#22 Rui Nascimento Alves - Gestão de recursos humanos

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José Maria Pimentel
Bem vindos ao 45 Graus. Neste episódio estou a conversa com Rui Nascimento Alves sobre o gestão de recursos humanos. O convidado é diretor de recursos humanos na Johnson & Johnson, uma multiracional na área da Saúde, atualmente com responsabilidades sobre as regiões da Europa do Sul e de Portugal, e tem uma carreira que já o levou a passar por vários locais do mundo, o que lhe dá uma sensibilidade particular para as diferenças culturais na área da gestão. Esta é já a segunda vez que trago este tema ao podcast, depois de ter conversado com José Bancaleiro no episódio número 13. Nesta conversa com o Renascimento Aves tentei, portanto, abordar temas diferentes. Falamos, por exemplo, do trabalho em equipa e avaliação de desempenho, talento, liderança, métricas de avaliação, diferenças culturais, políticas de compensação, contratação, entre vários outros tópicos. A propósito, durante o episódio, não estranhe a referência a uma conversa com Carlos Coelho, especialista em gestão de marcas, não foi publicada ainda por um problema técnico que estou a tentar resolver. Uma última nota para relembrar que agora já se podem tornar apoiantes deste projeto através do Patreon, no site www.patreon.com.br. Aproveito para agradecer aos patronos, João Vítor Baltasar e Ana Mateus, pelo apoio generoso. Sem mais demoras, vamos então à conversa com Rui Nascimento Alves. Rui, já estamos a gravar. Bem-vindo ao podcast. Olá, muito obrigado. Boa tarde. Obrigado pelo convite. Nada, foi um gosto. Ainda parecia-me um ouvinte do podcast. É verdade. Bom, nós vamos falar de recursos humanos, que é um tema que já vem a segunda vez ao podcast, é primeiro com o José Bancaleiro. Amigo José Bancaleiro. Exatamente. Tem piada e de certeza que vai acontecer falarmos de algumas coisas em comum e é possível até que eu me lembro de pontos de conversa com ele, se é interessante ter outra opinião, mas aquilo que eu gostava sobretudo de fazer é falar de temas diferentes para acrescentar faça aquilo que foi que foi falado para começar até porque de certeza que depois nos vai levar na direção de uma das algumas das coisas que eu queria falar quase de certeza como ns combinado Acho que faz sentido começar a falar do seu livro, o Segurar Loucos ou Empurrar Elefantes. Fazer aqui um bocadinho de product placement, embora como o Rui explicava, é um product placement altruísta, porque o livro, as receitas revertem a favor da Fundação Sorriso. A maneira como eu entendi o livro, sei ou não sei, o teor lido, isto é daquilo que lhe dei ali das entrevistas do Rui, é que o livro estuda basicamente as empresas portuguesas que saíram bem-sucedidas da crise, no pós-crise, e tem a peculiaridade, ou não tanto assim, de ter uma abordagem, embora se centre em recursos humanos, tem uma abordagem mais estratégica e por isso entrevista os CEOs, os diretores gerais ou o que for, das empresas e não os responsáveis pelos recursos humanos, o que é uma peculiaridade interessante. A ideia foi tentar perceber o que é que as empresas que tinham sido bem-sucedidas faziam que não faziam hoje. Porventura não tinham feito aquelas que não tinham sido bem-sucedidas. O que eu acho que nos deve levar, de certeza, no sentido de uma conversa interessante, sendo que, de um ponto de vista, aquilo que me interessaria mais era aquilo que concretamente aquelas empresas fizeram e, sobretudo, porque eu acho que é aí que está a género de uma boa gestão de recursos humanos, aquela junção de inteligência, ou seja, decisões informadas e coragem, porque a gestão de recursos humanos tem muito a ver com coragem, tem muito a ver com tomar decisões difíceis para os trabalhadores nas alturas certas e decisões difíceis de vender à administração nas alturas certas.
Rui Nascimento Alves
Sim, é verdade. O que me motivou... Eu sempre gostei de conversar, sempre gostei muito de conversar. Nós somos dois. E comecei por ser jornalista há bastantes anos, no início da minha carreira, e portanto eu gosto muito do formato da conversa, da entrevista, da conversa. E acho que fui buscar um pouco disso aliando à experiência, enfim, à área em que trabalho. Portanto, o que eu quis foi conhecer empresas que naquela fase durante, mas no pós-crise de 2011, 2012, 2013, de facto podem ser bons exemplos, podem ser de alguma forma uma referência no que toca à gestão das pessoas em Portugal. Tentei também perceber se existe algum estilo de gestão português. Português? Porque sou sociólogo de formação. Eu creio que há alguns traços que podemos dizer que são portugueses.
José Maria Pimentel
O Wess é sociólogo de formação. Eu sou
Rui Nascimento Alves
sociólogo de formação, embora sempre tenha trabalhado em gestão de pessoas, em contexto de
José Maria Pimentel
empresa, de organização. E depois especializou-se em comportamento organizacional. Sim, tenho feito sempre. E para juntar-lhe outra coisa, que é que como tenho muita experiência internacional, sobre os últimos anos, acabo por ter, aliás, pois é interessante falar sobre isso, o contacto com realidades muito diferentes.
Rui Nascimento Alves
Com culturas muito diferentes. O
José Maria Pimentel
que a existir nos estilos de liderança portuguesa, eu ritava-me o bobo disso para identificar. Enfim, posso-te dar algum contributo.
Rui Nascimento Alves
Posso-te dar algum contributo. Mas voltando ao livro, a ideia foi essa e, portanto, acabei por entrevistar mais, enfim, depois por razão de editoriais só publicámos 30, só, enfim, mas são bastantes, Um conjunto de 30 empresas, algumas delas já foram seus convidados aqui, o caso do Pedro Janel. Exatamente, do Cacho Coelho. Do Cacho Coelho. Sim. Que se destacam pela forma como fizeram, como se aproximaram, e isto tem muito a ver já com a resposta à sua questão. No fundo, perante uma adversidade, o que é que fizeram? O que é que fizeram em relação às suas pessoas? Porque se calhar a fórmula mais comum é reduzirem o seu quadro de pessoas, é cortarem os custos, é despedirem, enfim. E estes, em grande medida, não o fizeram. Estes exemplos não o fizeram. Aliás, encontraram na adversidade uma forma de catapultarem e de desenvolverem os seus negócios. Muitos deles até se internacionalizaram nesta fase.
José Maria Pimentel
Exato, na fase mais difícil. Portanto,
Rui Nascimento Alves
em situações de grande adversidade internacional, enfim, do contexto da organização, acabaram por desenvolver os seus negócios, aproximando-se mais as pessoas. E isto prende-se de alguma forma com aquilo que dizia na sua introdução, é que, aliás, o Jack Welch fala disto, uma das características do gestor eficaz é a sua frontalidade. Essa é frontal? É não ocultar o que se passa.
José Maria Pimentel
Aquilo que eu chamo de kenner software. Exatamente. Em português tem um significado muito
Rui Nascimento Alves
intimamente. Sim, exatamente. E, portanto, creio que foi isso. A grande lição é essa. Claro, depois são 30 histórias muito interessantes, não é? Com 30... E o que me interessou foi isso. Foi não analisar do ponto de vista técnico, processual, de recursos humanos, mas do ponto de vista do líder. Do líder, porque todos eles são ou são os fundadores, ou são diretores gerais, ou são administradores, portanto têm muito do seu estilo na gestão da empresa.
José Maria Pimentel
Claro, têm o ADN, no fundo são muitas dessas empresas
Rui Nascimento Alves
mais próprias, desenvolvidas, criadas, lançadas por eles ou por elas. Foi mais difícil de encontrar líderes femininas nacionais, bastante mais difícil. Esforcei-me para tal, para ter alguma paridade na amostra, mas não foi fácil.
José Maria Pimentel
Há vários aspectos da gestão eficaz dos recursos humanos, desse ponto de vista, do ponto de vista de quem gera empresa como um todo e que tem essa visão estratégica da gestão dos recursos humanos. E estes são até aspectos um bocadinho diferentes, lá está daqueles que eu falei com o José Bancaleiro, que torna isto interessante. Um dos mantras que se costuma ouvir falar é a questão de criar uma cultura de alta performance, uma cultura empresarial. Há vários desafios para isso. Um dos desafios, que eu depois gostava de falar, a questão das métricas, como criar as métricas adequadas.
Rui Nascimento Alves
Mas há outros desafios,
José Maria Pimentel
por exemplo, uma dificuldade é conseguir articular os incentivos e os objetivos individuais de um trabalhador com os objetivos da empresa. E o trabalhador pode ser o trabalhador mais aplicado, o colaborador, o membro da empresa, mais aplicado e mais consciencioso e no entanto não estar a fazê-lo na direção que a empresa pretende, não estar a correr no sentido certo e estar até por ventura a maximizar a sua carreira, mas não a maximizar os objetivos da empresa. Este, por exemplo, é um desafio. O outro tem a ver com a capacidade de compatibilizar a cultura de alta performance, que obviamente implica ter alguma pressão com necessidade de um work-life balance, ou seja, necessidade de mais equidade, de assegurar que existe equidade ao mesmo tempo que existe a pressão suficiente para produzir. E isto no papel é muito mais fácil de fazer do que na prática. E depois até outro aspecto também muito interessante é que é heterogeneidade da empresa, porque uma empresa tem... Em recursos humanos é muito comum, e é uma simplificação que é compreensível, só ver uma solução que é um one size fits all. Uma solução que é esta é a solução é isso que se deve fazer e na prática há pessoas muito diferentes. Na sua opinião qual é que é o maior desafio para criar esta cultura de alta performance? Alta performance no fundo ou de alto desempenho no fundo conduzente ao melhor desempenho global da empresa tendem conto às pessoas que a compõem tendem conto a estas condicionantes que existem e ainda sem falar, ou se quiser pode falar das métricas, mas isso para mim é outro aspecto. Sim, isso é outro
Rui Nascimento Alves
aspecto. Eu creio que é uma receita onde há um conjunto de componentes que eu creio que têm que existir, e que têm que se juntar de forma eficiente, de forma produtiva. Eu acho que, eu entendo que da minha experiência, acho que há um papel fundamental que é ter o estilo de liderança que faz sentido naquele contexto cultural. Acho que é fundamental. Eu já vi e já vivi por dentro processos de mudança iniciados pelo facto de o líder de uma pessoa ter mudado. E, portanto, e com isso ter transformado radicalmente a cultura da organização num curto espaço de tempo, em poucos meses, por uma pessoa. Portanto, acho que A liderança, e se calhar vamos acabar por falar um pouco sobre isto hoje, é determinante. E a liderança mais eficaz faz sentido num determinado contexto, e num determinado contexto cultural. Ou seja, uma liderança que não se adecua a um contexto cultural próprio, digamos assim, pode redundar num fracasso tremendo. E, portanto, esse é um elemento essencial. O outro são, obviamente, enfim, são lugares um pouco comuns, mas a verdade é isto, não é? É que faz toda a diferença ter um conjunto de pessoas com o perfil que mais se adequa àquele determinado contexto, à aquele período, não é? Ou seja, pessoas que são, que têm por um lado a competência certa e por outro a atitude certa. Eu não consigo ter apenas competência e não ter atitude. E o contrário também é verdade. Não consigo ter apenas uma atitude positiva, pessoas que se envolvem, team players, flexíveis, com curiosidade intelectual, mas que depois não têm competência e não têm resultados. Estamos a falar no contexto de equipas de alta performance. Portanto, acho que a combinação destes dois aspectos é muito importante. Depois, aquilo que falava da questão de... É uma empresa, mas há muitas empresas muitas vezes dentro da empresa e, portanto, hoje vivemos um momento em que há esta combinação de múltiplas e diferentes gerações na mesma organização E, portanto, a organização tem os baby boobers, tem a geração X, Y, Z, o que seja, os millennials, e, portanto, nós não conseguimos ser tudo, uma empresa não consegue ser tudo para todos. Eu diria que, mais em contexto de grandes empresas, empresas multinacionais, eu diria que esse é uma angústia que se vive hoje em dia, não é? É de não conseguir... Para conseguir chegar a essa alta performance, a empresa não consegue ser tudo para todos, não consegue oferecer tudo, não consegue oferecer a mesma experiência a alguém que tem 25, 30 anos que oferece a alguém que tem 50 ou 60 ou que está perto da sua fase de pré-reforma ou o que seja. E muitas empresas têm essas múltiplas culturas e múltiplas formas de ver e de ser, digamos assim, na mesma organização. Mas eu diria que há este conjunto de aspectos que concorrem para uma determinada performance, eu diria. Acho que há aspectos fundamentais no mundo, como seja a comunicação, como seja a motivação, o envolvimento de todos. Comunicar, a meu ver, comunicar mais é sempre melhor do que não comunicar, não é? Portanto, É muito importante esse envolvimento, essa frontalidade, essa claridade de qual é o objetivo, onde é que estamos, para onde é que vamos, como é que vamos fazer. E, portanto, muitas vezes preferimos gerir nessa... Prefere-se, por falta de comunicação, por falta de informação, gerir um pouco na ambiguidade. E a ambigüidade gera diferentes visões que não ajudam a que haja um alinhamento de todos.
