#72 [série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes - Desigualdade, liberalização...

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Olá, o meu
José Maria Pimentel
nome é José Maria Pimentel e este é o 45°. Neste episódio continuamos a falar de política, e para quem gostar menos do assunto, não temam porque os episódios não vão ser todos seguidos, E desta vez o convidado é Mário Amorim Lopes, do Centro Universitário e investigador na área da Economia e Políticas da Saúde, e alguém que se descreve de forma provocadora como, e cito, despudoradamente liberal. O Mário tem sido uma presença ativa na discussão pública nos últimos anos, seja no blog insurgente, no Twitter ou ainda através dos ensaios sobre temas na área da saúde que tem escrito no Observador. Uma vez que nos identificamos ambos enquanto liberais, eu porventura um pouco mais puduradamente do que o Mário e talvez quem sabe por eu ser um tudo ou nada do contra, tentei puxar mais por temas em que previa que fôssemos discordar, e resultou por isso numa conversa desafiante, embora na verdade até tenhamos discordado menos do que pensei inicialmente, o que mostra bem como não se deve reduzir as pessoas a rótulos. Entre os temas em que estivemos alinhados, destaca um que o Mário trouxe à conversa, o papel que os privados podem ter em áreas como a saúde ou o ensino e que não tem que ser, à partida, incompatível com um sistema de acesso universal como o que nós temos. Falámos também de outros assuntos que extravasam o âmbito de Portugal, como o aumento da concentração de riqueza nas últimas décadas em países como os Estados Unidos e o aumento do poder de mercado de alguns gigantes tecnológicos. São temas que me parecem que devem suscitar no mínimo dúvidas entre quem se revê no liberalismo, visto que poder econômico, seja ele de indivíduos ou de empresas, facilmente se converte em poder político. Discutimos ainda uma crítica que faça uma parte relevante da direita liberal em Portugal, que em muitos casos, parece-me, que fala muito em meritocracia, mas na prática parece dar pouca atenção a tentar diminuir a desigualdade de oportunidades que ainda persiste e é grande entre as pessoas. Terminámos a discutir o que me parece ser um dos grandes desafios atuais para qualquer progressista liberal, que é como fazer oposição às agendas políticas que vêm a reboque da expansão da política identitária e das tentativas de condicionamento do discurso, sem deixar de ao mesmo tempo reconhecer que existem inegavelmente problemas urgentes de injustiça social subjacentes e que, pelo menos na minha opinião, não se vão resolver sozinhos. No total da conversa acabamos por percorrer uma série de temas, uns mais sociais, outros mais económicos. Podem encontrar a lista completa dos temas que abordámos na descrição deste episódio. Uma última nota mais técnica para a qualidade do som, que não é a melhor, visto que a conversa foi gravada remotamente, mas acho que não incomoda excessivamente. E agora deixo-vos com Mário Amorim Lopes. Mário, muito bem-vindo ao 45°. Obrigado. Como de costume nesta série política vou-te pedir que comeces por explicar a tua orientação política, o teu posicionamento. Pode incluir explicar-me de onde é que ele vem, em que é que a senta e o que é que isso implica. Portanto, está à vontade, leva o tempo que quiseres e depois seguimos a partir daí.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Eu sou, eu sou liberal, sou um liberal clássico, mas na verdade não nasci liberal clássico. Eu diria até que há uns dezesseis anos em que não tinha um pensamento político minimamente estruturado. Eu acabava por ser aquilo que hoje em dia as pessoas chamam de social-democrata, portanto, é uma coisa que não se sabe bem o que é que é, é de centro, ora tenho um posicionamento um bocadinho mais à esquerda, ora tenho um posicionamento um bocadinho mais à direita, mas não tenho ali uma base política sólida e estruturada, aquilo que nós chamaríamos de ideologia. Portanto, eu estava de acordo com muitas coisas que o PS ou o PSD estão de acordo hoje em dia, ou até o CDS, coisas como os progressivos, uma série de posições que são comuns em ambos os partidos. E, aliás, uns anos antes, aos 14 anos, também tive, nunca fui um revolucionário, mas também tive algum momento, alguns momentos um bocadinho mais, não diria conturbado, mas questionar as pessoas tinham de ir em empresas, porque é que queriam acumular tanto dinheiro, porque é que eram egoístas a partir do princípio, que eram gananciosos. Era quase, na altura, isso era quase um posicionamento blockista, mas tinha desculpa de ter 14 anos. E depois houve dois momentos muito engraçados que acabaram por ser bastante definidores. Um foi com o, na altura dos blogs, o então, depois de chegou a ser deputado, o Michael Seufert Misha, do CDS, líder da JP, ele tinha um blogue que se não me engano se chamava Small Brother, em alusão ao livro do Orwell, Big Brother, de 1984, e nesse blogue eu já o conhecia porque nós tínhamos amigos em comum e eu gostava de ir lá trocar assim umas pingardadas com ele e estávamos a trocar uns comentários e alguns ele diz-me, e julgo que até foi a propósito dos impostos progressivos do IRS, após isso ele recomenda-me ler Constitution of Liberty do IAC. E eu, confesso muito presunçoso, cansei-se. Bom, vou ler isto, vou tentar encontrar aqui alguma incongruência e depois venho aqui responder mais tarde. E até hoje, até hoje porque de facto não houve assim nenhuma incongruência, pelo contrário foi um livro que me fez pensar e fez-me ver uma área política de uma perspectiva que não conhecia, não é? Comecei um bocadinho a estruturar o meu pensamento político. E depois, mais ou menos pela mesma altura, quando tinha uma empresa, tinha um designer que trabalhava connosco que me recomendou, estávamos a falar de uma pessoa em comum que conhecíamos e ele recomendou-me, porque essa pessoa ele tinha recomendado a ele, ele tinha gostado muito, ele recomendou-me ler um livro que esse fim talvez tenha sido ainda mais definidor, principalmente no momento em que o li, que foi o Atlas Shrugged, da Ayn Rand. Ainda assim não é pequeno. Não é nada pequeno, mas foi o livro que eu li mais rápido que nunca larguei. Embora eu não seja propriamente um objetivista e não me reveja em toda aquela visão ultra-racional da Ayn Rand, a verdade é que o livro foi interessante do ponto de vista do posicionamento político. Eu diria que o pós-leitura Até fiquei um bocadinho estremado, mas acho que isso é normal, não é? Quando há algo que nos influencia bastante temos um momento de ajuste. E depois, olhando agora em retrospectiva, diria até que de facto, ali, mesmo da parte dela, há ali posições bastante exageradas com as quais eu discordo. Não apenas dela, havia, por exemplo, existem alguns pensadores anarco-capitalistas, como a Rothbard, que têm algumas posições que me parecem manifestamente exageradas. Por exemplo, eles os dois são a favor do aborto e do aborto incondicional, portanto não há limite de tempo e partem do pressuposto que o ser humano não estando vivo, estando dentro do corpo da mulher é um parasita e sendo um parasita as mulheres têm direito a exercer a liberdade sobre o seu corpo, incluindo eliminar esse parasita. Ora, toda a forma como isto é formulado parece-me um pouco abjecto e, portanto, são posicionamentos bastante extremos. E é curiosamente que eles dois, tanto Rodgard como Ayn Rand, não estavam muito bem, pelo contrário, mas no entanto tinham esse posicionamento em comum. E, portanto, hoje em retrospectiva acho que há ali algumas coisas com as quais não me revejo minimamente. No entanto, acho que foi absolutamente definidor. O AIE, acho que tem uma posição muito mais ponderada e, sinceramente, não estou a ver nada em particular de que discorde dele, ao contrário de alguns posicionamentos da Inrem. Portanto, foi aí, eu acho que foi a partir daí que comecei a descobrir um posicionamento político mais estruturado, porque de facto as minhas posições sobre os assuntos, que decorriam um bocadinho, não tinham, não radicavam de um conjunto de princípios que me ajudavam a guiar o meu posicionamento. Acabava por ser um fruto das circunstâncias, das discussões que entendo, que atendo, que ouvindo, aquilo que hoje poderíamos chamar de pragmático. E isso incomodava um bocadinho, porque me parecia um bocadinho um processo um bocado aleatório. Portanto, a partir desse momento, aquilo que são os valores, os princípios, porque o liberalismo não é uma doutrina, embora muitos queiram fazê-la passar por um tal, não é, eu diria que é sobretudo um projeto de contenção de poder e, portanto, a partir desse momento consegui encontrar um conjunto de pilares que me ajudam a pensar sobre temas políticos sobre os quais ainda não tinha abordado. Portanto, acabou por ser bastante útil. E, a partir daí, comecei a ler muito mais coisas, comecei a ler também mais coisas da área política, que não a minha, para conhecer o pensamento político do adversário e tentar perceber porque é que ele pensa como pensa, mas acho que o momento que definiu aquela que é a minha, os meus princípios políticos e a minha visão política foi aí. Por acaso a história que tu contaste é interessante
José Maria Pimentel
porque ao descreveres o teu percurso dessa forma é inevitável a pessoa pensar naquilo que é um bocadinho a psicologia da personalidade do liberal ou libertário. Eu acho que a Ayn Rand é um bocadinho extremo disso, não é? Ayn Rand é uma espécie de libertarismo extremo. Ayn Rand dizia coisas como que o altruísmo não fazia sentido, porque tudo que fosse estar-se a sacrificar por alguém era uma negação da tua individualidade.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Na verdade, ela tem um livro muito interessante sobre isso que é The Virtues of selfishness, portanto as virtudes do egoísmo. E ela faz lá um paralelo muito interessante e quando pensamos nisto em perspectiva ela se calhar não estava assim tão errada quanto a isso. O que ela dizia? Pegando por exemplo no exemplo da Madre Teresa de Calcutá, a dedicação que ela tinha, que nós vendo de fora podemos dizer que é sem dúvida altruísmo, que dedicou a sua vida a ajudar terceiros, mas a madre Teresa de Calcutá efetivamente estava a fazer aquilo que a satisfazia, que era ajudar terceiros. Portanto, do ponto de vista pessoal ou individual, era uma atitude bastante egoísta, Ela fazia aquilo que gostava, que lhe dava satisfação. A Kresge era uma atitude honrada que ajudava terceiros e, portanto, quem vê de fora parece que é altruísmo. Portanto, a perspectiva, a forma como ela fala do egoísmo é muito nesta perspectiva. É na perspectiva em que o egoísmo não é necessariamente causar dano a interesseiros. Aliás, esse é
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
um dos limites do liberalismo. A nossa liberdade tem uma outra fase que é a responsabilidade individual e, portanto, a nossa liberdade esgota-se na nossa esfera. Não vamos tentar impor em
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terceiros aquilo que são as nossas conficções. E, portanto, essa perspectiva sobre o egoísmo que ela dá é interessante, não é? E, de facto, faz pensar, será que a Madre Teresa Calcutá era, de facto, egoísta porque era aquilo que lhe dava satisfação, era aquilo que lhe dava prazer, era aquilo que a deixava feliz ajudar terceiros. Sim, estava a ser egoísta porque ela estava a fazer aquilo que lhe dava prazer, contudo era um ato altruísta.
