, ao lado dela Não, mas é bom sim. Arrumar a garagem, convido sempre as pessoas a dizer assim é que eu tenho muitos executivos e executivas que têm realmente a garagem desarrumada e por isso é que este exemplo me surge muito e eles acham que vão ser melhores pessoas a arrumá-la. Se tu pegares três sacos daqueles plásticos grandes, daqueles do lixo, e lhes trouxeres o pescoço para eles ficarem com uma bocarra bem aberta e pousares na garagem e vieste embora, essa é uma microação que faz milagres. Primeiro porque se tu tiveres esses três sacos bem abertos no meio da tua garagem é quase inevitável que pelo menos uma coisinha vá para o lixo. E vá para o lixo bem reciclado, atenção. Como é que se faz? E nesse momento o que acontece é que o teu robô esfrega as mãos e diz uuuuh, cenas para fazer! Mas cenas para fazer não é cenas para decidir, ok? Cenas para fazer é. O senhor só tem uma coisa para fazer, tem uma meta perfeitamente clara, e que é pôr lá os três sacos, só isso. Concentre-se, é para isso que me está a pagar. Vai fazer isto. Quando ele vem na próxima cena... É porque
José Maria Pimentel
nem não gosta nada, não é? Vai dizer
Gonçalo Gil Mata
assim, ainda bem, nem sabe... Eu primeiro achei que ridículo o seu exercício, porque eu queria era arrumar a garagem, não queria pôr três sacos lá. Claro. Mas pronto, enfim, já que lhe estou a pagar faço o que diz, então foi isso que eu fiz, e sabe o que é que me aconteceu? Pá, de repente, comecei a ver que havia muitas coisas para ir para fora, tirei o lixo e de repente comecei a dizer pá, eu tenho a garagem arrumada. Pronto, e este fenómeno, nem sempre vai resultar assim desde a forma, atenção, preview of coming attractions, é que as microações desbloquem a ação. Desbloquear a ação, às vezes é eu não estou a ir ao ginásio, mas vou só pôr as sapatilhas. E eu, não sei se vou ao ginásio, mas vou só ter o saco do ginásio na mala do carro e vou só estacionar a porta do ginásio e depois vim-me embora, mas não vou ao ginásio. Exato. Este tipo de aldeiravistas. Ou
José Maria Pimentel
vou só correr, mas vou só correr um minuto. Se for preciso, vou só tirar o alfume da rua e volto e mudo de roupa outra vez, nem preciso tomar banho. Quando as pessoas
Gonçalo Gil Mata
não têm tempo para ir ao ginásio, eu digo assim ok, então se o ginásio só demorasse 10 minutos, dava? Se demorasse só 10 minutos, dava. E se só tinha tempo para isso? Então ok, vai fazer assim. Vai estacionar um ginásio, vai lá dentro, veste a roupa do ginásio, tira a roupa do ginásio, vem embora, não faz nenhum exercício e depois conversamos para ver o que deu. E isto desmonta muitas vezes a noção que as pessoas têm de que não tem a ver com tempo, tem a ver com todo o filme que as pessoas fazem sobre vão ser capazes de perder peso, não vão, não sei o quê. É muito mais, as pessoas vivem num mundo mental sem se aperceberem disso, não vivem num mundo real.