José Maria Pimentel
Claro, e o trabalho de recursos humanos é um bocadinho… Minimizar essa
Rui Nascimento Alves
ambigüidade. É, exatamente. E trabalhar com todos estes fatores. Num contexto que é cada vez mais de resultados. Um gestor de recursos humanos é cada vez mais um gestor, ponto. Que ajuda a gerir pessoas, não é ele que gera as pessoas. Eu não faço gestão das pessoas. Eu, claro que muito, sou alguém que desenha estratégias, que define novos mecanismos, novos instrumentos, que sou um catalisador, um agente de mudança, mas eu não faço gestão das pessoas. Portanto, eu não sou diretor-geral. Eu não sou diretor de um negócio, não é? Claro, claro. Este conceito tem mudado muito. Em particular, em referência ao que dizia de eu trabalhar em multinacionais e de trabalhar com culturas, eu tenho mais esta perspectiva das empresas fora de Portugal, empresas multinacionais, em que a função recursos humanos, em que as áreas de recursos humanos estão a mudar radicalmente. Estão a mudar muito, de facto. E eu noto isso nos últimos, eu diria, 10 anos. Mas qual é?
José Maria Pimentel
Vindo de onde e em que direção? Digamos assim.
Rui Nascimento Alves
Sobretudo relativamente ao que, por um lado, finalmente a esta passagem da responsabilidade da acção das pessoas ser dos gestores que gerem, que têm as pessoas a seu cargo, que lhe
José Maria Pimentel
reportam.
Rui Nascimento Alves
E, portanto, essa é uma tendência cada vez maior. Ou seja, se o José trabalhar numa organização e tiver 15, 20 pessoas a seu cargo, cada vez tem que estar mais treinado e mais equipado com os instrumentos, com as ferramentas que o vão ajudar nesse sentido. E, portanto, essa responsabilidade é sua, mais do que dos recursos humanos. Por outro lado, as mudanças todas dentro da, chamemos na função, recursos humanos, na área de recursos humanos, que cada vez está mais dotada de tecnologia, das métricas, e que são uma área cada vez menos, digamos, menos subjetiva e menos no mundo das ciências ocultas, mas é cada vez mais uma função de gestão, não é? E, portanto, estamos a transformar muito esta função de recursos humanos, o que é incómodo para muitos dos profissionais de recursos humanos, que preferiam ser mangas de alpaca e gerir processos do que serem consultores internos, do que serem gestores, estão menos confortáveis nesse domínio.
José Maria Pimentel
Claro, porque essa ambiguidade, ele deve ser uma coisa que eu também falava com o José Bancaleira, essa ambiguidade é, por um lado, a grande dificuldade da gestão de recursos humanos, mas também é aquilo que permite depois caminhos fáceis, preguiçosos, digamos assim, porque se é ambíguo e é difícil de medir, então eu digo uma coisa qualquer no ar, vejo para onde é que sopra o vento e digo uma coisa qualquer. E essa questão das... Há um aspecto, está um nível acima das métricas ainda, mas que eu achei interessante falar consigo. Tem a ver com um artículo que eu li no outro dia na Harvard Business Review, sobre uma tendência interessante, que não é propriamente nova mas aparentemente tem estado a ganhar alguma atração nos últimos anos, que é passar de processos de avaliação anuais para uma espécie de avaliação contínua. Isto pode parecer um micro tema, mas na verdade isto é quase a essência da gestão de pessoas. E o argumento, que é de facto curioso, não é rocket science como é hábito nestas coisas, mas é interessante, é que o processo de avaliação anual é um processo que, primeiro, olha para trás. A pessoa está a ser avaliada, tipicamente, já há meses, até depois do ano ter acabado, está a olhar para trás, a avaliar um comportamento e resultados que, porventura, até já nem existem e a gerir sobre uma realidade que até já se pode ter alterado. E enquanto uma espécie de feedback permanente... E outro aspecto também que é o facto de tudo ser muito artificial e aliás uma coisa que o Rui conhece de certeza muito melhor do que eu que é o processo de avaliação é uma que ninguém gosta. Nem os avaliados, nem os avaliadores. Em Portugal, então, porque a nossa cultura é pouco permeável, quer dizer, pouco feita para esse tipo de situação, tem dificuldade com a assertividade que é necessária, o processo torna-se difícil, até porque, lá está, se nós... É quase como um casal que acumula agravos durante vários meses, depois tem uma espécie de conversa final, que obviamente vai ser difícil. Numa empresa é a mesma coisa, se a pessoa só é avaliada anualmente, de repente estão em cima da mesa tantas coisas que já é muito difícil gerir aquele processo, enquanto que uma avaliação, neta de uma avaliação, quase um feedback quase diário ou imediato, permite agilizar muito mais o processo e permite estar muito mais em cima do acontecimento, não é? Sim, sim.
Rui Nascimento Alves
Aliás, no seguimento daquilo que diz, muitas das empresas aboliram, algumas dessas empresas, estou a falar no caso da GE, a falar no caso da PwC, na Accenture também, aboliram por completo a avaliação tal como conhecemos. Portanto, inicial, a meio do ano e final. E logo a GE, ainda por cima, que era conhecida por... A GE lançou, inclusive, uma aplicação, através de uma aplicação móvel, que utiliza um iPhone ou o que seja, em que, basicamente, qualquer gestor ou alguém que quer, digamos, avaliar o comportamento, neste conceito da avaliação 360, ou seja, alguém que queira dar um feedback positivo a outra pessoa, utiliza a sua ferramenta online para poder fazer e, portanto, vai registrando ao longo do ano quase que um track record, digamos, dos factos significativos, como chamamos neste domínio, digamos assim, relativos ao seu desempenho. E é um pouco isso o que o José dizia, não é? Portanto, é retirar essa formalidade de uma avaliação que está definida no tempo para valorizar muito mais uma conversa entre gestor e equipa, uma conversa permanente em relação ao seu desempenho. Porquê? Porque obviamente se eu não tiver essa conversa, quer dizer, é um bocadinho ineficiente, para não dizer estúpido, quer dizer, eu ter tido alguma coisa que devia ter sido corrigida há seis meses, só tem feedback de três ou quatro meses, que não faz sentido. Muitas empresas já estão, a própria Jónson Anjosa, no meu trabalho, já está a pensar num modelo muito direcionado nesse sentido. E isto, quando falamos nestas tendências que têm vindo a transformar as funções de recursos humanos e não só recursos humanos, outras, como no marketing e em outras áreas, têm muito a ver com esta individualização, este conceito do valor do eu e da experiência. E eu, enquanto candidato, ter uma experiência fantástica, enquanto colaborador ter uma experiência fantástica. As empresas preocupam-se cada vez mais na importância dos seus talentos e dos seus contributos, dos seus colaboradores, digamos assim. E, portanto, querem tratar cada um como se fosse único. É verdade, é verdade. Ou seja, Cada um é único, não é? Mas sentir-se enquanto tal. Há aqui um conjunto de tendências, como seja a tecnologia, esse aspecto que lhe mencione da individualidade, por assim dizer, das gerações, que têm vindo a transformar muito a forma como a gestão de pessoas é feita hoje em dia. O próprio conceito de gestão de recursos humanos já é muito limitativo, não é? Sim, é um jargão técnico. É um jargão técnico, não é? Preferimos falar... Enfim, José Bancaleiro fala em ativos humanos, eu falo em gestão de pessoas,
José Maria Pimentel
enfim...
Rui Nascimento Alves
Portanto, há muitas designações ao gestão de talentos, não é? Embora eu entenda que nem todos são talentos.
José Maria Pimentel
Claro, isso... Esse, pois, exatamente, é um espécie de subconjunto... Também era outra pergunta que eu queria fazer. É uma pergunta interessante. Antes disso, só para arrumar este tema, descendo um bocadinho à aplicação prática disto, parece-me claramente que faz todo o sentido, ou seja, que é uma melhoria. Não tenho a certeza, apesar de tudo que seja uma melhoria, sem um trade-off implícito. Por um lado, o feedback permanente também tem as suas limitações, porque é difícil a pessoa no dia a dia ter a noção, por exemplo, da consequência de uma determinada decisão ou de uma determinada ação no futuro. Também não é fácil saber isso. E, por exemplo, algumas empresas têm esses sistemas até de elogio, uma espécie de elogio a colegas e às vezes até a colegas a trabalhar noutras áreas. E isso, por exemplo, eu coloco-me sempre que isso deve enviazar muito o sistema a favor dos extrovertidos, por exemplo, que lidam bem, que falam com pessoas até de outras áreas, enquanto aqueles que são extrovertidos e que não são, nem pior nem melhor, são apenas diferentes e lá está naquela lógica de diversidade. O ideal é ter de ambos, uma empresa só que constrói partidos, não será provavelmente uma boa empresa. Acabam por ficar penalizados, portanto é difícil. Não deixa de ter os seus desafios também.