José Maria Pimentel
Na verdade isso vai muito ao encontro de uma coisa que eu já pensei várias vezes, que é o facto de que existem muito poucos atos verdadeiramente altruístas, no sentido em que tu estes a fazer uma coisa a contra gosto apenas para fazer bem alguém. A maior parte dos atos chamados altruístas que nós fazemos são porque nós gostamos de fazer ou gostamos da pessoa que vai receber. Desse ponto de vista não são verdadeiramente altruístas. Por outro lado, como esta relação é dinâmica, não é? E tu tens uma espécie de feedback loop, o facto de tu encorajares atos altruístas faz com que a esfera de atos que nos dão prazer ou que nós gostamos de fazer, ela própria se vai alargando, não é? Portanto, até esse efeito social positivo que se calhar ela não estava a considerar. Não sei porque eu não conheço o original disso. Voltando à psicologia, à personalidade do liberal, acho que é uma coisa interessante e há um tipo de quem eu já falei aqui no podcast, que é o Jonathan Hight, que é um psicólogo moral e social e tem vários livros interessantes e um deles que eu já falei aqui que é o The Righteous Mind, porque seria a mente íntegra ou alguma coisa deste género e que estuda basicamente a moral sob vários pontos de vista, mas um deles é tentar perceber os diferentes valores dos diferentes posicionamentos políticos, ou seja, de pessoas com posicionamentos políticos diferentes, o que mostra que muito, mas não tudo, do nosso desacordo resulta de termos valores diferentes. E o que é interessante, ou uma das coisas interessantes daquele trabalho é que ele estuda não só, aqui ela é na realidade americana, para variar, e ele estuda não só os conservadores, ou seja, as pessoas que tendencialmente votaram no Partido Republicano, como os progressistas, ou seja, aqueles que votaram tendencialmente no Partido Democrata, mas também os libertários naquele sentido e, portanto, nós poderíamos dizer liberais no sentido lato, ou seja, abarcariam liberais clássico e versões um bocadinho mais extremadas para o libertário. E isso é muito interessante porque o que ele mostra é que há uma diferença, por exemplo, entre conservadores e progressistas na medida em que os progressistas focam muito a justiça no sentido da equidade, por exemplo, e a questão do que chama care, portanto, o cuidado. É uma coisa que nós vemos muito no PAN, por exemplo, a história dos animais ou até a tratar o ambiente como se fosse um ser vivo e, portanto, a empatia, se quiseres. E do lado dos conservadores existem também esses, mas depois existem outros valores que a esquerda basicamente não vê e que têm que ver com autoridade, com o sentimento de grupo e com dever perante o grupo e até com questões de que ela chama de pureza, que estão muito na liberdade sexual e coisas do género. E há outra, há um outro valor, que existem ambos, progressistas e conservadores, mas não estou pronunciadamente assim, e que é o único do lado dos libertários, ou podemos dizer, do lado dos liberais, que está elevado. Para os outros cinco que eu referi, não é que os liberais não sejam sensíveis a isso, mas têm uma sensibilidade mais baixa do que os restantes. Mas há um valor, que é, não surpreendentemente, liberdade, que eles chamam de liberty, nesse sentido, que é muito mais elevado nos liberais do que nos outros. E eu acho que é interessante fazer este exercício, e eu próprio acho é interessante fazê-lo, porque eu tenho um bocadinho, quer dizer, eu defino o meu próprio também como liberal clássico, e sinto muito o apelo da liberdade naquele sentido negativo, no sentido em que é muito comum na filosofia liberal, e é interessante nós pensarmos, fazer esse exercício de autoanálise e pensar, ok, isto acontece assim porque eu tenho, no fundo é como se eu tivesse este interruptor especialmente sensível, sensível e muitas vezes mais sensível do que outras pessoas que me rodeiam e ser estranho, é essas dinâmicas, não é? Que no fundo tocam nessa questão da liberdade. Eu acho que sim, eu acho que essa de facto, pessoas diferentes,
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posicionamentos políticos acabam a ter diferentes valores. Os valores que emanam da Revolução Francesa de 1789, liberdade, igualdade e fraternidade, Em boa verdade, para alguém que esteja um bocadinho mais à esquerda atónica está muito mais na questão da igualdade, enquanto que alguém que seja mais liberal, e aqui não digo direita porque dentro da direita também existe direita muito estatista, que está disposta a dedicar-lhe liberdade se for para atingir os fins que acredita serem justos. Sim,
José Maria Pimentel
eu prefiro chamar não esquerda.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Ou não esquerda, exatamente, é uma boa forma de aglutinar, de facto, quem não tem essa visão tão estatista. E, portanto, de um posicionamento mais liberal, a liberdade acaba por ser um foco. No contexto dos Estados Unidos, eu acho que eles foram bastante influenciados pelo John Rawls e pela visão que ele tem da liberdade positiva, não é? Que é bastante diferente da visão liberal da liberdade, que é a liberdade negativa. E liberdade negativa significa a liberdade da interferência de terceiros e sobre terceiros e portanto eu tenho o direito a fazer o que eu quiser desde que não interfira com terceiros e sobretudo que não os prejudique. E portanto a visão que os liberais constroem da liberdade assenta sobretudo neste princípio. Enquanto que a visão de Rawls é positiva, é no sentido de eu tenho de ter os recursos para efetivamente ter liberdade para fazer as coisas que eu quero, não é? Ou seja, eu, sem recursos financeiros, não consigo atingir o fim que me faz feliz e, portanto, para ele a liberdade pressupõe isso. Eu acho que isto acaba por ser, criar uma dicotomia que de facto existe, não é? De esquerda e direita na forma como vemos aquilo que é a liberdade e claramente nós, na perspectiva de um liberal, o nosso foco acaba por ser muito mais na questão da liberdade do que na igualdade. E é curioso porque mesmo neste tema da igualdade não é apenas igualdade de oportunidades, porque eu acho que, tirando uma visão mais radical, que acha que nem deve existir Estado Social e que portanto cada um entrega a sua sorte e mesmo que tenha um azar vai ter de contar com a ajuda de terceiros, portanto é um modelo completamente voluntarista, um modelo anarco-capitalista, mas os liberais clássicos não se revêem nisto, o próprio Hayek no seu Road to Serfdom fala de, justifica a ajuda do Estado em situações, por exemplo, de necessidade de saúde e, portanto, o Estado poder ajudar, o que não significa prestar, mas ajudar no sentido de financiar, de garantir essas condições, fala também do modelo de segurança social, etc. Na questão da igualdade, tipicamente, a esquerda está sobretudo preocupada com a existência de pobres e a direita, que não esta direita mais radical, mais anarco-capitalista, que acredita num modelo perfeitamente voluntarista e sem existência do Estado, acredita no fim da pobreza. E que são duas coisas verdadeiramente diferentes, porque um dia mais tarde, quando os nossos níveis de riqueza material forem continuarem a crescer e certamente continuarão e atingirem outros níveis, se calhar o pobre vai ser aquele que tem dois carros e duas casas e um iate e o rico é aquele que vai passar férias a mais. E, portanto, haverá sempre essa discrepância entre um pobre e um rico, no sentido em que o rico é aquele que tem mais que o pobre, Mas em termos de nível material de pobreza, não é pobre certamente, porque tem tudo o que necessita e ainda mais. E portanto a tónica da esquerda é muito mais na questão da desigualdade, nas discrepâncias do que nos níveis de pobreza e eu acho que essa deve ser efetivamente a grande preocupação de um liberal, que é, ok, o Estado existe, conhecemos-o, é aliás um protetor das liberdades dos indivíduos, cumpre algumas funções fundamentais para as quais não existe mercado, tipicamente, a questão das defesas, soberania, e se serve para alguma coisa, mas serve certamente para ajudar aqueles que efetivamente precisam e, portanto, serve também para resolver a questão da pobreza, muito mais do que reduzir as desigualdades. Portanto, as desigualdades é uma não questão, foi trazida para a agenda política porque serve um outro objetivo maior, não é? Que é continuar a impor a mesma agenda socialista.
José Maria Pimentel
As desigualdades são uma espécie de proxy para a pobreza, não é? O argumento que tu faz é um argumento com que eu concordo para aí a 90%, já vamos aos 10 em que eu discordo, e é um argumento que está feito. No fundo, o argumento passa por dizer que a nossa variável objectiva não é a desigualdade, a nossa variável objectiva é a pobreza, não é? Nós queremos eliminar a pobreza e não eliminar a desigualdade. Ou seja, o facto de eu ser rico e o meu vizinho ser mega rico não é necessariamente um problema. O problema é se eu for pobre e ele for
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
médio ou… Mas por outro lado, deixa-me só interromper. Diz, diz. Isto é na perspectiva de, da ação, intervenção em políticas públicas, não é? Porque se a coisa acontecer naturalmente via ação voluntária, individual das pessoas, ótimo. Aliás, isso foi um dos grandes méritos do capitalismo, não é? Quando nós acabamos com o feudalismo e depois com o mercantilismo, é quando aí efetivamente começa a surgir a classe burguesa, a classe média, não é? E a classe média é justamente o início do fim das enormes igualdades que existiam. E, portanto, hoje em dia há muito menos desigualdades do que existia certamente há 100 ou há 200 anos
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
atrás, em que tínhamos uma casta de privilegiados. Sim, e depois não eram só económicas, não é? E não eram só económicas, eram também sociais e, portanto, o surgimento da burguesia
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
desta classe média, que é algo proporcionado pelo capitalismo, permite justamente reduzir, dirimir, bastante desigualdades. Agora, para a esquerda nunca será perfeito, enquanto todos não tiverem exatamente o mesmo. No entanto, na perspectiva de um liberal, se as coisas ocorrerem, se for esse o resultado da ação voluntária e espontânea dos indivíduos e daí resultar uma sociedade em que os níveis salariais, os níveis de rendimento e património estão alinhados, ótimo, nada contra, nem nada particularmente a favor. Acho que a tónica na nossa perspectiva deve ser sempre a questão absoluta da pobreza. Portanto, ajudar sobretudo aqueles que precisam e não estar tão preocupado com aqueles 1% que por algum motivo têm muito mais que os outros. Não é isso que pelo menos a mim me preocupa. A mim me preocupa quem tem menos, não é? Quem tem mais. Aliás, há uma história muito engraçada, não é? Do logo a seguir ao 25 de Abril, quando o hotel Sarava de Carvalho foi ir numa digressão... Já contei no podcast, não te podes
José Maria Pimentel
contar também outra vez.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Não, Mas essa história é muito gira e é sobretudo muito sintomática, não é? Quando o hotel-sarava de trabalho vai numa digressão pela Europa a explicar os milagres da revolução em Portugal, porque ainda decorriam, ele vai ter com o Olav Palme do Partido Social-Democrata sueco e muito entusiasmado diz-lhes que em Portugal vão acabar com os ricos e o Olav Palme diz, na Suécia nós queremos acabar com os pobres. Portanto, isto ilustra bem, não é? O foco de uns versus o foco dos outros. E o Partido Social Democrata não é propriamente um partido liberal. O Partido Social Democrata sueco, aliás, pelo contrário, teve ali uns momentos que o seu programa era claramente socialista. E no entanto a perspectiva, a posição, o posicionamento dele era manifestamente distinto, não lhe preocupava os ricos, preocupava é que vissessem pobres, portanto essa deve ser a nossa preocupação.
José Maria Pimentel
Eu adoro esse exemplo porque é um belo exemplo de perseguir a variável errada. Há uma andota soviética que o Steven Pinker conta no livro dele, que retrata basicamente a mesma mentalidade, que era uma... Se calhar não vou contar perfeitamente, mas havia dois camponeses soviéticos, um deles tinha uma cabra e outro... Um deles tinha uma cabra que lhe dava grande parte do sustento e o outro não tinha. E este segundo que não tinha, parece um género da lâmpada ou whatever, qualquer coisa que lhe dá uma espécie de desejo, e o género pergunta-lhe qual é o desejo que ele quer cumprir e ele diz matar a cabra do outro camponesa. Ou seja, não era aumentar a propriedade dele, era diminuir a do outro. Objetivamente.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Eles não dirão que sim, eles não dirão... O que nós queremos é que toda a gente seja pobre. A questão é, se por acaso for tudo nivelado por baixo, portanto estamos mais pobres mas todos têm o mesmo, no fundo o objetivo está alcançado.
José Maria Pimentel
E nem é preciso ir tão longe, eu acho que isso é uma caricatura que nem precisa de ser verdade, basta o facto de tu não ganhares, acabar com os ricos para aceitar o hotel, não faz nada. Claramente que não,
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
principalmente quando isso se tenta fazer, geralmente tem um impacto enorme depois no todo, em todo o processo produtivo e em todo o motor do crescimento económico, portanto não é apenas ir buscar aos ricos para distribuir para os pobres, geralmente pretende-se mais, quando isso acontece tem um impacto substancial em termos de crescimento económico. Portanto, isso acaba por ser contraproducente e no final a economia
José Maria Pimentel
fica pior e os pobres ainda ficam pior do que o que estavam. Portanto, é completamente contraproducente, não é? Isso é uma questão complicada porque depende sempre do contexto em que nós nos estamos a colocar. Uma coisa é nós colocarmos no contexto do mundo ocidental como um todo, outra coisa é colocarmos no contexto português. E essa é uma confusão que eu acho que muitas vezes é feita, que é muito diferente de tu discutires um problema destes. Por exemplo, no caso dos Estados Unidos, que é sempre o modelo que a pessoa acaba por seguir porque tem uma sociedade civil muito viva nesse aspecto, ou discuti-lo no caso português. No caso dos Estados Unidos, por exemplo, há vários que é enviado-se em relação ao que tu disseste, no sentido de que ter uma concentração de riqueza em poucas pessoas claramente pode ter, e eu julgo que tem, um efeito prejudicial sobre o crescimento, a própria desigualdade, embora não seja variável ou objetiva, a partir de um determinado ponto cria instabilidade social e cria descontentamento e, portanto, há uma série de razões nesse caso, há uma série de razões que me faz discordar-te neste, no caso dos Estados Unidos. O caso português é um caso bastante diferente, o caso português acho que tem outras condicionantes. Mas
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
no que tu acabaste de dizer eu me discordo, isto é, eu reconheço e aliás há alguma literatura que de facto as desigualdades criam alguns problemas sociais. Aliás, está bastante estudado que tipicamente nós nos comparamos com os cunhados. Exato. Como ponto de comparação, e há também um estudo muito engraçado, em que perguntam a uma pessoa num país subdesenvolvido, Mas perguntam a uma pessoa que para aquele país, no contexto daquele país é uma pessoa rica, não é? E perguntam-lhe se está feliz, está satisfeita. E depois perguntam a uma pessoa que claramente não é pobre no contexto de um país mais desenvolvido, mas também não é rica, não é? Está ali na classe média e perguntam-lhe se ela é feliz. Claro que, me digo felicidade, é uma questão de percepção, é muito difícil desafiar isto e não estamos a perguntar à mesma pessoa. Mas, seja como for, é muito engraçado que aquela pessoa que é rica na perspectiva relativa, mas não absoluta, comparativamente com uma pessoa mais pobre num país desenvolvido europeu, que tem uma safety net muito grande e que consegue o mínimo dos mínimos, na verdade do ponto de vista material, a pessoa rica num país subdesenvolvido tem menos do que a pessoa, não estou rica no país desenvolvido, que seja o país europeu nos Estados Unidos. E no entanto aquela que é rica no país mais pobre é, por regra, reporta ser mais feliz, mais satisfeito, não é? Porque é uma questão de comparação e, portanto, Se me disseres que pode levantar questões sociais, estou de acordo que isso pode acontecer, não é? Portanto, isso é verdade. No entanto, a questão da concentração de riqueza nos Estados Unidos, eu acho que tem muito que ver com, não apenas com a globalização, mas também com a digitalização, porque hoje em dia uma empresa chega a qualquer lado do mundo e, portanto, temos casos de grandes empresas que precisam de facto de economias de escala e que a projeção mundial lhes dá essa possibilidade. Basta ver, por exemplo, uma banda de música, uma banda de música há 100 anos atrás ou mais tocava, quando muito, na sua região e se tivesse sucesso seria no seu país, não era comum vir uma banda alemã há 200 anos atrás, nem que fosse música clássica, tocar a Portugal. E hoje em dia nós temos bandas que imediatamente via Spotify têm exposição para todo mundo, que fazem concertos em todo o mundo, que estão em tours por todo o mundo e portanto mesmo aquilo que acaba por ser um serviço acaba por circular por todo o mundo e ainda mais com os bens.