José Maria Pimentel
Sim, e eu imagino que isso funciona sobretudo bem com lá está para desbloquear tarefas que são chatas de alguma forma. Um amigo meu, foi engraçado até ver isso no teu livro, porque ele não há muito tempo falava-me disso, a propósito do exemplo ultracorriqueiro, que era usar fio dentário quando estava a lavar os dentes. E é um bocado seca, não é? Tu tens mesmo de disciplinar, porque é certa forma mais trabalhoso do que escovar os dentes, demora um bocado mais de tempo, é mais uma pedra... Às vezes é doloroso. Às vezes é um bocado e ele dizia, o que eu faço é passar num dente. E depois a partir daí não vais parar, não vais tirar o fio e mandar fora. Depois continuas, já que passaste, então continuas. E é um bocadinho o exemplo da corrida do ginásio. Se tu tiveres uma dúvida em ter de correr ou não e fores correr um minuto, depois não vais voltar para casa. É
Gonçalo Gil Mata
o célebre proveiro chinês de todas as grandes viagens que começam por um passo. Exato. Não conhecia esse para casa, não sei se
José Maria Pimentel
é bem visto. E pegando aqui noutras técnicas que tu falas para desbloquear a ação, nós já falámos de perceber o valor da ação, de visualizar esta questão das microações, tu também falas, por exemplo, isto é válido para objetivos maiores em estabelecer metas intermédias, e partir impostos, imagina tens que escrever um relatório e vamos supor que tens de fazer de raiz não é simplesmente atualizar um relatório já existente, tens de fazer ou quem diz isto, tens de escrever um ensaio ou um texto, uma apresentação preparar uma apresentação
Gonçalo Gil Mata
para a administração e aquilo parece uma
José Maria Pimentel
coisa gigante e inalcançável e é fácil nós irmos procrastinando e adiando isso porque aquilo é tão grande. E um dos truques ou um dos métodos é justamente partir aquilo aos pedaços.
Gonçalo Gil Mata
E é um método que motiva muitas pessoas. Um bom gestor de projeto conhece muito bem isto, um bom líder conhece muito bem essa técnica. Porquê? Porque às vezes tu estás... Eu falo muito na liderança porque nós também nos autolideremos mas na liderança é muito visível isto. É muitas vezes o líder vê mais longe e consegue ver para muito longe, mas as pessoas que estão a liderar estão a ver para onde? E está o líder à frente do barco. É para ali, a 100 milhas, consigo ver ali um ilhéu e o pessoal que está no resto do barco assim capitão, não se vê nada, daqui de baixo é uma nuveirada que não se vê nada. E rapidamente o líder passa para micromanagement para, ok, então ponham o ramo para ali, o ramo para lá, assim. Não, isso é estar a falhar a questão. Eles não vêem tão longe, mas se lhes apresentasse uma ilhazinha um bocadinho mais perto eles saberiam ir até ela. Exato. E portanto, nós queremos... E parecia alcançável, não é? Parecia alcançável. Nós queremos dar ao nosso cérebro uma perspetiva de vitória. As maratonas, eu gosto muito do exercício porque as pessoas que melhor se dão com isso percebem que é um jogo mental mais do que físico. Sim,
José Maria Pimentel
maratona é um bom exemplo, sim. Há aquele livro até do... O autor japonês muito conhecido tem um livro sobre isso. Sério? E eu gosto de
Gonçalo Gil Mata
ir para o final da maratona, a ir para o quilómetro 36, 37, e levar uma tabuleta que diz assim já só falta um pequeno treino. Toda a gente sabe que 5 km é um pequeno treino. 6 km para quem treina no maratona é um pequeno treino. Ou seja, toda a gente sabe que ir fazer um pequeno treino e de repente gosta de apreciar a cara das pessoas e dizer assim, um pequeno treino, bem mas agora é um pequeno treino difícil, não sei o que é, e comentam, mas visualizam que só faltam 5km, 5km, elas estão fartas de saber o que é que é. Conseguem visualizar. Senão eles estão na cabeça, estão a pensar assim Chegou aos 42? Os meus chegaram aos 42? E aquela noção de meta global que não passaram por além de muitas pessoas estão a fazer pela primeira vez ou estão a fazer pela segunda ou terceira ainda é uma meta muito pouco visualizável. Se tu lhes disseres, malta, falta um treino de 5km, como é que é? Fazemos isto ou não? O pessoal diz, se treinos 5km já faço eu as carradas e de repente tens essa unidade. Portanto, a unidade de medida que tu usas para trabalhar a tua mente para conseguir dar-lhe uma perspectiva de sucesso é parte intrínseca de conseguires converter esse elefante das portas. Mais no sentido de brincares com a cabeça e brincares com a capacidade dela de projetar uma imagem que é uma imagem credível,