Rui Nascimento Alves
Sim. Tudo o que existe, digamos, de forma e que possa ser utilizado de forma não sistematizada, digamos assim, depende muito da vontade e até da disciplina de cada um. Ou seja, quando eu digo, olha, deixamos de ter uma avaliação que está definida no tempo, calendarizada, e passa a ser, enfim, a tua avaliação passa a ser o resultado de um conjunto de conversas que o teu gestor tem contigo. Isso vai depender da disciplina do gestor a marcar e a ter, de facto, essas conversas. Ele
José Maria Pimentel
pode ser forçado, se sabe
Rui Nascimento Alves
seja, a fazer. De alguma forma pode ser forçado a fazê-lo. Isso
José Maria Pimentel
até tem outras vantagens. Há muitos problemas, e isto também surge numa altura em que o trabalho em equipa, o trabalho em grupo é quase uma constante, até porque os trabalhos são mais qualificados do que antigamente e por várias razões eles têm que ser feitos em grupo e até às vezes à distância, o que torna mais fundamental isso existir. E este tipo de ferramenta ou este tipo de política força a haver... O feedback podia não haver noutras ocasiões. Muitos dos problemas da equipa têm a ver com não haver feedback. Porque, aliás, quase em qualquer relação, se a pessoa tivesse... Se nós dessemos feedback ao outro, quando nos desagradasse a mínima coisa, podíamos ter ali vários falsos positivos. Mas certamente seria muito mais difícil a coisa descambar. Sim. Porque logo à primeira pisadela a pessoa explicava olha, isso de facto não gostei.
Rui Nascimento Alves
Sim, sim. Muitas dessas mecanismos, dessas ferramentas, procedimentos são muito dependentes dessa frontalidade que falávamos, dessa comunicação permanente, dessa assertividade, que não é característica da nossa cultura, em muitos aspectos. Exatamente. Não é. E, portanto, muitas vezes nós queremos adotar, implementar mecanismos que dependem do conjunto de uma matriz cultural que não é a nossa. E, portanto, importamos uma coisa e forçamos a adotar algo que não é o nosso. Nós, assim como, enfim, não raras as vezes quando fazemos um programa de desenvolvimento com base no modelo da avaliação 360°, por exemplo, e pedimos às pessoas para escolherem quem pretendem que dê feedback sobre o seu desempenho, no sentido do desenvolvimento, as pessoas preferem escolher alguém que sabe que dará informações mais positivas. E muitas vezes eu falo sobre isto com pessoas com quem trabalho e alunos e tudo, de que nós aprendemos, Eu entendo que nós aprendemos muito mais com quem nos dá um feedback muito direto. Não é? Ainda que possamos não gostar, não é? A verdade é que aprendemos muito mais, não é? Somos
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mais desafiados. Claro, exatamente. Com pessoas diferentes de
Rui Nascimento Alves
nós. Exatamente.
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O Rui falava há pouco da questão do talento, que é um tema também interessante. O nome em si, até podem dizer um bocadinho a erro. A minha interpretação é que o talento não é necessariamente uma coisa absoluta, mas uma realidade, ou por outra, mas uma característica adaptada a determinada realidade. Ou seja, eu porventura terei algum talento para podcast, não tenho talento nenhum para pintar. E, portanto, numa empresa, ou seja, num ateliê de pintura, estaria despedido ao fim de uma semana. E portanto, nessa lógica, mas continuando por facilidade a usar o nome de talento, há duas visões para os opostos de um espectro, mais ou menos. Uma é aquela visão, lá está um bocadinho a Jack Welch, que era o CEO da General Electric, da GE, que é aquela visão de nós vamos, temos aqui um núcleo pequeno de pessoas com talento e vamos, e teremos sempre, com a rotação que houver, e portanto vamos sempre descascando. Ele tinha uma política um bocadinho polémica mas que é possível que tenha estado por trás dos resultados extraordinários que eles tiveram na altura que era que anualmente cortavam os 10 piores, os 10% piores, portanto ia descascando os 10% sempre piores, só não iluminava ao fim de 10 anos porque o 10% ia crescendo cada vez menos. Mas era esse tipo de política, obviamente, iam entrando pessoas, embora tenha diminuído muito o quadro de pessoas que lá trabalhavam. Portanto, esta é uma política de há aqui um núcleo muito pequeno, muito reduzido de pessoas com talento, eu quero descobri-las, quero pô-las no lugar certo, com o melhor desempenho, porque aí, no fundo, quero pôr o melhor onze a jogar. E os outros cem jogadores, quero-me livrar deles. E há outra visão, no campo oposto do espectro, e pensai que é obviamente uma massa no meio disto, mas há outra visão no campo oposto, que é toda a gente é boa em alguma coisa, é preciso, de certa forma, aproveitar a pessoa, qualquer pessoa será boa a fazer qualquer coisa, qualquer pessoa terá um... Até eu lá estar num atelier de pintura, podia ser uma a fazer qualquer coisa e o que é preciso é aproveitar. Muito, quer dizer, friamente no sentido de muito honestamente, onde é que o Rui se situa nesse espectro, neste contínuo? Enfim, talvez no primeiro. Ou seja, eu acredito que, enfim, se acharem que eu
Rui Nascimento Alves
tenho talento, eu gosto de cozinhar, não é? Portanto, podem achar que eu tenho o melhor lugar no refeitório, em detrimento da área de recursos humanos. No primeiro, neste sentido, o talento para mim tem muito a ver com o que falávamos ao início de competência e de atitude em ação. Ou seja, Eu não quero ter pessoas que são especialistas em treinado à área, mas que têm uma péssima capacidade de trabalhar em equipa, por exemplo. Tal como não quero apenas o contrário, ser pessoas fantásticas em equipa, que pensem que mesmo a organização é um country club, mas depois não têm nenhum expertise que possa ser utilizado. Portanto, o talento, para mim, tem muito esta ligação entre competência e atitude, entre desempenho e potencial, em ação. Ou seja, tem que ser, como dizia e bem, tem que estar contextualizado, tem que ser utilizado numa determinada necessidade que tenhamos na organização. E por isso entendo que, embora possa ser polémico, entendo que nem todos na organização são ou têm talento. O
José Maria Pimentel
discurso em recursos humanos tem muitas vezes essa pecha da pessoa quase ter que ter que dizer coisas
Rui Nascimento Alves
bondosas. Não, não é isso. Isso Eu não alinho por aí no GoFiz. Exatamente. Fá em GoFiz. As empresas não conseguem investir em todas as pessoas. E, portanto, têm budgets limitados, têm recursos limitados. E, portanto, as empresas que trabalham e têm uma política, uma estratégia de gestão de talento, avaliam o seu talento regularmente e têm ferramentas e instrumentos para tal. Têm ciclos de avaliação de talento ao longo do ano, ao longo do trimestre, por exemplo. E, Portanto, tudo isto, José, a meu ver, tem muito de processo. Ou seja, nós somos melhores quão melhores sejamos num determinado processo, digamos, de gestão de pessoas. E, portanto, não é se deixarmos tudo à boa vontade, não conseguimos ter nada. E, portanto, é óbvio que quanto melhor, mais claro for o processo qualquer que tenhamos de ser um talento. Quão mais habituados estejamos a fazê-lo? E é, por exemplo, a aspectos práticos, a organizar uma equipa de líderes, séniores, por exemplo, a discutir o seu talento. Melhores resultados teremos. E muitas vezes as organizações têm muito esta perspectiva de cada líder, cada diretor, por exemplo, cada líder ter o seu talento e usarem essas expressões muitas vezes, as minhas pessoas. E muitas vezes esse trabalho que nós fazemos é de destruir esse conceito de não são as tuas pessoas. É o talento que é da organização e que é partilhado por todos. E, portanto, tens tanta responsabilidade com as tuas pessoas como com as pessoas do teu par. E, portanto, há ferramentas, há procedimentos interessantes de diálogo, de trabalho em equipa para discutir o talento e para em conjunto se definirem planos de desenvolvimento, por exemplo, nas organizações. Estamos a falar de organizações que fazem isto de forma regular, não é? Mas lá está, quanto mais e melhor fizerem, melhores resultados terão. Nós na gestão de recursos humanos, na gestão de pessoas, o que fazemos são três coisas. Atrair talento, desenvolver e reter. E é isto, São as atividades que nós... É aqui que nós investimos o nosso tempo. E, claro, hoje em dia o talento... Nós hoje estamos muito influenciados, nós nas organizações estamos muito influenciados por um conjunto de tendências, não é? Que já são conhecidas, a questão da tecnologia, a questão da mobilidade, a questão dos aspectos culturais que vão mudando, não é? Quer dizer, hoje o trabalho, não é? O que é isto o trabalho? O trabalho já não é uma coisa onde se vai, não é? Ou que se faz das 9 às 5, quer dizer, ou das 9 às 6, ou o que seja, o trabalho pode ser feito a qualquer hora. A tecnologia permite-nos fazer isso. Eu tenho equipas que trabalham entre meados de projeto e que estão em vários continentes, e que trabalham em horários muito diferentes. E, portanto, alguém hoje, e eu falo muito isto com jovens, fazia isto na semana passada com um grupo de alunos de recursos humanos, em que lhes dizia, quer dizer, vocês estão a competir no mundo, mas também são talento para o mundo. Ou seja, vão estar a competir com pessoas e com talento que está no mundo todo, mas também têm mercado no mundo todo.
José Maria Pimentel
Depende da forma como queiram
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aproveitar essas oportunidades. Portanto, Já não há barreiras, não há barreiras relativamente às pessoas e ao talento e, portanto, podem trabalhar. Nós temos, por exemplo, usamos muito a organização que temos para colocar problemas de gestão a uma rede de talento que não está apenas em Portugal, não está apenas em Espanha, está no mundo todo. E de repente temos a possibilidade, que é fantástica, de ter 140 mil opiniões diferentes, que não queremos gerir porque é muita informação, mas sobre o mesmo problema, o que é fantástico, vamos aproveitar no fundo, é uma espécie de crowdsourcing
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em que se aproveita o talento interno
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e cada vez mais a rede, a tecnologia vão permitir isto, portanto o mundo está totalmente aberto.