José Maria Pimentel
É o winner takes all, não é?
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Do winner takes all, agora, também pode ser e eu acho que, isto é um ponto muito interessante, o Milton Friedman dizia que ele não era pro-business, ele era pro-free enterprise e, portanto… Eu cito essa frase muitas vezes, sim. Nós devemos pugnar por existir um mercado competitivo e, portanto, se me falares de empresas como Facebook e Google que cada vez mais amassam mais concentração, mais poder, e que têm mais poder que alguns Estados, não é? Google tem mais influência, tem mais soft e hard power do que Portugal. E, portanto, são agentes de políticos com impacto. Se isso me preocupa, certamente sim, claramente que sim, não é? Existirem estruturas tão grandes, com o poder e com a dimensão que têm, não é positivo para o mercado, no sentido em que diminui a sua concorrência e até certo ponto podem ser perigosas. Agora, como se resolve isto? Alguém de esquerda diria, bom, intervém-se no mercado e obriga-se as empresas a separarem-se, enfim. E se os Estados Unidos faziam isso nos anos 70 com as elétricas e depois elas voltaram a se juntar porque precisavam de economia escala, porque o negócio não era rentável.
José Maria Pimentel
Mas já fez com sucesso no passado, não é? Com a Standard Oil, por exemplo.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Sim, conseguiu fragmentá-la e foi-se manter.
José Maria Pimentel
Assim, eu acho, provavelmente tu não concordas, mas eu acho que vai ter que haver alguma intervenção aí, embora tenha que ser uma intervenção com cuidado para não deitar o... Como é que é? Para não deitar o bebê com a água do banho. Porque, sabes, o problema aí é que há um lado, obviamente que há um lado, sei lá, as bandas com o maior sucesso ou as tecnológicas que amassam uma grande parte do mercado têm obviamente um lado de mérito para transportar essa analogia para aqui, ou seja, tem o lado de elas prestarem um serviço melhor do que a concorrência. Mas há um lado, há outra variável que não é mérito e que é um bocadinho aleatória, e tu num modelo completamente aleatório, de winner takes all, tu podias ter um... O Euromilhões é uma espécie de winner takes all, ou seja, tu tiras um número à sorte e aquela pessoa ganha tudo. E num mercado destes, quem tem a sorte do timing e de uma série de outras variáveis, acaba depois por estar numa posição em que se não houver uma intervenção externa, essa posição não desaparece. E tu aí pode ser uma série de problemas e o exemplo da era dourada, da Standard Oil e outras empresas, é um exemplo que eu acho que tem um poder explicativo grande. Eu concordo contigo e quando vejo alguém de esquerda fazer Essa recomendação fico sempre com medo, porque me parece que por princípio não trará muita atenção ao BBE, mas parece-me, para continuar a analogia, que é preciso deitar água do banho fora, ou seja, que é preciso resolver aqui o problema. Eu estou de acordo, preocupa-me, de facto, essa concentração. E é preciso a intervenção do Estado, Ou seja, é preciso
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o Estado intervir? A esse respeito, não sei. Era preciso ver a que intervenção. Estamos a falar de quê? Aí já tenho algumas dúvidas, porque no caso do Google não foi de todo uma questão de sorte. O Sergei Brinler e o Peito estavam em Sanford a fazer o seu doutoramento, no contexto do doutoramento criaram o PageRank, aquilo foi completamente revolucionário no contexto então, não é? Os motores de pesquisa, o Alta Vista, para quem se recorda, para quem for bastante mais velho que não, O Alta Vista, entre outros, eram umas coisas, e o próprio Yahoo eram umas coisas assustadoras, aquilo era um diretório que tinha uns links e, portanto, aquilo era péssimo. E esse algoritmo PageRank, que depois da origem ao Google foi absolutamente revolucionário e por isso é que ainda hoje é o standard na indústria, não é? E isto verifica-se em muitas outras indústrias, ocorre que o produto que o Google oferece é de facto usado por todo mundo, enquanto que há indústrias que nem todos são consumidores, no caso do Google, eu acho que, quer dizer, se não é todas,
José Maria Pimentel
potencialmente todas. As que não usam, apontem computador, apontem possibilidade. Repara que isso é em si mesmo sorte, não é? É a sorte do timing. Eu não estou a tirar mérito, como imaginas, não é? Mas há uma sorte do timing, aliás o próprio Bill Gates teve a sorte do timing, não é? Claro,
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e de onde nasceram, quer dizer, nada daquilo teria sido possível sem ter nascido em Agda, não é? E, portanto, claro, claramente que sim, eles nasceram ali no, onde estava na zona mais hot da tecnologia, onde estava lá dinheiro, venture capitalists para financiar o projeto, tive a estudar na melhor universidade, numa das melhores universidades do mundo, da Ivy League, Stanford, e portanto tudo isso tem muito impacto. Claro que sim, acho que concordo que teve uma dose de sorte, agora, que tipo de intervenção é que deve ser feita eu não sei, acho que é preciso muita cautela porque senão há
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mais dezenas de perigosos. Mas não
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
pões de parte, pelo menos. Quero dizer, eu não tenho uma postura completamente automática em relação a isso, em que o governo não toque em nada, não, Claro que não, mas acho que um bom princípio, por regra, é deixar as coisas quietas. Mínima intervenção, especialmente porque, e isto é uma coisa que curiosamente nunca é muito referido, mas está relativamente bem estudado em welfare economics, acontece que às vezes A intervenção do governo é mais custosa que a falha de mercado. Tipicamente diz-se os mercados falham. Os mercados falham, o mercado falhou e tal. Mas depois a intervenção é pior. Claro. A emenda é pior que o soneto. E portanto, se é para ser assim, mais vale estar quieto, não se gastam recursos a tentar deixar uma coisa ainda pior do que elas
José Maria Pimentel
estavam. Sim, sim, sim. De acordo. Embora este não pareça ser um caso desses, mas em Portugal
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
há... Não sei. Imagina, por exemplo, que a intervenção vai impactar substancialmente a qualidade dos resultados de pesquisa do Google e que isso afecta pessoas no dia a dia. Estamos a falar de milhões de pessoas e milhões de pessoas. Ah, não, certo. Que a intervenção pode ser mal
José Maria Pimentel
feita, não há dúvida nenhuma.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Claro, sim, eu acho que o Facebook, provavelmente, conseguiríamos viver sem ele de uma forma ou de outra. Impactaria mais uns do que outros, mas cada vez mais, porque cada vez há mais empresas
José Maria Pimentel
a ganhar o cargo
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
do ano de publicidade. Se calhar até melhorou. Não é? Sim, em algumas coisas, certamente. Agora, no caso do Google, poderia ter um impacto muito grande, eles pegaram ali um ecossistema que muitas empresas são dependentes desse ecossistema. E portanto, não sei, não sei, mas reconheço que é um problema Facebook ter Instagram, WhatsApp, mais o messenger deles, todas as plataformas de comunicação, ou seja, quase tudo passa por lá, isso no limite pode ser problema, então se tem ali um manancial de dados muito significativo e informação hoje em dia poder e, portanto, quer dizer, eles podem mandar um governo baixo, podem mandar um político abaixo, isto é preocupante, não é? Como resolver, sinceramente, não
José Maria Pimentel
sei. Exatamente isso, aliás, leva-nos até para, de novo, aquela frase do Friedman que tu citavas, o liberal à partida é tão a ver só ao poder do Estado como ao poder de uma grande empresa, não é? Ou seja, ambos são... A ver só ao poder. Exatamente, ambos são formas de... Embora muitas vezes manifestem mais o primeiro do que o segundo, que eu acho que é um problema na prática. E o próprio Friedman tinha esse problema, que ele justificava de uma forma que nem parecia ser muito coerente. Mas em tese, pelo menos, ambos... Quer dizer, são duas formas diferentes do mesmo mal, de coartar a liberdade individual. Mas entretanto, isto levou-nos... Nós começámos a falar de desigualdade e acabámos por... Estávamos a falar implicitamente de Estado Social e acabámos por herdar a intervenção do Estado como regulador ou até interveniente mais forte do que isso, que é um tema interessante mas eu queria voltar ao que nós estávamos a falar há bocadinho e até àquele ponto que eu estava a fazer. O caso dos Estados Unidos é um caso de um país próspero, é de um país rico se quisermos, com problema de desigualdade, que é diferente do nosso caso, que é um caso de um país pobre, em termos relativos, bem entendido, país pobre para a zona geográfica e cultural em que está inserida, que também tem um problema de desigualdade. E o que é curioso, eu depois de pensar sobre o assunto e até ter gravado a ronda anterior destas conversas sobre política, acabei por perceber, até porque, como falei, com pessoas com preferências muito diferentes, percebi que na prática o que acontece, no caso português, é que tu chegando, quer dizer, amanhecendo politicamente num país como Portugal, tens duas hipóteses, e ambas são parcialmente verdade, não é? E tu já aludiste a isso há bocadinho. Ou tu olhas para Portugal como um problema de subdesenvolvimento face aos outros, aos países que te servem implicitamente de modelo, mal ou bem, e muitas vezes eles até não servem demasiado como modelo, e portanto são países que são mais prósperos, com uma sociedade mais equilibrada, com maior rendimento, com maiores posses materiais e, portanto, nós... E no fundo é isso que falta a Portugal e essa é muito a minha tese e acho que também é muito a tua tese. E aqui já nem estamos sequer só no plano da liberdade, estamos no plano da prosperidade. Ou olhas para Portugal como um país historicamente desigual, de privilégio, em que as pessoas têm o seu destino muito mais marcado pelo privilégio ligado ao dinheiro que têm, ao estatuto social com que nascem, ao meio em que nascem, à educação que têm, e daqui podíamos partir para o sexo da pessoa, a etnia, uma série de outras coisas. E isto são duas maneiras que, em termos de plano de ação, dão respostas radicalmente diferentes, mas são complementares, são duas maneiras possíveis de fazer o diagnóstico da mesma realidade. E é difícil de desatar este nó. Eu alinho mais pelo primeiro, acho que o primeiro como diagnóstico que informa uma estratégia de longo prazo me parece mais viável, mas percebo perfeitamente que alguém faça o segundo diagnóstico. E o segundo diagnóstico dá-te respostas completamente diferentes. Só
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
para ver se percebi bem. Nos Estados Unidos, de facto, existe mais ascensão social, não é? Ascensão e também queda social.
José Maria Pimentel
Sim, ou existia historicamente, hoje em dia pelo menos... Ainda, ainda, não é?
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
O top de empresas do Forbes 500 em 80, neste momento não há nenhuma empresa lá. Portanto, nenhuma se manteve. Ah, não,
José Maria Pimentel
mas as empresas sim, sim, mas em termos individuais, não seja...
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Porque as tecnológicas, entretanto, assumiram o pódio, não é? E, portanto... Quer dizer, existe bastante mobilidade, tanto em quem detém o capital, como nas próprias pessoas, nas diferentes classes
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
sociais, não é? O sonho americano possibilita, enquanto que em Portugal está estudado, que é preciso 5 ou 6 gerações para conseguir dar um salto significativo. Agora, eu acho que isso não é um fado, isto é, tem sido o nosso fado, não é?
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
De facto o nosso fado tem sido um pouco esse, mas não tem de ser necessariamente assim, isto é, Portugal não está condenado. Não é uma fatalidade, não estamos condenados a estar na cauda da Europa, a sermos ultrapassados por todos. Eu acho que há aqui questões culturais que não ajudam, não é? Um livro que eu achei muito interessante, eu acho que não explica tudo, o R² há de estar abaixo de 50%, mas eu acho que explica uma componente muito importante, que é o livro do Max Weber, da ética protestante e o espírito do capitalismo, não é? E a visão protestante é muito no pain no gain, não, meu amigo, não trabalhas, não chegas ao céu. Sim, exato. E, portanto, deixa-te lamúrias e de, se Deus quiser, vai mais é trabalhar. E isto cria uma ética de trabalho muito forte e muito rigorosa. Eu acho que isso não é por acaso que os países protestantes na Europa são todos, na Europa e não só nos Estados Unidos também, é maioritariamente protestantes, são mais ricos que a maior parte dos países católicos do Sul. Eu acho que tem um pouco de ver com isso, tem que ver com a cultura religiosa, independentemente da pessoa ser religiosa ou não. Muitos não são, eu não sou, e no entanto todos nós fomos influenciados pela matriz judaico-cristã dos valores ocidentais.
José Maria Pimentel
Isso faz-te querer um, tendencialmente, um estado social menor, ou seja, tu achares que tens um... Isso está muito ligado àquela questão da psicologia do locus de controle, ou seja, tu achares que influencias o teu destino. Paradoxalmente, porque o protestantismo é acredito, pelo menos parte dele, que o destino já está traçado, a ser sentido.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Sim, certamente que nós influenciamos, não acredito num determinismo histórico, certamente.