José Maria Pimentel
não é uma imagem... Até porque tu falas uma coisa que eu achei interessante, é a questão de alterar perceções versus utilizar a força bruta da disciplina. Certo. O exemplo que estás a dar é o exemplo que tu alteraste a perceção da pessoa, até utilizando um truque, no sentido em que obviamente correr 5km fresco ou correr 5 mil km completamente exausto não é a mesma coisa, mas para todos os efeitos tu estás com essa desonestidade inocua, não é? Estás-lhe a dizer, ou benéfica até, estás-lhe a usar um truque de percepção em que a pessoa de repente pensa Oh, mas são só 5km, isto é só uma corridinha. Até ao fim. O que chamas a atenção, o que eu achei interessante é que isso é muito mais eficaz e eu diria até muito mais sustentável do que usar a força bruta, força bruta é a expressão minha, mas usar a força bruta da disciplina. Ou seja, tu usares a tua disciplina que é o recurso que nós temos mas que é limitado e que oscila, ou seja, não é constante, há dias em que estamos mais disciplinados e outros menos. É muito difícil para tu atingir o objetivo, por exemplo, para o histórico do deixar de fumar. Todos nós conhecemos casos de pessoas que tentaram deixar de fumar apenas com disciplina. Conseguem um dia, dois dias,
Gonçalo Gil Mata
três dias. É insustentável. Sexta-feira
José Maria Pimentel
vão beber um copo, já foi. É insustentável,
Gonçalo Gil Mata
esse exercício é insustentável. Eu diria assim, a disciplina é como se tu tivesse um reservatório auxiliar de gasolina no teu carro, e tu tens o teu depósito normal, que é a vontade de fazer as coisas, e depois de vez em quando, ficas sem vontade de fazer as coisas e fazes esse reservatório e pum, metes desse depósito auxiliar. A disciplina funciona assim, mas se tu carregas outra vez esse reservatório auxiliar, se aquilo para o qual tu usaste disciplina, te retornar em gozo, te retornar em objetivo, te retornar em valor. Se as pessoas desbaratarem a disciplina, elas vão torrar esse depósito e depois já não têm esse depósito. Por isso, usar a disciplina como base de combustível é falhar a noção de que é limitada. E para tu percebes como é que é mexer a perceção, mexe nas pessoas conseguirem realizar coisas, nós temos... Eu uso muitas vezes este exemplo. Imagina que tu vais para o trabalho diariamente, num determinado trajeto, e eu mostro-te que se fosse por uma via linha especial, que passa por ali, uma coisa que tu não conheces, pô pôs dois semáforos. Pá, dois semáforos não é muito, mas são dois minutos, dois minutos todos os dias, já pode ser alguma coisa significativa. Claro. Quanta disciplina precisarias ter para usar o atalho regularmente? Ah não, tenho que treinar pelo menos 3 semanas. Não é verdade? No primeiro dia que experimentaste,
José Maria Pimentel
e naquele tempo
Gonçalo Gil Mata
tu... Nunca mais vou à volta, só se estivesse distraído ao telefone, estava meio automatizado. Ora, se as pessoas tiverem de tentar fazer uma alteração comportamental sem visualizar o benefício ou sem fazer uma apreciação quase óbvia do benefício, vão ter pouca sustentabilidade na adoção do hábito. E há muitos métodos à volta disto, mas eu não vejo nenhuma razão para nós usarmos a disciplina como principal motor da nossa vida. E o meu editor, quando eu fiz o subtítulo do livro, porque o meu livro chama-se ainda não tive tempo, mas depois o subtítulo diz assim 7 passos para ser mais produtivo com menos disciplina. E o meu editor falou assim Ah, Pancelo, quando nós depois vemos isto, não sei se... As pessoas essencialmente querem comprar um livro de tanto tempo para se disciplinarem, as pessoas acham que é a próxima chibata que vão usar para andar para a frente, por isso...