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Mas na sua experiência gerindo pessoas e gerindo talento para continuar a usar esta designação, as pessoas... A diferença, por exemplo, entre os top performers e os average performers, por exemplo, é uma diferença de magnitude? Ou seja, é uma diferença substancial ou é uma diferença contingencial? Relativa, quer dizer, não só mais pequena como até contingencial dos... Eu diria que
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nós encontramos, sobretudo, diferenças em soft skills. Nós encontramos... Porque... Enfim... Temos citado muito nestes meios o relatório do Fórum Económico
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Mundial, o Future
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of work e o futuro do emprego, que fala precisamente nisso, quer dizer, nas 10 ou 11 competências que mais se valorizam, todas elas são soft skills, todo o resto é possível treinar e é possível desenvolver. Portanto, respondendo à questão, onde é que está a diferença? Está nisso, está muito nos aspectos atitudinais. Está muito na curiosidade intelectual, está muito na energia, está muito no querer aprender cada vez mais. Mais do que aspectos técnicos ou capacidades ou conhecimentos, está muito nos aspectos comportamentais e nas atitudes. E como é que se faz, como é que se encontra, como é que se deteta esses aspectos, a diferença, e
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como é que se passa ao lado inicial de selecionar as pessoas que os têm e as pessoas que não têm. E depois há o outro lado, que me parece também interessante, e esta aliás era uma pergunta que um amigo meu me sugeriu hoje quando falava desta conversa, é como fazer passar esses aspectos, as best practices, se quisermos, para o resto da empresa, identificá-los naquela pessoa e passar, conseguir ir à origem e passá-los para o resto da empresa. Porque parece uma coisa mais ou menos simples, mas não será assim tão fácil.
Rui Nascimento Alves
Não, não é fácil fazê-lo bem e não é fácil mantê-lo de forma consistente ao longo do tempo. Mas tem muito a ver com a cultura que se quer desenvolver na organização e tem muito a ver com os valores que se quer definir para a organização, eu diria assim, não é? Tem que se comunicar, tem que se falar, tem que se dizer é isto que nós valorizamos, é isto que nós procuramos, não é? Tem que haver uma declaração expressa daquilo que se procura.
José Maria Pimentel
Há uma aplicação prática disso, como estou a lembrar, que tem a ver com o trabalho em equipa, por exemplo. E há um lado, são dois soft skills que envolvem mais ou menos um trade-off, que é a pessoa, há um lado, toda a gente precisa de ser competitivo e, ou por outra, as empresas para instaurarem um ambiente meritocrático, para usar outra palavra que às vezes aqui nos usa um bocadinho erro, mas para instaurarem um ambiente meritocrático têm que instaurar um ambiente competitivo. Mas esse ambiente competitivo dá muitas vezes lugar a um ambiente não cooperativo. Lá está quando é preciso que exista cooperativa. E há muitos setores onde isto existe hoje em dia. Consultoria existe, muitos escritórios de educacia existem imenso. E não são provavelmente empresas sem recursos para gerir recursos urbanos. Portanto, não é por falta de capacidade, não é por falta de disponibilidade financeira, orçamental e no entanto isso continua a existir hoje em dia, não é? Que é uma coisa que se fala, que é como às vezes usar em economia, o jogo de perda para eu ganhar o rui tenho que perder a vice-versa, não é? Como é que na prática, quer dizer, é fácil dizer, bom, é preciso instaurar práticas que levem ao trabalho a equipa, claro que sim, mas na prática, com os constrangimentos que existem, como é que se resolve isto? E porquê é que estas empresas normalmente não conseguem resolver? Não é do interesse?
Rui Nascimento Alves
Se calhar não há nada para resolver. Se calhar isso é deliberado e é intencional.
José Maria Pimentel
Mas isso não é... É um problema de desalinhamento do objetivo. Porque nenhuma empresa quer jogos de soma nula. Sim.
Rui Nascimento Alves
Quer jogos de soma positiva. Sim, eu estou a ser... Estou a ironizar e a provocar porque eu creio que há culturas, nomeadamente na consultoria, onde isso até é estimulado dessa forma.
José Maria Pimentel
No papel é, desculpe-me. Sim, sim. No papel é, mas sempre que falo com pessoas que trabalharam nessas áreas, o que elas contam é que na prática não acontece bem assim. E essa é sempre uma limitação da gestão de recursos humanos, não é? Uma coisa é o que acontece no papel, outra coisa é o que acontece na prática. E na prática, claramente, isso é muito difícil de fazer, porque senão já tinha sido feito. Sim. Parece-me. É difícil
Rui Nascimento Alves
e há uma perda de valor, não é? Nas pessoas que... Esse tipo de culturas que são, digamos... Enfim, muitas delas... Cada vez se fala mais nessa cultura tóxica, diria assim, até... Que criam uma organização de competição permanente, a expressão que utilizava do Luz-Luz, do jogo de soma nula, em que não há... Até podem, numa primeira fase, ser para determinadas grupos sociais e geracionais, pode ser muito interessante, muito atrativo, mas não é consistente, não é... Não se consegue reter talento e pessoas dessa forma, porque vai haver... O modelo esgota-se em pouco tempo. Mas algumas organizações aderiam, se calhar, a sentar aqui a criar estereótipos, mas na consultoria, eventualmente, na banca... Enfim, pode fazer sentido, pode ser esse o objetivo. Sectores, no fundo, são sempre sectores competitivos. Sectores mais competitivos e que criem essa imagem de tubarões.
José Maria Pimentel
E há um lado disso, e isso é muito interessante, porque há um lado... Pode ser propositado. Pode ser, há um lado propositado. E os setores mais competitivos têm uma vantagem, que muitas vezes não é óbvia, e que ajuda a meritocracia, isto é, ajuda a premiar o desempenho, que é o facto de não poderem andar a brincar. Mas não podem andar a brincar. Uma empresa que já é contada pode andar a brincar, ter umas coisas mais ou menos no ar e tal, e soltar as rédeas. Uma empresa num certo competitivo não se pode dar ao luxo de ter pessoas que não produzem. Mas este é o imediato e aquilo que é palpável. Mas por trás daquilo que é palpável, pois existe esse jogo de soma nula em que de facto eu estou a ser avaliado pelo meu desempenho, mas o meu desempenho não é penalizado ou é tratado de igual forma se ele surgir à custa de nada ou a custa do outro. Sim, sim. E aí, vai ser um problema a gerir isso na prática. O... Enfim, esta conversa
Rui Nascimento Alves
sou como as cerejas e acho que é um pouco essa... Não, força, força, a ideia é essa. Não, Eu pensava que neste conceito, quando comentava isso, pensava neste conceito da felicidade das empresas, que está muito em voga, e lembrava-me de uma conversa que tive precisamente com o Carlos Coelho, no âmbito do livro, em que ele me dizia, a felicidade, enfim, passa a expressão felicidade do ténis. Eu não tenho que me preocupar, eu achei interessante a ideia, porque de alguma forma eu concordo, enfim, colegas na área de recursos humanos vão-me comer vivo, mas também durmo bem com isso. O Carlos dizia, eu aqui preocupo-me em dar desafios, em proporcionar desafios às minhas pessoas que as façam correr atrás, que as façam sentir-se vivas, que as façam comer relva, é uma expressão, que as façam lutar pelo seu resultado, pelo seu ganho. Se isso depois as faz felizes ou não, é com elas. Não deve ser uma preocupação minha. Mas isto para ligar àquilo que dizia é que as organizações tóxicas e os líderes tóxicos até podem… são líderes e são organizações de pavio curto. Eu não acredito que no médio prazo sequer consigam gerar uma cultura que retenha as pessoas, que retenha
José Maria Pimentel
o mercado. Eu acho que a chave está aí. Ou seja, o que é que estes exemplos que nós estávamos a dar têm, sem querer particularizar muito aqui, O que é que eles têm de peculiar é que o terceiro pilar daqueles que o Rui falou, da atração, desenvolvimento, retenção, o terceiro pilar é mais fraco e é propositadamente mais fraco, faz parte quase do modelo de negócio. É o modelo de rotatividade, onde as pessoas estão um pouco tempo a não ser que subam e aí as condicionantes são outras.
Rui Nascimento Alves
Sim, eu não sei se é isto que está a querer dizer, mas uma organização é um organismo vivo. E, portanto, eu tenho que em permanência conseguir atrair pessoas e ter sangue novo, e ter novas ideias, e tem que ter uma organização capaz de o fazer. Já trabalhei em organizações em que isso era mal visto. É pá, não, a gente tem que nos proteger a quem... Temos que proteger quem está cá dentro e quem está cá dentro há mais anos.
José Maria Pimentel
Sim, exatamente, é uma visão quase coletivista. Isso também, é tribo.
Rui Nascimento Alves
No contexto, digamos, orgânico, olhando isto da perspectiva orgânica, um ser vivo que não consiga aportar oxigênio e novas ideias e tudo mais, em última análise morre e definha. Assim como tem que libertar recursos, tem que libertar. E, portanto, na minha perspetiva é muito salutar que a organização ganhe talento, falando em talento, e perca talento. E, portanto, a minha responsabilidade é fazer tudo para conseguir reter o talento que eu quero reter. Muitas vezes eu não quero reter certas pessoas. Não quero. Porque mantê-las terá um peso e um custo-impacto maior e mais negativo do que perdê-las. Claro que sim. E aquilo que eu
José Maria Pimentel
não queria deixar cair, aquilo que o Rui falou à voz, parece demasiado importante para nós... Podemos voltar a... Passarmos rapidamente por isso. Não, não, mas até fui eu que me desviei disso. Essa frase do Carlos foi uma coisa que eu já ouvi dizer também. Acho corajoso, diz eu, lá está, porque vai ao arrepio, vai contra o discurso normal nestas coisas, que é, por ver, mesmo não seja usado o termo felicidade, está lá implicitamente, que é o bem-estar, então, dos travesseiros. E essa visão tem algo com que eu concordo e que é até uma ausência de paternalismo, que é dizer, a pessoa tem agência, tem livre-arbítrio, é dona do seu destino e ela é que tem que decidir se está bem ou não está bem. Porque muitas vezes isto, o que acontece naquele discurso fofinha, passa a expressão, é que
Rui Nascimento Alves
depois... Eu uso a palavra fofinha. É?
José Maria Pimentel
Eu acho que é a palavra certa. É fofinha. É divertido. Mas que depois quase uma espécie de marketing de recursos humanos, mas depois na prática, muitas vezes até podem não contar isso, quer dizer, essa felicidade lá está, porque andam a fazer um paternalismo e a admitir que as pessoas ligam a coisas que podem não ligar. E essa maneira é uma maneira orgânica de fazer as pessoas escolherem isso. Depois, há o outro lado que é, obviamente, que há um certo bem-estar que é necessário assegurar, até porque isso é uma maneira de gerir passiva que tem esta vantagem de respeitar o livre-arbítrio da pessoa, mas pode ter a desvantagem de, ao ser passivo, não controlar para, lá está, introvertidos versus extrovertidos, pessoas que possam não ter determinadas características, mas que têm outras pela sua complementariedade, é interessante, Pela complementariedade, ou seja, eu se estivesse uma empresa com uma só pessoa, por exemplo, até podia criar a pessoa X, mas tenho uma empresa com 100 e não quero que todas sejam X. Isto até aliás, até entrou um bocadinho com aquilo que falávamos há pouco do talento. A definição de métricas para o talento e da maneira como eu identifico o talento, mesmo a nível de soft skills, tem que ter isto em consideração. Sim, dúvida. Eu não quero, por exemplo, o meu talento não é toda a gente sabe a falar em público. Isso é bom, mas como há uma correlação entre soft skills, se eu vou querer toda a gente a falar bem em público, depois vou perder alguns pelo caminho.