José Maria Pimentel
No ponto de vista religioso, quer dizer.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Sim, claro. Nós influenciamos o nosso destino e, aliás, nós conversamos sobre isto antes, uma das frases que eu acho fabulosas porque é uma súmula, em meia dúzia de palavras, daquilo que nós acabamos de ser, não é? Do filósofo espanhol, do Ortega Gasset, em que ele diz eu sou eu e as minhas circunstâncias. E, portanto, nós também somos o conjunto das circunstâncias e qualquer um de nós tivesse nascido em outro país certamente estaria exposto a outras condições e seria uma outra pessoa. Dito isto, eu acho que a questão do Estado Social, e pegando aqui num exemplo mais concreto que eu acho que ajuda, no caso de Portugal, por exemplo, o Estado Social tem, o Estado tem aqui, cumpre várias funções, cumpre a função reguladora, cumpre a função financiadora e cumpre a função prestadora. Em muitos países da Europa, por exemplo, na saúde aliás, diria até, na maior parte dos países da Europa, a prestação dos cuidados de saúde é privada, mesmo aquela que é garantida pelo Estado. Existe um seguro social de saúde e, portanto, as pessoas têm a seguro social de saúde, se não puderem pagar por ele, se estão desempregadas, o Estado garante a seguro social de saúde e depois a pessoa escolhe onde vai. Há uns tempos atrás, lembro-me que estava a falar com um irmão e ele estava em uma conferência, ele estava a contar que tinha ido ao hospital e como a área da saúde é uma área de investigação e de trabalho, eu por acaso pergunto-lhe se ele se recordava se tinha ido a um hospital público ou privado e ele fica a olhar para mim e diz que não me lembra. Não sabia. Portanto, para ele é uma questão completamente acessória se a prestação é pública, se a prestação é privada. No entanto, isto aqui é um motivo de grande discussão em Portugal, que há um fim que é grande, que a prestação tem de ser pública. E, portanto, essa é uma perspectiva de um Estado social que é menor, no sentido em que a prestação não é necessariamente garantida pelo Estado.
José Maria Pimentel
Mas isso para mim não faz parte do Estado Social. Pois, mas isso
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
é... Justamente, mas é justamente esse o ponto. Em França, 90% da prestação de cuidado de saúde é privada. Na Suíça a mesma coisa e, no entanto, as pessoas têm acesso aos cuidados de saúde, acesso universal, ninguém é deixado fora e, aliás, a França tem E tanto a Suíça e a Suíça tem os melhores sistemas do mundo.
José Maria Pimentel
E a Holanda, se eu souber, também tem um
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
rango, não é? Também. Também a Holanda, a Alemanha, a Áustria, com o sur social, sim. E não ia agora transpor o mesmo raciocínio para o caso da educação. A educação, há muitos países na Europa, por exemplo, o caso da Suécia, não é? Que é muitas vezes apontado pelos socialistas, como exemplo, de um país socialista e não é socialista, tem um status forte, tem um status social forte, mas na verdade, do ponto de vista económico, em termos de liberdades económicas, é muito mais liberal do que do que Portugal. Aliás, a The Economist tem um artigo muito interessante, já datado de 2013, em que diz que se o Milton Friedman fosse vivo sentia-se muito mais em casa em Estocolmo do que em Washington neste momento. Portanto, isso ilustra bem que de facto a Suécia não é todo um país socialista, mas no caso da Suécia existem, por exemplo, cheques de ensino, quem diz no caso da Suécia diz também no Reino Unido. Existem charter schools, cheques de ensino e, portanto, existe prestação privada de serviço educativo. Portanto, o setor privado pode e deve ser chamado a prestar serviço público só por dogmatismo. E por preconceito,
José Maria Pimentel
não é? Sim, e por
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
preconceito ideológico. É que se poderá excluir esta opção e de facto é isso que acontece, não é? Quando nós temos, claramente, eu sei que esta conversa não era para falar de coisas em concreto, mas acho que são bons exemplos. No caso de Portugal, as PPPs em saúde, que de facto têm bons resultados, bons resultados em termos de qualidade e em termos de custo público comparado, também pouparam dinheiro ao Estado. E
José Maria Pimentel
ninguém sabe se está a ir a um privado ou a um público, não é?
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
E muitos não sabem, efetivamente, não é? Porque de facto vão via SNS, não pagam nada para além da taxa moderadora, na verdade 60% e tal das pessoas estão isentas e portanto, muito provavelmente, nem sequer pagou o taxa moderadora e, portanto, nem se apercebe que o serviço está a ser prestado por uma empresa privada. Perante isto, e perante, aliás, os PPPs que foram lançadas por um ex-ministro socialista, o Correio de Campos, embora tivessem sido, na verdade, todas gizadas e negociadas por o anterior Ministro, que na verdade era do PSD, Luís Felipe Pereira. Mas, seja como for, Correia Campos podia ter colocado aquilo na gaveta ou deixado aquilo na gaveta e não avançava com as PBBs. E foi ele, com bons resultados, portanto temos evidência que mal não foi, ao contrário das PVPs, das quadroviárias. Portanto, perante isto, quando se diz que não, não pode ser, que tudo tem de ser público, isto é claramente um preconceito ideológico. Portanto, o liberal aqui... Eu sei que há liberais que sonham com uma solução utópica em que todo o ensino é privado ou toda a saúde é privada e, portanto, não há sequer qualquer interferência do Estado. Acho que isso aí não se coloca, tendo em conta principalmente qual é o nosso ponto de partida. O nosso ponto de partida é um sistema altamente estatizado e, portanto, tudo aquilo que for um bocadinho menos estatizado do que é hoje, já é ótimo. Portanto, se nós conseguirmos ter um sistema de saúde que conta com o setor social, já contemparo, porque há muitos hospitais que estão concessionados à Santa Casa e a PSS, mas contar mais com o setor privado na prestação de cuidado de saúde, mantendo o modelo de acesso universal, não vamos excluir ninguém, porque não? Mesma coisa com a saúde, se há uma boa escola que é privada e se essa escola funciona bem, para que manter uma escola pública? Porque, não é? Qual é o racional para o fazer? Não há, não existe.
José Maria Pimentel
Sobretudo é, exatamente, não é pragmático, é apenas ideológico. É justamente, é justamente. Há uma discussão, como é que eu ia dizer, muito mais técnica e muito mais formalizada a fazer em relação a isso, no caso concreto. O problema em Portugal é que ela não chega a existir porque há, porque lá está essa barreira ideológica. Agora, é evidente que nos dois exemplos que tu deste, tanto na saúde como na educação, existem limitações à prestação privada no sentido que existem falhas de mercado, existe informação assimétrica, por exemplo, no caso da saúde e basta, por exemplo, os Estados Unidos têm um modelo que gera muitos problemas na saúde por as clínicas, os hospitais estarem construídos para dar lucro agora. E isso em si é uma discussão interessante e eu acho que há muitos méritos na crítica ou na chamada de atenção a essas limitações. Agora, o problema era aquele que tu olhas há bocadinho, é que em Portugal nunca se fala das limitações da prestação pelo Estado, que também existem.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Existem e são enormes porque o setor público e todo o setor empresarial do Estado está preso por um espartilho que lhe retira todo o tipo de autonomias. Gerir um hospital, em primeiro lugar, não é gerir, não é um gestor público, na verdade não é um gestor, é um administrativo. Saem normas e despachos do Ministério e dos diversos órgãos.
José Maria Pimentel
E nas universidades a mesma coisa. São controlados
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
pelo Ministério, nas universidades a mesma coisa, embora agora com o modelo fundacional acabem por ter um bocadinho mais de autonomia, mas não muito mais, a massa salarial está congelada e tem de ter uma autorização para aumentar a massa salarial,
José Maria Pimentel
enfim, há aqui uma série
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
de condicionalismos, seja como for. No contexto também de um hospital, o administrador não pode contratar ou despedir livremente os seus recursos humanos e, portanto, se precisa de ajustar ali a sua força de trabalho não consegue fazer, todos os processos de contratação, incluindo o de compra de medicamentos, são altamente burocráticos, podem demorar dois a três meses, ter de ir ao tribunal de contas e, portanto, a autonomia é muito limitada, não pode fazer despesa de capital, basta ver o que está a acontecer com o Sr. João e com o Joãozinho, a aula para Oncologia Pediátrica, estão limitados, mesmo que pudessem ter dinheiro carecem da autorização não do Ministério da Saúde mas do Ministério das Finanças e portanto de facto não têm autonomia e portanto a questão é, este modelo é reformável, nós conseguimos reformar o setor público conferindo autoridade, ao mesmo tempo conferimos também autoridade, autonomia, ao mesmo tempo que conferimos também transparência e capacidade para garantir que não exista abuso, que não existem todos os ilicitudes que tipicamente existem neste contexto. Não só é complicado, mas a verdade é que já existe um modelo que funciona. E se o Estado conseguir contratualizar de forma a que, tendo em conta o seu custo interno, consiga contratualizar mais barato e garantir que os cuidados ou o serviço prestado seja dele qual for, tenha o mesmo nível de qualidade ou até superior, então aí só tem de se focar na auditoria, só tem de se focar em garantir que de facto aquilo que foi controlizado está a ser entregue. Sim,
José Maria Pimentel
é uma análise empírica e não uma análise a priori, não é uma análise a priorística que condena tudo que seja uma solução privada, até porque como eu dizia há bocadinho, e tu sabes disso obviamente muito melhor do que eu, há problemas que podem surgir numa solução privada, mas há também, em teoria, várias vantagens que podem existir associadas à questão do lucro e da concorrência, desde logo a questão da eficiência, ou seja, o incentivo para a eficiência num privado é obviamente maior do que no Estado, quer dizer, isso não tem nada extraordinário, por muito bem que seja desenhada a solução do Estado, a questão da inovação, por exemplo, são duas, desde logo, como ocorrem, não é?
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Sim, e racionalidade econômica também. Neste momento nós temos um modelo altamente perverso em que compensa ao hospital endividar-se, ter um déficit nas suas contas, porque depois o Estado vai e cobre a dívida acumulada, enquanto que um hospital que tenha tido um superávit vai ter obrigatoriamente de fazer um ajuste. O princípio é, se conseguiste poupar, então vais continuar a ter de conseguir poupar. Exatamente. Portanto, é um sistema pernicioso, quebra toda a racionalidade económica e quebra de facto os incentivos a querer melhorar e, portanto, depende aí, nesse caso, acaba por ser apenas, vai apenas depender da vontade das pessoas que lá estão e muitas pessoas têm imensa boa vontade e fazem milagres com os recursos que têm. Mas o sistema não pode estar pensado para depender da boa vontade das pessoas, não é? Tem de estar estruturado por forma a que por si só consiga dar resposta e portanto não existem incentivos neste momento no contexto das instituições, de muitas instituições governadas, geridas pelo Estado, para que de facto haja mais inovação, para que haja mais eficiência, portanto continuamos a ter imensa ineficiência, tanto nas escolas públicas como nos hospitais, mas acho que no caso dos hospitais é escabroso o que se passa. Sim. Portanto não há justificação para não pensar em outro modelo, sendo que, aliás, em muitos países da Europa e incluindo os Estados Unidos, a maior parte dos hospitais privados são sem fins lucrativos. Não é apenas o setor social que tem instituições de saúde sem fins lucrativos, também existem instituições privadas sem fins lucrativos, esse modelo também pode...
José Maria Pimentel
Como fundações. Sim, sim. Esta discussão é ultra interessante, esta discussão que nós estamos a ter agora, porque isto liga diretamente à questão do crescimento, que falávamos há pouco, tudo isto tem implicações para o desenvolvimento do país, que conseguiste ter uma economia mais eficiente e, portanto, que produza mais recursos e que os aloca de maneira mais eficiente. O que eu acho, a limitação que eu vejo em Portugal é que nós estamos sempre num bocadinho de diálogo de surdos entre duas fações que não se cruzam, não é? E tu tens esta fação que fazes este diagnóstico, com o qual eu concordo, de que... Há um diagnóstico mais geral, quer dizer, nós não podemos estar contentes com o nível ridículamente baixo de crescimento e desenvolvimento que temos tido nas últimas décadas, como é óbvio, e depois há um nível mais micro, quais são as soluções para chegar aí. Agora, como eu te dizia há pouco, eu percebo o outro lado, percebo se calhar duas coisas. Percebo que nós temos um problema de desigualdade de oportunidades enorme, e não cheguei a falar sobre ele, ou seja, há claramente um problema enorme de desigualdade em Portugal. Sim, eu estou de acordo, perfeitamente de acordo. Mas tu tens de ter uma solução, como é que eu quero dizer, o que a direita faz muito, e quando eu digo a direita, a ala liberal do PSD e o CDS fazem muito este discurso, mas como eleitor é fácil de perceber que é difícil confiar que isto... Ou por outra. O outro lado do discurso, o lado da igualdade de oportunidades, tem muito menos peso. E esse é essencial. Não é um discurso bonito sobre isso, é um facto de... Em Portugal, de facto, é um argumento que tem um poder explicativo grande, tu dizeres que há pouca meritocracia. É um argumento com poder explicativo grande, ou seja, entre o aleatório que nós falávamos há bocadinho, que é uma coisa que as pessoas esquecem sempre, mas tem um peso grande, e é uma das razões pelas quais o Estado Social deve existir, é por essa aleatoriedade, E aquilo que nós temos enquanto background económico, o meio social em que nascemos e tudo aquilo que falávamos há bocadinho, independentemente dos extremos identitaristas que são feitos em relação a questões como o sexo da pessoa ou a etnia, a verdade é que isso tem um peso grande, ou seja, se não resolveres este problema, adianta-te pouco resolver o outro porque vais estar
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
a criar uma injustiça na mesma. Estou totalmente de acordo que ainda existem grandes problemas sobre a questão da desigualdade de oportunidades e, na verdade, acho que o que nós temos aqui a falar está perfeitamente ligado com isso. Repara, um exemplo prático. Quando uma criança nasce num bairro complicado, em que tipicamente as escolas a redondeza são também complicados, as suas oportunidades para a vida estão severamente limitadas, porque a escola é má, os professores vão colocar baixa porque, enfim, é complicado dar aulas ali, portanto, isto acontece com frequência, ou seja, estamos a limitar aquela criança porque nasceu, teve o azar de nascer num bairro social mau. Alguém com recursos pega no dinheiro e põe o filho numa escola privada e resolve o seu problema, porque escolhe a escola. No entanto, quem nasceu naquele bairro está condenado, porquê? Porquê que alguém que nasceu pobre há de estar condenado? Porquê que não há de poder também ter a possibilidade de tentar ir para as melhores escolas e há de estar condicionado pela zona geográfica onde vive e onde os pais trabalham. E, portanto, tudo isto, de facto, isto acontece, não é? É a mesma coisa com a saúde. Repara, neste momento quem é que inevitavelmente tem de usar o Serviço Nacional de Saúde e ficarem livres de espera que às vezes chegam aos 4 anos em alguns hospitais. São as pessoas mais pobres, quem tem dinheiro das duas uma ou é funcionário público e tem ADSE, portanto, recorre ao setor privado, ou tem um seguro de saúde e recorre ao setor privado e, portanto, resolve o seu problema. Não está sujeito, de facto, a estas limitações do Serviço Nacional de Saúde. E, portanto, no modelo que nós temos atualmente ele cria, efetivamente, desigualdade de oportunidades. Porquê? Porque há pessoas que conseguem ter tratamentos e cuidar de saúde até pioras E depois há pessoas que não, e a mesma coisa com a educação, há pessoas que conseguem ir para boas escolas e há pessoas que são limitadas às escolas mais onde, do da zona geográfica onde nasceram. E, portanto, de facto concordo, aliás, a esquerda e a direita eu diria que concordam em imensos temas, concordam no diagnóstico de imensos temas. O que não concordam é na solução para esses problemas, não é? A solução da esquerda para isto é dizer, de uma forma um bocadinho autóptica, bom, o que nós temos que fazer é investir mais no SNS, para garantir que as consultas demoram 4 anos e que temos de investir mais nas escolas públicas para garantir que todas as escolas são boas. É mandar mais dinheiro para cima. É mandar mais dinheiro para cima. Isto é uma plena utopia porque haverá sempre, seja no modelo privado, seja no modelo público, haverá sempre escolas boas e escolas más. O que não existe, certamente, no modelo público é a possibilidade de fechar e encerrar uma escola mais, enquanto que no modelo privado o próprio mercado encarrega-se disso. Se as pessoas não tiverem, se não tiverem estudantes, vai acabar inevitavelmente por falir e, portanto, falta isto. Confere bastante racionalidade económica e que, na verdade, ajuda a criar mais igualdade de oportunidade. Eu acho que em relação a este ponto, na maior parte dos liberais estão de acordo quanto à questão do ponto de partida, que todos devemos partir do mesmo, que devemos dar condições para que todos possamos partir do mesmo ponto. Agora, onde cada um chega aí, claro, já vai depender de cada um, não é? Do esforço, do mérito, da sorte de cada um.