José Maria Pimentel
Mas eu também pensei nisso, também achei o título
Gonçalo Gil Mata
original nesse sentido. Nós não temos de desafiar o mercado nesse... E assim, eu por acaso discordo completamente e acho que era importante nós resolvemos já isto porque eu acho que as pessoas estão a pegar mal no assunto. As pessoas estão a pegar no assunto no lado do, vamos disciplinar-nos a fazer a lista das tarefas. E isso está completamente errado. Pessoas que apreciaram o benefício de manter uma revisão semanal de estruturação de atividades e a clareza de perspetiva que isso traz e a serenidade que isso traz perante um possível caos e perigo que as semanas dão, são pessoas que não precisam de grande disciplina para manterem essa revisão semanal, porque sabem que dali sai a vivência que eles querem, dali sai o conseguir navegar uma velocidade incrível de estímulos, uma velocidade incrível de exigências, uma quantidade enorme de solicitações, de uma forma tranquila, calma e otimizadora dos resultados. Não preciso de grande disciplina para montar
José Maria Pimentel
isto, isto é só uma evidência. Precisa de disciplina
Gonçalo Gil Mata
para dar o impulso inicial,
José Maria Pimentel
Mas depois tem que ser autocomprovado e o benefício tem que ser evidente. Por isso é que, por exemplo, qualquer nutricionista, por exemplo, que é conselho sobretudo em dietas, como é o caso, acho eu, de mais de 90% dos nutricionistas, sabe que a dieta que funciona com um
Gonçalo Gil Mata
cliente qualquer... É insustentável,
José Maria Pimentel
não. Não, não, eu quero dizer, para a dieta funcionar com um determinado cliente ou com uma determinada pessoa essa dieta não pode implicar que essa pessoa esteja sempre a esforço. Porque senão não vai conseguir, vai conseguir fazer uma semana e depois regrede. Aquilo de alguma forma precisa da disciplina inicial mas depois tem que conseguir encontrar numa espécie
Gonçalo Gil Mata
de velocidade cruzeiro. E visitar que há uma densidade emocional profunda à volta de coisas. Quando fazemos os nossos processos mais complexos tendem a ser os processos de coaching para emagrecimento que são muito densos. E são muito densos porque não tem a ver com o que as pessoas comem, tem a ver com a relação emocional que têm com a comida, tem a ver com déficits afetivos, tem a ver com significados que estão a atribuir e quase invariavelmente as pessoas surpreendem-se quando chegado o momento de sucederem e quando conseguem fazê-lo, dizerem assim, bolas, e eu nunca imaginei, e eu até estou meio assustado, meio assustada, porque eu não me está a custar nada. E eu sempre que eu consegui emagrecer 5kg ou 10kg e depois os ganhei, foi à custa de uma força de vontade enorme e agora estou assustado porque eu não estou a fazer nada ativamente por isto e tenho medo e por isso não está no meu controle. É meio assustador porque de repente está a acontecer mas não sei porquê. Sim. De repente, mas não me está a custar nada, já até me está meio a assustar porque não sei quando é que vou descarrilar, assim. Se calhar não vais descarrilar, se calhar viu qualquer coisa que nunca mais podes ver. Sim,
José Maria Pimentel
e nós temos um bocadinho essa heurística, não é? De que o esforço, de que uma coisa eficaz tem que requerer esforço, não é? Portanto, pensamos que é parecido isso. Gonçalo, estamos para terminar, querias só fazer umas perguntas rápidas antes de passarmos ao livro, mais concretas. Ou seja, a relação, nós já falámos aqui de uma série de coisas, mas há aspectos concretos, quase truques, que a pessoa pode implementar, acho eu, diariamente, que era uma maneira gira de terminarmos isto. Vou começar por um, que é uma dúvida que eu tenho, e tu me saberás responder, e depois se quiseres dar mais algo, está à vontade. Isto é muito simples, E eu já vi recomendações mais ou menos antagónicas em relação a isto. Tens duas abordagens em relação ao e-mail, por exemplo. Tens uma abordagem que é, tu recebes e-mails, vamos supor que tu implementas uma metodologia de laço de semáforos, como tu dizias, e portanto só vejo o e-mail de hora a hora, desativas os alertas, só vejo o e-mail de hora a hora. Há uma metodologia em que tu passas por aqueles e-mails vais mais ou menos organizando os e-mails e por prioridade ou com base até em outros critérios e depois tratas deles mais tarde no fundo tens uma fase de processamento e uma fase de ação se quiser e depois tens outro método, quer dizer, não é bem outro método, mas é se calhar um twist sobre este que eu também já vi defender, que é que há as pessoas que dizem se tiveres um email, se vês um email cuja resposta demora menos de 5 minutos, responde logo e despacha logo esse email. Qual é a tua visão em relação a isto? Despachas logo o email ou despachar logo o email implica estar sempre a canalizar a tua atenção para coisas novas e mesmo demorando 5 minutos na prática, aquilo que depois fica-te na... É