Rui Nascimento Alves
Esse é um risco, e é um risco que muitos gestores e líderes de recursos humanos correm, que é de criar organizações muito padronizadas à volta de determinados perfis. E muitas organizações não têm essa capacidade de criar as equipas, a diversidade necessária nas equipas. Muitas organizações estão focadas neste contexto da diversidade e da inclusão, que é um tema, é um novo tema, da diversidade e da inclusão, mas focam-no apenas na paridade de
José Maria Pimentel
género, em vez de... Com uma espécie de fim em si mesmo, não como um meio para ter melhores resultados. Exatamente. Em vez
Rui Nascimento Alves
de pensarem na diversidade de pensamento e de mindset, aceitar essa diversidade é preciso, vou usar uma expressão que se calhar ninguém usou neste podcast, que é como os meus colegas espanhóis diriam, é preciso ter luz grande para aceitar alguém que é diferente de mim. Um líder tem que estar muito bem resolvido consigo próprio para o poder aceitar. Alguém que o desafie. Alguém que tenha a capacidade de ir buscar alguém que é melhor do que eu e viver tranquilo com isso. Exatamente. E ver que é possível ser bom de maneiras diferentes. Sim, sim, sim. É preciso estar muito bem consigo próprio. E a verdade é que as empresas refletem os problemas que a sociedade tem, são constituídas por pessoas. Por isso é que é tão mágico, tem tanto de ciência como de
José Maria Pimentel
utopia
Rui Nascimento Alves
esta coisa da gestão das pessoas. Porque não são recursos inanimados, sem vida, e portanto... Mas ter culturas que permitam trazer perfis diferentes, que aceitem essa diversidade, que aceitem o erro, que permitam que as pessoas aprendam com o erro. Muitas vezes isso... Enfim, isso tem limites, obviamente, mas muitas vezes não se faz esse walk the talk, não é? Não se faz. E as pessoas
José Maria Pimentel
percebem isso. E deixarem as pessoas errarem. Exatamente. Esse é o outro, por exemplo. Aquele ambiente que eu falava há pouco, muito competitivo, típico de alguns sectores, é um ambiente... Isto é tudo chamado de anexo televidência, que é conversas com pessoas, não é propriamente especialmente científico, mas admito que não esteja longe da realidade. É um ambiente onde, por exemplo, é muito difícil admitir que se errou. Ou seja, a pessoa vai dar o máximo, quer dizer, faz o máximo esforço possível para não admitir que errou em qualquer coisa. Porque admitir que a pessoa errou é perder um certo capital de prestígio interno. O que lá está é um desalinhamento entre o objectivo pessoal e da empresa. Porque para a pessoa aquilo faz todo sentido, porque está a gente com capital interno e eu não quero parecer... Não há nada que eu possa não saber, não há nenhuma sombra cognitiva ou de conhecimento que eu possa ter, mas para a empresa é péssimo, porque é capaz de haver pessoas... Eu já assisti a coisas deste género, pessoas a fechar-se em copas, a usar todo o tipo de discurso falacioso, às vezes até ao ridículo, para não admitirem que estão a ver um programa de jornal de programa normal. Sem dúvida.
Rui Nascimento Alves
Isso é péssimo. E de facto, este mundo da cultura nas empresas é fantástico, Porque muitas vezes isso permite ter empresas ganhadoras e empresas mais competitivas e que conseguem atingir os seus resultados e aquilo a que se propõe e outras que não, que acabam por desfalecer e por morrer e por desaparecer, não é? Portanto, tem muito a ver com aquilo que os gestores permitem ser possível.
José Maria Pimentel
Agora lembrando-me de uma pergunta que vai também estar lá. Por causa disso que o Rui falou, para além de Jones, eu imagino, quais são as suas referências em termos de gestão de recursos humanos, de empresas na gestão de recursos
Rui Nascimento Alves
humanos? É uma pergunta interessante. Então mas pergunte. Pergunte interessante. Pense e depois no fim, se quiser, falamos sobre. Sim, dê-me algum
José Maria Pimentel
tempinho para pensar, porque é uma pergunta, é uma boa pergunta. Lá no fim voltamos a isso. Vamos falar das métricas, que era o ponto que eu queria falar. Uma dificuldade e uma pecha dos recursos humanos na minha opinião. E aqui até faço uma... Não tenho culpa nenhuma, porque sou uma das pessoas, mas uma crítica geral aos recursos humanos, que é exatamente aquilo que eu dizia há pouco. E já falei com o José Bancalete, também falei sobre isso, que é pela ambiguidade, pela incerteza que está inerente a isto e pelo facto de lá estar tanto uma arte como uma ciência, porque tem que ver, tudo isto tem que ver com pessoas e com interações múltiplas entre pessoas ao longo do tempo em situações diferentes, tudo isto é ultra complexo, faz com que haja uma tendência, uma tentação para seguir caminhos fáceis. E há muitas ferramentas de recurso a menos que depois são vendidas que ou a ferramenta em si é altamente incompleta ou a maneira como ela é vendida não é é pouco profissional e é simplista. Vou dar um exemplo, por exemplo, eu estive aqui, não sei se você ouviu esse episódio sobre psicologia da personalidade com a Margarida Pedro de Lima e nós falámos de um, aquela é um tema que já me interessa há muito tempo, que eu entrei por uma das ferramentas que é muito comum aplicar em ambiente organizacional, que é o MBTI, e depois acabei por me interessar por aquilo, ler algumas coisas e tal, e acabei por chegar ao modelo dos 5 fatores, que foi o tema que nós abordámos aqui, e que é o modelo, de longe, mais aceito na comunidade académica e que está testado em circunstâncias muito diferentes, e é o modelo... Com variantes, porque há algumas variantes sobre aquilo, como é lógico, mas é o modelo aceite. Quando a pessoa vai à realidade empresarial, primeiro, é raríssimo ver aquele modelo aplicado e ver todo o tipo de modelos alternativos, o MBTI, o DISC, há mais, o Enneagrama, há uma data de coisas que... Eu até gosto bastante do MBTI, devo dizer, mas não têm validade científica, não estão comprovados cientificamente. E é bizarro isto, quer dizer, e as pessoas estão a ouvir aquilo e quem está a dar aquelas informações ou o que for, está a expor-se, porque está a dizer, porque é que não está a vender o melhor produto do mercado? Claro que ele era mais difícil de comunicar e aí é que está a chave, o enfoque muitas vezes é, eu vou para esta ferramenta porque ela é mais simples, é mais fácil de comunicar. Se ele o há, mas corre o risco de fazer perder credibilidade. E depois de quem está a assistir, muitas vezes, são umas coisas lá, está fofinhas, umas coisas muito no ar e tal, muito giras, mas não é. Eu não sei se
Rui Nascimento Alves
partilha desta... Sim. Porquê que estava associar isso às métricas? Só para eu responder de forma mais... Ah,
José Maria Pimentel
porque muitas vezes estes modelos são usados exatamente para fazer um apiamento da personalidade das pessoas. E lembra-me disto até há bocado, com o exemplo que o Rui estava a dizer do CEO precisar de ser uma pessoa corajosa e bem resolvida para contratar pessoas diferentes e havia um exemplo que se dava, já não sei com que empresa, não sei se empresa era nomeada, por causa justamente do MBTI, que havia um CEO qualquer que exigia que qualquer candidato fizesse aquele exame, aquele teste, aquela avaliação de personalidade e só queria contratar pessoas de um dos tipos. O MBTI tem 16 tipos, eu só queria contratar, quero o dele. Claro, pois, exatamente. Quero o tipo dele.
Rui Nascimento Alves
Eu quando respondia, quando respondia há pouco, quando falava nisso, ocorria-me essa ideia, não é? De um filme que usava há muitos anos em formação, precisamente com isso, ou seja, em que o chefe de cabelo preto e de bigode só conseguia recortar pessoas de cabelo preto e de bigode.
José Maria Pimentel
Isso é um absurdo. Exatamente, exatamente.
Rui Nascimento Alves
Eu próprio já apliquei ferramentas desse tipo, o DISC, por exemplo, e outras, para criação e constituição de equipas, sempre equipas comerciais, em que só nos interessava ter um determinado perfil, pode ser interessante para nós aqui debatermos...
José Maria Pimentel
É, Gil, exatamente.
Rui Nascimento Alves
Sim, em que aplicámos essa ferramenta a um conjunto de candidatos e só queríamos ter uma equipa constituída com aquele perfil, que era o perfil que nós entendíamos que tinha...
José Maria Pimentel
E isso tem alguma validade, é tensão. Tem alguma validade. E era já agora, acho que muito ruim, queriam diversidade ou pelo contrário queriam... Era uma equipa de vendas, imagina... Era uma equipa de vendas,
Rui Nascimento Alves
sim, e o perfil, apesar de haver diversidade, quanto mais não fosse de género... Claro,
José Maria Pimentel
sim, mas não havia um objetivo de diversidade...
Rui Nascimento Alves
Não, não, não, um objetivo de ter um perfil... Era uma equipa que queríamos de alta performance, digamos assim, e que queríamos testar se aquele... E de facto conseguíamos fazê-lo. Conseguíamos fazê-lo. E, portanto, eu tenho essa experiência de o ter feito. E, portanto, as empresas utilizam essas ferramentas, no fundo, para a avaliação de talento, para assessment. De facto, todas elas andam... Há muita variação, mas estruturalmente todas elas andam à volta dos mesmos conceitos. O
José Maria Pimentel
DISC, para descrever rapidamente, eu próprio já o apanhei, não me lembro de cor das dimensões, mas aquilo tem essencialmente quatro dimensões. Sim,
Rui Nascimento Alves
tem dominância, influência, estabilidade e a… Exatamente, que tem a ver com preferências
José Maria Pimentel
comportamentais da pessoa. Todos eles têm a ver com preferências cerebrais, no fundo. Exatamente, o disso que eles têm é aquele preciosismo, que uma vez tive uma informação sobre isso, e havia o prejuízismo de que aquilo não mede personalidade, mede comportamento. Sim. Portanto, é um nível mais à frente. Sim. E claro, é óbvio que aquilo tem uma aplicabilidade prática, como eu dizia, eu interessei-me por isto exatamente por essa aplicabilidade e tem-na claramente. Agora, o que é facto é que existe um corpo académico feito sobre aquilo e se a pessoa, é óbvio que em finanças ou para as práticas empresariais não são necessariamente feitas pela cartilha, mas tem uma colagem à cartilha. Pode ser uma simplificação relativamente a ela, mas tem uma colagem. Mas obviamente que na prática um tipo não pode estar... Muitas vezes não tem informação toda e há uma série de coisas que obrigam a simplificar. Mas há uma colagem. Aqui, estamos a usar um exemplo específico, mas é um exemplo que eu conheço relativamente bem e que me tem feito pensar, aqui não há uma colagem, ou seja, há uma completa separação e essa simplificação é feita não face ao canone académico, mas face... Todos os museus têm origens diferentes, não é? E eu até ouvi uma vez um relato de um tipo não português que é psicólogo clínico e também tem algum trabalho feito nessa área e ele contava que... Isto ainda está a anotar no YouTube, ele contava que uma vez tinha devolvido um modelo baseado nos 5 fatores, mas que ia para além disso, e que ele tinha conseguido uma capacidade explicativa muito elevada, muito elevada era para aí 30%, mas para este tipo de ferramenta é elevadíssimo, e que ele tinha ido vender aquilo às empresas mas depois não havia aceitação. Porquê? Primeiro porque era mais caro, lá está, não era standardizado, porque essas coisas depois estão muito standardizadas, porque demorava mais tempo e porque, e essa talvez seja um bocadinho também a chave disso, era difícil depois vender aquilo à administração, que eu acho que é uma das grandes dificuldades que tem para os recursos humanos, não é? Sim, sim. Vender, porque a administração lá está, que era também uma coisa simples, não é? Sim. Era uma coisa fácil de gerir.