José Maria Pimentel
Eu acho isso perfeitamente condizente com a filosofia liberal, mas acho que concordas com o meu diagnóstico e não estou a falar de ti nem de mim, nem de ninguém em particular, mas é verdade que na prática, quer dizer, a sensibilidade social que nós vemos, que não seja a sensibilidade social na orla da social-democracia, que também abarca um bocado o PSD, mas está maioritariamente à esquerda, ou seja, tu não vês... Eu por acaso discordo. Faltam muitas medidas concretas que mostrem às pessoas que a intenção não é ter as escolas privadas para uma elite, por exemplo, mas sim... Diz. Eu
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
por acaso discordo, Eu acho que essa sensibilidade existe. Agora, se tu me disseres a forma como ela é comunicada é diferente, certamente, não é? Até porque o que acontece imediatamente a seguir é tentar, principalmente por parte da esquerda, não é? Isso é uma tática leninista bastante eficaz, é tentar diabolizar logo, tanto a medida como a pessoa. Certo. E, portanto, fazer juízes de intenção sobre a pessoa. O liberal quer que as grandes empresas sejam ricas, quer é apoiar os ricos, taxa nas tintas para os pobres e portanto o único garante para os pobres que continuamos a ser nós, as esquerdas, a direita não quer saber, só quer saber dos grandes interesses, grande capital e tal. E este discurso repetido ad nausium a toda hora acaba por passar e principalmente se do lado da direita houver inação quanto a isso. Se dissemos não, não é verdade, preocupa-nos justamente os pobres e sabemos bem que as nossas medidas, ao contrário das vossas, são muito mais eficazes justamente a reduzir a pobreza, porque enquanto que a esquerda é muito eficaz a redistribuir o bolo, a esquerda não sabe fazer crescer o bolo e, portanto, nós de facto tendencialmente, eu julgo que as ideias que defendemos privilegiam muito mais o crescimento do bolo e, portanto, quando o bolo cresce há muito mais para distribuir. Certo,
José Maria Pimentel
isso eu completamente acordo.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Se nós não estabelecermos isso e não deixarmos isso bastante claro, eu acho que irá continuar a permanecer, a pairar no ar esta ideia de que a direita não gosta dos pobres, queira que toda a gente seja pobre e miserável e a esquerda quer proteger, mas acho inaceitável essa ideia feita absurda, enfim, que prevalece, concordo.
José Maria Pimentel
Eu acho uma ideia em tese errada, mas na prática eu acho que essa carapuça infelizmente serve a muita gente, ou seja, há muita gente que se diz liberal, e aqui falamos sobretudo de liberalismo económico, e depois é mais pro-business do que pro-market, como falávamos há bocadinho, ou tem uma sensibilidade, uma insensibilidade social gritante, ou está à procura de favores do Estado, ou está, por exemplo, contente com o modelo do ensino que nós temos atual que é, parece-me uma má síntese entre dois modelos opostos. Às vezes há casos em que tens boas sínteses. O modelo nórdico, em que é uma economia de mercado com o Estado Social, parece-me uma boa síntese. É um modelo que gera crescimento e gera equidade e é muito esse modelo que eu defendo, independentemente das particularidades. O ensino que nós temos em Portugal é uma má síntese, porque tu tens o ensino numeralmente público e tendencialmente gratuito e depois as boas escolas são privadas. Ou seja, tem um pior de dois mundos. Tu tens um ensino
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
completamente estatizado, está um modelo soviético, não é? Certo, mas tu tens escolas privadas. Quando a colocação dos professores, claro, certo, mas quando a colocação dos professores é feita centralmente no Ministério da Educação todos os anos e o professor, este ano foi dois dias antes, portanto as colocações saíram um par de dias antes e o professor que tem de atravessar, ir de Bragança para Sines fica a saber dois ou três dias antes que vai ter de reorganizar a sua vida, não é? Portanto, isto é absolutamente impensável e eu acho que as pessoas só toleram uma coisa destas porque não percebem que pode ser diferente. As pessoas só toleram ter de esperar meses para uma consulta no Serviço Nacional de Saúde ou para uma cirurgia, porque não sabem que noutros países não existem essas usas e se aspera. Em muitos outros países que têm um modelo diferente do nosso. Portanto, eu acho que é justamente por, eu não queria dizer ignorância, mas por desconhecimento, que a nossa tolerância, que somos, antes de mais, um povo de grandes costumes e somos tolerantes com estas coisas, vai. Mas não deveríamos, claramente que não, não é? Principalmente porque não tem de ser assim. E tu,
José Maria Pimentel
aliás, podias ter... Tu agora ouviste uma coisa, essa questão da centralização, tu podias ter um modelo concorrencial, ou pelo menos semi-concorrencial, dentro do Estado, ou seja, não deixavas ter a
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
previsão pública daquele serviço, mas tinhas de centralização, por exemplo. Claro, claramente sim, podes centralizar a nível dos municípios e pode certamente dar muito mais autonomia às escolas para contratar os seus recursos. O que é que tipicamente eu ouço quando proponho isto? Ah bom, mas depois então aí é que entram os favores, o nepotismo, enfim, a corrupção, etc e tal. A credeção é, nós temos imensas escolas, imensas universidades em todo o mundo e curiosamente, coincidentemente ou não, essas universidades são as melhores pessoas do mundo e portanto não foram colocar lá o filho, nem foram lá colocar o primo, porquê? Porque sabem que se o fizerem vão ser prejudicados por isso. E Portanto, se houver um modelo de incentivos que claramente acabe por beneficiar quem de facto procura o melhor para a escola e depois prejudica aqueles que não o fazem, eu acho que pelo menos isso já seria muito melhor do que temos atualmente, não é? Quer dizer, como é que é possível uma instituição de ensino não escolher os seus recursos humanos, que são o asseto mais importante da escola. E não ter controle sobre eles, é ridículo. Não ter controle sobre eles, quer dizer, um mau professor, o que é que se vai fazer? Vai-se colocar uma... Não faz nada. Não, nada, justamente, não é? Quer dizer...
José Maria Pimentel
Eu já dei este exemplo, eu não sei se tu desculpas em concorrer.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Os cursos que ficam de castigo e vão para o horário zero. Ou então vão dar aulas de apoios. Então é um absurdo, não é?
José Maria Pimentel
Sim, ou então não lhes acontece absolutamente nada. Eu acho já até... Mas foi com o Daniel Oliveira que eu falei sobre isto. Eu andei quase sempre na escola pública, mas eram escolas públicas pela zona em que estavam situadas boas, em Coimbra, e portanto estamos a falar de um percentile relativamente elevado de qualidade das escolas públicas. Eu tive vários professores bons e bastante bons e tive vários professores péssimos. Péssimos! Péssimos! Péssimos não é péssimos enquanto pessoas, é péssimos enquanto professores, naturalmente. Não lhes acontecia nada, e estavam a buscar um mau serviço, enfim, não fazia sentido nenhum. Mas há, para voltar àquela questão da síntese que eu falava
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
há pouco. Mas, a propósito disso, aqui um caso pessoal que eu acho que é interessante. Se eu tivesse a certeza que os meus filhos iriam parar, por exemplo, para aqui ir para o Porto, à escola Garcia da Horta ou Clara, satisfeito da vida, era ótimo que estudassem numa escola pública, porque são manifestamente boas escolas públicas, com bons professores. Agora, a verdade é que existem, e eu também conheço vários casos de pessoas que foram parar péssimas escolas com maus professores, que estão constantemente em baixa e que não lhes acontece nada e, portanto, acabam permanecer lá. Em contraponto, eu sempre estudei, sempre, não é? Mas estudei grande parte num colégio privado por um motivo, porque a minha mãe era professora e tinha dado aulas numas escolas privadas, escolas públicas e, portanto, disse logo não, eu quero te pôr num ensino privado, até porque não era garantido que eu conseguisse ir para uma das boas escolas públicas pela zona onde vivia. E, portanto, ela colocou-me, e aliás eu estudei naquela que tem sempre, todos os anos, a melhor posição, que é a de Nosso Senhor do Rosário, a melhor posição, pelo menos medido na perspectiva dos exames nacionais. E a verdade é que eu recordo-me de ter tido um ou dois maus professores, eram despedidos passar três meses. Portanto, não chegavam ao final do primeiro período, aliás, chegavam ao final do primeiro período, mas depois no segundo ou no terceiro já lá não está. Portanto, havia imediatamente pressão dos pais. Tudo bem que o contexto socioeconómico...
José Maria Pimentel
Quer dizer que os pais estejam sempre alinhados com a escola?
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Claro, naturalmente, mas... Neste caso funcionava bem. Pronto, aqui o contexto socioeconómico também ajuda, porque são pais informados, instruídos e, portanto, é natural que tenham mais pressão. Mas a verdade é que a escola estava sempre atenta, porque sabe que mais notas dos seus alunos é péssimo para a imagem deles. Tens incentivos alinhados, não é? Exatamente, havia incentivos alinhados e imediatamente havia uma ação. No contexto de uma escola pública não há um mau professor, por lá continua, não é? E depois acontece uma coisa ainda mais grave, que é no ano a seguir há novos concursos, ele pode ser relocado para outra escola, a escola não sabe que ele é mau professor e portanto volta, voltam a colocá-lo numa turma, ele volta a ter dano, a causar dano à aqueles alunos, e, portanto, o processo repete-se, não é? Aqui num ciclo interminável em que eles nunca saem, na verdade, dos quadros. Portanto, isto não faz qualquer sentido, não é?
José Maria Pimentel
Sim, sim, volta a não ensinar mais uma geração, no fundo é isso que acontece.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Exatamente isso, sim, sim. E há alguns casos com danos que permanecem.