Gonçalo Gil Mata
uma pergunta muito gira e eu diria, se tu tiveres cadenciado a apreciação dos estímulos, portanto, salva guardando o foco e só estás a ver da hora à hora, tu quando vires, e ele demorar menos de 2 minutos, podes responder logo, parece-me uma boa prática. Porque se não estás a responder logo, provavelmente está ali qualquer coisa que... Estás a fugir com a rabacerinha ou... Mas outra coisa importante é, por um lado, nunca abdicar da cadência, do tal ritmo de trabalho, de só visitar de X em X sem os avisos ligados, sem os alertas ligados, essa é a dica, continua a ter mais sucesso, todas as dicas que eu dou, e dizem ipa, desliguei os avisos do e-mail, a minha vida mudou. E eu acho surpreendente, porque acho que por esta altura, já digo isto há 10 anos, por esta altura as pessoas já, provavelmente, já já deveriam ter todas percebido que ter os avisos de e-mail ligados é muito mal. Mas isso é bom, porque continuas a ter trabalho. Mas olha, continuo a ter trabalho, é verdade. Mas se essa estiver assegurada, a tua pergunta mantém-se, que é pronto, eu, Gonçalo, essa assegurei, mas estou a passar pelos e-mails todos. O que é que eu faço agora? Agora tenho estes 15 acumulados, o que é que eu faço agora? Pô, atenção que nós não queremos organizar os e-mails. Nós queremos organizar a ação que os e-mails contenhem. Esta frase que eu disse é muito importante. Eu vejo as pessoas atrapalhadas a organizar comunicação e eu quero que as pessoas traduzam comunicação em ação e organizem-a em ação. Muitas das vezes, a maior parte daquilo é só informação. Não está claro quem é o dono, quem é que vai fazer o quê. E esse é o exercício que eu convido as pessoas a fazer, é descortinar o que é para fazer. Se o que é para fazer demorar menos de dois minutos, mais vale fazer logo, e o David Allen recomenda os dois minutos, e eu também sou do jeito dos dois minutos, cinco parece-me um bocadinho muito. E porquê os dois minutos? Porque para menos de dois minutos vais perder mais tempo a pôr mais coisas no sistema e depois organizá-las no sistema para depois definir prioridades e tal quando aquilo podia ter desaparecido logo do teu radar. A métrica é vai dar-te mais trabalho arrumar e rearrumar e avolumar a tua lista do que desaparecer logo com ele. Portanto, esta aqui seria a minha resposta. Se demorar menos dois minutos, faz logo mas nunca abdicar do ritmo. Uhum, boa. Tens mais truques?
José Maria Pimentel
Olha, eu diria...
Gonçalo Gil Mata
Vá lá, assim, intuitivamente, repescando eu nunca tenho essa resposta preparada eu acho que hoje em dia já quase que devia ter, fazia-me muitas vezes, mas eu gosto de pensar e de refletir no momento porque também acho que vou utilizando na minha cabeça o que é que tem tocado mais as pessoas. Essa dos avisos é de caras. É olhar para os estímulos tecnológicos e ver se vocês querem mesmo tantos beeps, tantos alertas, tantos pop-ups. Portanto, desligar as notificações. Hoje em dia o iPhone já nos dá uma boa ajuda nisto o do Exos iPhones, todos os smartphones, os Samsung e por aí fora, dão-nos umas boas dicas a dizer para vocês podem ter maior controle sobre a vossa vida, vocês podem ter maior controle sobre aquilo que está a mandar em vocês. E se não repararem, se não tiverem a humildade de reparar que vocês seguem os bips, não vão fazer isto que eu estou a dizer. Mas se forem humildes e dizerem nós somos uma máquina mental e essa máquina mental é estimulada e reage automaticamente, então eu digo assim espera aí, se reage automaticamente eu quero condicionar os estímulos que a fazem disparar. E então vou desligar as notificações e vou... Nos primeiros tempos dá um certo susto porque quando vamos lá ver temos muitos acumulados. Ai meu Deus, como estava atento! Mas isso não é verdade, isso aparece rápido porque nós não queremos ser responsivos, queremos ser produtivos, a menos que a nossa função seja iminentemente responsiva. Se eu for uma secretária e tiver meia hora sem ver os e-mails do meu chefe, acabar-se de correr mal. Se eu for, se tiver
José Maria Pimentel
nos bombeiros, igual.