Rui Nascimento Alves
Sim. Neste momento, posso-lhe dizer que tenho utilizado várias dessas ferramentas, enfim, temos ferramentas múltiplas, mas em contexto de formação de equipas. Ou seja, até formação e até equipas que já existam há algum tempo e que queiram aplicar a ferramenta a si próprio, aos seus membros, aos membros da sua equipa, no sentido de se melhor conhecerem entre si e de utilizarem uma linguagem comum na forma como se podem relacionar. Ou seja, no caso do organ assessment, o disc, o que seja, que utilizam... A ferramenta é utilizada para avaliar determinadas preferências cerebrais dos seus membros e depois poder haver um debriefing sobre isto, uma explicação à equipa de como é que cada um é, como é que a equipa é no seu todo, e como é que podem comunicar melhor e trabalhar mais eficazmente enquanto equipa. No fundo é um processo de... Enfim, no fundo de criação de uma equipa de maior performance. Exato. Mas muito neste contexto de tudo bem, temos aqui 60% dos membros da equipa que são... Então, se por exemplo, se falamos de uma equipa comercial, naturalmente o seu perfil vai ser muito... Uma grande porcentagem dos seus membros terão um perfil muito similar. Se falamos de uma equipa de supply chain, ou de engenharia, ou de qualidade, a mesma coisa acontece, mas terá um perfil diferente.
José Maria Pimentel
Claramente, exatamente.
Rui Nascimento Alves
Mas utilizam muito, e há muito esta preocupação com as equipas que têm trabalhado, de se conhecerem melhor, no sentido de trabalharem melhor. O objetivo não é, ah, eu quero perceber qual é o teu perfil para…
José Maria Pimentel
Sim, às vezes há esse receio, não é? Sim, sim.
Rui Nascimento Alves
Mas há cada vez mais, portanto, muitas empresas começam a ter, já têm esta prática e fazem de forma salutar, eu diria assim. As métricas são outra... É outro tema, não é? É outro...
José Maria Pimentel
Vamos a esse, para agravar a surpresa? Então vá, vamos.
Rui Nascimento Alves
Sobre esse também,
José Maria Pimentel
esse é... Quer dizer, é a eterna... Quer dizer, é quase a chave do problema, como o Rui falava há pouco da importância dos soft skills, como é que se mede, já vimos que é melhor medir continuamente do que medir periódicamente, mas como é que se mede, como é que se consegue definir métricas específicas que consigam avaliar isso de uma forma objetiva, minimizando a incerteza, a ambiguidade, o efeito do tempo ao longo da empresa. Se tiver exemplos, melhor ainda.
Rui Nascimento Alves
Avaliar o quê em concreto?
José Maria Pimentel
Avaliar o desempenho ao nível, presumivelmente, destes soft skills. Hard skills é sempre mais fácil. Por exemplo, uma equipa de vendas, é muito fácil medir as vendas. Pois é mais difícil vender o como, não é? Aqueles dois eixos, não é? O modelo usado, com quatro quadrantes, o que e o como, sabe o erro? Sim, Sim, sim. Quanto é que vendeu e depois outro tipo de... O como são estes soft skills.
Rui Nascimento Alves
É, ou seja, eu já trabalhei nestes anos todos, já trabalhei com modelos muito diferentes. Portanto, nós temos, Eu diria que temos métricas que avaliam atingimento de objectivos, portanto, de negócio, digamos assim, portanto, eu com as equipas que tenho, temos 10 boards, digamos assim, com métricas que são estabelecidas, ok? E portanto, são aquelas que são avaliadas trimestralmente ou em que período seja. Mas, claro que há muitas métricas que estão associadas a talento, à diversidade, a projetos que eram importantes a alcançar e, portanto, que nós avaliamos. Outra coisa, e se bem entendo a questão, são como é que definimos melhor as métricas da avaliação de desempenho, por exemplo, do indivíduo e alguém, não é? E, portanto, posso-lhe dizer que nestes anos todos, quer dizer, trabalhei com coisas muito
José Maria Pimentel
diferentes. Exato, imagino que sim. Muitas com valor
Rui Nascimento Alves
científico abaixo de zero, outras que são um bocadinho mais tangíveis e, portanto, desde modelos mais lineares, digamos assim, que há escalas de 0 a 5, de 0 a 6, de 0 a 9, ou melhor, de 0 eu não diria, mas de 1 a 9, até modelos que são bidimensionais. Por exemplo, quando eu chamo, quando eu digo bidimensional, é, por um lado, avaliamos o atingir de objetivos em concreto, ou seja, objetivos que são os SMART, que são específicos, funcionáveis, alcançáveis e tangíveis, por um lado. E isso é o quê, digamos assim, se é isso que
José Maria Pimentel
tem de bem.
Rui Nascimento Alves
Exatamente. E a outra dimensão que é a forma como eu faço, é o como, não é? Ou seja, que tem mais a ver com compromissos de liderança, que tem mais a ver com uma forma. Mas
José Maria Pimentel
como é que se assegura que isso é avaliado numa empresa, numa multiracional pior, de uma forma objetiva, com diferentes pessoas a avaliar
Rui Nascimento Alves
diferentes pessoas? Nunca é 100% objetivo. Não, claro que não. Essa batalha está perdida logo a partir disso. Sim, acho que está perdida. Mas continuamos, curiosamente, à espera de algum modelo que consiga na sua totalidade. Eu acho que passa muito, José, por definição de objetivos que sejam o mais tangíveis possível.
José Maria Pimentel
Se me conseguir dar um exemplo… Qualquer um, mas para…
Rui Nascimento Alves
Não é fácil dar-lhe um exemplo tangível, digamos assim. Eu posso dizer que, por exemplo, no caso da organização em que trabalho, em que temos um modelo desse tipo de bidimensional, em que por um lado, nos resultados, temos objetivos que são, de facto, implementou determinado programa, atingiu determinado volume de vendas, portanto, é difícil negar, ou seja, são muitos objetivos. No outro lado, que é aquele que lhe interessa, é nesse que me está a desafiar, nós aí avaliamos, sobretudo, comportamentos de liderança. E é em que temos o nosso modelo de liderança, digamos, com um conjunto de aspectos que valorizamos, e aí o que definimos são objetivos. Não são mais do que 3, 4, 5 objetivos por ano, que são mais atitudinais, digamos, que são mais comportamentais. Como é que eu desempenhei a minha função, por assim dizer. Eu desenvolvi pessoas e então aí posso definir um objectivo enquanto líder de ter desenvolvido 3 ou 4 pessoas, de ter participado num programa de desenvolvimento qualquer, de ter sido, por exemplo, se o tinha como objetivo, de ter sido, por exemplo, promotor da imagem da organização no exterior, este tipo de coisas que são idealmente o menos subjetivo das possíveis. Mas nunca é o mesmo que avaliar métricas quantitativas.
José Maria Pimentel
Nunca será. Mas, Ossis, não é possível definir alguma quantificação dentro desse...
Rui Nascimento Alves
Eu creio que é possível. Bastante... Não sei o que pode dizer... Desenvolveu 5 pessoas no nível de management ao longo de 2018.
José Maria Pimentel
Pois, justamente, não é? A dificuldade é... E depois não desenvolveu 3, só conseguiu desenvolver 2. Mas o que é melhor? Ou seja, o melhor é tentar definir, tentar quantificar... Ou, para o efeito da avaliação, o melhor é sempre quantificar. Porque há um trade-off, a quantificação uniformiza e faz com que a pessoa passe a gerir de acordo com esse número, se o objetivo é 5 pessoas, então vou fazer os mínimos para aquelas 5 pessoas porque sei que esse é o objetivo. Está aqui, não é fácil. E, sobretudo, deve ser difícil, num ambiente multinacional, deve ser difícil definir políticas que depois sejam implementáveis em todo o lado de uma organização grande à distância, com realidades culturais diferentes. Sim. Aliás, até é interessante. O Rui tem uma experiência internacional grande e deve ter tido já casos difíceis de implementar. Lá está, cada aquele exemplo que falámos em relação aos modelos americanos, as práticas, determinadas práticas que resultavam cá e depois não resultavam no... Acho que o Rui já andou por Angola, pela China...
Rui Nascimento Alves
Sim, eu tenho tido... Isso tem sido, nesta minha vida, tem sido o caminho, não é? Acho que tem sido... Eu costumo dizer que tenho sido abençoado com isso, porque tem sido, de facto, uma experiência fantástica. Pelo menos tenho a sentido como tal. Desde jovem, trabalhei em Angola. Eu nasci em Angola e, portanto, sempre a história do... Também eu fui refugiado, não era retornado, era refugiado. E depois voltei para Angola muito jovem, portanto com 23 anos e trabalhei em consultoria e tudo mais. Tive essa experiência desde muito cedo e pelo meu percurso profissional sempre tive essa exposição a diferentes culturas, quer todas as culturas da Europa, quer a Europa Ocidental, quer a Europa de Leste, o Médio Oriente, e fui expatriado nos Estados Unidos. Depois, nos Estados Unidos, trabalhei com culturas da Europa novamente e da Ásia, portanto, andia, a China e o Japão. E agora sou novamente despatriado em Espanha, onde estou desde de Janeiro e portanto tenho uma experiência só por sair de trabalhar em Espanha.
José Maria Pimentel
Claro, imagino. É o mais diferente do que se diria. E com espanhóis.
Rui Nascimento Alves
Mas aprende-se imenso. E portanto, de facto, sou um fã das diferenças culturais e a cultura explica tudo.