José Maria Pimentel
Sim, sim, claramente. E muitas vezes lacunas, não é? Muitas vezes... Sim, sim, sem dúvida. Já senti isso várias vezes ao longo da vida, quer dizer, um determinado tema ter uma lacuna porque o professor que tive, ou a professora naquela disciplina não era um bom professor e acho que tenho a sorte, apesar de todas essas lacunas serem sempre relativas, tendo em conta que tive a sorte lá de ter pais informados, mas se não fosse isso é que é tanto pior quanto pior o meio em que tu cresces, não é? Portanto, ainda por cima tem esse efeito. Uma coisa que eu já pensei várias vezes a propósito disto, ou seja, a propósito de soluções de mercado para problemas sociais, é que quando tu implementas uma solução de mercado, e agora podemos falar do ensino, podemos falar da saúde ou até de outros exemplos, há um potencial relativamente grande para tu teres perturbações no curto prazo. Ou seja, aquilo no curto prazo funciona mal porque há qualquer coisa que corre mal, a procura de lucro, por exemplo, gera um exagero numa coisa qualquer e aquilo vai parar às notícias. E o que eu noto em Portugal, mas este meu diagnóstico pode ser errado, é que nós lidamos muito mal depois com essa incerteza, ou seja, ao primeiro obstáculo há uma pulsação grande para voltar atrás. E o exemplo dos hospitais se calhar pareceu-se um bocadinho isso. Quando estas soluções, independentemente de poderem ter obstáculos inicialmente, os grandes furtos que elas dão são a prazo, não é no momento um. No momento um uma solução centralista até é melhor, não é? Se tu só contasse o primeiro momento, uma solução top-down centralista piramidal é mais fácil de implementar, tem depois é menos flexibilidade, será menos eficiente e terá uma série de desvantagens a prazo. Mas enfim, mas esta é uma tese que eu tenho, é mais uma hipótese do que uma tese, não é uma coisa que eu tenho muito comprovada.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
O que me parece é que nós somos manifestamente, ou ainda há muito preconceito ideológico, anti-empresas, anti-capitalismo, anti-prestação privada e, portanto, qualquer oportunidade para cair em cima de algo que possa correr mal, porque correrá mal o mercado, há muita ideia de que o mercado é uma coisa perfeita, obviamente que não, o mercado é algo constituído por humanos e naturalmente tem erros e, portanto, coisas falham e as empresas vão à falência, mas essa é justamente a virtude, é nesse processo de falência e destruição, e destruição criativa, para citar aqui um economista relevante, que de facto surgem melhores empresas, liberta-se capital, capital pode ser alocado a negócios que são mais eficientes e que são mais interessantes e que acrescentam mais valor. Portanto, isso faz parte, enquanto que no modelo que nós temos, no modelo estatizado, nunca há oportunidade para existir esta regeneração, quando muito leva umas obras adicionais, mas não muda nada de substancial, de estrutural. E, portanto, a solução do mercado pode claramente ajudar a mitigar muitos dos problemas sociais. Agora, não resolve todos, existem naturalmente e aí sim verdadeiras falhas de mercado. Se existe uma região que não seria minimamente rentável existir um hospital, Dificilmente um operador privado estará interessado em abrir lá um hospital. Mas aí lá está, justifica-se ou a prestação privada ou um modelo de subsidiação que permita instalar lá um hospital privado. Claro, exatamente. Agora, num contexto de competitividade em que a empresa ou o organismo do Estado está inserido num mercado competitivo, o que acrescento tem ser público nenhum, é puramente preconceito. Claro, claro. E o
José Maria Pimentel
modelo que eu acho que, o modelo que eu gostava de ter em Portugal. É um modelo que faz esta distinção que nós temos estado a falar. Porque uma coisa é o Estado enquanto produtor e enquanto regulador, ou seja, o Estado intervencionista, outra coisa é o Estado Social. E, pelo menos para mim, são coisas diferentes. O Estado Social não é independente da eficiência da economia, se quiseres, ou do crescimento potencial da economia não é independente, mas... Pelo
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
contrário, só existe Estado Social se existem condições económicas. Sim, é suposto
José Maria Pimentel
que sim. E aliás, esse é um dos argumentos para... É uma das razões pelas quais nós precisamos desesperadamente de crescimento económico. Acho que era a Isabel Moreira que me dizia que qualquer coisa que o Estado Social era um... Uma coisa que fazia parte da nossa cultura e é verdade, é absolutamente verdade, mas tu precisas de o financiar, ele não surge do nada. Mas eu aqui até falava do contrário, ou seja, quando tu aumentas o Estado Social podes estar a sacrificar eficiência económica, mas parece-me que empiricamente se percebe que sacrificas bastante menos do que se pensaria em teoria. Agora, um facto mais ou menos estilizado, muita gente rejeita isto, mas parece-me mais ou menos incontornável, é que países com maior liberdade económica são países com maior prosperidade. Essa correlação não sendo de 100% é muito forte. Tu percebes claramente que uma economia de mercado gera prosperidade. Portanto, do ponto de vista da... Isto genericamente, independentemente dos casos particulares, mas isso parece-me evidente e parece-me que é uma conclusão que é muito pouco aplicada em Portugal. E Outra coisa diferente é a questão do Estado Social. Outra coisa diferente é qual é a proteção que o Estado deve dar às pessoas e até o investimento, porque a educação é um investimento nas pessoas e a própria saúde, em certo sentido, também é um investimento nas pessoas. E aí, por exemplo, eu até concordo mais, e se calhar faz-me não ser bem um liberal clássico, eu concordo mais com o modelo europeu do que com o modelo americano. Há várias razões que não são óbvias para dever existir um Estado Social forte, desde logo a questão da aliatura, da sorte, que falávamos há bocadinho, para muitas pessoas, as pessoas não, muita gente não pensa na sorte, quando pensa no mérito, naquela questão da meritocracia, não pensa na sorte. Não pensa, por exemplo, na sorte aqui no sentido do aleatório, não é? E não pensa na sorte individual no sentido da sorte genética. Ou seja, a nossa inteligência, o nosso QI, ou a nossa inteligência, as nossas capacidades, são em certa medida uma grande sorte, não é? Ou seja, podíamos ter saído mais perto, podíamos ter saído menos perto. E depois ainda há aí outro, ainda há outra variante desta sorte individual que é o tempo e espaço em que tu nasces. Um tipo como o Cristiano Ronaldo, por exemplo, ele teve uma sorte enorme em ter nascido quando nasceu. Em qualquer outro momento da história, que tu podias fazer simulações de outras realidades, que ele nunca teria o sucesso que tem agora, não
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
é? Mas eu acho que no caso do Ronaldo, e não entrando aqui no futebol, pá, que eu tenho uma máxima que eu tento sempre cumprir, que é eu adoro ver futebol, adoro jogar futebol, detesto discutir futebol. Porque as pessoas ficam completamente
José Maria Pimentel
insana. E não acrescenta nada.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
E o nível de irracionalidade não acrescenta nada e tal. E meia hora a discutir futebol e a discutir um fora de jogo, enfim, por uma conversa que depois fica completamente estéreo. Mas seja como for, eu acho que o Cristiano Ronaldo é um bom exemplo, comparativamente com o Messi, é um bom exemplo de quem chegou onde chegou por causa do trabalho dele. Ah, certo. Porque é o primeiro a chegar ao treino, é o último a chegar ao treino, porque o homem não para, ele está constantemente a treinar. Enquanto que o Messi nota-se que há ali um talento natural e, portanto, aquilo estar mais ou menos nos genes, obviamente...
José Maria Pimentel
Mas a determinação também está nos genes.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Trabalho físico e determinação, claro que sim. O Ronaldo tem uma capacidade de trabalho absolutamente estrondosa. Portanto, ele é um exemplo que ilustra bem que, pelo trabalho, pelo esforço, consegue também não diria ditar por completo o destino de cada um, mas pelo menos tentar influenciar a sorte por meios ou dados. Em relação à questão dos Estados Unidos, aquilo que eu vou dizer, Acho que vou perder alguns amigos liberais, mas é um facto, é uma circunstância pessoal que de facto aconteceu. Quando terminei o meu primeiro curso, antes de tirar a economia de Engenharia e Informática, aí exerci, depois é que fiz o, quando voltei mais tarde, é que fiz o mestrado em economia. Antes disso, eu fui, logo terminei, fui trabalhar para os Estados Unidos, para a Califórnia, para Silicon Valley justamente, e a verdade é que eu saí de lá mais europeista e recorrentemente tinha muitas conversas com uma alta bastante conservadora E na verdade, na altura, eu ainda estava num processo de descoberta do meu posicionamento político, portanto, aqueles dois episódios que eu referi no início da entrevista não tinham acontecido. Mas a verdade é que eu saí de lá bastante europeista e com um certo orgulho naquilo que é o nosso modelo de apoio a quem precisa. Dito isto, eu acho que os Estados Unidos têm do melhor e do pior. A capacidade, o comunitarismo que eles têm, a sensação de comunidade, de entreajuda voluntária que eles têm é incomparável com a que existe na Europa. De facto, eles mobilizam-se para ajudar quem precisa. Não têm a mesma rede, a mesma safety net montada, claro que não, deixam muita gente fora nos cuidados de saúde. Na educação não têm, porque existe uma rede de escolas públicas, portanto pelo menos o ensino, aquele equivalente ao ensino obrigatório, até o high school, está garantido, depois o universitário é que não, aí é que eles têm que se endividar e endividar substancialmente. Mas no caso da saúde eles deixam muita gente fora e noutro tipo de apoios sociais também, mas a verdade é que depois o termo entre ajuda dos americanos. Diretamente o anonymous website é uma pessoa muito, muito grande. Exatamente, exatamente. Aliás, é curioso porque as sociedades do Norte da Europa são extremamente individualistas. Já tive esta conversa com dinamarquês e eles diziam que eles têm um estado social forte porque não querem se preocupar com os outros. Isto é, eles querem ser deixados em paz, querem que tudo funcione, para que cada um possa gerir a sua vida e não terem de se preocupar com...
José Maria Pimentel
E é um bocadinho essa lógica, sim, sim, absolutamente sim. Até porque lá está, porque o coletivismo tem limites, não é? Ou seja, nós culturalmente somos mais coletivistas, mas aquilo que os sociólogos chamam coletivismo no sentido sociológico é a tua família e os teus amigos, por razões óbvias, porque tu não podes chegar mais longe. Portanto, as redes de entre-ajuda que nós temos são redes locais,
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
não funciona a um nível nacional. Justamente, os Estados Unidos, elas extravasam essa rede mais próxima, o que é curioso.
José Maria Pimentel
É, mas isso é o Ofsted, que é um sociólogo que estuda essas questões e de quem eu já falei montes de vezes no podcast, ele distingue uma das dimensões, é individualismo e coletivismo, como tu dizias, tanto os Estados Unidos como os países nórdicos, por exemplo, são individualistas, e o individualismo faz-te... Os países individualistas são mais sensíveis às necessidades de quem está distante deles, enquanto que os países coletivistas, como nós, faz com que nós sejamos muito próximos e muito sensíveis, muito empáticos com a nossa família, e aqueles que nos são próximos, mas muito insensíveis em relação a quem está longe. E isso, por exemplo, é uma das razões, acho eu, pelas quais temos o problema da desigualdade étnica, se quiseres, em Portugal. Ou seja, de teres, não haver negros, por exemplo, em empresas grandes ou mesmo no parlamento é um caso ou outro raro, quer dizer, tens uma espécie de problema a céu aberto que não está reconhecido. Mas o caso dos Estados Unidos é giro porque eu acho que ilustra, comparar os Estados Unidos com a Europa, ilustra muito a relação entre a dimensão do Estado Social e o perfil do Estado Social e o dinamismo da economia. Como eu dizia há pouco, essa correlação, ou seja, a medida em que o Estado Social limita o crescimento económico, acho que é bastante menor do que os escritos iniciais liberais achavam que iria ser. Mas ainda assim claramente existe e é um desafio grande. Eu lembro-me de quando estava a gravar esta série, acho que o Daniel Oliveira, que ele me falava da questão do mérito e chamava a atenção porque o mérito tinha um... Mas é essa carta da meritocracia que aqueles que, como nós, dizem liberais, estão sempre a falar é uma coisa que vale muito pouco na prática, ou seja, traduzindo isto para a estatística tem um coeficiente disso na equação é muito baixo, ou o poder explicativo disso é muito reduzido. E ele usava isso como justificação para existir um Estado Social. Nos Estados Unidos eles acreditam o contrário, naquela questão do locus de controle que eu falava há bocadinho, ou seja, a mentalidade americana é uma mentalidade de que tu podes influenciar muito a tua vida. A verdade é que a tua influência sobre a tua vida, em qualquer caso, provavelmente é menor do que, por exemplo, o americano médio pensa. Mas ao mesmo tempo tu tens uma relação dinâmica entre as duas coisas, ou seja, se tu imaginas um Estado Social absoluto que, no fundo, te ampara todos os golpes, isso vai diminuir ainda mais o coeficiente dessa questão da meritocracia. Ou seja, quanto mais tu achares que ela não existe, menor ela será. E ao ser menor, ou seja, quanto mais convencidas as pessoas tiverem de que não têm esse locus de controle, de que esforçarem-se mais ou serem melhores, vai produzir melhores resultados para
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
elas próprias, sendo
José Maria Pimentel
que em Portugal é um facto, e isso eu reconheço à esquerda como dizia há pouco, que as outras variáveis na equação têm um peso, têm um peso enorme, ou seja, o meio em que tu nasces, econômico, e mesmo aquelas questões identitárias do sexo, da etnia e uma série de coisas. Eu não sei se nós concordamos ou não nesse aspecto, eu acho que o identitarismo é levado muitas vezes a um extremo e sobretudo é uma... Como filosofia é contraproducente em vários aspectos, agora tem o mérito de assinalar coisas que estavam mais ou menos na sombra, que é o facto do teu sexo, da tua etnia, de uma série de coisas, terem obviamente um impacto nessa tua equação de sucesso material, ou seja, o teu sucesso material tendencialmente é determinado por isso. Aquilo tendencialmente é a chave, acho eu, numa lógica individual para perceber qual é a resposta que se dá para isso, porque é muito diferente ser tendencial ou ser determinístico.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Enquanto posição de princípio, se aquilo que nos acontece na vida fosse perfeitamente determinado pelas nossas ações, então, enquanto liberal acredito na responsabilidade individual, portanto na responsabilização individual e diria que se nós, por algum motivo, temos um estilo de vida pouco saudável e depois surgem as consequências disso, então temos que ser nós a cobrir esse prejuízo, não é? E temos que ser nós a pagar por isso. Agora, eu concordo que não é assim que as coisas acontecem, não é? Portanto, existe aqui o efeito muito grande do meio ambiente, a genética, seja o que for, as áreas da vida e que de facto pode acontecer que qualquer um de nós, por muito saudável e muito responsável que tenha sido na sua vida, tenha um desaio. E portanto aí, claramente, eu acho que é de haver o espírito de ter ajuda, não sendo voluntário, então, sendo o Estado a ajudar e justamente a apoiar aquelas pessoas que estão num momento mais debilitado, não é? Eu acho que os americanos, eu concordo com a tua visão, de que de facto os americanos atribuem muito do desenrolar da vida, atribuem muito isso a uma lógica de mérito ou desmérito pessoal e como tal têm, se calhar, são menos propícios a querer ter um status social justamente que vai acabar por apoiar as pessoas que simplesmente não queriam saber ou foram irresponsáveis
José Maria Pimentel
ou descuidaram da sua vida. Sim, eu acho que tem muito a ver com isso, não tenho a certeza, mas a minha intuição é que tem muito a ver com isso.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Em relação às questões identitárias, antes de mais isso é um enorme coletivismo, não é? Porque eu não vou julgar nenhum indivíduo porque ele é negro, ou porque ele é judeu, ou porque ele é mulher, não é? Eu julgo o indivíduo por aquilo que ele é. E portanto, tentar criar aqui grupos que, pegando numa característica que ainda por cima é uma característica física e através dela tentar tirar conclusões políticas, eu acho que é muito perigoso. Dito isto, não quer dizer que não existam, obviamente, casos de racismo, casos de discriminação e que esta não seja a posição de partida para aquilo que muitos hoje tentam fazer para tirar dividendos políticos, isto é, usar o identitarismo político de uma forma positiva, não quer dizer que não seja feita de uma forma negativa, que existe de facto, existe o movimento identitário, que tipicamente era da extrema-direita, nazi, dos white supremacists, que desconsideravam todas as outras etnias ou como eles dizem, raças e as tomava por inferiores. Portanto, e se existia agora passar daí e fazer o seu exato oposto e tentar pegar em classes identitárias e daí tentar distrair dividendos políticos, eu acho que é extremamente perigoso e é curioso ver como, na verdade, os marxistas são, aliás, contra esse modelo, portanto os marxistas mesmo clássicos estão preocupados, sobretudo, com uma luta de classes, portanto é uma luta de classes que é uma luta econômica e não é uma luta identitária. Toda esta corrente mais identitária associada à esquerda surge mais tarde, surge com Gramsci, surge não diretamente mas Foucault quando começa a questionar as estruturas de poder, depois derrida com o desconstrutivismo e com as correntes que não origem ao interseccionismo e com esta ideia de que a luta, uma feminista tem de ser também alguém que defende as etnias negras, os muçulmanos, etc. Portanto, é preciso pegar em todos estes grupos minoritários para fazer aqui a revolução. Portanto, morre a revolução econômica, aliás, no maio de 68 é justamente isso, os alunos estão na rua, os estudantes estão na rua, não sabem bem porquê, não é uma luta econômica, não é, não é uma greve geral, não são os operários, são estudantes, e estudantes até de classes que estavam bem da vida, estão ali a manifestar-se, não sabem bem porquê, portanto morreu a luta de classe, morreu a luta económica, portanto o que lhe sucede é esta coisa um bocadinho assustadora em que os argumentos políticos que são dados são argumentos de cor de pele. Nós tentamos acabar com isso e portanto no limite chegar ao indivíduo e não através de características de grupo tentar concluir sobre o indivíduo e nesse momento estamos a retroceder e fazer exatamente o oposto. Estamos a dizer ou votem em mim, que eu sou chinês e os chineses são um pouco representados em Portugal, não obstante de facto existir essa discriminação negativa. Atenção, uma coisa não impede a outra. Repara que
José Maria Pimentel
primeiro, é verdade o que tu disseste, os marxistas clássicos acham que isto é uma uma invenção de, não sei, não me preventure que é uma invenção de privilegiado, mas que se está... É
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
uma preocupação da verdadeira luta, está a desvirtuar a verdadeira luta, que deveria ser sobretudo económica.