Gonçalo Gil Mata
Mas se eu precisar, no meu trabalho, de me concentrar em coisas de alto valor acrescentado que exigem decisões e profundidade de raciocínio, então eu sei que o semáforo é o meu amigo. A segunda questão é aquela de nós não queremos gerir comunicação, queremos gerir ação. Portanto, esforcem-se por clarificar quem é o dono disto, quem é que tem que tomar decisões, quem é que vai fazer o quê, em tudo que contactam que se configura como candidato à vossa ação. A terceira tem a ver com, se nós queremos clarificar prioridades e ganhar robustez em cadenciar o ritmo de trabalho, em conseguirmos realmente respeitar estes semáforos e sentir-nos bem em cumprimento e trazer uma sensação de realização no final do dia, nós temos que responder uma pergunta que tem várias aplicações que é, para que é que serve? Para que é que eu sirvo? Para que é que serve este e-mail? Para que é que serve esta reunião? Para que é que serve este relatório? Para que é que serve esta proposta? Para que é que serve esta comunicação? Para que é que serve? E para que é que eu sirvo? E as pessoas têm um contexto, normalmente têm um contexto corporativo, e a pergunta para que é que eu sirvo é uma pergunta que está altamente descurada. As pessoas não sabem para que é que servem e como tal, com muita dificuldade, conseguem ter a solidez de fazer esperar outras pessoas e uma pessoa que esteja sólida a saber o que tem que fazer e focada, quando recebe aquele telefonema passado 5 minutos olha, recebeste um e-mail? Responde com serenidade não, estava a ser produtiva, e tu? E esta solidez, esta tranquilidade é o que vai permitir as pessoas navegarem num dia a dia que hoje em dia é desafiante, quando se chega a estímulos.
José Maria Pimentel
Então é a questão dos estímulos de origem, digamos assim, muitas vezes até pessoal, grupos do WhatsApp e coisas do género, mas mesmo no lado... O WhatsApp já não é bem pessoal.
Gonçalo Gil Mata
Diz? O WhatsApp já não é bem pessoal.
José Maria Pimentel
Sim, mas pronto, digamos que maioritariamente... Lúdicas. Sim, ou não necessariamente lúdico, mas que tem a ver com o outro lado da tua vida. E se calhar até posso estender isto para incluir aqui o email. No fundo a distinção que eu quero fazer não é tanto entre pessoal profissional, é no sentido de, para além da questão dos estímulos, tu tens o facto de, em organizações grandes, haver uma incerteza em relação, lá está, qual é o objetivo, qual é o teu papel, o que é que se pretende realmente, qual é o objetivo daquilo que te pediram é realmente importante, qual é exatamente o prazo, ou seja, o prazo que lá está é um prazo para cumprir
Gonçalo Gil Mata
o legal. Qual é o compromisso
José Maria Pimentel
por trás daquilo? Exato, Aquilo vai servir para quê? A pessoa que pediu, que pode até estar relativamente distante, ou seja, o originador daquilo quer exatamente o quê, quer aquilo que ali está, ou quer eventualmente uma coisa diferente. E tudo isso tem um impacto grande em termos da tua motivação? E portanto tem um impacto grande em termos daquilo que
Gonçalo Gil Mata