José Maria Pimentel
Sim, concordo. Culture eats strategy for breakfast. Quem disse isso era o Drucker? Eu não sei. Acho que sou que sim. Nunca li isso na origem,
Rui Nascimento Alves
portanto não sei. E é verdade. Explica tudo. E, portanto... E também explica a forma como nós somos. Enfim, há alguns modelos do Officer e do Trump, a Nars, que são... Que se leem e que são... Enfim, são... Explicam imensas coisas no mundo das empresas e no mundo da sociedade, de uma forma geral, nas sociedades, não é? Como é que nós somos, não é? Porquê é que nós somos corruptos? Porquê é que nós somos machistas? Porquê é que nós precisamos ter um BMW para demonstrar poder? Porquê é que existem as corporações e o poder e o impacto? Porquê é que somos uma cultura ainda com influência da igreja, estes aspectos todos na nossa cultura e que compõem a nossa sociedade.
José Maria Pimentel
Para explicar isso, na raiz, há outra vertente ultrainteressante que é a biologia evolutiva. Quero perceber os incentivos evolutivos que houve e lá está, e a hierarquização. Por exemplo, um grande desafio deve ser... Há um aspecto curioso, eu acho que diferentes culturas estão adaptadas a diferentes realidades. A cultura americana parece que nasceu para trabalhar em ambiente empresarial, Parece que foi feita para aquilo. Por exemplo, a nossa cultura é uma cultura que parece que foi feita para a convivialidade num verdadeiro bom sentido. Ou seja, no sentido da comunidade, da partilha, das relações fraternas na comunidade, não no país, que é diferente. E isso é muito curioso, por exemplo, isso é uma generalização, mas a família, que para nós é um ambiente ultra-natural, um ambiente onde nós estamos à vontade, muitas vezes é um ambiente ultra-difícil para um inglês ou para um americano. Até aqueles que eu percebo que eles se embedam no Natal, porque aquilo é difícil, é uma altura de tensão. Nunca tinha pensado nessa perspectiva. Vão ter com as familias, não se mal o tio que é maluco, tudo aquilo é muito difícil. Mas depois, para o trabalho, parece que aquela questão, lá está, o off-set do que o Rui falava, baixa hierarquia, fluidez de informação. Nós temos uma hierarquização maior, temos esse sentido de tribo, lá está, que pode ser bom para a família, mas é mau para a empresa. Há países, veja, como o Médio Oriente, que o Rui falava, ainda é pior. E como é que uma empresa, como é que um multinacional lida com isso? Porque é uma luta, não é? Não pode forçá-los a adaptar-se tudo totalmente, mas tem que tentar levar alguma adaptação.
Rui Nascimento Alves
Há aspectos dos exemplos que conheço, há aspectos que são inegociáveis, digamos assim, há aspectos de valores da empresa que são os mesmos de forma global, há aspectos da sua cultura que são, e dos seus valores sobretudo, que são imutáveis dependendo de onde se esteja e do país que esteja. E depois há aspectos que são mais locais e que são respeitados, há muitos atundos, até têm impacto e digamos, não tanto impacto, mas têm uma implicação, digamos assim, legal que se respeitam, obviamente, na sua totalidade. Mas é muito interessante ter tido essa experiência de trabalhar e continuar a ter essa experiência de trabalhar, sobretudo, com estruturas matriciais, ou seja, estruturas em que trabalhei e nas quais trabalhava com equipas que não me reportavam e, sinceramente, fiquei tão rotinado nisso que não tinha como reportar. Quer dizer, para mim ainda dava-me igual que se reportasse ou não. Havia objetivos que eram comuns e, portanto, nós tínhamos que implementar o projeto, o que fosse a iniciativa, reportando-me essas pessoas ou não. E, Por outro lado, equipas virtuais e multiculturales, equipas que não estão presentes no dia-a-dia, que nos treina muito no contexto de gestão de pessoas, mas também no contexto de trabalho, de uma forma geral. Ou seja, fazer com que alguém trabalhe para o mesmo objectivo que eu tenho, não estando com ela presencialmente, não vivendo com ela, não a vendo durante meses e fazendo com que isso funcione, é duro. Por vezes é duro, não é? Claro. Desenvolve certas competências. Exatamente. E nós temos competências para isso, de alguma forma. Nós, portugueses, nós latinos, porque utilizamos muito a comunicação. Exatamente. Utilizamos muito essa proatividade na abordagem e na comunicação, de uma forma geral.
José Maria Pimentel
Sim, uma certa inteligência emocional, algum grau de diplomacia.
Rui Nascimento Alves
Sem dúvida, que é determinante. E se não tivermos, certamente vamos fracassar. E muitos projetos fracassam porque isso não existe. Não existe. E há muito esse importar e esse impor de modelos que não funcionam.
José Maria Pimentel
Há aquele caso clássico, o gestor americano que vai enviado para a China, ou para o Médio Oriente, lá está o Paráfrico, ou até para a América Latina, e o tipo chega lá com a sua matriz rígida, a crer que as coisas funcionam daquela forma e aquilo funciona tudo ao contrário. Porque as pessoas lá não funcionam dessa forma. A grande dificuldade de fazer isso deve ser, por exemplo, num ambiente com uma hierarquização elevada, isto é, em que o chefe, aquele que tem responsabilidades nas tuas pessoas, está longe, seja em termos físicos, seja em termos de poder, tipicamente naquela cultura, mas em que há uma empresa que tem uma filosofia diferente, como é que se consegue forçar o meio caminho? Porque se esforça totalmente aquilo esbarra e parte, como nestes casos. Se não se esforça nada também não vai dar resultado porque a empresa não está feita para aquilo e provavelmente o modelo de negócio não é compatível com
Rui Nascimento Alves
aquilo. Na prática deve ser difícil. Não é nada fácil. Sobretudo as diferenças na comunicação. Não é nada fácil. Ou seja, é claro que nos treinamos disso. Eu lembro-me sempre de exemplos de trabalho com os indianos, por exemplo. Eu gosto imenso da cultura indiana.
José Maria Pimentel
É uma cultura interessante.
Rui Nascimento Alves
Muito interessante. Bem diferente da cultura musulmana, obviamente. Gosto imenso dandia.
José Maria Pimentel
É uma cultura que costumamos chamar ética de trabalho. Que é um termo um bocadinho carregado, mas que tem a ver com como preparada a cultura está para trabalhar,
Rui Nascimento Alves
correndo o risco de entrarmos, enfim, de criarmos algum preconceito ou de imagens preconcebidas, digamos assim. Quer dizer, quando trabalhamos muito com culturas diferentes, acabamos por criar estas sensibilidades, mas também preconceições.
José Maria Pimentel
Os preconceitos
Rui Nascimento Alves
existem, se forem usados com cautela fazem todo o sentido. Sim, sim, sim. E treinam-nos, rotinam-nos na forma como trabalhamos. No caso da cultura indiana tem muito a ver com a comunicação, tem muito a ver com o... Porquê? Porque a perca de face é muito pouco tolerada, portanto... Como na China. Como na China. É muito difícil... O não é muito difícil. E portanto, no conceito de equipas de trabalho é muito fácil dizerem-nos, não, não, vamos fazer, isso está feito, mas depois nada acontece.
José Maria Pimentel
Exatamente. Sim, sim, é uma resposta ambígua. Os chineses dizem talvez.
Rui Nascimento Alves
Não, não, eu vou providenciar, providencia mas faz.
José Maria Pimentel
Eu só tenho piada. O ginês tem a do talvez, não é? Talvez é porque não. Talvez no mínimo é porque está muito na dúvida. Mas não é para sim, é para não. É para não fazer. Rui, estamos a aproximar do tempo da nossa conversa, mas ainda havia algumas coisas que eu queria falar. Vamos a isso. Rapidamente, a fechar aqui alguns pontos. Em relação àquilo que falávamos há pouco das métricas, há um ponto que eu acho importante e que na altura não cheguei a dizer o que é. E imagino que o Rui partilhe disto e até talvez tenha tido essa experiência, que é, se uma empresa não consegue definir bem as métricas para mapear, para rastrear, para detectar os talentos, corre o risco de que numa situação de aperto, e elas existem, é normal, não é? Empresas têm altos e baixos, eles vão sair. Aliás, não é o risco, é quase uma certeza, porque o mercado normalmente é bom a valorizar as pessoas e as primeiras a sair são aquelas... São
Rui Nascimento Alves
as melhores. É uma grande coisa de colar.
José Maria Pimentel
E se há uma segunda crise, saem os restantes melhores. Como aquela questão dos 10% de tudo já com eles, mas
Rui Nascimento Alves
ao contrário. Por isso é tão importante, e falávamos nisso, ter qualquer que seja um procedimento,
José Maria Pimentel
um processo
Rui Nascimento Alves
de definição de quem é o nosso talento. Exatamente. E, enfim, alguns modelos mais simples partem desse cruzamento entre performance e potencial, entre desempenho e potencial. Obviamente que se temos lá no quadrante máximo de desempenho e máximo de potencial os nomes que estão lá dentro, eu tenho que conhecer o que é que eles gostam, tenho que saber o que é que eles gostam de comer ao pequeno almoço. Porque se eu não tenho essa informação, eu vou perdê-los. Se eles são, e se estão em posições críticas da minha organização, se alguma das pessoas desse quadrante, é o meu diretor de marketing, é o meu diretor financeiro, e não os consiga agarrar, não os consiga reter, amanhã eles estão na minha concorrência e estão a trabalhar contra mim, não é? Na minha... Contra uma empresa concorrente, não é? Portanto, é óbvio que isto é caricato, que eu estou a brincar, mas não estou. É importante conhecer o que se passa na sua vida, quais são as suas expectativas, o que é que pretendem, vou conseguir ou não responder às suas necessidades pessoais, de carreira, do que seja. O oposto é não fazer nada. Se eu não faço nada, bom, aí então tenho que viver com as consequências disso.
José Maria Pimentel
Isso está relacionado com outra coisa interessante, que é... Há um aspecto que eu acho que é muitas vezes até mal percebido, que é a questão da remuneração. E até às vezes politicamente uma coisa complicada, não é? Ainda agora recentemente saiu uma notícia dos setores mais bem pagos que recebem um absurdo. Agora, o que acontece, isso é resultado, parece-me, pelo menos, de um fenómeno que acontece justamente por causa do efeito do mercado, que é, essas pessoas, esses top performers, esses talentos, que lhes queremos chamar, são aqueles, são os transacionáveis, digamos assim, e ao serem transacionáveis o seu valor vai sendo inflacionado. O caso como acontece com os jogadores de futebol. Porque é que há aquela discrepância tão grande? Não é que o Cristiano Ronaldo seja mil vezes melhor do que o jogador de um clube médio, estou a disparar o valor, mas não deve andar muito longe da realidade, do que o jogador médio de um clube da primeira liga. Ele não é mil vezes melhor. Aquilo é exponencial. Acontece que, como há muito poucos Cristiano Ronaldos, depois o valor vai disparando. E o valor não é o que a pessoa recebe não é a compensação pelo seu trabalho se não ninguém recebia esses valores absurdos o que recebe é a compensação para não aceitar proposta do outro. Exatamente. E esse é uma grande... E esse tema... Dito isto, eu acho que há... Isto não quer dizer que não haja muitos exageros nos salários dos toros, por exemplo. Porque muitas vezes lá está, eles estão justamente... Então, exatamente, é fora do mercado. Estão protegidos do mercado. Mas é verdade que a mera ação do mercado por este efeito vai levar, inevitavelmente, a que aqueles poucos que dão nas vistas e que são mais transacionáveis, vai levar a que os salários deles sumam imenso. Sim, sim. Isso
Rui Nascimento Alves
é inevitável. Sim, sim, sim. As áreas de compensação são muito interessantes, não é? Portanto, no mercado tem-se assistido a um incremento de facto considerável das componentes variáveis da compensação que leva a situações dessas, não é? Portanto, Eu tenho um pouco esta ideia de que, enfim, a compensação é o que é e essas situações existem mas não são os aspectos que mais contribuem para a retenção. Não são. Porque chega a um momento em que é uma máquina de dinheiro, ou seja, é uma slot machine. Não é por mais que se... Isso está,
José Maria Pimentel
aliás, te dando... Eu não acredito que havia um número disso. Já não sei
Rui Nascimento Alves
como é que era. Sim, exatamente.