José Maria Pimentel
Exatamente, está a desviar a atenção daquilo que realmente interessa. Agora, eu acho, eu já tive esta discussão com o Pedro Lomba, mais ou menos sobre isto, eu acho que não só o Marques tinha parcialmente razão, evidentemente, independentemente de uma coisa ser o diagnóstico e outra coisa ser a solução, como neste caso, do ponto de vista do diagnóstico, esta corrente veio chamar a atenção para coisas que estavam, não digo que não estivessem presentes mas que estavam pelo menos um bocadinho afastadas e que têm nessa equação que eu estava aqui a lançar há pouco do SESI, que é uma equação feita na média, isso é importante, isso é que é preciso nunca esquecer, são variáveis que têm peso, e a questão é, elas têm peso na média, e tu dizes, têm peso na média, não têm peso no... Mas isso não nos diz muito necessariamente em relação ao indivíduo, não é? Ou seja, tu podes ter... Alguém ser mulher, por exemplo, a pessoa até pode concordar e há quem não concorda com isto. Eu acho que, embora eu não ponha o coeficiente dessa variável tão alto como muita gente que está mais à esquerda nesse tema, claramente eu acho que existe poder explicativo no sexo da pessoa, por exemplo, tendencialmente, em média, um homem tem mais probabilidade de ter... Tem o caminho mais facilitado, se quisermos, para ter sucesso material, mas isso, para o indivíduo, tu podes ter uma mulher que foi muito mais beneficiada do que um homem, ou seja, se tu só olhares para uma pessoa isso não te diz muito.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Mas esse é justamente o paradoxo, não é? E curiosamente, o que é que diria um marxista se alguém está a defender, por exemplo, que haja cotas raciais para entrar numa faculdade e entra um estudante negro que é rico e um estudante branco que é pobre e fica à porta. Portanto, esse tipo de paradoxos são gerados justamente por isso. Agora, atenção, mas aqui a questão é, existem de facto opressões a determinados grupos, isto é, existe gente que discrimina justamente com base nessas características coletivas de grupo, existe gente que diz, os negros são isto, eu sou aquilo. Não é isso que está em questão, eu não nego isso, obviamente, sabemos que isso acontece. O que eu questiono é a resposta a isso ser, votem em mim porque eu sou negro. Por exemplo, acho que isso não é uma resposta adequada, não é? O que nós temos de fazer é dirimir justamente todo o tipo de pessoas que tentam apropriar de características grupais de uma forma negativa e dizer, não, o indivíduo nós julgamos não por uma pertença, ainda por cima em características completamente inopas politicamente, ou que deveriam ser inopas politicamente, como a cor de pele, nós julgamos não com base nessas características, mas sim com base naquilo que é o indivíduo e que são as ideias do indivíduo. E
José Maria Pimentel
muitas vezes não estás a neutralizar essa característica, não estás a neutralizar essa variável, estás a virá-la ao contrário. Pois
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
é justamente isso, avalio-me o meu destaque. Em vez de dizer, não, isso não é relevante num contexto político e social, vamos esquecer essa variável. Mas esquecer também não é a solução. Se é negro, por que não? Seria bom sinal, se nós deixássemos de falar disso, seria provavelmente sinal de que já não é um tema para mente, não
José Maria Pimentel
é? Certo, mas não se corre espontaneamente, não é? Ou seja, o mérito que eu reconheço, e provavelmente tu não concordas comigo, mas o mérito que eu reconheço nessa ação é que há um problema que não estava adequadamente identificado, é um problema que é preciso ser resolvido e tu não resolves um problema na lógica do indivíduo, ou seja, qualquer problema que tu resolvas, tu tens sempre que ter uma agrameação de pessoas.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Não, tu resolves um problema, É um problema cultural, sobretudo, não é? Se tu tens uma sociedade. Eu não acho que seja o caso de Portugal, sinceramente. Existem indivíduos racistas, aliás, ainda recentemente um amigo que… aliás, não é amigo, ele é sobrinho de uma amiga Minha, eles são brasileiros e ele estava alguns num café e deliberadamente dois tipos se meteram com ele e até lhe deram um muro. Estavam mesmo à procura de confusão e no final um deles disse porque eu sou skinhead e tal. Enfim, portanto, esse tipo de episódios existem e não é isso que está em causa. Existe de facto xenofobia, discriminação e também existe algum racismo, eu não acho que isso seja transversal à sociedade portuguesa. Há quem tente vender essa ideia, são todos racistas, são todos machistas, acho isso um efeito absurdo, uma generalização absurda. Sim, Eu concordo, acho que
José Maria Pimentel
está muito abaixo disso, sim.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Esses fenómenos existem. Eu não acho que a forma de os resolver seja passar de uma discriminação negativa para uma discriminação positiva e dizer ok, agora vamos com uma espécie de compensar o passado e agora vamos criar cotas, uma espécie de apartheid virado ao contrário, vamos criar cotas para compensar o dano gerado. Não, o que devemos fazer continuamente é, a nível cultural, social, clarificar o absurdo que é julgar alguém pela cor de seu apelo, pela sua religião ou por outra característica qualquer de grupo, que não faça qualquer sentido. Nós julgamos as pessoas por aquilo que elas, aquela pessoa em particular, defende. Esse deve ser o princípio. Tudo o que desvirtua este princípio eu não posso concordar e, portanto, colocarmos cocas em que estamos a avaliar o mérito da pessoa porque ela pertence a um determinado grupo, não posso em algum momento concordar, não acho que seja uma solução, não se corrige um mal com outro mal, portanto não acho que essa possa ser uma solução.
José Maria Pimentel
Aí já estás a falar na solução, e o que é que era outro? Sem discutir. Mas eu estava a aludir à questão da maneira como isso é acionado. Para tu provocares uma mudança social em relação a um grupo desprivilegiado, essas pessoas têm que se unir e manifestar-se. Os trabalhadores não eram só trabalhadores, porque os trabalhadores que se manifestavam tinham outras coisas que os beneficiavam, mas personificavam uma injustiça social que claramente existia. Depois outra questão é como é que tu corriges, isso é uma questão muito diferente e qual é o método certo e se ao corrigir não estás a criar outra... Sim, eu estou a dizer que isso tem
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
de haver a ação coletiva. Eu,
José Maria Pimentel
Por muito que nos custe, eu acho que historicamente e até do ponto de vista da maneira como os seres humanos interagem e como a sociedade funciona, tem que acontecer assim. Outra coisa diferente, e para caso essa é a minha principal objeção à
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
identitaria. Eu não consigo, isso é uma visão muito platónica da coisa, não é? A ideia de que as pessoas são muito pardas e que precisamos de um rei filósofo.
José Maria Pimentel
Não, eu digo é que as pessoas... A ação coletiva, que é desenvolvida com base num elemento em comum, quando tu vais festejar o campeonato europeu de Portugal, vais para lá porque és português. E, portanto, há ali aquele ponto em comum que é mais ou menos fictício. Fictício isto é, está na nossa cabeça, a própria etnia e o sexo da pessoa está, se pensarmos sob um certo ponto de vista, na nossa cabeça. Ou seja, a ação de um grupo desprivilegiado para provocar mudança tem que ser uma ação coletiva. Outra coisa diferente é que Essa é a minha principal objeção, que é muito diferente tu identificar-se num problema e haver pessoas a manifestar-se para ele, que parece que o problema será alterado, ou aquilo que o identitarismo provoca, que é eu sou definido por esta característica, tu que não a tens não te podes pronunciar, porque
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
se te pronunciarem... Mas é justamente isso, e é isso que acontece. Mas é isso que acontece. Há casos, eu vejo reiteradamente gente a dizer que um gay tem de ser de esquerda, porque um partido de direita em Portugal não defende os gays porque era contra o casamento homossexual, contra a adoção dos gays. Absurdo! Isto estamos a pegar uma característica que é individual, não é? Que é a sua orientação sexual para dictar qual deve ser o seu posicionamento político. Portanto, isto é uma forma de tentar... É um posicionamento, não é? Tirar dividendos políticos. Sim, sim. Isto é, na verdade, isto é uma usurpação e muita gente acaba por ser instrumentalizada sem se apreceber bem, não é? Portanto, o meu problema com os grupos identitários é justamente isso, é esta ideia de que se pode tirar conclusões políticas com base em características de grupo que não perceberem sequer que são características iminentemente políticas. Sim, pelo contrário. Agora, que ação tem de ser uma ação coletiva? Não sei. Em alguns casos teve de ser, por exemplo, na questão da união contra a confederação nos Estados Unidos, a guerra civil foi uma ação coletiva, no sentido em que os Estados do Norte se uniram para intervir no Estado Sul e para acabar com a escravatura. No entanto, em muitos outros casos, essa mudança e os agentes de mudança têm de ser, sobretudo, culturais, não é? Também educativos.
José Maria Pimentel
Mas como é que eles surgem? Como é que essa mudança cultural surge? Atenção, eu não desvalorizo a ordem espontânea como imaginas, e convém tentar capitalizá-la ao máximo, mas é um facto que há uma série de coisas que hoje em dia fazem parte da nossa cultura comum e que foram causadas por... Olha, os sufragistas, por exemplo, o direito de voto das mulheres, não é? As mulheres hoje votam porque houve sufragistas, não é?
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Faça atenção, eu não tenho nada contra que as pessoas se juntem voluntariamente para lutar pelos seus direitos, isto é. Enfim, para não entrar muito em grande detalhe na questão aqui do casamento homossexual, que eu sou aliás absolutamente a favor, a favor no sentido em que ninguém tem nada a ver, muito menos o Estado, com quem é que eu estou, com quem é que eu vivo e com quem é que eu me deito. Portanto, isso é uma decisão da esfera do indivíduo e ninguém tem nada a ver com isso. Mas depois a transposição para a lei e para o Código Civil, isso já é todo um outro assunto, porque na verdade o matrimónio era uma instituição religiosa e depois na Primeira República tem a resposta para a lei, portanto muitos conservadores têm o seu desentendimento justamente aí, não é? Mas seja como for, nessa questão que um grupo de indivíduos de gays se juntem e digam nós queremos, e que façam luta política para viabilizar aquela proposta, não vejo qualquer problema, não é? Eles estão a identificar um problema que lhes é comum, como poderia ser os adeptos do futebol clube porto ou como poderia ser estudantes universitários que têm ali uma causa comum, que se aglutinam e que fazem luta com base nisso. A questão mais complexa do que essa, não é? É basicamente fazer uso continuado dessas características do grupo para nem sequer fazer uma luta específica, mas para usar isso como uma espécie de trunfo político. Exato. Sobre isso é que eu tenho bastante dúvida.