tu... Toda a gente quer fazer um bom trabalho e se não souber o que é um bom trabalho, não souber quais são as minhas bolas, quais são as tuas, se eu não souber, vai ser difícil. E este era um tema que nos dava outro podcast certamente, mas deixava só aqui uma mensagem que é... Boa. Se as pessoas tiverem o mindset de clarificação, de ownership, de responsabilidade, quem é o dono do assunto o dono do assunto não tem que fazer tudo, é o sentinela do assunto a comunicação pode ser muito menos inclusiva e como tal ajuda mais a que cada indivíduo no seu local de trabalho, se consiga focar naquilo que vai mover realmente os assuntos para frente, sentarmos todos atentos a tudo, que às vezes faz-me lembrar que quando nós éramos meninos e jogávamos futebol e o nosso posicionamento no campo era simples, não é? Não estava a bola, estava toda a gente. E Se alguém perdesse a bola, então, o que aconteceu? Dizia-se, a bola perdeu-se. Vocês estavam todos em ciência. Só
José Maria Pimentel
não digi-la, futebol é boa. Boa sim, boa maneira de determinar. Até sobretudo por causa desta questão do casamento entre eficácia, a falta de melhor palavra, e satisfação. No fundo é como nós começámos, se tu seres eficaz não é simplesmente ou eficiente, que no fundo são dois lados da mesma moeda, não é simplesmente estares a ser mais produtivo por ser mais produtivo e se estiveres alinhado com os teus objetivos vai-te fazer ser mais
Gonçalo Gil Mata
satisfeito. E depois se alinhares esse teu contributo com a missão da organização. Sim. Ou
José Maria Pimentel
com a tua própria, não é? Se estiveres a trabalhar
Gonçalo Gil Mata
sozinho. Estás a ter uma utilidade num bem maior social. Que hoje em dia, post-mile analysis, fundamental. As empresas que estejam a falhar esse caráter de para que é que isto tudo serve? Que é outra versão da mesma pergunta, para que é que serve? Falham esta relação afetiva.
José Maria Pimentel
Lá está, porque as pessoas, como falavas no início, são mais críticas em relação à...
Gonçalo Gil Mata
Muito mais exigentes no seu enquadramento. Exatamente,
José Maria Pimentel
o que crie dificuldades, mas é melhor. Bom, para terminar, Gonçalo, livro, o que é que nos traz?
Gonçalo Gil Mata
Eu cada vez mais considero neste momento que as pessoas deveriam visitar a temática de que a sua realização não vem das suas circunstâncias, vem de um determinado estado mental e que nós vivemos a experiência dos nossos pensamentos e não vivemos a experiência das nossas circunstâncias. E um autor que tenho trabalhado perto e é meu mentor e já trabalhei com um dos Estados Unidos durante bastante tempo é o Michael Neal, digamos que é o autor que mais facilmente traduz isto numa linguagem super fácil num livro super engraçado que se chama The Inside Out Revolution e que em português se chama... A revolução dentro para fora, não é? É isso. Michael Neal, uma revolução pessoal de dentro para fora. É assim. O título em português, acho que não está muito bem conseguido, mas... Vá lá, é The Inside Out
José Maria Pimentel
Revolution. Claro, claro, claro. Eu ponho nas referências, como sempre. E eu recomendo bastante. Boa, está bem. Ótimo. Boa sala. Obrigado por teres
Gonçalo Gil Mata
vindo. Desamaria, obrigado pelo convite.
José Maria Pimentel
Gostaram deste episódio? Que parte da conversa vos ficou mais no ouvido? Se puderem, partilhem comigo essa impressão por e-mail para o 45graus.com para que eu possa selecionar esse shirt para o 45 Graus Express, o podcast onde publico versões reduzidas destas conversas. Obrigado! O 45 Graus é um projeto tornado possível em grande medida pela comunidade de mecenas que o apoia. Mecenas como Gustavo Pimenta, Eduardo Correia de Matos, João Baltazar, Salvador Cunha, Duarte Dória, Tiago Leite, Joana Faria Alves, João Manzarra, Mafalda Lopes da Costa, entre outros cujos nomes encontram na descrição deste episódio. Até à próxima!