José Maria Pimentel
Se põe isso em pós-edição ou se põe nas referências do podcast mas havia um estudo que media o valor, o salário anual a partir do qual nós nos tornávamos insensíveis a aumento sim, sim, sim, sem dúvida que não é um valor muito baixo, mas claramente há um valor a partir do qual... E está muito abaixo do salário de Cristiano Ronaldo, claramente. Portanto, tudo o que está para cima disso não tem a ver com isso. E quero apontar que o Rui queria chegar com isto, a motivação está muito longe de estar indexada à remuneração e tem a ver com muitos outros fatores. Assim, a remuneração atinge um patamar mínimo. E lá está, é mais verdadeiro em países mais ricos do que em países mais pobres.
Rui Nascimento Alves
E é interessante que, uma breve referência, nas novas gerações isso tende a ter menor impacto.
José Maria Pimentel
Exato. Millenials.
Rui Nascimento Alves
Tende a ter menor impacto, não é? E, portanto, enfim, se calhar os millenials daqui a poucos anos já serão 50% da força de
José Maria Pimentel
trabalho. Mas diga-me uma coisa a propósito disso. Eu já vi isso em vários fídeos. Sim, sim. A discussão dos millenials, os menos importados com o salário e tal. Mas isso é verdade em Portugal?
Rui Nascimento Alves
Eu não conheço informação relativa a variantes, digamos, em função do país de origem. De uma forma geral, eu diria que as novas gerações estão mais focadas num maior equilíbrio entre as suas vidas pessoais e profissionais, entre a possibilidade de trabalharem naquilo que gostam, de poderem parar para estudar e para continuar a aprender e em poderem ter tempo para si próprios. Esta tríade, digamos assim, que são muito... Sim,
José Maria Pimentel
trabalho, desenvolvimento, prazer. Exatamente.
Rui Nascimento Alves
E eu, enfim, eu costumo, em alguns fóruns, para provocar, costumo dizer, enfim, eu não sou maila nenhum, mas gostava de ter a mesma... Quem é que não gosta de poder trabalhar, ter tempo para estudar e...
José Maria Pimentel
E já gosta de ter... Subtrair os anos correspondentes à experiência. Exatamente.
Rui Nascimento Alves
Quem é que não gosta, não é? Quer dizer, eu acho que são bastante mais inteligentes do que nós nas gerações anteriores.
José Maria Pimentel
Mas isso é claramente verdade. Ou seja, há uma lógica de, lá está, até de autodeterminação, pegando aquilo do livre-arbítrio, não é? De individualismo no bom sentido que diverge. Isso em Portugal claramente acontece. Agora, esse lado de menor preocupação com o salário e tal, e até de alguma aleviandade em relação a isso, eu acho que o nosso... Por nós sermos um país menos rico do que os países... Somos um país apesar de todo rico a nível mundial, mas não somos um país rico a nível dos países ocidentais. E eu não vejo isso tanto assim em Portugal. Em Portugal não há a prática como existe nos países anglo-saxónicos ou nos países nórdicos de bom, vou tirar um gap year, vou tirar um ano sabático. Não é que não exista, mas é muito mais raro. E essas notícias muitas vezes são, faz uma bocadinha as notícias sobre nutrição, são das de uma forma simplista, como se aquilo se adaptasse à realidade. Exatamente. Não é a mesma coisa. Havia outra coisa que eu queria falar antes de acabar que é muito brevemente relacionado com a contratação de pessoas, não para falar das especificidades, porque isso seria outra conversa, mas para falar de um pormenor que tem que ver também com outra coisa que já falamos várias vezes ao longo da conversa. Esta conversa tem sido particularmente desorganizada, o que eu acho graça, porque acho que este tema, agir a pessoa a andar, cai lá. E há um ponto que falámos há pouco, relacionado com o alinhamento de objetivos e de incentivos, e com aquela questão do trabalhador, a pessoa ter os incentivos alinhados com os incentivos da empresa, que é o que quem gera a empresa deseja. Às vezes também acho que há um desalinhamento, aliás, acho que grande parte dos problemas de gestão se resume a desalinhamentos. Desalinhamentos por um lado e pensar no longo prazo por outro. Para mim, 90% dos problemas resumem-se a pensar no longo prazo. A pessoa, se estiver a pensar no longo prazo, está a tomar a decisão certa. E existe um desalinhamento, ou pelo menos eu tenho a impressão de um desalinhamento, muitas vezes, entre a gestão, isto é a administração, e quem gera os recursos humanos, ou seja, o departamento dos recursos humanos, o que for. E, por exemplo, na contratação, a minha impressão é que muitas vezes os recursos humanos fazem algo que é, lá está, completamente de acordo com os incentivos que têm, que é tomar o caminho mais fácil e mais estandardizado. Ou seja, é muito mais fácil eu usar o mesmo método para contratar toda a gente, estou a ir contra aquela diversidade que falávamos há pouco, não olho para casos menos ortodoxos, currículos no sentido histórico, historial daquela pessoa de experiência menos ortodoxa e sim vou procurar pessoas mais ou menos que todas encaixem nesta forma, porque é mais simples, não vou ter trabalho a vender isso superiormente e aparentemente ficamos todos contentes.
Rui Nascimento Alves
Sim, e o papel dos recursos humanos é cada vez mais esse, é contrariar isso, é desafiar esses dogmas, digamos assim, essa ortodoxia.
José Maria Pimentel
Eu acho que dos recursos humanos, como interrompeu, dos recursos humanos e também do CEO, ou do diretor geral,
Rui Nascimento Alves
sem dúvida. Se não é o CEO fazê-lo, enfim,
José Maria Pimentel
o trabalho para
Rui Nascimento Alves
A sua equipa vai ser mais difícil. Mas eu diria que a pessoa que está, enfim, que tem a responsabilidade da gestão de pessoas, enfim, todos têm, mas obviamente do homem das pessoas, do homem, da mulher, dos recursos humanos, Tem muito essa componente de desafiar, de ser um ator de mudança, por assim dizer, mas tem que ter essa capacidade, tem que ter esse poder interno e tem que ter essa credibilidade. Não é nada fácil ganhar essa credibilidade. Quando não tem um líder, ou uma líder, que tem a mesma visão, o trabalho torna-se bastante mais complexo, bastante mais desafiante. Quando não há o líder a pensar assim, a não pensar a longo prazo, a não querer ter, se calhar, capacidades que hoje não têm, no conceito de capabilitização. Ou seja, eu sei que hoje não trabalho nas componentes de e-commerce, mas preciso ter alguém daqui por dois anos. Então vamos começar a desenvolver essa capacidade interna, vamos começar a recrutar alguém, porque temos que atuar nesse mercado. Se não é ele a pensar nisso, não sei quem é que vai pensar, sinceramente. E, portanto, há muitos problemas que surgem desse desalinhamento. Ou ter um líder que está muito à frente, mas ter um gestor de recursos humanos que está muito atrás, ou o contrário. Ou o contrário, exatamente. É desse desalinhamento. Ou ambos atrás. Ou ambos atrás. Então é um catastrófico ser o P1. Portanto, esse alinhamento de facto é mágico e produz excelentes resultados. Muitas vezes há esse trabalho entre os dois, ou entre as duas, ou quer que seja, de mudança de organização. Mas tem que ser uma relação muito de desafio, mas também de companheirismo e de trabalho em conjunto. Trabalho de equipa. Verdadeiramente. Em relação às empresas. Eu não queria nomear empresas em concreto, mas eu trabalho há muitos anos em organizações norte-americanas. Ou melhor, trabalhei numa empresa suíça e nos últimos 15 anos numa empresa norte-americana. E, portanto, eu creio que esse é um modelo que me interessa bastante, com o qual me identifico muito, muito focado no mérito e muito focado no desempenho. E lá está, no desempenho em contexto de equipa. Portanto, interessa-me muito organizações nessa esfera, mas também organizações do Norte da Europa, que por oposição, digamos, são modelos se calhar mais humanistas,
José Maria Pimentel
mais harmoniosos,
Rui Nascimento Alves
culturas mais femininas, digamos assim, do ponto de vista sociológico. Portanto, eu responderia assim. Exatamente.
José Maria Pimentel
Bom, então para terminar, vamos à rubrica normal, que introduzi recentemente no podcast, de recomendar um livro que pode ser sempre isto, pode ser um livro que não tem que estar relacionado com a conversa, nem necessariamente tem que estar relacionado com a área, é um livro que tenha marcado a pessoa no fundo.
Rui Nascimento Alves
Sim, eu recomendaria-me, enfim, pela sua mensagem e pelo seu impacto, o livro Vencer, de Jack Welch, pela importância, pelo peso que teve numa organização também norte-americana que transformou e que mudou ao longo de mais de 20 anos. Enfim, pela mensagem, pela simplicidade. Eu gosto cada vez mais de coisas simples, mas que tenham impacto. E que façam sentido e que resultem da prática de gestão.
José Maria Pimentel
Sim, exatamente. Umas longas experiências que vão até à raiz da... Exatamente. No fundo é a aparição depurada de muitos anos de experiência. Sim, sim. E
Rui Nascimento Alves
todo ele é, digamos, é um conjunto de receitas, embora não goste muito do termo, de melhores e pessoas, em contexto de equipe.
José Maria Pimentel
Ele é um tipo com um bocadinho polémico, não tanto pela personalidade dele, pela maneira de ser, mas mais pelas práticas, lá está que ele recomendava, e um tipo que teve resultados inacreditáveis. Os resultados que ele conseguiu que a General Electric tivesse são completamente astronómicos, claro que é muito difícil lá como treinador de futebol, não é? É difícil estabelecer o que é que foi dele e o que é que não foi, mas é incrível. Boa recomendação. Eu li-me já para
Rui Nascimento Alves
aí. Também eu. Também eu. Mas fica-me como uma referência, de facto.
José Maria Pimentel
Boa, Rui, obrigadíssimo pela conversa. Muito obrigado. Obrigado eu pelo convite, mais uma vez. Obrigado.