José Maria Pimentel
É ir a um debate político.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Exatamente, até porque senão, até parece, porque o que transparência é que existe ali uma usurpação daquela causa por aquele grupo de pessoas, Quer dizer, nós podemos todos reconhecer, seja um partido de esquerda ou um partido de direita, que existe um determinado problema e tentar encontrar aqui uma solução para esse problema, sem que isso tenha de ser um monopólio de um determinado partido, não é? E portanto, isso, esta usurpação da política identitária é muito propícia a isso, não é? Em que partidos se apropriem delas e digam nós é que somos os grandes
José Maria Pimentel
defensores deste grupo, o que não faz qualquer sentido. É uma lógica de fieldo político, não é? Este é o meu fieldo,
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
não é? Esta é a minha cotada, aqui ninguém se mete. Mas é justamente isso, é justamente isso. E, aliás, a propósito disto, o livro do... Era um dos livros que eu ia recomendar, mas vou me antecipar, do Francis Fukuyama, o Identity Politics, é muito interessante. E ele coloca isto numa perspectiva interessante, explica a origem desses movimentos, não é? Na verdade os movimentos identitários têm a sua género em partidos de extrema-direita, mas era na perspectiva negativa, não era a diferenciação deste grupo, nós somos melhores que aqueles. Aqui é na perspectiva oposta, mas seja como for, é perigoso. Mas, enfim, isso daria para três ou quatro programas. Não gostaria.
José Maria Pimentel
Sim. Outra manifestação disto que já falámos há bocadinho é a questão do discurso, ou seja, que liga à questão da liberdade de expressão e da coação do discurso e da vigilância do discurso e não só, não só, por exemplo, falando da questão do género, não é? Não só o homem tem muita dificuldade em criticar políticas de género, por exemplo, ou seja, tem uma espécie de desconto no mínimo ou no máximo, é de turpar daquilo que ele diz, por exemplo, se for contra cotas, por exemplo, ou uma coisa qualquer do género, independentemente dos méritos, como depois gera um efeito muito curioso, que é aquela questão do virtue signaling, portanto, da sinalização da virtude, em que a lógica passa, e as redes sociais potenciaram muito isso, a lógica passa a ser aquilo que tu dizes e não o que tu fazes, ou aquilo que tu não dizendo podias estar a querer dizer porque pode ser subentendido daquilo que tu disseste, que é uma deturpação própria complicada também, Porque é uma lógica de dominação do discurso, não é? E a pessoa tem que dizer, se não fala da maneira correta e não diz a coisa correta no tempo certo, está imediatamente torcidado. E isso segue muito também esta lógica e essa lógica de, Por exemplo, se não és negro não percebes, se não és mulher, por exemplo, não percebes e por aí em diante.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Isso é a experiência vivida, aquilo que Simone de Beauvoir chamava de experiência vivida, isto é, uma pessoa tem que ser mulher para poder discutir o aborto, isso é um absurdo, mas na verdade é uma ideia que vingou e que vinga cada vez mais, desde que o pós-modernismo tomou conta da atualidade, não é? E, portanto, surge com vários pensadores e, portanto, esta ideia da auto-etnografia e do foco na experiência do indivíduo enquanto fonte de conhecimento, o que ainda é mais perigoso, porque isto aqui já fez a sua transposição para a ciência e, portanto, do ponto de vista epistemológico temos agora quem acha que a experiência do próprio investigador é em si fonte de conhecimento científico, portanto estamos aqui a distanciar-nos por completo do positivismo, em que o investigador era um mero observador, não é? Não era uma entidade ativa e, portanto, surge justamente isto. E a tentativa de controle do discurso e isso também, lá está tal pós-modernismo e muito influência de Foucault, que aliás, eu vou fazendo aqui um parênteses, o curioso de Foucault é que ele começou como um grande radical de esquerda e no final da sua vida quase que se convertia que nem constantista ao liberalismo e, portanto, faz um enorme distanciamento, tenta-se distanciar ao máximo do marxismo e das correntes de esquerda mais extremistas e consegue encontrar ali algumas virtudes, mas seja como for o dano já estava feito e portanto muito do trabalho que ele faz acaba por depois deixar uma lastra considerável e dar origem a algumas teorias um bocadinho mais, enfim, pelo menos questionáveis. Mas, seja como for, o discurso obviamente é um instrumento de poder, por isso é que tanta gente o quer controlar, não é? Exato. E Por isso é que... Sobretudo se tiver uma lógica de que tudo é poder, não é? Exatamente, exatamente. E, portanto, não é por acaso que há a tentativa de controlar o discurso e de tentar dizer o que é que é aceitável e o que é que não é aceitável. Mas isso é uma enorme limitação da liberdade e, portanto, como é absolutamente óbvio, nenhum liberal pode ficar a assistir a isso de uma forma impávida e não reagir, não é? Acho que tem de haver um ponto, tem de haver aqui uma posição de força contra qualquer tentativa de coação do discurso. E devia
José Maria Pimentel
haver, quer dizer, do ponto de vista da convivência social, devia haver uma parcimónia enorme na utilização de adjetivos como racista ou misógino. Isso deve ser usado em casos extremos. Tu usares esse... Isso é típico, principalmente à esquerda, quer dizer, o
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Sacarneira era fascista. Sim. O Sacarneira, a apelidade fascista, qualquer um, qualquer pessoa, qualquer liberal, é frequentemente apelidado, eu já fui apelidado fascista, neoliberal, populista, trumpista, bolsonarista e, portanto, isto aqui, o que for, é o epíteto da moda, não é? Uns dias é um, outros dias é outro. E isto é uma forma fácil de desvalorizar o adversário, uma vez mais, uma tática bastante leninista, não é?
José Maria Pimentel
Atacar o adversário. Até porque, e se calhar, até Giro, até podemos terminar aqui porque vamos a volta à conversa, Esse é um tipo de coisa que tanto a esquerda como a direita conservadora fazem e que eu confesso muitas vezes, talvez das coisas que me tornam mais liberal, pelo menos na intervenção que eu lhe dou, que é a propensão ao julgamento moral dos outros. Isso é, por exemplo, é aquilo que a esquerda em Portugal faz muito, que é se chamar... O juízo de intenções. E se chamar fascista, normalmente é facho até, que é o... Tem, tem. O short-hander. O diminutivo.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
O diminutivo. Eles usam muitas vezes, eles como usam muitas vezes a palavra, tem
José Maria Pimentel
de ser curta, né? Se não dá trabalho. Isso. Mas é um bocadinho assustador, eu tenho vários amigos de esquerda e já os apanhei a usar essa expressão e muitas vezes em relação a alvos que não... Primeiro não merecem o meu mentido, depois chama a fascista de alguém, é um insulto tão extremo. Obviamente que isto é feito informalmente, às vezes, outras vezes não é feito informalmente, mas são coisas diferentes, não é? Não quero passar eu por julgador do discurso, mas quer dizer, é um insulto tão extremo que me faz imensa impressão, e das características que eu acho que mais me levaram, do ponto de vista da personalidade, ao liberalismo é justamente a minha enorme aversão a julgar os outros. Nós somos um ser ultra-social, somos feitos para viver em ambientes morais e nos quais nos estamos a julgar uns aos outros, para assegurar que todos cooperamos. Mas depois isto em sociedade não funciona bem. Nós não evoluímos para existir numa sociedade de milhões de pessoas, evoluímos para existir numa tribo. E isso torna-nos sobre-moralistas numa lógica social.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
O que me parece que acontece é uma pressura muito manicaísta, não é? Que é ao lado do bem e ao lado do mal.
José Maria Pimentel
Exato, isso mesmo. E eu estou
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
do lado do bem e tu estás do lado do mal por diferentes ideias que não são as minhas e, portanto, só podes estar do lado do mal e só podes ser mal intencionado.
José Maria Pimentel
Exato. E isso existe à direita e à esquerda. Isso também acontece à direita. Claro,
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
exatamente. Isto existe em ambos os campos.
José Maria Pimentel
Em Portugal é mais visível à esquerda, acho, por causa do... Também
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acho que sim. Também acho que sim. Essa, pelo menos, é a minha percepção, de que existe muito essa superioridade moral, não é? Essa ideia de que eu é que defendo a virtude, eu é que sou virtuoso, não é? Sou aqui o paladino e defendo os valores superiores. Aliás, o maior exemplo disso é chamar a ética, a ética republicana, não é? Essa tentativa de acantonar princípios éticos num modelo de organização da coisa pública, da rege pública, é muito… é curiosa, mas é sintomática, explica bem como é que tentam imediatamente apropriar-se disso. Isso acontece, acho que é uma pena porque acaba por gerar muito ruído e depois a conversa acaba por se perder, não é? Por isso é que espaços online são absolutamente infrequentáveis para se ter uma conversa. O Twitter, por exemplo, não serve para ter uma conversa cor d'acta, nem é nacional, não é? Que É absolutamente impossível, porque a primeira coisa que acontece é o juízo de intenções, é um insulto e, portanto, não vale a pena, em glório, tentar fazer daquilo um espaço de conversa nacional. Eu acho que se perde muito, mas sinceramente não vejo forma de… Não vejo nem ação individual nem coletiva que pudesse resolver isso, sinceramente. Talvez uma mudança cultural quando amadurecermos daqui uns anos, eventualmente.
José Maria Pimentel
Acho que mais podcast.
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
Mais podcast. Talvez ajudassem.
José Maria Pimentel
Sim, sim. Mais podcast. Porque é antigo do Twitter nesse sentido. Sim, sem dúvida alguma,
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
são conversas ponderadas em que é possível explicar todo o contexto, onde não se fazem juízos premeditados e também o objetivo não é provocatório, enquanto o do Twitter. Isso. Há duas
José Maria Pimentel
coisas que um podcast, ou quem diz um podcast diz uma conversa de um para um não tem. Não decorre num ambiente virtual e o ambiente virtual não tem um monte de características de linguagem corporal que ajudam a clarificar a intenção que tu tens e acontece de um para um, ou seja, não tens pessoas, não tens um ambiente social exatamente junto do qual tens que mostrar que não estás a trair a causa. Antes de passarmos como habitual às recomendações do convidado, deixem-me lembrar-vos que podem apoiar diretamente este projeto através do Patreon, a partir de apenas 2€ por mês. Visitem o site no link que encontro na descrição deste episódio, www.patreon.com.br e vejam os benefícios associados a cada modalidade de contribuição. Se não puderem apoiar financeiramente, o que percebo perfeitamente, podem sempre contribuir para a continuidade do 45° avaliando nesta mesma aplicação em que estão a escutá-lo e divulgando o podcast com amigos e familiares. Muito obrigado pelo vosso apoio e agora de volta à conversa. Obrigadíssimo por teres vindo, foi uma excelente conversa. Se
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
quiseres dizer mais alguma coisa... Não, não é só obrigado eu pelo convite.
José Maria Pimentel
Faltam os livros. E se quiseres dizer mais alguma coisa, está à vontade, agora o espaço
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
é teu. O livro, o livro, um dos que... O que eu tinha escolhido por ter sido um dos últimos livros que eu gostei bastante de ler, foi do Francis Fukuyama, que ele foi, sou político, do Ronald Reagan e também julgo que do Nixon, o Identity Politics, acho que é muito interessante e é um livro bastante contemporâneo porque analisa um tema que é atual. E o outro livro é um livro que também que estou a ler neste momento, que é o livro do Brandon Sims, The Struggle for Supremacy, na Europa, e é muito interessante porque basicamente desde a Pax Romana, que durou cento e tal anos, Portugal, Portugal, a Europa anda sempre continuamente às turras e há aqui um jogo de poder com um tino. De cooperação e poder, o que é curioso, a Oscila entra cooperação e poder e as várias potências, ora se aliam, ora lutam umas contra as outras e eu, apesar de tudo, e porquê que eu escolhi a Estrela? Porque apesar de eu não ser propriamente fé incondicional da União Europeia, no sentido em que acho que ela é perfeita, que não há imensa coisa a melhorar, eu acho que apesar de tudo deu-nos aqui um novo período de Pax do pós-guerra, que foi muito importante. E eu adoro esta visão de uma Europa unida em que andamos de um lado para o outro, onde trabalhamos onde quisermos, onde vamos de férias para onde quisermos e mantemos aqui uma certa paz, harmonia, cooperação, estabilidade, onde os países transacionam entre si, onde toda a gente circula, circulam pessoas, bens e serviços e, portanto, acho que, apesar de tudo, ilustra que pelo menos permitiu ter aqui alguns momentos de paz e de cooperação e que isso é bom, é positivo. Concordo contigo, sim.
José Maria Pimentel
Olha, foi uma excelente conversa. Obrigado por teres vindo. Gostei
[série Orientações Políticas] Mário Amorim Lopes
muito também. Muito obrigado pelo convite. Foi um prazer.
José Maria Pimentel
Gostaram deste episódio? Que parte da conversa vos ficou mais no ouvido? Se puderem, partilhem comigo essa impressão por e-mail para o 45graus.com para que eu possa selecionar esse xerto para o 45graus Express, o podcast onde publico versões reduzidas destas conversas. Obrigado! O 45graus é um projeto tornado possível em grande medida pela comunidade de mecenas que o apoia. Mecenas como Gustavo Pimenta, Eduardo Correia de Matos, João Baltazar, Salvador Cunha, Duarte Dória, Thiago Leite, Joana Faria Alves, João Manzaga, Mafalda Lopes da Costa, entre outros cujos nomes encontram na descrição deste episódio. Até à próxima!